RESUMO
O artigo tem como objetivo discutir aspectos da economia política brasileira contemporânea apresentando a forma como os empresários da grande indústria do país atuaram em defesa de seus interesses na disputa do desenho da política econômica ao longo dos governos do Partido dos Trabalhadores entre 2003 e 2016. Argumenta-se ser possível identificar uma disputa interclasses pela definição de quatro preços macroeconômicos - taxa de lucro, taxa de juros, taxa de câmbio e taxa salarial - que coloca os capitalistas industriais ora ante o setor rentistas, ora ante o movimento trabalhista no país.
PALAVRAS-CHAVE:
Política macroeconômica; classes sociais; Partido dos Trabalhadores; empresários
ABSTRACT
The article aims to discuss aspects of the contemporary Brazilian political economy, showing how Brazilian large manufacturing entrepreneurs acted in defense of their interests in the dispute over the design of economic policy throughout the Partido dos Trabalhadore (Workers’ Party) governments between 2003 and 2016. It is argued that is possible to identify an inter-class dispute over the definition of four macroeconomic prices - the profit rate, the interest rate, the exchange rate, and the wage rate - which places industrial capitalists sometimes against the rentier sector, sometimes against the labor movement in Brazil.
KEYWORDS:
Macroeconomic policy; social classes; Workers’ Party; entrepreneurs
Este artigo1 1 Versões anteriores deste trabalho foram apresentadas no 5th Workshop on New Developmentalism: Economics and Political Economy of New Developmentalism, no 2nd SDMRG International Workshop, no 13° Workshop Empresa, Empresários e Sociedade, e no GT 34 Estado e Burguesia no Brasil do 47° Encontro Annual da Anpocs. O autor agradece os valiosos comentários recebidos pelos colegas nestes diferentes eventos. . O autor agradece também a revisão e as sugestões realizadas pelo parecerista anônimo da Revista de Economia Política que auxiliaram de forma significativa o aperfeiçoamento do trabalho para esta versão do texto final. pretende discutir algumas das disputas ao redor da política macroeconômica implementada durante os governos do Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil entre 2003 e 2016. A partir dos resultados de um estudo de caso sociológico entre os grandes empresários industriais brasileiros, argumentamos ser possível identificar uma disputa entre classes sociais ao redor da definição de quatro preços macroeconômicos (Bresser-Pereira, 2016BRESSER-PEREIRA, L. (2016) “Reflexões sobre o Novo Desenvolvimentismo e o Desenvolvimentismo Clássico”. Revista de Economia Política, v. 36, n. 2, p. 237-268.; Marconi, 2017MARCONI, N. (2017) “O papel dos preços macroeconômicos na crise e na recuperação”. Estudos Avançados , v. 31, n. 89.) - taxa de lucro, taxa de juros, taxa de câmbio e taxa salarial - em diferentes momentos desse período.2 2 O foco sobre a interação dos empresários industriais com política macroeconômica responde, de um lado, à relevância que a política macro ganhou em debates a respeito da caracterização do primeiro ciclo de governos do PT como desenvolvimentistas. De outro lado, busca dar conta ao fato de que a própria pesquisa empírica conduzida junto a esses agentes apontou para uma relevância sensível desta mesma política macro em seus discursos sobre políticas econômicas (industriais inclusive) e o desenvolvimento brasileiro, em geral, entre 2003 e 2016.
Nosso foco primordial se concentra na análise da ação de uma parcela do grande empresário industrial brasileiro reunido no Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) - o mais importante think tank industrial brasileiro. Em primeiro lugar, apresentaremos, a partir de dados colhidos por meio de análise documental e entrevistas conduzidas pelo autor, as ações e percepções desse grupo sobre as políticas econômica e industrial implementadas no Brasil entre 2003 e 2016. Em seguida, interpretaremos essas ações e opiniões levando em consideração o desenvolvimento estrutural da economia brasileira no período em questão observando a evolução das taxas de lucro, juros, câmbio e salários. Ao final, discutimos como a ação desses agentes os coloca em oposição, no primeiro momento, ao núcleo rentista da economia e, posteriormente, ao movimento trabalhista, o que revela algumas das dimensões da economia política do período.
A argumentação se baseia nos resultados de pesquisa que tomou como base a análise documental de 868 reportagens jornalísticas com entrevistas de membros do IEDI conferidas entre 2003 e 2016 e disponibilizadas no site do instituto3 3 Disponível em: https://iedi.org.br/imprensa/. Acesso em: 5 maio 2021. e na realização de entrevistas conduzidas pelo autor com o presidente, ex-presidentes, e outros dos principais dirigentes do instituto.
Este artigo possui, além desta introdução, outras sete seções. A seguir, faremos uma apresentação da problemática inicial que motivou a pesquisa que baseia este texto a respeito da relação dos empresários industriais com os governos federais do PT, seguida de uma apresentação do IEDI. Após isso, expomos a forma como se deu a avaliação dos dirigentes do instituto ao longo do governo Lula, para, na seção seguinte, analisar como as políticas monetárias e cambiais estiveram no centro de suas preocupações no período. Então, analisamos a relação do IEDI com o governo Dilma e, no tópico seguinte, a centralidade que, neste governo, as taxas de lucro e salários ganharam entre os grandes empresários da indústria nacional. Finalmente, na conclusão, retomamos os principais argumentos discutidos no texto propondo reflexões ulteriores.
EMPRESÁRIOS DA INDÚSTRIA E GOVERNOS DO PT
A relação dos empresários com o Governo Federal no Brasil é um tema de estudo clássico nas Ciências Sociais do país. Mais recentemente, estabeleceu-se no interior deste campo de pesquisa um debate sobre a posição e a atuação dos dirigentes industriais nacionais para com os primeiros governos do PT, de modo geral, e com o governo Dilma, em particular. Em grandes linhas, a preocupação desse conjunto de autores residia na tentativa de compreensão da forma como os industriais brasileiros se relacionaram com governos que, aparentemente, haviam executado uma série de políticas de aceno direto ao setor industrial. A problemática ganhou contornos específicos após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, momento fulcral de seu governo que contou com o apoio de associações de classe industrial - como o caso notório da atuação da Federação das Industriais do Estado de São Paulo no período. O fato foi emblemático já que fora a partir do governo Dilma que justamente os governos do PT haviam mais acenado ao setor, no que ficou conhecido como “ensaio desenvolvimentista” (Singer, 2018SINGER, A.. (2018) O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras.) ou “experimento industrialista” (Carneiro, 2018CARNEIRO, R. (2018) “Navegando a contravento: uma reflexão sobre o experimento desenvolvimentista do governo Dilma Rousseff”. In: CARNEIRO, R; BALTAR, P.; SARTI, F. Para além da política econômica. São Paulo: Editora Unesp.).4 4 O “ensaio desenvolvimentista” do governo se baseou, no plano macroeconômico, na redução da taxa básica de juros e na desvalorização cambial e, no campo da política industrial executada no âmbito do Plano Brasil Maior, na proteção ao produto nacional, no uso intensivo do BNDES, desonerações ao setor produtivo, na execução de um plano de infraestrutura e na reforma do setor elétrico (Singer, 2016). A estratégia, que pode ser entendida como uma resposta do Governo Federal às reivindicações do empresário industrial nacional (Carvalho, 2018), foi logo abandonada por esses agentes que deixam de apoiá-la para se colocar, finalmente, contra o próprio governo (Singer, 2018; Boito, 2018).
