Resumo:
Introdução:
Com a pandemia de Covid-19, instituições globais de saúde recomendaram a adoção de medidas restritivas, como o fechamento de unidades de ensino. As instituições de ensino tiveram que se adaptar ao ensino remoto emergencial de forma abrupta e com pouco tempo para preparo. Os alunos também tiveram desafios a serem enfrentados, como uso da internet e isolamento dentro de casa. O ensino superior na área de saúde também teve que se adequar a esse novo modelo com adaptação a práticas humanizadas.
Objetivo:
Este estudo teve como objetivo avaliar a percepção da utilização do ensino remoto emergencial por discentes em uma universidade pública de saúde durante a pandemia da Covid-19.
Método:
Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória, com delineamento transversal e abordagem quantitativa, realizada por meio de aplicação de um questionário com perguntas fechadas. O questionário foi dividido em quatro tópicos: caracterização da amostra, condições de uso da internet, condições do local do estudo e percepção do estudante acerca da utilização do ensino remoto.
Resultado:
Participaram do estudo 480 alunos dos cursos de Enfermagem, Medicina e Odontologia da Universidade do Estado do Amazonas. A maioria desses alunos utilizou wi-fi residencial, com qualidade de sinal regular, e aqueles que residem no interior do estado foram os mais prejudicados por conta da inconstância da internet. Os alunos assistiram predominantemente às aulas no quarto e apontaram a fácil desconcentração como o fator mais prejudicial das aulas remotas. A maioria dos alunos discorda da eficácia das avaliações para esse tipo de ensino, assim como avalia de forma insatisfatória a experiência com o ensino remoto. No entanto, a maioria concordou que é possível aprender o conteúdo teórico com qualidade no ensino remoto.
Conclusão:
A pandemia de Covid-19 acarretou uma mudança repentina de cenário. O novo modelo educacional, de educação a distância, trouxe novos desafios para o ensino. Os resultados evidenciam que os fatores que prejudicaram os estudantes foram a instabilidade da internet e a dificuldade em se concentrar durante a aprendizagem remota. Houve facilidade para os discentes esclarecerem as dúvidas das aulas com os docentes, o que corrobora o ensino e a aprendizagem da parte teórica por meio desse sistema.
Palavras-chave:
Ensino a distância; Universidades; Avaliação Educacional; Covid-19
Abstract:
Introduction:
The onset of the Covid-19 pandemic led global health institutions to recommend the adoption of restrictive measures such as the closure of educational facilities. Educational institutions were forced to suddenly adapt to emergency distance learning methods, with little time for preparation. The students also faced challenges such as relying on the internet and remaining isolated at home. Medical and health science schools also had to adapt to this new model to humanized practices.
Objective:
To evaluate the perceived use of emergency distance learning by students at a state university health sciences and medical school during the Covid-19 Pandemic.
Method:
This is a descriptive and exploratory study, with a cross-sectional design and quantitative approach, involving the application of a questionnaire containing closed questions. The questionnaire was divided into four topics: sample characterization, conditions for internet use, study site conditions, and student perception of the use of distance learning.
Result:
The study included 480 students from the nursing, medicine, and dentistry courses at the Amazonas State University. Most of these students used their home wifi, with regular signal quality. Students from smaller, inner state towns were the most disadvantaged by inconsistent internet connections. Students were mainly in their bedrooms when they attended the and pointed to losing concentration easily as the main detrimental factor of the remote classes. Most students disagreed with the effectiveness of assessments for this type of learning,and rated the experience with remote teaching as unsatisfactory. However, most students agreed that it is possible to learn theoretical content with quality through distance learning.
Conclusion:
The Covid-19 pandemic brought about a sudden change of scenery. The new educational model, using distance learning, has brought new challenges for teaching. The results show that the factors that hindered the students were the instability of their internet connection and difficulty in maintaining concentration during distance learning classes. Students found it easy to clarify doubts about the classes with the teachers; the system proved adequate for the teaching and learning of the theoretical content.
