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Substâncias antifúngicas de Xylaria sp., um fungo endofítico isolado de Palicourea marcgravii (Rubiaceae)

Antifungal compounds of Xylaria sp., an endophytic fungus isolated from Palicourea marcgravii (Rubiaceae)

Resumo

Five compounds, 2-hexyl-3-methyl-butanodioic acid (1), cytochalasin D (2), 7-dechlorogriseofulvin (3), cytochalasin B (4) and griseofulvin (5), have been isolated from the endophytic fungus Xylaria sp., and their structures were elucidated on the basis of spectroscopic data. In the bioautography assay against Cladosporium cladosporioides and Cladosporium sphaerospermum, compounds 1 and 2 were found to be active while compounds 3, 4 and 5 did not show antifungal activity.

endophytic fungus; Xylaria sp.; antifungal compounds


endophytic fungus; Xylaria sp.; antifungal compounds

ARTIGO

Substâncias antifúngicas de Xylaria sp., um fungo endofítico isolado de Palicourea marcgravii (Rubiaceae)

Antifungal compounds of Xylaria sp., an endophytic fungus isolated from Palicourea marcgravii (Rubiaceae)

Mariana C. CafêuI; Geraldo H. SilvaI; Helder L. TelesI; Vanderlan da S. BolzaniI; Ângela R. AraújoI, * * e-mail: araujoar@iq.unesp.br ; Maria Cláudia M. YoungII; Ludwig H. PfenningIII

IInstituto de Química, Universidade Estadual Paulista, CP 355, 14801-970 Araraquara - SP

IISeção de Fisiologia e Bioquímica de Plantas, Instituto de Botânica, CP 4005, 01061-970 São Paulo - SP

IIIDepartamento de Fitopatologia, Universidade Federal de Lavras, 37200-000 Lavras - MG

ABSTRACT

Five compounds, 2-hexyl-3-methyl-butanodioic acid (1), cytochalasin D (2), 7-dechlorogriseofulvin (3), cytochalasin B (4) and griseofulvin (5), have been isolated from the endophytic fungus Xylaria sp., and their structures were elucidated on the basis of spectroscopic data. In the bioautography assay against Cladosporium cladosporioides and Cladosporium sphaerospermum, compounds 1 and 2 were found to be active while compounds 3, 4 and 5 did not show antifungal activity.

Keywords: endophytic fungus; Xylaria sp.; antifungal compounds.

INTRODUÇÃO

Vários produtos naturais com propriedades terapêuticas foram isolados de espécies de fungos, especialmente agentes quimioterápicos, como penicilinas e cefalosporinas usadas até hoje como antibióticos; mevinolina, um agente redutor de colesterol; bleomicinas, daunorubicinas e análogos, como agentes antitumorais; avermectina B, um anti-helmíntico de largo espectro, entre outros1,2. Recentemente, o aumento de infecções fúngicas causadas por fungos oportunistas, como Candida e Aspergillus, e a resistência microbiana a uma série de antibióticos disponível no mercado estão motivando, novamente, as companhias farmacêuticas a investirem na busca por substâncias antifúngicas de fontes naturais2.

Dentre os microrganismos que acumulam substâncias antifúngicas, fungos e leveduras destacam-se pela quantidade de produtos farmacêuticos de uso corrente na medicina com tais propriedades.

Os fungos filamentosos, onde os endofíticos estão incluídos, constituem um grupo de microrganismos que biossintetizam uma quantidade fantástica de metabólitos secundários, chegando, em casos especiais, a uma produção 73% superior a de outras classes de microrganismos3. Fungos endofíticos são microrganismos que habitam o interior de plantas e constituem-se em uma fonte valiosa de produtos bioativos4. Este nicho de fungos associados a espécies vegetais de Cerrado e da Mata Atlântica permanece praticamente sem qualquer estudo químico e biológico sendo, portanto, uma fonte potencial de substâncias de interesse farmacológico.