A partir das discussões a respeito das razões que estiveram por trás do fim do apoio por parte dos empresários da grande indústria nacional ao ensaio desenvolvimentista de Dilma Rousseff, este artigo busca apresentar material empírico inédito a respeito da relação da grande indústria nacional com os governos do PT. Em particular, pretendemos enriquecer interpretações aventadas pela literatura5 5 Cf. entre outros, por exemplo, Porto (2020). oferecendo visão que qualifica o entendimento da forma como esses agentes perceberam e tentara influenciar a condução da política macroeconômica no país.
Com isso, em diálogo com os estudos que apontam a queda da rentabilidade do setor produtivo no Brasil - que se dá de maneira mais clara a partir do primeiro mandato de Dilma Rousseff - como um fator importante para a oposição do empresário da indústria a este governo (Marquetti et al., 2016MARQUETTI, A. A.; HOFF, C. R.; MIEBACH, A. D. (2016) Lucratividade e distribuição: a origem econômica da crise política brasileira. Mimeo, 2016.; Braga, 2016BRAGA, R. (2016) “Terra em transe: o fim do lulismo e o retorno da luta de classes”. In: SINGER, A.; LOUREIRO, I. As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo.; Singer, 2018SINGER, A.. (2018) O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras.; Rocha e Novais, 2020ROCHA, M; NOVAIS, L. (2020) “Indústria e grandes empresas no governo do partido dos trabalhadores.” Texto para Discussão n 281, IE; Unicamp, 2020.), analisamos a forma como os empresários da grande indústria brasileira reunidos ao redor do IEDI avaliaram e se relacionaram com os governos do PT desde 2003 a 2016.
De todo modo, se as taxas de lucro, em particular, são fundamentais para entender sua ação em 2016, a análise da relação desses agentes com os governos do PT como um todo demonstram sua preocupação com os demais preços macroeconômicos em diferentes momentos ao longo desses treze anos. Como ficará claro, a forma como tais empresários avaliaram a taxa de câmbio, a taxa de juros e a taxa de salários de 2003 a 2016 condicionou sua avaliação sobre o próprio governo em exercício.
O IEDI E O DESENVOLVIMENTISMO
O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) é uma instituição fundada em 1989 na cidade de São Paulo que reúne empresários de algumas das maiores empresas da indústria de transformação brasileira, dentre as quais, entre outras, Vale, Embraer, Iochpe-Maxion, WEG, Gerdau, Klabin, Ultrapar, Natura, Braskem e Ambev.6 6 Para a lista completa das atuais empresas que compõem o conselho do instituto, cf. https://iedi.org.br/artigos/iedi/conselho/conselho_do_iedi.html. Fundado diante de um cenário de crise do desenvolvimentismo, o instituto foi criado por trinta empresários de empresas industriais de origem e controle nacional - dentre os quais dirigentes como Eugênio Staub (Gradiente), Ivoncy Ioschpe (Ioschpe), Jorge Gerdau (Gerdau). José Ermírio de Moraes Filho (Votorantim) e Paulo Cunha (Ultraquímica) -, que defendiam a proeminência da indústria brasileira no desenvolvimento do país.
À época de sua fundação, os empresários do instituto entendiam ser necessária a defesa de uma estratégia de desenvolvimento para o país na qual a economia nacional fosse capaz de se inserir nos circuitos internacionais de acumulação. Nesse sentido, desde sua criação, o instituto baseou sua atuação na defesa de agenda que promulgava a necessidade de atrelar as empresas industriais nacionais às cadeias globais de valor. Para isso, a estratégia defendida pelo IEDI passava tanto pela defesa de menores barreiras comerciais para importação (justificada como forma para as indústrias brasileiras terem acesso a produtivos mais baratos, por exemplo) quanto de políticas de auxílio à exportação para que as firmas nacionais pudessem ter melhor acesso ao mercado consumidor internacional. A este respeito, a ideia-chave é a da “integração competitiva”, mote usado pelo instituto para designar justamente uma agenda baseada, de um lado, na eliminação de barreiras tarifárias e não tarifárias e, de outro, de políticas públicas explícitas de apoio à competitividade internacional das empresas.7 7 Para uma discussão aprofundada da relação do IEDI com a abertura comercial, internacionalização da economia e inserção às cadeias globais de valor, cf. Aguiar e Micussi (2022).
Dessa forma, é possível entender que o IEDI defendia uma política que conservava e superava certas características típica do desenvolvimentismo clássico. Isto é, ao mesmo tempo que enxergava a necessidade de defesa da indústria nacional como motor do processo de desenvolvimento, entendia que isso não mais se daria a partir da defesa do setor por meio de estratégias baseadas em proteções unilaterais e na industrialização por substituição de importações. Neste quadro, embora o instituto apontasse a necessidade da execução de políticas setoriais e industriais de promoção ao setor, entendia a importância da definição da política macroeconômica para seu sucesso.
Finalmente, em relação à sua base social, é possível entender o IEDI como uma instituição representativa das grandes empresas industriais brasileiras, na qual estão presentes as empresas líderes em seus respectivos setores de atuação.8 8 Atualmente, o conselho do IEDI conta com 42 empresas, das quais 34 de capital aberto. Dessas, de acordo com a publicação Valor 1000, seis delas são líderes em seus setores de atuação no Brasil (Suzano, Weg, Vale, Votorantim, Natura e Braskem), três ocupam a segunda posição (Ambev, Klabin e Gerdau), e outras catorze figuram entre as dez primeiras em seus respectivos ramos. Das firmas de capital aberto do IEDI, 68% estão entre as dez maiores companhias de seu setor. Se levarmos em conta a comparação das empresas do IEDI apenas com suas outras brasileiras - isto é, excluindo-se as empresas estrangeiras que atuam em seus ramos no país -, vemos que 85% dessas firmas (ou 29 das empresas de capital aberto) figuram entre as dez primeiras em seus respectivos rankings setoriais.