Keywords:
Distance Learning; Universities; Educational Assessment; Covid-19
INTRODUÇÃO
A Covid-19 é uma doença respiratória aguda que foi identificada pela primeira vez em dezembro de 2019, em Wuhan, na China. Com a rápida difusão da doença para outros países, em 11 de março de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou o estado de pandemia11. Organização Pan-Americana da Saúde, Organização Mundial da Saúde. OMS afirma que Covid-19 é agora caracterizada como pandemia. Opas, OMS; 2020 [acesso em 24 fev 2023]. Disponível em: Disponível em: https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic
https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-w...
. O primeiro caso registrado no Brasil ocorreu em 26 de fevereiro, e a primeira morte aconteceu em 17 de março, e a partir de então os casos aumentaram significantemente22. Penha LM. A pandemia em Manaus: desafios de uma cidade na Amazônia. Ensaios de Geografia. 2020;5(9):118-23.. No estado do Amazonas, os primeiros registros foram identificados no início de março, sendo a cidade de Manaus a mais afetada pelo coronavírus na região, e esse índice elevado resultou em sobrecarga do sistema de saúde e em situação de emergência na saúde do Amazonas22. Penha LM. A pandemia em Manaus: desafios de uma cidade na Amazônia. Ensaios de Geografia. 2020;5(9):118-23.),(33. Silva GA e, Jardim BC, Lotufo PA. Mortalidade por Covid-19 padronizada por idade nas capitais das diferentes regiões do Brasil. Cad Saude Publica. 2021;37(6):1-8.. Associado a tal situação, há o fato de o Amazonas ser um estado que historicamente é resignado às condições de pobreza e desigualdade social, o que se reflete no acesso aos serviços de saúde44. Orellana JDY, Cunha GM da, Marrero L, Horta BL, Leite IC. Explosão da mortalidade no epicentro amazônico da epidemia de Covid-19. Cad Saude Publica . 2020;36:e00120020:1-8..
No cenário de pandemia, a partir de recomendações de instituições globais de saúde, medidas restritivas foram adotadas. Uma delas foi o fechamento de unidades de ensino com o objetivo de conter a mobilidade da população e, por conseguinte, a disseminação do novo coronavírus55. Brasil. Portaria nº 343, de 17 de março de 2020. Diário Oficial da União; 2020 [acesso em 24 fev 2023]. Disponível em: Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-343-de-17-de-marco-de-2020-248564376 .
http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portar...
. A interrupção do funcionamento dos serviços educacionais levou a uma adaptação do ensino por meio de formas alternativas de educação, e, nesse sentido, o modelo de ensino remoto emergencial (ERE) tornou-se essencial para a continuidade das atividades por meio da utilização da tecnologia digital66. Appenzeller S, Menezes FH, Santos GG dos, Padilha RF, Graça HS, Bragança JF. Novos tempos, novos desafios: estratégias para equidade de acesso ao ensino remoto emergencial. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):1-6.),(77. Silva DSM da, Sé EVG, Lima VV, Borim FSA, Oliveira MS de, Padilha RQ. Metodologias ativas e tecnologias digitais na educação médica: novos desafios em tempos de pandemia. Rev Bras Educ Med . 2022; 46 (2):1-9..
A maioria dos professores não teve treinamento e nem tempo hábil para se adequar à nova modalidade de ERE, sendo necessário adaptar conteúdos de aulas presenciais para plataformas on-line. O uso da criatividade e a aplicação de atividades de metodologias síncronas ou assíncronas em plataformas como Google Classroom, Google Meet e Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) foram aperfeiçoados para se adaptar a essa nova realidade88. Alves L. Educação remota: entre a ilusão e a realidade. Educação. 2020;8(3):348-65 [acesso em 24 fev 2023]. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.set.edu.br/educacao/article/view/9251/4047 .