Dando continuidade às nossas pesquisas de bioprospecção, várias espécies vegetais de Cerrado e Mata Atlântica foram selecionadas para isolamento e cultivo de fungos endofíticos. De Palicourea marcgravii St. Hil., uma Rubiaceae de larga ocorrência no Cerrado, e conhecida popularmente como "erva de rato" ou "café bravo", foram isolados vários fungos endofíticos. Dentre os já identificados, Xylaria sp. foi selecionado para estudo devido a atividade apresentada por seu extrato bruto frente aos fungos fitopatogênicos Cladosporium cladosporioides e Cladosporium sphaerospermum, indicando a produção de metabólitos com atividade antifúngica em potencial. Xylaria sp. foi submetido aos procedimentos usuais de cultivo em larga escala para fornecimento dos extratos brutos que após fracionamento bioguiado, levou ao isolamento de 5 substâncias: ácido 2-hexilideno-3-metilbutanodióico (1), citocalasina D (2), 7-declorogriseofulvina (3), citocalasina B (4) e griseofulvina (5) (Figura 1).


PARTE EXPERIMENTAL

Procedimentos experimentais gerais

Os espectros de RMN de 1H e 13C e experimentos bidimensionais foram realizados em espectrômetro Varian INOVA-500 operando a 500 MHz para o núcleo de 1H e em 125 MHz para o núcleo de 13C; TMS foi utilizado como referência interna. Os espectros de massas foram registrados em espectrômetro de massas de baixa resolução FISONS- Modelo VG Platfform II, no modo Electrospray. As análises cromatográficas por CLAE no modo analítico foram realizadas em equipamento ProStar da Varian acoplado ao detetor ProStar 330 de arranjos de diodos, utilizando coluna analítica Phenomenex Fenil-Hexil (250 x 4,60 mm; 5 mm). No modo preparativo, as análises por CLAE foram realizadas em equipamento ProStar da Varian acoplado ao detetor ProStar UV, utilizando coluna Phenomenex Fenil-Hexil (250 x 21,20 mm; 10 mm). Nas separações cromatográficas em coluna aberta ou sob pressão foram utilizadas sílica gel C-18 (Merck) e Sephadex LH-20 (Merck) como fases estacionárias. Para cultivo de Xylaria sp. em meio líquido foram utilizados 20 frascos de Erlenmeyers (500 mL) contendo 200 mL de meio de cultivo preparado a partir de água Mili-Q e PDB (DIFCO), posteriormente submetidos a esterilização em autoclave a 121 ºC e 1 atm de pressão por 20 min. Para cultivo em meio sólido de milho foram colocados 90 g de milho descascado (Yoki) em 2 Erlenmeyers (500 mL) contendo 75 mL de água destilada. Estes meios foram autoclavados quatro vezes (4 dias) por 40 min à temperatura de 121 ºC e 1 atm de pressão.

Material vegetal

A espécie vegetal Palicourea marcgravii St. Hil. (Rubiaceae) foi coletada, em junho de 2001, na Estação Ecológica Experimental de Mogi-Guaçú (SP). Uma exsicata do material vegetal identificado encontra-se depositada no Herbário do Instituto de Botânica da Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo (SP).

Isolamento da cepa fúngica

O fungo endofítico foi isolado de folhas saudáveis de Palicourea marcgravii. As folhas foram lavadas com água e sabão e esterilizadas por imersão em NaClO 1% (5 min) e em etanol 70% (1 min), seguidas de lavagem com água estéril (10 min) e secagem5. Após o processo de esterilização, as folhas foram cortadas e incubadas em placas de Petri contendo PDA, às quais foi adicionado o antibiótico sulfato de antamicina (50 mg/mL) para evitar crescimento de bactérias contaminantes. Repiques sucessivos em placas de Petri contendo PDA resultaram no isolamento de 4 linhagens codificadas como PM-01, PM-02, PM-03 e PM-04. Estas linhagens foram preservadas em frascos esterilizados com água. A linhagem PM-03, identificada como Xylaria sp. pelo Prof. Dr. L. H. Pfenning, Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Lavras – MG, foi selecionada para estudo químico, visando a obtenção das substâncias bioativas.