GOVERNO LULA: DO OTIMISMO À DECEPÇÃO
O ano de 2003 foi um momento de inflexão na relação do empresariado industrial com o Governo Federal no país a partir da chegada do Partido dos Trabalhadores sob a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva. As opiniões dos agentes ligados ao IEDI nesse período demonstram otimismo com o novo governo. É possível destacar que esses agentes viam no novo governo que passou a ocupar o Palácio do Planalto um agente que poderia trazer melhores condições à indústria nacional.
O otimismo diante do novo governo pode ser em boa parte explicado pela expectativa dos empresários com a realização de políticas industriais que, em sua visão, ficaram de fora da agenda dos governos brasileiros durante a década anterior. Nesse sentido, o conselheiro do IEDI Eugênio Staub, por exemplo, em declaração após a posse de Lula, indicava o caráter reformador do novo governo. Para ele, o governo do PT estaria “comprometido com mudanças” (Neuman, 2003NEUMAN, D. (2003) “Industriais esperam revanche contra oito anos de monetarismo”. Valor Econômico , 2 jan. 2003. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2003/industriais_esperam_revanche_contra_oito_a nos_de_monetarismo.html >. Acesso em: 14 jun. 2019.
https://iedi.org.br/artigos/imprensa/200...
, on-line.). Ao lado das políticas industriais, os empresários do IEDI entendiam que o bom futuro da indústria nacional passava por programas de estímulo às exportações de bens industrializados. Da mesma forma, Ivoncy Ioschpe, presidente da entidade de 2001 a 2005, defendia que “estimular exportações e substituir importações é o caminho para reduzir nossa vulnerabilidade externa” (Neuman, 2003NEUMAN, D. (2003) “Industriais esperam revanche contra oito anos de monetarismo”. Valor Econômico , 2 jan. 2003. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2003/industriais_esperam_revanche_contra_oito_a nos_de_monetarismo.html >. Acesso em: 14 jun. 2019.
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, on-line).
Podemos entender que a expectativa positiva do IEDI com o novo governo se devia pela compreensão de que este implementaria políticas que algo se diferenciaria dos dois governos peessedebistas anteriores. Ainda segundo Ivoncy Ioschpe, o período anterior havia sido marcado pela crença de que o “mercado” traria as soluções da economia brasileira, o que, na sua visão, demonstrou-se equivocado. Afastando-se de uma visão liberal da economia, o empresário reiterava a necessidade da definição de “políticas de desenvolvimento econômico, setoriais e de comércio exterior” (Neuman, 2003NEUMAN, D. (2003) “Industriais esperam revanche contra oito anos de monetarismo”. Valor Econômico , 2 jan. 2003. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2003/industriais_esperam_revanche_contra_oito_a nos_de_monetarismo.html >. Acesso em: 14 jun. 2019.
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, on-line).
O otimismo pode ser visto ainda, por exemplo, em 2004 quando do lançamento da primeira política industrial dos governos do PT, a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE). Entre os empresários e dirigentes do IEDI, é possível identificar que tais agentes viram a instauração dessa política como uma espécie de confirmação de suas próprias expectativas em relação à forma pela qual seria conduzida a política industrial na nova administração federal: um rompimento com o padrão estabelecido ao longo das últimas décadas no país (Grinbaum; Cançado, 2004).
Entretanto, se o começo do governo despertou otimismo na avaliação dos empresários da grande indústria, isso logo se transformaria em uma decepção com os rumos do governo. Em entrevista proferida em junho de 2004, por exemplo, Ivoncy Ioschpe sublinhava sua decepção com os primeiros dezoito meses do governo Lula. Para ele, o presidente da República adotava posição demasiadamente “conservadora” ao não buscar atacar questões centrais da política econômica no país (Attuch, 2004ATTUCH, L. (2014) “Ivoncy Ioschpe: “Lula está na gaiola dos conservadores”” IstoÉ Dinheiro, 30.06.2004. Disponível em:<Disponível em:https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2004/iedi_na_imprensa_ivoncy_ioschpe_lula_esta_na_gaiola_dos_conservadores.html >. Acesso em: 14 jun. 2014.
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, on-line). Tal declaração, como veremos mais detidamente a seguir, se insere no quadro geral de centralidade da política macroeconômica no interior da análise dos empresários da grande indústria a respeito dos governos do PT.
A DISPUTA PELAS TAXAS DE CÂMBIO E DE JUROS
As políticas cambial e monetária foram, como veremos a seguir, dois pontos de suma importância na percepção dos grandes empresários da indústria a respeito das políticas econômica e industrial executadas de 2003 a 2016 no Brasil. O fato é notório já que revela, por um lado, a própria relevância que esses empresários conferiram à política macroeconômica no período e, por outro, o descontentamento constate de tais agentes com o desenho dessa política ao longo dos governos do PT. Isso fica claro em diversos momentos no período.
No início do governo Lula, em 2003, por exemplo, o então presidente do IEDI Ivoncy Ioschpe tratava da questão da taxa de câmbio praticado pelo governo, apontando o que via como um erro nas recentes declarações do novo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para quem a economia brasileira poderia passar por uma nova fase de valorização do real.9 9 Segundo o empresário: “A interferência no câmbio não é um direito, mas uma obrigação do Estado. Se não interferir, a autoridade estará se omitindo. Todos os países do mundo intervêm no câmbio. Da mesma forma que o Copom se reúne para interferir nos juros, o BC também tem a obrigação de reduzir a dependência externa do país. Essa política é tão séria quanto a de combate à inflação” (Barros, 2003, on-line).
A questão da valorização cambial se mostrou o tema mais relevante nas declarações dos membros do IEDI à imprensa também no início do segundo governo Lula. Afirmações que buscam apontar o preço da divisa brasileira como principal fator para diferentes percalços da economia nacional em 2007, por exemplo, estão presentes em dezenas de reportagens realizadas com os empresários do instituto.10
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Ela aparece, por exemplo, nas análises do IEDI a respeito do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no começo de 2007. Sobre isso, o instituto recomendou a desoneração da folha de pagamentos para reduzir os custos de produção de modo a compensar a perda de competitividade de setores afetados pelo câmbio. Cf. Folha de S.Paulo (2007), Trevisan (2007) e Araújo (2007).