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. Segundo Moretti-Pires et al.99. Moretti-Pires RO, Campos DA de, Tesser Junior ZC, Oliveira Junior JB, Turatti BD, Oliveira DC de. Estratégias pedagógicas na educação médica ante os desafios da Covid-19: uma revisão de escopo. Rev Bras Educ Med . 2021;45(1):1-9., as disciplinas do ciclo básico apresentam maior facilidade em adaptação a essa modalidade, porém as disciplinas predominantemente clínicas, em que o contexto prático é essencial para uma boa formação discente, tiveram prejuízo educacional99. Moretti-Pires RO, Campos DA de, Tesser Junior ZC, Oliveira Junior JB, Turatti BD, Oliveira DC de. Estratégias pedagógicas na educação médica ante os desafios da Covid-19: uma revisão de escopo. Rev Bras Educ Med . 2021;45(1):1-9..
Para o funcionamento eficiente dessa modalidade de ensino, é necessário que a entrega dos conteúdos seja feita de forma competente e igualitária, entretanto, por causa da desigualdade social e econômica entre os alunos, há um cenário de carência em relação ao acesso à internet e às tecnologias, o que impede a qualidade isonômica do aprendizado66. Appenzeller S, Menezes FH, Santos GG dos, Padilha RF, Graça HS, Bragança JF. Novos tempos, novos desafios: estratégias para equidade de acesso ao ensino remoto emergencial. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):1-6.),(1010. Magalhães RC. Pandemia de Covid-19, ensino remoto e a potencialização das desigualdades educacionais. Hist Ciênc Saúde-Manguinhos 2021;28(4):1263-67.. Além disso, esse novo panorama apresenta outros desafios para os alunos: saber fazer o bom uso do tempo. Para que possam participar das aulas e atividades por meio de dispositivos eletrônicos, os alunos terão que administrar com eficiência o tempo despendido para isso, uma vez que estarão em um ambiente doméstico que pode possuir diversas distrações e facilidade na desconcentração1111. Máximo ME. No desligar das câmeras. Civitas - Revista de Ciências Sociais. 2021;21(2):235-47..
Diante da conjuntura desses cenários, o objetivo deste estudo foi avaliar a percepção da utilização do ERE por discentes em uma universidade pública de saúde, descrevendo condições de uso da internet, local e condições de estudo, e a percepção do aluno acerca do processo de ensino-aprendizado por meio desse modelo.
MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória, com delineamento transversal e abordagem quantitativa, que tem como cerne avaliar a percepção da utilização do ERE por discentes em uma escola superior de saúde, por meio da aplicação de um questionário com perguntas fechadas. O estudo foi realizado no contexto do ensino remoto dos cursos de saúde da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), no período suplementar de 2021, de agosto a dezembro de 2021. Após autorização formal de aplicação do formulário de avaliação pela direção da escola de Ciências da Saúde e da aprovação no Comitê de Ética, os estudantes da UEA receberam uma mensagem de texto, via aplicativo de comunicação móvel e/ou por e-mail, com instruções para participar de forma espontânea da pesquisa.
Amostra de participantes
A amostra foi coletada por conveniência, de acordo com os seguintes critérios de inclusão: discentes regularmente matriculados nos cursos de Medicina, Odontologia e Enfermagem da UEA, maiores de 18 anos, cursando entre o terceiro e o décimo período. Dos 1181 alunos matriculados no semestre suplementar remoto, 480 concordaram em responder ao questionário.
Instrumento para coleta de dados
O questionário foi aplicado de forma on-line por meio da ferramenta Google Formulário. Todos os alunos que preencheram os critérios de inclusão foram convidados a participar da pesquisa. Enviou-se o questionário por e-mail e nos grupos de aplicativos de conversação dos centros acadêmicos de cada curso. Antes de responder ao questionário, o aluno deveria ler um texto explicativo que abordava os objetivos da pesquisa, bem como os riscos e benefícios. Em seguida, o discente deveria ainda aceitar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O questionário foi dividido em quatro tópicos: 1. caracterização da amostra (idade, gênero, período, curso e capital/interior); 2. condições de uso da internet (tipo de internet, qualidade e quem arca com esse custo); 3. condições do local do estudo (local, distrações e dificuldades); 4. percepção do estudante acerca da utilização do ensino remoto (afirmativas relacionadas ao processo de ensino/aprendizado).