Cultivo do microrganismo e obtenção dos extratos brutos

A cepa fúngica de Xylaria sp. foi repicada em placa de Petri contendo PDA e incubada por 7 dias. Após este período, o fungo foi inoculado nos meios de cultivo líquido (PDB) e sólido (Milho). Em PDB, Xylaria sp. foi cultivada em 4000 mL de meio (20 frascos de Erlenmeyers de 500 mL) e mantida em incubadora rotatória ("shaker") sob temperatura controlada (24 ºC) por aproximadamente 28 dias, fornecendo o caldo fermentado. O caldo foi submetido à filtração para separação dos micélios e à partição líquido/líquido com AcOEt que, após a evaporação do solvente, forneceu 2,0 g do extrato bruto acetato de etila (PDB-AcOEt). Xylaria sp. também foi cultivada em meio sólido milho, onde permaneceu incubada por 21 dias, à 24 ºC em modo estático. Em seguida, foi realizada a extração com metanol, filtração para separação dos micélios e concentração do solvente, fornecendo 5,3 g de extrato bruto metanólico (milho-MeOH).

Isolamento dos constituintes químicos

O extrato bruto PDB-AcOEt (2,0 g) foi dissolvido em acetato de etila e, em seguida, particionado com hexano e acetonitrila, resultando em duas soluções. A solução ACN, após concentração, forneceu a fração ACN (0,7 g) que foi submetida à cromatografia em coluna usando sílica de fase reversa (C-18), eluída com MeOH:H2O no modo gradiente, resultando em sete sub-frações. As sub-frações ACN-4 a ACN-7 foram reunidas (ACN4-7; 400 mg) devido à bioatividade apresentada frente às linhagens Cladosporium cladosporioides e C. sphaerospermum. Esta sub-fração ACN4-7 foi submetida a uma partição com acetato de etila e solução de hidróxido de sódio 5%. A fase aquosa foi tratada com ácido clorídrico até pH 5 e, em seguida, extraída com clorofórmio que, após a concentração do solvente, forneceu a substância 1 (100 mg). A fase orgânica (AcOEt), após concentração do solvente, foi fracionada em uma coluna Sephadex LH-20 eluída com metanol, resultando em 10 sub-frações (FCS 1-10). A sub-fração FCS-1 (23 mg) foi submetida à CLAE preparativa empregando modo de eluição isocrático acetonitrila:água (38:62), fluxo 20 mL/min, l 221 nm e coluna fenil hexil, resultando no isolamento da substância 2 (3,5 mg).

O extrato bruto milho-MeOH (5,3 g) foi analisado por RMN de 1H, onde constataram-se vários sinais referentes a hidrogênios metínicos e metílicos típicos de açúcares. Para remover estes açúcares, uma porção do extrato (1 g) foi dissolvida (parcialmente) em acetato de etila, obtendo-se a fração AcOEt-milho (210 mg). Em seguida, esta fração foi submetida à cromatografia em coluna com sílica de fase reversa C-18 no modo de eluição isocrático empregando MeOH:H2O (80:20), resultando em M-1 (100 mg). A subfração M-1 foi purificada por CLAE preparativa utilizando como eluente MeOH:H2O (60:40), fluxo de 15 mL/min, coluna fenil hexil e l 221 nm fornecendo 8 sub-frações (M1.1 – M1.8). As sub-frações M1.3, M1.5 e M1.7 resultaram no isolamento das substâncias 3 (8,3 mg), 4 (20,6 mg) e 5 (8,8 mg).

Bioensaio

Os extratos brutos (PDB-AcOEt e milho-MeOH) e as substâncias isoladas foram submetidos à técnica de Bioautografia para detecção de atividade antifúngica. Este bioensaio consiste na nebulização de suspensões dos fungos Cladosporium cladosporioides e Cladosporium sphaerospermum (concentração 5 x 107 esporos/mL em solução de glicose e sais) em placas de CCDC contendo 400 µg dos extratos brutos e 100 µg das substâncias puras, previamente eluídas com solvente adequado. Em seguida, as placas foram incubadas em câmara úmida a 25 ºC por 48 h. O aparecimento de zonas de inibição na placa nebulizada com C. sphaerospermum e/ou C. cladosporioides indica a presença de substância(s) com potencial antifúngico6. A nistatina foi a substância utilizada como antifúngico padrão.