Vale notar ainda como o desemprego daquele período, por exemplo, foi visto por Josué Gomes da Silva, presidente do instituto de 2005 a 2009, como função direta da sobrevalorização do real (Valor Online, 2007VALOR ONLINE. (2007) Iedi culpa câmbio valorizado e China por taxa alta do desemprego ao longo de 2007. Valor Econômico , 21.6.2007. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2007/iedi_na_imprensa_iedi_culpa_cambio_valori zado_e_china_por_taxa_alta_do_desemprego_ao_longo_de_2007.html >. Acesso em: 16 jun. 2019.
https://iedi.org.br/artigos/imprensa/200...
).
A questão cambial também foi apontada pelo IEDI quando incitado a comentar o desempenho do PIB no ano de 2006 no Brasil. Para o instituto, se o crescimento econômico naquele ano ficou aquém do satisfatório, isso em muito se devia ao câmbio excessivamente valorizado (Folha Online, 2007FOLHA ONLINE. (2007) “Veja a repercussão do crescimento do PIB de 2006 em 2,9%”.Folha de S.Paulo , 28.2.2007. Disponível em:<Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u114822.shtml >. Acesso em: 16 jun. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/folha/dinh...
, on-line).
Se o IEDI apontava a influência do câmbio em indicadores gerais de emprego e de crescimento econômico, parece ser nas análises de desempenho setorial da indústria que a valorização da moeda brasileira ganha mais evidência. A queda da participação da indústria brasileira na economia11
11
A título de ilustração, a indústria de transformação, que respondeu no seu auge por 35,9% do PIB brasileiro em 1985, caiu para 12,9% do PIB em 2022. Nos primeiros treze anos de governos do PT, ela foi de 16,9% a 12,5% do PIB entre 2003 e 2016, de acordo com dados CNI base no IBGE (https://industriabrasileira.portaldaindustria.com.br/grafico/total/producao/#/industria-total). Por sua vez, em relação à sua participação no emprego formal no país, a indústria de transformação respondia por 27,1% dele em 1986, caindo a marca de 18,1% em 2003 e 15,5% em 2016, conforme dados da FIESP (2018).
foi tema recorrente nas declarações do instituto. O então presidente do IEDI Josué Gomes da Silva afirmava que, junto com a crescente participação dos produtos chineses no mercado mundial e brasileiro, o câmbio podia ser considerado como o grande “vilão” do setor industrial (Carnier, 2007CARNIER, T. (2007) ““Efeito China” e Câmbio São os Vilões do Setor”. DCI, 23.3.2007. Disponível em:<Disponível em:https://iedi.org.br/artigos/textos/ini/iedi_na_imprensa_efeito_china_e_cambio_sao_os_ viloes_do_setor.html >. Acesso em: 16 jun. 2019.
https://iedi.org.br/artigos/textos/ini/i...
).
A importância conferida à política cambial no período pode ser atestada ainda por dois fatos. Em primeiro, as reivindicações, pelos empresários conselheiros do IEDI, de medidas para a contenção da valorização cambial durante almoço com o Ministro da Fazenda em 2007 (Barros, 2007aBARROS, G. (2007a) “Pacote corresponde a R$ 3,33 por trabalhador, afirma Iedi”. Folha de S.Paulo , 13.6.2007. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2007/iedi_na_imprensa_pacote_corresponde_a_r_3_33_por_trabalhador_afirma_iedi.html >. Acesso em: 16 jun. 2019.
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). Em segundo, o fato de que Julio de Almeida, ex-diretor-executivo do IEDI, que havia sido indicado para o cargo de Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, ter sido desligado da pasta meses após sua posse, em agosto, alegando justamente que o câmbio foi um dos principais motivos que influíram em seu desligamento (Barros, 2007cBARROS, G. (2007b) “Investir é arma anticrise, diz ex-secretário”. Folha de S.Paulo , 21.8.2007. Disponível em: <Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2108200710.htm >. Acesso em: 16 jun. 2019.
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).
Com efeito, conforme é possível observar na figura a seguir, em 2007 o Real atinge seu menor valor desde o ano 2000, efeito de uma desvalorização contínua desde 2004. A trajetória de queda só seria revertida em agosto do ano seguinte.
Taxa de câmbio nos governos do PT (2003 - 2016): dólar americano (compra) - média mensal - Real/US$
A questão cambial também aparece nas queixas desses empresários a respeito da presença de produtos manufaturados chineses no mercado brasileiro. Esses agentes identificaram, em diversos momentos, uma correlação positiva entre o aumento da importação de bens manufaturados chineses e a desindustrialização brasileira.12 12 Sobre isso, o empresário do ramo têxtil Ivo Rosset deu a seguinte declaração em entrevista para o autor: “O câmbio alto me prejudica um pouco [...] o câmbio alto inibe a importação de manufaturados chineses. Aí sim é câmbio 100% na veia […]. O mercado de confecção, o manufaturado no Brasil é enorme, o consumo é enorme. E a quantidade de produto manufaturado que vinha da China era uma coisa absurda […]. Havia uma concorrência quase desleal” (Ivo Rosset em entrevista ao autor em 14 de julho de 2020). Opinião no mesmo sentido pode ser observada na seguinte declaração do empresário Eugênio Staub: “Tanto o governo FHC quanto o governo Lula como o governo Dilma prejudicaram demais a indústria no país. Principalmente por causa de política cambial com o real sobrevalorizado que começou com o Gustavo Franco em 1994. Isso foi mortal” (Eugênio Staub em entrevista ao autor em 21 de julho de 2020).
Tais queixas referentes ao que foi visto como uma sobrevalorização da moeda brasileira se enquadram no que aqui denominamos como conjunto de decepções dos empresários do IEDI com os primeiros anos de governo petista. Como fica claro nas vozes dos industriais, esses empresários identificaram um fio de continuidade entre aspectos da política macroeconômica petista e aquela conduzida durante os oito anos de governos tucanos. O fato é relevante uma vez que a política macroeconômica havia sido um dos principais pontos de atrito do instituto com o governo de Fernando Henrique desde, pelo menos, seu segundo mandato. É significativo, portanto, que esses industriais sublinhem as semelhanças entre a política cambial petista e aquela praticada por FHC.