Os tópicos 1, 2 e 3 eram perguntas fechadas de múltipla escolha, e o tópico 4 continha afirmativas a serem respondidas em uma escala do tipo Likert com 5 pontos: 5 = concordo totalmente, 4 = concordo parcialmente, 3 = neutro, 2 = discordo parcialmente e 1 = discordo totalmente.
Análise e interpretação dos dados
Realizaram-se análises descritiva e inferencial dos dados, e os resultados foram apresentados por meio de tabelas e gráficos. Verificaram-se as relações entre as variáveis por meio do teste qui-quadrado de Pearson, considerando o nível de 5% de significância para a tomada de decisões. Os dados foram analisados por meio do programa estatístico IBM SPSS Statistics versão 21.
Aspecto ético
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética da UEA, por meio da Plataforma Brasil, e aprovado sob Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 46708621.7.0000.5016, com Parecer nº 4.798.971.
RESULTADOS
A caracterização da amostra dos 480 discentes que participaram deste estudo é apresentada na Tabela 1: 322 (67,1%) correspondiam ao gênero feminino, 155 (32,3%) eram do gênero masculino e três (0,6%) se declaravam de gênero não binário. A maioria dos discentes estava na faixa etária de 21 a 30 anos, 360 (75%). Dos discentes, 214 (33,6%) cursavam Enfermagem; 144 (30%), Medicina; e 122 (25,4%), Odontologia. Quanto ao local de estudo onde o discente assistiu às aulas remotas, 402 (83,8%) estavam na cidade de Manaus; 67 (14,0%), em municípios do interior do Amazonas; e 11 (2,3%), em outros locais. Desses 11, oito (72,7%) responderam que assistiram a uma parte das aulas em Manaus e a uma parte em seu município de origem (interior do Amazonas); dois (18,2%) responderam que fizeram isso no estado do Pará, e apenas um (9,1%) não especificou o local. Quanto ao tipo de acesso à internet, 443 (92,3%) estudantes utilizaram a rede wi-fi residencial, e, em relação ao ambiente de estudo, 370 (77,7%) dos alunos relataram que estudaram no quarto, considerado um local adequado para assistir às aulas e desenvolver uma rotina de estudos.
Avaliação do ensino remoto
A avaliação da percepção do estudante acerca da utilização do ensino remoto estabeleceu-se a partir de dez afirmativas relacionadas a esse processo de ensino-aprendizagem, cujas respostas seguiram uma escala de 5 pontos, do tipo Likert, com as seguintes alternativas: 1 = discordo totalmente, 2 = discordo parcialmente, 3 = neutro, 4 = concordo parcialmente e 5 = concordo totalmente, caracterizando que quanto maior for o conceito, melhor será a avaliação de cada construto.
De acordo com o Gráfico 1, podemos notar que, quanto à aprendizagem no ensino remoto, apesar de grande parte dos alunos ter avaliado positivamente diversos aspectos do período remoto, 201 (41,9%) participantes relataram que estavam insatisfeitos com essa modalidade de ensino, 219 (45,7%) mencionaram que as avaliações foram ineficientes para o aprendizado, e 182 (37,9%) não se sentiram apoiados pelo professor para resolver conflitos relacionados à qualidade da internet. Em relação aos pontos positivos encontrados pelos alunos no ensino remoto, podemos destacar três, conforme mostrado no Gráfico 1: cumprimento do cronograma das disciplinas, 266 (55,4%), aprendizagem de conteúdo teórico, 173 (36%), e esclarecimento de dúvidas em relação à matéria dada com o professor, 239 (49,8%). Constatou-se também que os alunos em períodos mais avançados são mais críticos em relação ao ensino remoto.