As substâncias puras que se mostraram potencialmente bioativas foram submetidas a bioensaio, para determinação do limite de detecção. Os resultados são expressos como valores de concentração da amostra (µg/mL) requeridos para produzir um halo de inibição comparável com o produzido pelo padrão nistatina. Os ensaios foram realizados em diferentes concentrações (100, 50, 25, 10, 5 e 1 µg/mL) para as substâncias puras e para o padrão.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo químico dos extratos brutos PDB-AcOEt e milho-MeOH, produzidos pelo fungo endofítico Xylaria sp., resultou no isolamento do ácido 2-hexilideno-3-metilbutanodióico (1), citocalasina D (2), 7-declorogriseofulvina (3), citocalasina B (4) e griseofulvina (5). A identificação destas substâncias foi realizada com base na comparação de seus dados espectroscópicos (RMN 1H e 13C, gCOSY, gHMQC, gHMBC e EM) com valores disponíveis na literatura. Os metabólitos 1-5 já haviam sido produzidos por fungos da família Xylariaceae, entretanto, este é o primeiro relato da produção de 3, 4 e 5 por um fungo endofítico.

A análise detalhada dos espectros de massas, RMN de 1H e 13C (uni e bidimensionais), além da comparação com dados da literatura7, permitiu a identificação de 1 como ácido 2-hexilideno-3-metilbutanodióico.

A substância 2 foi identificada como citocalasina D (C30H37NO6) através da análise dos dados de RMN de 1H e 13C e EM-ES (+120 V) e evidenciou 13 graus de insaturação. A análise dos dados de RMN de 1H e 13C indicou a presença de três carbonilas, um anel benzênico monossubstituído e seis carbonos olefínicos, o que resultou no grau de insaturação 10. Os 3 graus de insaturações remanescentes sugeriram que a molécula fosse constituída por 3 anéis, além do anel aromático. O espectro de hidrogênio apresentou sinais em dH 3,57 e 5,26 característicos de hidrogênios carbinólicos, que foram atribuídos à H-7 e H-21. A geometria das ligações duplas D13-14 e D19-20 foi determinada como E, devido às constantes de acoplamento (J = 15,0 Hz) entre os hidrogênios. Os sinais dH 1,38, 1,05, 0,39 e 2,27 foram atribuídos às metilas H3C-23, H3C-22, H3C-11 e H3C-25, respectivamente. O sinal referente a uma metila em dH 2,27 é típico de citocalasina com um grupo acetato na forma de radical. Estas informações aliadas à análise dos dados espectrométricos de RMN de 1H, 13C, gHMQC, gHMBC, gCOSY, EM e comparação com os dados da literatura8 confirmaram a substância 2 como sendo uma citocalasina do tipo D. A configuração relativa de 2 foi determinada por comparação dos valores de deslocamentos químicos de RMN 1H e 13C, constantes de acoplamentos e comparação com os dados da literatura. Experimento de rotação ótica forneceu [a]D25 +15,4 (c. 0,25 EtOH), condizente com a literatura9, permitindo identificá-la como (+)-citocalasina D. Os valores dos deslocamentos químicos da citocalasina D (2) estão apresentados na Tabela 1.