Ainda sobre a política macroeconômica, é importante pontuar a forma como ela ganha notoriedade, no círculo do IEDI, ante a política industrial, por exemplo. É possível identificar a recorrência da temática da política macroeconômica nas observações do IEDI a respeito das políticas econômicas e industriais executadas entre 2003 e 2016. Em diversas vezes, mesmo quando instados a comentar sobre o sucesso de uma política setorial, por exemplo, empresários e economistas do IEDI atrelaram seu sucesso ao tipo de política monetária e cambial executada no período. É possível atestar, dessa forma, uma preponderância na visão dos empresários do instituto a respeito da política macroeconômica como um todo em relação à política industrial.13 13 O fato se evidencia, por exemplo, nas seguintes declarações de conselheiros do IEDI: “[Houve] políticas equivocadas, excesso de controle e política industrial. Hoje eu tenho dúvidas [...]. Eu acho que o caminho é mais políticas macroeconômicas compatíveis com a industrialização e política tecnológica” (Eugênio Staub em entrevista ao autor em 21 de julho de 2020). Ou ainda: “Eu não preciso de uma política industrial. Eu preciso de uma política de país [...]. Eu não quero privilégio industrial nenhum, zero! [...]. De forma global, eu diria que, ao se criar as macrocondições, os espaços são encontrados” (Conselheiro do IEDI em entrevista ao autor em 22 de junho de 2020). O empresário Dan Ioschpe deu declaração no mesmo sentido ao comentar que: “Eu tenho uma visão de que a política industrial por si só não é o fator predominante. Eu tendo a achar que ela terá maior ou menor sucesso se tiver subsidiária a uma agenda horizontal mais ampla que comece com a condução da trajetória macroeconômica do país” (Dan Ioschpe em entrevista ao autor em 16 de outubro de 2020).
Aqui, é possível notar que a relevância da política macroeconômica aproxima o IEDI de aspectos defendidos pela teoria novo desenvolvimentista. Com efeito, tal corrente de pensamento enxerga justamente o desenho da política macroeconômica como o cerne para o sucesso do desenvolvimento industrial. Ao contrário do desenvolvimentismo clássico, que via as políticas industriais como “central”, o novo desenvolvimentismo passa a entendê-las como “subsidiárias” (Bresser-Pereira, 2012aBRESSER-PEREIRA, L. (2012a) “A taxa de câmbio no centro da teoria do desenvolvimento”. Estudos Avançados, v. 26, p. 7-28. ; 2012bBRESSER-PEREIRA, L. (2012b) “For a Heterodox Mainstream Economics: An Academic Manifesto”. Journal of Post Keynesian Economics v. 35, p. 3-20.). Existe, nessa visão, uma preponderância da política macroeconômica sobre a política industrial para o sucesso do processo de industrialização e de desenvolvimento nacional.
Por sua vez, se afirmamos que as posições do IEDI em um só tempo conservam e buscam superar aspectos do pensamento desenvolvimentista clássico brasileiro, vale pontuar como, na preponderância conferida pelo instituto à política macroeconômica sobre políticas microeconômicas (como políticas industriais ou setoriais em geral, por exemplo), o instituto se distancia da visão tradicional dessa escola de pensamento que, nos inspirando na interpretação de Bresser-Pereira (2012bBRESSER-PEREIRA, L. (2012b) “For a Heterodox Mainstream Economics: An Academic Manifesto”. Journal of Post Keynesian Economics v. 35, p. 3-20.), enxergava o contrário.
Em resumo, é possível atestar uma insatisfação por parte dos empresários do IEDI em relação à política macroeconômica executada ao longo dos governos do PT. Sobre isso, é interessante notar como, de acordo com esses agentes, os “equívocos” na condução dessa política poderia ser explicado pelo desejo do governo em atender os interesses do “mercado financeiro”.14 14 De acordo com declaração de Ivocny Ioschpe no início do Governo Lula, por exemplo: “O Lula está preso numa gaiola de conservadorismo. E a culpa é da própria elite, que, nas eleições de 2002, alimentou um temor irracional em relação ao que o Lula poderia fazer. Foi por isso que, dois meses antes de eleito, ele assinou a tal Carta ao Povo Brasileiro, com as diretrizes de política econômica que têm sido seguidas. “Como o mercado financeiro aplaudiu, o governo ficou refém do conservadorismo” (Attuch, 2004, on-line, grifos nossos). Explicita-se, aqui, uma verdadeira disputa de interesses entre o setor rentista da economia e os grandes empresários da indústria brasileira. A partir das declarações dos industriais, fica claro haver uma cisão entre os dois setores da economia na medida em que os empresários do IEDI efetivamente atrelam o que enxergavam como uma condução equivocada da política macroeconômica ao intuito do governo em atender os interesses do setor financeiro da economia.15 15 De acordo com Pedro Wongtschowski, presidente do IEDI entre 2015 e 2017: “Eu me lembro que nós dizíamos […] que [era] a diferença entre o céu e o inferno. O paraíso dos banqueiros era o câmbio baixo e os juros altos, e o paraíso dos industriais era o contrário, o câmbio alto e os juros baixos. Então nós convivemos durante tempos longos demais com juros definitivamente altos demais” (Pedro Wongtschowski em entrevista ao autor em 6 de abril de 2020). Sobre o mesmo assunto, de acordo com o empresário Ivo Rosset: “A taxa de juros era absurda, era desproporcional. Taxa de juros mais reoneração da folha gerou uma desindustrialização, sem dúvida nenhuma [...]. Já discuti com alguns presidentes de Banco Central e sempre disse: o que segura inflação não são os juros, não adianta colocar os juros lá no espaço para conter a inflação. A inflação se contém com oferta” (Ivo Rosset em entrevista ao autor em 14 de julho de 2020).
Se há, notoriamente, uma disputa ao redor da taxa de juros e de câmbio ao longo dos governos do PT que coloca, de um lado, empresários da grande indústria e, de outro, o setor financeiro, é interessante discutir a forma pela qual esses agentes se posicionaram durante o governo Dilma ao longo do ensaio desenvolvimentista (Singer, 2018SINGER, A.. (2018) O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras.). A esse respeito, vale uma breve recapitulação a respeito da atuação do instituto ao longo dos primeiros anos do governo Dilma.
GOVERNO DILMA: “INTERVENÇÃO” E OS LIMITES DA CRÍTICA
O início do governo Dilma, em 2011, foi marcado no campo da política industrial pelo lançamento do Plano Brasil Maior (PBM). A medida foi a primeira clara iniciativa do governo Dilma Rousseff de incentivo à indústria. Grosso modo, as avaliações do IEDI a respeito do PBM apontaram, no primeiro momento, para a mesma contradição observada a respeito das demais políticas industriais petistas desde o lançamento da PITCE em 2004. Isto é, embora o PBM tenha sido visto como uma política que estivesse na “direção correta” (IEDI, 2011IEDI. (2011) Uma análise do Plano Brasil Maior. IEDI: São Paulo .), insuficiências em domínios da política macroeconômica eram vistas pelo instituto como importantes constrangimentos ao sucesso dessa política industrial.