De acordo com os resultados, entre as maiores dificuldades no processo de ensino aprendizagem, destacam-se a desconcentração fácil (208; 43,3%) e a dificuldade em se organizar ou se adaptar a esse processo de aprendizagem (163; 34,0%), representando 77,3% da amostra (Gráfico 2).
No que concerne à relação entre a qualidade da internet e o local de origem, considerando a capital Manaus e os municípios do interior do Amazonas, observou-se que, em Manaus, o conceito “boa” foi mais frequente, sendo representado por 175 (37,3%) estudantes, e, no interior do Amazonas, o conceito “regular” foi o mais frequente, representando a resposta de 34 (7,3%) de 469 estudantes. Apesar de os alunos terem atribuído conceitos diferentes à qualidade da internet, não houve evidências de que a qualidade dela tenha relação com o local de onde o aluno assistiu às aulas (p = 0,105). Isso indica que a qualidade da internet na capital Manaus não foi significativamente diferente da qualidade da internet nos municípios do interior do Amazonas (Gráfico 3). Sobre a instabilidade da rede, em sua maioria, os alunos do interior afirmaram que foram razoavelmente prejudicados, enquanto os da capital foram pouco prejudicados (p = 0,020) (Gráfico 4).
Percepção do discente sobre o prejuízo de aprendizagem associado à instabilidade da internet
DISCUSSÃO
A pandemia da Covid-19 causou uma ruptura abrupta nas rotinas de vida e trabalho em todo o mundo, e obrigou as pessoas a mudar seu status quo para enfrentar a nova realidade1212. Bezerra KP, Costa KFL, Oliveira LC de, Fernandes ACL, Carvalho FPB de, Nelson ICASR. Ensino remoto em universidades públicas estaduais: o futuro que se faz presente. Res Soc Dev. 2020 Aug 21;9(9):1-17.),(1313. Gomes PWP, Santos AJM dos, Paixão MS, Soares IS, Assis DMS de, Gomes PWP, et al. O ensino remoto emergencial na percepção de discentes do nível superior durante a pandemia do SARS-CoV-2 em um contexto amazônico. In: Silva AJN, Souza IS, Lima RF, organizadores. Discursos, práticas, ideias e subjetividades na educação. Atena; Ponta Grossa (PR); 2021:58-74. A modalidade educação a distância (EAD), definida como um rompimento do contato físico entre aluno e professor, tornou-se nessas circunstâncias a principal ferramenta de aprendizagem e tem sido muito usada a fim de facilitar a comunicação entre discentes e docentes ou entre alunos e seus colegas1414. Pereira RMS, Selvati FS, Ramos KS, Teixeira LGF, Conceição MV. Vivência de estudantes universitários em tempos de pandemia do Covid-19. Revista Práxis. 2020;12(1 sup):47-56.),(1515. Fávero ACD, Parreira FM. Ensino remoto de urgência nos cursos da área da saúde durante o distanciamento social gerado pela pandemia. Pensar Acadêmico. 2020;18(5):950-62.. Neste estudo, com relação ao local de acesso às aulas remotas, 443 (92,3%) dos discentes o obtêm de suas residências, sendo o quarto o local mais utilizado para assistir às aulas, definido pela grande maioria dos estudantes. Yamaguchi et al.1616. Yamaguchi HKL, Yamaguchi KKL. Desafios e avanços educacionais do ensino remoto aulas não presenciais: Um panorama dos desafios da educação tecnológica em tempo de pandemia do Covid-19 no interior do Amazonas. Revista de Estudos e Pesquisas sobre Ensino Tecnológico. 2020:6:1-16., ao analisarem a percepção de discentes sobre desafios e avanços da educação tecnológica em tempo de ensino remoto no interior do estado do Amazonas, também evidenciaram que a maioria dos discentes acompanhou as aulas de suas residências, porém com carga horária de estudos inferior à do período regular presencial.