A substância 4 foi identificada como citocalasina B através da análise dos dados espectrométricos de RMN de 1H e 13C (uni e bidimensionais), EM-ES (+120 V) e comparação com dados da literatura10,11. Os sinais registrados pelo espectro de RMN de 1H em dH 5,81, 5,03, 6,76 e 5,70 foram atribuídos aos hidrogênios das ligações duplas D13-14 e D21-22, respectivamente. Ambas ligações duplas possuem geometria E, uma vez que a constante de acoplamento entre os hidrogênios H-13-H-14 e H-21-H-22 é de 15,5 Hz. Pelo espectro de RMN de 1H também foi possível verificar a presença de 2 metilas (CH3-11 e CH3-24) e de hidrogênios carbinólicos (dH 3,61 e 4,36) atribuídos aos hidrogênios H-7 e H-20. Os dados espectrométricos de 4 foram comparados com os da citocalasina D (2), onde foi possível notar uma grande semelhança nos sinais e constatou-se que 4 se tratava de uma substância da classe de citocalasinas. A diferença marcante entre 2 e 4 está na ausência de um sinal entre dH 2,10-2,30, atribuído ao deslocamento químico da metila do acetato, o que permitiu propor que a ligação com o C-9 ocorre com o oxigênio do grupo acetato, em vez de se ligar no átomo de carbono como no caso da citocalasina D (2). A configuração relativa de 4 foi determinada por comparação dos valores de deslocamentos químicos em RMN de 1H, 13C, constantes de acoplamentos e comparação com dados da literatura8. O experimento de rotação ótica forneceu [a]D25 +71,3 (c. 0,006 MeOH) e permitiu identificar 4 como (+)-citocalasina B. Os valores dos deslocamentos químicos da citocalasina B (4) estão apresentados na Tabela 1.

A substância 3 foi identificada como 7-decloro-griseofulvina (C17H18O6) através da análise dos dados espectrométricos e comparação com a literatura12. O espectro de massas obtido pela técnica EM-ES (+35 V) apresentou o pico base (100%) em m/z 319 [M + H]+ e picos em m/z 341 [M + Na]+ e m/z 181 [M + C8H10O2]+ , indicando 9 graus de insaturação, permitindo propor um sistema de três ciclos e seis insaturações. O espectro de RMN de 1H registrou sinais em dH 6,15 (d, J=1,5 Hz) e dH 5,97 (d, J=1,5 Hz) sugerindo um padrão de substituição meta, em um anel aromático tetrassubstituído. Observaram-se singletos em dH 5,47, 3,83, 3,82 e 3,55, indicando a presença de um hidrogênio olefínico e três metoxilas, sendo duas aromáticas e uma sobre sistema insaturado, respectivamente. Foi verificado um dubleto em dH 0,89 (6,5 Hz) e um multipleto em dH 2,68, indicativo da presença de uma metila e um hidrogênio metínico. O espectro de RMN de 1H também registrou dois duplos dubletos em dH 2,33 (dd, J= 17,0 e 5,0 Hz) e dH 2,99 (dd, J=17,0 e 13,0 Hz) com dC 40,1, evidenciando tratar-se de um metileno a a um centro estereogênico e a uma carbonila a,b insaturada. O espectro de RMN de 13C indicou a presença de 17 átomos de carbono, dos quais seis foram atribuídos como sendo do tipo aromático (dC 176,1; 170,4; 159,1; 104,4; 93,3 e 88,6), dois carbonos sp2 em dC 171,3 e 104,8, dois carbonos carbonílicos em dC 197,3 e 192,4, três metoxilas atribuídas aos sinais em dC 56,6, 56,1 e 56,1, uma metila em dC 14,2, um metino em dC 36,6, um carbono metilênico em dC 40,1 e um carbono quaternário em dC 89,9. Através da análise detalhada do mapa de contorno gHMQC foi possível atribuir os hidrogênios aos respectivos átomos de carbono. Pela análise do mapa de contorno gHMBC observaram-se as correlações entre H-5«C-3a/C-7a/C-7/C-6, H-7«C-3a/C-4/C-5/C-6, 4-OCH3«C-4* ou C-6*, 6-OCH3« C-4* ou C-6* (*podem estar trocados), H-3'«C-1'/C-2'/C-4', 2'OCH3«C-2', 6'-CH3«C-6'/C-5'/C-1', Ha5'«C-4'/C-6'/C-1', Hb-5'«C-4'/C-6'/CH3-6' e H-6'«C-1', os quais confirmaram 3 como 7-decloro-griseofulvina. A configuração relativa de 3 foi determinada por comparação dos valores dos deslocamentos em RMN de 1H, 13C, constantes de acoplamentos e comparação com dados da literatura12. Após experimento de rotação ótica, que forneceu [a]D25 = + 146,1 (c. 0,0035 em CHCl3), foi possível identificar esta substância como (+)-7-decloro-griseofulvina. Os valores dos deslocamentos químicos da 7-decloro-griseofulvina (3) estão apresentados na Tabela 2.