Contudo, a despeito dessa semelhança com as avaliações das políticas industriais anteriores, o PBM foi entre elas a política que gozou de melhor avaliação pelas lideranças do IEDI. Aqui, entendemos a existência de uma espécie de crescendo das avaliações do instituto a respeito das três políticas industriais petistas: desde a PITCE, vista como a mais tímida, e passando pela Política de Desenvolvimento Produtivo,16 16 Em relação à Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada no primeiro semestre de 2008, a expectativa do IEDI era de que ela pudesse representar melhores avanços ao setor produtivo nacional do que a PITCE. Em 2010, após um ano de seu lançamento, a visão do IEDI sobre o sucesso da PDP parecia refletir os diagnósticos proferidos pelo instituto um ano antes quando de seu anúncio: bom papel cumprido pelo BNDES na facilitação do crédito via modalidades específicas, apesar do alto custo desses recursos, devido aos juros excessivamente altos. Entretanto, a despeito disso, a crise financeira internacional de 2008 alterou essencialmente as expectativas e avaliações do instituto em relação ao sucesso da PDP. Dessa forma, muitas das declarações de membros do IEDI em 2009, por exemplo, buscaram apontar a dificuldade de cumprimento das metas fixadas a partir das políticas anunciadas no ano anterior. o PBM foi tida como a mais robusta das três políticas.
Entretanto, ao longo do ano de 2012, ao passo em que o Governo Federal realizava uma série de medidas de aceno ao setor industrial, que seria denominada como Nova Matriz Econômica (NME), foi possível observar que a avaliação do IEDI sobre a inserção do Plano Brasil Maior dentro do arranjo macroeconômico mudou, na medida em que os dirigentes do instituto passaram a apontar maior coerência entre as setoriais e macroeconômicas.17 17 Isso pode ser visto em entrevista de José Roberto Ermírio de Moraes em dezembro de 2012: “É a primeira vez que vejo um alinhamento muito forte de todos na busca da retomada da competitividade da indústria brasileira” (RIBEIRO, 2012, on-line). Já o empresário Pedro Passos afirmou que: “Esse é um governo muito próximo da indústria. Existe um diálogo aberto” (Landim, 2012, on-line). De acordo com Singer (2016SINGER, A. (2016) “A (falta de) base política para o ensaio desenvolvimentista”. In: A. SINGER; LOUREIRO, I. (Org.). As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo .), a NME pode ser pode ser resumida em nove conjuntos de medidas: a) proteção ao produto nacional; b) uso intensivo do BNDES; c) aposta na reindustrialização; d) desonerações; e) plano para infraestrutura; f) reforma do setor elétrico; g) desvalorização do Real; h) controle de capitais; i) redução de juros.
Em relação ao último ponto, de fato, se analisada a trajetória da taxa básica de juros ao longo de todo o período dos governos do PT, observamos que em outubro de 2012 ela atinge seu menor valor nominal durante todo o período, alcançando o patamar inferior de 7,25%. Essa taxa seria mantida até abril do ano seguinte, quando a autoridade monetária inicia um aumento contínuo na Selic até atingir a marca de 11% em abril de 2014, voltando a subir novamente em outubro daquele ano, para chegar em 14,25% em julho de 2015, percentual que será mantido até o fim do governo Dilma.
Entretanto, se pontos da Nova Matriz Econômica implementados contavam com o apoio das lideranças do IEDI, identificou-se que o instituto adotou posição cautelosa a respeito de aspectos sensíveis da NME que, embora favorecessem a indústria, iam de encontro aos interesses de outros setores da economia. São elas: a redução das tarifas de energia via reforma do setor elétrico e a diminuição das taxas de juros via alteração da Selic e por meio de atuação pela redução dos spreads bancários cobrados no país.18 18 A diminuição dos spreads foi motivo de significativa tensão entre o governo e o setor financeiro, no que Singer (2016) identificou como a “batalha dos spreads”. Vale notar como a cautela dos grandes empresários da indústria se valeu para duas medidas que justamente conferiam ao Estado brasileiro papel de arbítrio diante de uma disputa travada no interior da economia política nacional do período.
Sobre as mudanças das tarifas de energia elétrica e da taxa de juros, o governo federal contou com o apoio dos dirigentes industriais do IEDI de forma particular: ao mesmo tempo que o instituto apoiava as medidas, ele reafirmava sua insatisfação a respeito da forma como elas vinham sendo executadas. Entende-se que tal insatisfação esteve diretamente relacionada à maneira pela qual foi travada a disputa pelo governo, feita direta e abertamente, noticiada pelos veículos de imprensa e comunicada pela própria presidente.19 19 A seguinte entrevista de Pedro Passos é elucidativa a esse respeito: “O empresariado apoia a briga contra o tamanho do spread no Brasil. Não há dúvida de que pagamos muitos juros e parte disso é porque as margens (de lucro dos bancos) são altas [...]. Mas a melhor forma de fazer isso é criar os incentivos necessários para que o mercado financeiro se mobilize nessa direção. Não pode haver briga do governo com um setor” (O ESTADO DE S. PAULO, 2012, on-line). Nos embates do governo contra outros setores da economia em defesa da indústria, os empresários do IEDI pediam cautela e condenavam a forma como eles estavam sendo feitos publicamente pela administração federal.20 20 Em relação à redução da tarifa da energia elétrica, em entrevista realizada em dezembro de 2012, Passos afirmou que: “A briga com o setor de energia era necessária e o próximo passo será a cunha tributária, que é enorme [...]. O peso do ICMS sobre energia, por exemplo, é um problema muito sério [...]. A direção está correta, mas o risco é ferir a imagem do País e espantar investidores” (Istoé Dinheiro, 2012, on-line, grifo nosso). Os empresários Pedro Wongtschowski e Décio da Silva, em entrevistas ao autor, proferiram declarações no mesmo sentido.
Assim, embora a redução dos juros e dos preços de energia elétrica fossem antigas demandas do setor industrial (cf. Passos, 2012PASSOS, P. (2012) “As causas da crise industrial brasileira”. O Estado de S. Paulo , 11.3.2012. Disponível em: <Disponível em: https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,as-causas-da-crise-industrial-brasileira-imp-,846927 >. Acesso em: 16 maio 2021.