Com relação à percepção geral do ERE pelos discentes, na sua maioria os alunos estão insatisfeitos. Os resultados de Silva et al.11. Organização Pan-Americana da Saúde, Organização Mundial da Saúde. OMS afirma que Covid-19 é agora caracterizada como pandemia. Opas, OMS; 2020 [acesso em 24 fev 2023]. Disponível em: Disponível em: https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic
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são semelhantes aos encontrados neste estudo, o que pode representar uma difícil adaptação dos discentes ao uso das tecnologias. Os autores relataram que, dentre os 144 discentes entrevistados, 24,3% aprovaram e 39,5% reprovaram os recursos tecnológicos utilizados nas aulas, e 36,1% se mostraram neutros1717. Silva ACO, Sousa SA, Menezes JBF de. O ensino remoto na percepção discente: desafios e benefícios. Dialogia. 2020;(36):298-315.. Silva et al.1818. Silva JGP e, Anjos HJR dos, Marinho MM, Marinho GS, Mendes FRS, Marinho ES. Avaliação das ferramentas de desenvolvimento da presencialidade virtual, aprendizagem autônoma e colaborativa presentes no Ava Moodle©. Redin - Revista Educacional Interdisciplinar. 2018;7(1):1-9. também afirmam que as ferramentas síncronas e assíncronas são úteis, mas ainda não equivalem às relações estabelecidas pela educação presencial e nem todas estão presentes no cotidiano do processo de ensino dos discentes. A demora na adaptação aos ambientes virtuais e à visualização das plataformas, consideradas confusas, pouco intuitivas e agradáveis, também foi relatada por Moran1919. Moran J. Mudando a educação com metodologias ativas. In: Souza CA, Morales OET. Convergências midiáticas, educação e cidadania: aproximações jovens. coleção mídias contemporâneas. Ponta Grossa: Foca Foto, Proex/UEPG; 2015. v. II: p. 15-33. como uma das dificuldades do ensino não presencial, principalmente para acadêmicos não acostumados com o ambiente no qual se deparam com inúmeros materiais, atividades e informações. O semestre dos discentes também interferiu em sua percepção, com maior insatisfação do ensino remoto nos períodos mais avançados, o que pode estar associado à maior necessidade de realização de atividades práticas presenciais e humanizadas. O aprendizado em serviço, que não é passível na modalidade EAD, é uma etapa que ocorre nos últimos períodos dos cursos e fundamental ao processo de aquisição de habilidades e competências que antecedem a formação do profissional de saúde2020. Gomes VTS, Rodrigues RO, Gomes RNS, Gomes MS, Viana LVM, Silva FS e. A pandemia da Covid-19: repercussões do ensino remoto na formação médica. Rev Bras Educ Med . 2020;44(4):1-2.),(2121. Vilagra SMBW, Vilagra MM, Vilagra HW, Vilagra LW, Souza MCA de, Tempski PZ. Percepção de preceptores do internato sobre a influência de modelos na formação médica. Rev Bras Educ Med . 2022;46(2):1-8..
