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Carta ao editor

CARTA AO EDITOR

A editoria recebeu, recentemente, da empresa Itatex Indústria e Comércio de Minerais Ltda. a carta abaixo, referente ao trabalho "Argilas especiais: argilas quimicamente modificadas - uma revisão", publicada em 2007, no vol. 30, nº 5, 1282. Publicamos também a resposta dos autores do referido trabalho.

Campinas, 04 de junho de 2009

Ao Redator-Chefe da Revista Química Nova

Prezados Senhores:

Sabemos que a Química Nova é uma revista de grande prestígio acadêmico e que alcançou esse nível de excelência pelo rigor e veracidade dos dados e informações publicadas, sob referendum de pesquisadores muito experientes. Não temos dúvida de que a Revista Química Nova contribui com muita competência não só através da divulgação diária dos avanços científicos, alcançados pelos pesquisadores, mas também porque permite atualizar os conhecimentos com seus valorosos trabalhos de revisão. Contudo, verificamos que o artigo de revisão do volume 30(5), páginas 1282-1294/2007 publicou uma informação equivocada quando afirmou que "no Brasil não há produção de caulins modificados, revestidos com silanos..." (pág. 1285).

Um dos objetivos desta carta é informar ao editor-chefe desta revista, de que a empresa ITATEX, fundada em 1983, detém o "know-how" do processo de silanização de uma série de minerais industriais, tais como caulim, talco, agalmatolito, mica, quartzo, dentro outros. Há mais de 15 anos, a empresa vem ampliando sua linha de produtos comerciais, através da silanização desses minerais. A nossa atual capacidade instalada para silanização de minerais industriais é de 200 toneladas mensais. A empresa detém, também, a propriedade de duas patentes, uma sobre calcinação de caulins e a outra sobre a obtenção de hidróxido de magnésio a partir da Magnesita, como antichama de polímeros. Recentemente, a empresa ITATEX desenvolveu um novo processo para fabricação de argilas organofílicas, como modificador reológico para tintas e fabricação de nanocompósitos.

A afirmação publicada (entre aspas), no artigo referenciado acima, negligencia as atividades de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico da empresa ITATEX e poderá servir de argumentação equivocada para justificar pedidos de fomentos ao governo para pesquisa, sem considerar e/ou reconhecer os progressos tecnológicos alcançados pela iniciativa privada. Além disso, a afirmação supracitada está na contramão do pleito que a empresa ITATEX irá fazer ao governo, com o apoio da ABIFINA, para que alíquota dos minerais especiais importados, seja aumentada já que muitos deles foram nacionalizados pela mesma.

Acreditamos que os pesquisadores cometeram esse equívoco por desconhecerem o negócio da ITATEX e, por esta razão, aproveitamos a oportunidade para convidá-los a visitar a empresa por meio desta carta. Sentiremos honrados em recebê-los, pois, os vários artigos publicados por esses pesquisadores, reforçam o foco do nosso negócio que se concentra na agregação de valor aos minerais industriais, abundantes em nosso país, e que são muitas vezes tratados como simples commodities.

Espero, então, que o editor-chefe da revista compreenda a importância de se fazer a correção da afirmação equivocada publicada, no artigo de revisão supracitado, com o objetivo de não só harmonizar os interesses distintos das partes, mas também evitar prejuízos plausíveis à empresa, à revista e ao país. Estamos disponíveis para dirimir quaisquer dúvidas pertinentes ao assunto.

Atenciosamente,

Engº Antônio Alonso Ribeiro

Diretor Geral

Itatex Indústria e Comércio de Minerais Ltda.

São Paulo, 22 de junho de 2009

A Comissão Editorial da Revista Química Nova

Caros Senhores

Agradecemos o envio da mensagem datada de 10/06/2009 na qual é a nós apresentada a carta do Engº. Antonio Alonso Ribeiro, Diretor Geral da empresa Itatex Indústria e Comércio de Minerais Ltda., na qual são feitos comentários a respeito do artigo "Argilas especiais: argilas quimicamente modificadas - Uma revisão", publicado nesta revista em 20071. Esse artigo foi enviado para publicação em abril de 2006, sendo aceito e publicado um ano depois.