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), a forma como foram realizadas incomodaram as lideranças industriais ligadas ao IEDI. É relevante notar a hesitação do instituto em relação principalmente à queda na taxa de juros, já que se tratava de uma das mais antigas demandas do setor industrial no país. Se basearmo-nos nas declarações aqui analisadas, entende-se que o desejo do não confronto - ou da estabilidade no ambiente de negócios - tenha sido decisivo para a resistência dos dirigentes do IEDI em apoiar efusivamente essas duas medidas adotadas pelo governo que o beneficiaria diretamente. Embora os dirigentes industriais do IEDI fossem beneficiados pelas medidas tomadas a respeito dos juros e custos da energia, na medida em que estas implicavam, necessariamente, disputas no interior da classe dominante, eles preferiam a reticência ante a intervenção.21
21
Sobre a questão da “intervenção na economia”, em entrevista concedida ao autor, Dan Ioschpe afirmou: “Outro tema, que talvez tenha sido um dos dois assuntos essenciais da fase do ministro Mantega, [é] a questão […] [da] intervenção no domínio econômico. Este é um tema muito complicado […]. Quando você sugere que intervirá no domínio econômico, e você toma decisões que deveriam, na maior parte dos casos, estarem sendo tomadas pela competição, pela média do relacionamento das empresas, você passa uma sinalização muito complicada [...]. Nisso a leitura do pequeno e do médio empresário é igual à do grande, ele diz: nesse ambiente, vai sobrar pra mim. Daqui a pouco, vão dizer que no meu açougue eu não posso cortar a carne da forma X ou Y, vendendo a preço H… Então eu não invisto [...]. Isso acaba criando um ciclo perverso, de redução do crescimento, com a redução do crescimento, cai a arrecadação de impostos” (Dan Ioschpe em entrevista ao autor em 16 de outubro de 2020, grifo nosso). O receio da classe industrial ante a intervenção na economia por parte do Estado já havia sido notado por Singer (2016).
A cautela na disputa observada contra agentes com interesses antagônicos a respeito do custo da energia e do dinheiro, contudo, não se repetiu quando o conflito aconteceu em relação aos custos do trabalho. Se se inaugurava um ambiente de tensão no setor industrial, comprovado pela falta de apoio a medidas tomadas pelo governo de embate contra outros segmentos econômicos, esta se intensificava, ao passo em que os dirigentes da indústria se percebiam mais e mais insatisfeitos a respeito do custo do trabalho no Brasil.22 22 A este respeito, cf. (Micussi, 2021).
A DISPUTA PELAS TAXAS DE LUCRO E SALÁRIOS
Se, por um lado, os empresários da grande indústria atuaram em defesa de taxas de câmbio e, ao menos até a execução da NME, de juros vistas como competitivas para a indústria se colocando, no caso desta última, em oposição aos interesses do setor rentista da economia, esses mesmos agentes travaram, a partir de início do governo Dilma, uma disputa ante o movimento trabalhista ao redor do preço dos salários no país. Isso pode ser entendido, por sua vez, como uma resposta à queda na taxa de lucro do setor industrial no início da década, como será discutido adiante.
A partir de 2012, em diversas declarações, os empresários da grande indústria brasileira congregados no IEDI manifestaram sua insatisfação com o custo do fator trabalho no país. Naquele ano, por exemplo, enquanto o empresário Ermírio de Moraes defendia a flexibilização das leis trabalhistas (Ribeiro, 2012RIBEIRO, I. (2012) “Resultado deve ser melhor que em 2012”. Valor Econômico , 19 dez. 2012. Disponível em: < Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/12/19/resultado-deve-ser- melhor-que-em-2012.ghtml >. Acesso em: 13 maio 2021.
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, on-line), Pedro Passos, presidente do instituto de 2009 a 2015, argumentava que o aumento dos salários na indústria representava um “fator de pressão” no setor (Passos, 2012PASSOS, P. (2012) “As causas da crise industrial brasileira”. O Estado de S. Paulo , 11.3.2012. Disponível em: <Disponível em: https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,as-causas-da-crise-industrial-brasileira-imp-,846927 >. Acesso em: 16 maio 2021.
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). No mesmo sentido, em declaração conferida no ano seguinte, o conselheiro do IEDI Jorge Gerdau também se queixava dos custos do trabalho no país (Rodrigues e Pereira, 2013RODRIGUES, F.; PEREIRA, A. (2013) “Para empresário, sem reforma é difícil conter avanço dos políticos na gestão”. Folha de S.Paulo , 15 mar. 2013. Disponível em: < Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/poderepolitica/2013/03/1246430-para-gerdau-burrice-de-criar-mais-ministerios-esta-no-limite.shtml >. Acesso em: 19 abr. 2021.
https://www1.folha.uol.com.br/poder/pode...
).
Na medida em que o aumento dos salários aparecia no discurso dos dirigentes empresariais ligados ao IEDI como uma das queixas para as dificuldades que o setor industrial enfrentava a partir de 2012, esse desconforto foi sendo refletido em pesquisas realizadas pelo think tank. De acordo com esses documentos, a queda na margem de lucro das empresas industriais nacionais podia ser em parte explicada pelo aumento do valor dos salários no setor. É o que fica claro em estudo publicado em 2016. Segundo o IEDI, isso era explicando, por um lado, pelo aumento das despesas financeiras das empresas (devido a juros e desvalorização cambial) e, por outro, ao aumento dos custos de produção que, afora as matérias-primas, pode ser resumido aos salários.
A queda da rentabilidade das empresas brasileiras no período do fim do governo Dilma também é pontuada por estudo de Rocha e Novais (2020ROCHA, M; NOVAIS, L. (2020) “Indústria e grandes empresas no governo do partido dos trabalhadores.” Texto para Discussão n 281, IE; Unicamp, 2020.) que analisa, respectivamente, a rentabilidade do patrimônio líquido dos 200 maiores grupos econômicos e das 500 maiores empresas não financeiras no Brasil.23 23 Em Rocha (2015) é possível avaliar a evolução e o crescimento dos gastos de pessoal no valor da transformação industrial a partir de 2004 no Brasil.
Assim, se, por um lado, os lucros na indústria caíam, os dados disponíveis apontam que, por sua vez, os custos de mão de obra tiveram um aumento importante no interior da estrutura de custos do setor. É o que confirmam os dados apresentados na Figura 3. Nela, é possível observar que a evolução dos custos com pessoal se destaca dentre o conjunto de custos do setor, crescendo de forma acentuada e preponderante sobre os demais de 2006 até meados de 2017. Isso ajuda a dimensionar a importância que a taxa salarial passou a ter para os empresários industriais em um contexto de redução da rentabilidade do setor.
Levando em consideração esse cenário, entende-se por que o custo da mão de obra e a legislação trabalhista estiveram presentes em inúmeras declarações de Pedro Passos em 2014PASSOS, P. (2014) “A indústria que queremos”. Folha de S.Paulo , 29.8.2014. Disponível em: <Disponível em: https://m.folha.uol.com.br/colunas/pedropassos/2014/08/1507599-a-industria-que-queremos.shtml >. Acesso em: 19 abr. 2021.