Os espectros de RMN de 1H e 13C de 5 foram comparados com os espectros obtidos para 3 e foi possível notar a grande semelhança no perfil espectral destas duas substâncias, sendo a diferença marcante a ausência de um dubleto na região de aromático e a presença de apenas um sinal, na forma de singleto, nesta região (dH 6,07). Este fato sugeriu a presença de um anel aromático pentassubstituído em C-7. O espectro de massas de 5 obtido pela técnica EM-ES a +35 V forneceu os picos m/z 375, indicando o aduto com sódio ([M + Na]+), m/z 353 [M + H]+ e m/z 377 [M+2]+ evidenciando a presença de um átomo de cloro, sugerindo estar posicionado em C-7. Estas informações aliadas à comparação com a literatura12 conduziram à estrutura da griseofulvina (C17H17ClO6). A rotação ótica de 5 foi medida e o [a]D = +104 (c. 0,0035 em acetona) permitiu identificar a substância como (+)-griseofulvina. Os valores dos deslocamentos químicos da griseofulvina (5) estão apresentados na Tabela 2.

Os extratos brutos (PDB e milho) e as substâncias isoladas foram submetidas a um ensaio preliminar para avaliação da atividade antifúngica através da técnica de Bioautografia. O extrato bruto obtido em milho, assim como as substâncias isoladas deste extrato (3, 4 e 5) não se mostraram ativas frente às linhagens Cladosporium cladosporioides e C. sphaerospermum. Entretanto a griseofulvina (5) é atualmente utilizada como um poderoso antimicótico, sendo comercializada em medicamentos como Fulcinâ (Zeneca) e Sporostatinâ (Shering Plough) com atividade contra várias espécies de Microsporum, Epidermophyton e Trychophyton. O extrato bruto obtido após cultivo de Xylaria sp. em PDB e os compostos ácido 2-hexilideno-3-metilbutanodióico (1) e citocalasina D (2) mostraram-se ativos frente às linhagens C. cladosporioides e C. spahaerospermum. Os resultados dos limites de detecção das substâncias 1 e 2 estão apresentados na Tabela 3, e este é o primeiro relato do potencial antifúngico demonstrado por estas substâncias.

CONCLUSÃO

O estudo químico dos extratos produzidos por Xylaria sp. permitiu o isolamento de substâncias com atividade antifúngica em potencial e de interesse comercial, evidenciando os fungos endofíticos como promissores na busca por metabólitos bioativos. Este é o primeiro relato das substâncias 3, 4 e 5 serem produzidas por um fungo endofítico do gênero Xylaria. As substâncias 1 e 2 já foram relatadas como metabólitos de Xylaria sp., porém esta é a primeira vez como substâncias produzidas por um fungo endofítico.

A produção das substâncias 1 e 2 com atividade frente aos fungos fitopatogênicos C. cladosporioides e C. sphaerospermum por Xylaria sp. dá indícios de que os endófitos associados com Palicourea marcgravii se encontram em uma relação de simbiose, produzindo substâncias antifúngicas contra possíveis fungos fitopatogênicos.

Os resultados encontrados até o momento evidenciam a potencialidade destes microrganismos e reforçam a necessidade do estudo químico biomonitorado neste nicho de fungos.

AGRADECIMENTOS

à FAPESP, programa Biota-FAPESP (Instituto Virtual da Biodiversidade, www.biota.org) pelo auxílio financeiro, à CAPES pelas bolsas concedidas a M. C. Cafêu, H. L. Teles e ao CNPq pelas bolsas de G. H. da Silva, V. da S. Bolzani e M. C. M. Young.

Recebido em 31/8/04; aceito em 11/3/05; publicado na web em 10/8/05

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  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Dez 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 2005

    Histórico

    • Recebido
      31 Ago 2004
    • Aceito
      11 Mar 2005
    Sociedade Brasileira de Química Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), CP6154, 13083-0970 - Campinas - SP - Brazil
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