Consideramos que o protesto do Engº. Antonio Alonso Ribeiro contra a frase escrita por nós no item "Caulins e Talco no Brasil": "...Contudo, não há produção de caulins modificados, revestidos com silanos..." (sic) é uma boa ocasião para que sejam discutidos alguns aspectos que consideramos relevantes em relação à troca de informações, a respeito das pesquisas que são desenvolvidas na academia e no meio empresarial brasileiros.

Em primeiro lugar, gostaríamos de expressar nossa satisfação em ter a informação clara de que caulins com modificação superficial estão sendo fabricados no Brasil pela Itatex, pois consideramos que produtos desse tipo são de grande interesse para vários segmentos industriais nacionais. No entanto, essa informação, apresentada na carta da empresa endereçada à Química Nova, não foi publicada, a nosso conhecimento, em publicações científicas, pelo menos antes do momento da redação do nosso artigo ora em discussão. Quando da redação do artigo (em 2005 e 2006), foi feita uma busca que consideramos exaustiva na internet, e não foi encontrada menção a caulins revestidos por silanos produzidos no Brasil em publicações de revistas científicas. Evidentemente, publicações podem ter sido feitas em Anais de eventos científicos aos quais não tivemos acesso, e se esse for o caso, pedimos desculpas por nosso desconhecimento.

Repetimos essa busca no presente momento para a redação da resposta ao questionamento que nos foi feito, e continuamos a não encontrar menção em revistas científicas. O próprio "web site" atual da empresa (www.itatex.com.br) não apresenta a menção da palavra "caulim" na página onde são descritos seus produtos, embora haja a apresentação de uma curva de difração de raios-X de uma argila chamada corretamente de "argila caulinítica" na página de apresentação da empresa. Essa argila, no entanto, é dada como exemplo de uma linha de produtos (linha denominada SACA pela empresa) que não é indicada como sendo a mesma linha dos produtos modificados, não sendo claramente mostrada, portanto, a ligação entre as duas linhas de produtos. Em todo o "web site", encontramos a menção da palavra-chave caulim apenas uma vez, numa nota existente na página "Imprensa", proveniente de uma nota publicada na revista da Abrafati nº 77, de abril de 2008, posterior, portanto, à redação e publicação de nosso artigo. Entendemos que a ausência de menção clara da palavra "caulim" possa ser devida a um interesse legítimo da empresa em proteger processos tecnológicos sensíveis, inclusive protegidos por patente. Mas é necessário dizer que, ao não empregar o nome do minério (argila denominada "caulim") com o qual desenvolve muitos de seus produtos, a empresa pode dificultar que o meio acadêmico possa dar o reconhecimento devido aos avanços tecnológicos por ela desenvolvidos.

O caso específico ora em discussão é emblemático. Nele, o uso de termos cientificamente imprecisos por parte da empresa para definir os argilominerais que constituem algumas de suas matérias-primas fez com que não conseguíssemos tomar conhecimento dos avanços importantes desenvolvidos pela empresa. Ao buscarmos na literatura científica para a redação de um artigo de revisão outros trabalhos, além dos desenvolvidos em nosso próprio grupo de pesquisas, tendo como tema o uso industrial de caulins procuramos artigos tendo necessariamente "caulim" e "caulinita" como uma de suas palavras-chave. E os termos caulim ou caulinita, a tomar como exemplo o "web site" atual da empresa, podem não ter sido empregados por ela para descrever seus produtos.

Ora, caulim é um tipo de argila (não é, portanto, um composto inorgânico) constituído essencialmente por um mineral2 (argilomineral), a caulinita. Além desse argilomineral, um caulim apresenta normalmente impurezas, em teores variáveis, conforme a origem e o processamento industrial que tenha sofrido.