Em relação aos pontos positivos encontrados pelos alunos no ensino remoto, podemos destacar o cumprimento do cronograma, a aprendizagem de conteúdo teórico e o esclarecimento de dúvidas em relação à matéria dada com o professor. O cumprimento do cronograma de atividades no ensino não presencial é importante para auxiliar aqueles alunos que encontram dificuldades em estabelecer uma organização de estudo e gestão de tempo e atividades em longo prazo2222. Santos KD, Castro S de, Valle Junior SR, Rodrigues ES, Almeida PR de. Ensino online em tempos de pandemia: a opinião de universitários quanto aos desafios encontrados. Res Soc Dev . 2021 Aug 7;10(10):1-9.. De acordo com Barbosa et al.2323. Barbosa MFSO, Rezende F. A comunicação tutor-aluno e dificuldades da prática dos tutores de um curso de educação profissional a distância. XI Congresso Internacional de Educação a Distância, 2004, Salvador. Salvador: Associação Brasileira de Educação a Distância; 2004:1-10., é necessário preparar o acadêmico para que ele possa ser o protagonista do seu próprio conhecimento, isto é, capacitá-lo também para planejar seus estudos, seja no auxílio da organização da carga horária semanal e/ou diária ou mesmo na compreensão de técnicas que o auxiliem a planejá-los. Além disso, a variedade de recursos pode influenciar positivamente no engajamento discente, como o desenvolvimento de atividades gamificadas que podem ser úteis para engajar os alunos no ensino on-line, de modo a favorecer o aprendizado de conteúdos teóricos77. Silva DSM da, Sé EVG, Lima VV, Borim FSA, Oliveira MS de, Padilha RQ. Metodologias ativas e tecnologias digitais na educação médica: novos desafios em tempos de pandemia. Rev Bras Educ Med . 2022; 46 (2):1-9.),(2424. Espinosa T. Reflexões sobre o engajamento de estudantes no ensino remoto emergencial. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências (Belo Horizonte). 2021;23:1-16.. Quanto ao destaque positivo para o esclarecimento de dúvidas com o docente, nota-se que o professor não perdeu sua natureza de mediador do conhecimento. Fedynich et al.2525. Fedynich L, Bradley KS, Bradley J. Graduate students’ perceptions of online learning. Res High Educ J. 2015;27:1-13. estudaram a satisfação de discentes de pós-graduação de cursos on-line e identificaram que o papel do professor como mediador é fundamental no ensino on-line. Para Stenman et al.2626. Stenman S, Pettersson F. Remote teaching for equal and inclusive education in rural areas? An analysis of teachers’ perspectives on remote teaching. The International Journal of Information and Learning Technology. 2020 Jan 28;37(3):87-98., os professores não perderam sua função com o surgimento do ensino remoto; pelo contrário, ganharam novas habilidades, como a capacidade de manusear, de forma mais eficiente, as tecnologias de informação e comunicação.
A internet é considerada um dos fatores mais importantes para que as aulas on-line aconteçam. Com base nisso, os estudantes foram questionados sobre a forma de acesso à internet, qual a tecnologia usada e sobre a estabilidade da conexão. Sendo assim, quando questionados sobre a forma de acesso à internet, a maioria, 416 (86,96%), atribuiu qualidade de regular a boa à conexão de internet durante as aulas, evidenciando que a grande parcela pode estar acompanhando de modo satisfatório as aulas remotas. No entanto, os alunos do interior afirmaram que foram razoavelmente prejudicados pela instabilidade da internet, o que pode representar um problema no ERE, uma vez que, para o avanço efetivo nos propósitos de uma educação emancipadora e reflexiva, a informação deve chegar a todos com relevante qualidade e de forma igualitária66. Appenzeller S, Menezes FH, Santos GG dos, Padilha RF, Graça HS, Bragança JF. Novos tempos, novos desafios: estratégias para equidade de acesso ao ensino remoto emergencial. Rev Bras Educ Med. 2020; 44(1):1-6.. Resultados semelhantes foram encontrados por Silva et al.1717. Silva ACO, Sousa SA, Menezes JBF de. O ensino remoto na percepção discente: desafios e benefícios. Dialogia. 2020;(36):298-315. com 63% dos discentes apresentando dispersão de atenção. Os autores chamam a atenção para o fato de que a maior dificuldade dos discentes está em concentrar-se nas aulas e não nas tecnologias em si, o que também foi observado em nosso estudo1010. Magalhães RC. Pandemia de Covid-19, ensino remoto e a potencialização das desigualdades educacionais. Hist Ciênc Saúde-Manguinhos 2021;28(4):1263-67.),(1717. Silva ACO, Sousa SA, Menezes JBF de. O ensino remoto na percepção discente: desafios e benefícios. Dialogia. 2020;(36):298-315.. A respeito disso, Martins et al.2727. Martins V, Almeida J. Educação em tempos de pandemia no Brasil: saberes fazeres escolares em exposição nas redes. Revista Docência e Cibercultura. 2020;4(2):215-24. ressaltaram que a educação remota não é compreendida exclusivamente pelas tecnologias digitais, mas sim a partir da construção conjunta por meio da interatividade, avaliação adequada, mediação docente e aprendizagem significativa. Entender os fatores que levam os estudantes a se engajar no ERE é tão importante quanto analisar o aumento ou a redução nos níveis de engajamento discente. Nesse contexto, destacam-se a utilização de métodos ativos de ensino, o suporte social e acadêmico provido pelo professor e a qualidade do material de estudo. Aulas síncronas, mesmo que em pouca quantidade, podem ser cruciais para o fomento e a manutenção do engajamento, bem como para suprimir dificuldades de acesso e aprendizagem durante o ensino remoto2424. Espinosa T. Reflexões sobre o engajamento de estudantes no ensino remoto emergencial. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências (Belo Horizonte). 2021;23:1-16.. A necessidade da operacionalização do ERE trouxe a preocupação em garantir um ensino de qualidade com equidade. Garantir essa equidade de acesso é fator fundamental para permitir a continuidade do processo ensino-aprendizagem na transformação do estudo presencial em remoto emergencial.