A caulinita, por ser um composto químico cristalino, tem uma composição química definida, uma classificação como composto químico - é um hidroxi-silicato de alumínio anidro, isto é, não tem águas de hidratação em sua estrutura cristalina, que tem uma fórmula do tipo "molecular" de cela unitária, que é Al4Si4O10(OH)4 , que evidencia esse fato.

Assim sendo, o termo empregado no "web site" atual da empresa para a matéria-prima que constitui os produtos que acreditamos serem aqueles produzidos a partir de caulins - hidrossilicato de alumínio - não é um sinônimo cientificamente adequado nem para caulinita, nem para caulim, nem para hidroxi-silicato de alumínio.

O fato de que sejam mencionadas no "web site", no caso dos produtos ora analisados, as composições químicas (em óxidos) não permite que se afirme, de um ponto de vista científico, que a matéria-prima empregada na produção de produtos modificados por silanos tenha empregado caulim ou caulinita, uma vez que a composição química é uma característica necessária, mas não suficiente, para o estabelecimento da identidade de um mineral - a estrutura cristalina específica é fundamental. Dessa forma, pode-se admitir que a linha de produtos denominada "SACA" pela Itatex, segundo a curva de DRX apresentada, seja produzida a partir de argila caulinítica, mas o mesmo não pode ser afirmado, tomando com base apenas as informações contidas no "web site", a respeito dos produtos modificados com uso de silanos, uma vez que a ligação entre as duas linhas de produtos (linhas "SACA" e "ITASIL") não foi inequivocamente estabelecida.

O caso é emblemático e agradecemos a oportunidade de discuti-lo. Ninguém pode ter a pretensão de abarcar todo o conhecimento científico e tecnológico disponível, mesmo em áreas aparentemente restritas do conhecimento - e isso é ainda mais verdadeiro em uma área multidisciplinar e com áreas de aplicação das mais diversas como é o caso da Ciência e Tecnologia de Argilas, e nós certamente não temos essa pretensão. Ficamos muito contentes em ter informação clara a respeito da existência no mercado de produtos nacionais à base de caulins revestidos com silanos, e parabenizamos a empresa Itatex pelo desenvolvimento de tais produtos. Esse fato não foi mencionado em nosso artigo de revisão pois não encontramos, no momento de sua redação, em alguma publicação científica que pudesse ser citada e recuperada por um leitor da revista Química Nova uma menção inequívoca a esse respeito.

Se equívoco houve da parte dos autores, não foi por negligência da nossa parte, nem por algum desejo de causar dano à empresa Itatex, pois buscamos conduzir nosso trabalho da forma mais adequada e precisa que pudemos. Trabalho esse que, por vezes e certamente sem essa intenção, é dificultado pelas próprias empresas que desenvolvem tecnologia e conhecimento no Brasil, as quais teríamos prazer de citar e valorizar, pois no afã legítimo de proteger conhecimentos valiosos, muitas vezes se dificulta o acesso à informação de forma exagerada.

Há que se buscar um equilíbrio adequado entre o que é conhecimento sensível e que deve ser protegido, e o que pode e deve ser divulgado, para que seja evitada uma multiplicação desnecessária de esforços, e para que se aprofunde a sinergia que deve existir entre os meios acadêmico e industrial. Nesse sentido, agradecemos vivamente o convite feito pela Itatex para uma visita a suas instalações. Colocamo-nos à disposição dos responsáveis da empresa para que esse encontro seja realizado numa data adequada para ambas as partes. E aproveitamos a ocasião para convidar o Engº. Antonio Alonso Ribeiro para nos visitar na Escola Politécnica da USP, no momento que lhe for mais conveniente.

Antonio Carlos Vieira Coelho

Pérsio de Souza Santos

Helena de Souza Santos

  • 1. Quim. Nova, Vol. 30, Nş. 5, 1282-1294, 2007.
  • 2. Definição de mineral segundo a IMA - International Mineral Association: Mineral é um elemento ou composto químico que normalmente é cristalino e que é resultado de um processo geológico (Canadian Mineralogist, 33, 689-690, 1995).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2009
  • Data do Fascículo
    2009
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