CONCLUSÃO
Em decorrência da pandemia do coronavírus, a vida da sociedade sofreu, de modo geral, diversas alterações, uma vez que o distanciamento social passou a ser considerado como um fator importante no combate à pandemia, principalmente no que tange à disseminação do vírus. Diversas atividades tiveram que ser adaptadas, como o ensino superior, e as universidades adotaram o ERE como medida paliativa para minimizar os impactos pedagógicos, além de mitigar os riscos à saúde pública. Os resultados deste estudo permitem concluir que o ERE, no geral, não atendeu à expectativa dos alunos, e as avaliações não foram eficazes para o aprendizado. Verificou-se ainda que, apesar de os estudantes utilizarem o quarto para a realização das atividades, 32,6% deles relataram que a instabilidade da internet afetou razoavelmente seus estudos e que as maiores dificuldades dos participantes na aprendizagem remota foram: a desconcentração fácil (208; 43,3%) e a dificuldade em se organizar ou se adaptar a esse processo de aprendizagem (163; 34,0%), o que representa 77,3% da amostra. Dentre os fatores positivos, cumprimento do cronograma, transmissão da parte teórica com qualidade e disponibilidade dos professores perante as dúvidas foram relatados pelos alunos. O suporte ao envolvimento do estudante pode ser oferecido pelo professor por meio de comportamentos de cordialidade, demonstração de afeto e atenção às necessidades individuais.
Finalmente, conclui-se que o ERE, como uma medida paliativa ao ensino superior durante a pandemia, possui alguns dificultadores aos estudantes em seu processo de aprendizagem, impactados principalmente pela adaptação do formato. Entretanto, para uma análise mais efetiva, em trabalhos futuros é necessária uma análise que englobe outros fatores a serem pesquisados, bem como a percepção dos docentes do curso, de modo a contribuir nos resultados identificados.
REFERÊNCIAS
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1Organização Pan-Americana da Saúde, Organização Mundial da Saúde. OMS afirma que Covid-19 é agora caracterizada como pandemia. Opas, OMS; 2020 [acesso em 24 fev 2023]. Disponível em: Disponível em: https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic
» https://www.paho.org/pt/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic -
2Penha LM. A pandemia em Manaus: desafios de uma cidade na Amazônia. Ensaios de Geografia. 2020;5(9):118-23.
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3Silva GA e, Jardim BC, Lotufo PA. Mortalidade por Covid-19 padronizada por idade nas capitais das diferentes regiões do Brasil. Cad Saude Publica. 2021;37(6):1-8.
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Avaliado pelo processo de double blind review.
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FINANCIAMENTO
Este trabalho foi desenvolvido com o apoio do Governo do Estado do Amazonas por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa da Universidade do Estado do Amazonas (Fapeam). Resolução nº 011/2021 - Programa de Apoio à Iniciação Científica do Amazonas (PAIC/UEA).
Editado por
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
27 Mar 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
07 Set 2022 -
Aceito
30 Jan 2023