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24
Como por exemplo em: “Em primeiro lugar, não será possível superar a crise da indústria sem a redução do ‘custo Brasil’, o que exige aprofundar os investimentos em infraestrutura e agilizar as reformas tributária e trabalhista” (Passos, 2014, on-line). A despeito de tais declarações, quando questionado posteriormente pelo autor sobre as disputas envolvendo os níveis de salário nesse período, Passos atenuou a importância da questão.
ou em artigo escrito pelo IEDI e FIESP em setembro de 2014 para o jornal Valor Econômico.25
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De acordo com as entidades: “O crescimento dos salários acima da produtividade do trabalho seria um dos fatores explicativos do fraco desempenho do setor [industrial] [...]. Em suma, as evidências são muito fortes no sentido do descolamento entre a produtividade do trabalho e os salários pagos na indústria [...]. Em conjunto com outros fatores, disto resultou a letargia da indústria de transformação, arrastando consigo os investimentos e a atividade econômica do país como um todo” (Francini e Souza, 2014, on-line).
O tema também aparece na publicação Para vencer a crise, organizada pelo IEDI em 2015. Nela, o instituto defendia que a “simplificação das leis e regulamentos, especialmente nas esferas tributária e trabalhista” da “preponderância do negociado com relação ao legislado na área trabalhista” seriam fundamentais para aumentar a competitividade da economia nacional (IEDI, 2015IEDI. (2015) Para vencer a crise. IEDI: São Paulo ., p. 6).26
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Para uma discussão a respeito da forma como as mudanças na taxa de lucros e salários influenciaram a ação dos empresários da indústria pela aprovação da reforma trabalhista em 2017, cf. Micussi e Aguiar (2023).
Com efeito, as manifestações empresariais no período em questão referente aos custos do trabalho e aos salários coincidem temporalmente com um ascenso do movimento sindical grevista brasileiro, de modo que é possível observar naquele momento, em linha com o observado pela literatura, um acirramento da polarização entre capital e trabalho no país.
De acordo com estudo realizado por Oliveira (2019OLIVEIRA, C. (2019) “Greves no Brasil, de 1978 a 2018: grandes ciclos, configurações diversas”. Revista Ciências do Trabalho, n. 16.), a partir de 2011 o Brasil assiste a uma explosão na frequência anual de greves, período que coincide exatamente com aquele da queda de rentabilidade das empresas industriais anteriormente analisado. Não é demais lembrar que, conforme apontado por Braga (2016BRAGA, R. (2016) “Terra em transe: o fim do lulismo e o retorno da luta de classes”. In: SINGER, A.; LOUREIRO, I. As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo.), aquele que seria o maior ciclo grevista da história do país foi diretamente beneficiado por um até então aquecido mercado de trabalho. À época, o proletariado sindicalmente organizado e dotado de maior poder de barganha logrou alcançar negociações coletivas vantajosas e benéficas em termos salariais.
De fato, de acordo com Marquetti et al. (2016MARQUETTI, A. A.; HOFF, C. R.; MIEBACH, A. D. (2016) Lucratividade e distribuição: a origem econômica da crise política brasileira. Mimeo, 2016.), que realizam estudo a respeito da distribuição funcional da renda brasileira a partir de dados das contas nacionais, há uma correlação direta entre a queda da taxa de lucro das empresas e o aumento da parcela salarial. Martins e Rugitsky (2018MARTINS, G.; RUGITSKY, F. (2018) “The commodities boom and the profit squeeze: output and profit cycles in Brazil”. FEA-USP: Working Papers Series.) também concluem na mesma direção ao relacionar o esmagamento dos lucros empresariais no governo Dilma com um aumento do poder de barganha dos trabalhadores e o crescimento do movimento sindical grevista no período.
Com efeito, é possível tirar conclusão semelhante se analisarmos a evolução do custo unitário do trabalho e do salário médio na indústria de transformação brasileira. Tal como é possível observar na figura a seguir, a partir de 2010, o custo unitário do trabalho, puxado pelo aumento dos salários médios do setor (medidos por hora trabalhada), sobe sensivelmente, até atingir o pico da série histórica em 2015. Neste ano, os salários médios no setor se estabilizam, para passarem a cair a partir de 2017.
Evolução do Custo Unitário do Trabalho (CUT) e dos Salários Médios na Indústria de Transformação - médias anuais, jan./2006 = 100
Finalmente, é possível notar como na disputa ao redor da taxa de lucros e salários o IEDI se aproxima novamente do novo desenvolvimentismo ao defender que a evolução dos salários deve responder à evolução da produtividade na economia. Embora a defesa do crescimento dos salários ao mesmo ritmo do da produtividade não seja exclusividade de autores ligados ao novo desenvolvimentismo, a argumentação de Marconi (2017MARCONI, N. (2017) “O papel dos preços macroeconômicos na crise e na recuperação”. Estudos Avançados , v. 31, n. 89.), por exemplo, para quem o aumento da taxa de salários acima do aumento da produtividade do trabalho deprimi a taxa de lucro e os investimentos na economia é precisamente a posição dos empresários do IEDI em relação aos salários e aos lucros durante o governo Dilma.
CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetivo discutir a forma como uma parcela dos empresários da grande indústria brasileira disputou a definição de quatro preços macroeconômicos no Brasil ao longo dos treze anos que abrangem os governos federais do PT de 2003 a 2016. A pesquisa buscou demonstrar como esses agentes se colocam em oposição ao setor financeiro através da defesa de taxa de juros e de câmbio vistas como “competitivas”, e em oposição aos trabalhadores industriais quando da definição da taxa de lucro e de salários no país. Nesse movimento duplo, o que se revela é uma disputa interclassista. No primeiro momento, entre diferentes setores da classe capitalista brasileira e, em seguida, entre capitalistas e trabalhadores no Brasil.
Vale notar, entretanto, uma questão fundamental. Se a disputa entre os capitalistas industriais e financeiros é logo abortada pelos primeiros no bojo dos conflitos acontecidos ao longo do governo Dilma, o mesmo não se dá na disputa entre industriais e trabalhadores. Com efeito, se durante o governo Dilma os empresários da indústria mostraram hesitação ante políticas estatais que buscavam diminuir a taxa de juros (apesar de constituírem-se antigas demandas do setor) uma vez que tais tentativas colocavam o Estado brasileiro diretamente contra os interesses do mercado financeiro, essa mesma hesitação não foi observada quando seu antípoda se mostrou ser o movimento trabalhista.
Grosso modo, se a pesquisa empírica junto aos empresários da grande indústria brasileira contemporânea faz revelar a existência de um agente que atua, de fato, em defesa do setor industrial nacional - ao menos a nível da grande empresa -, a forma de sua atuação a partir do momento em que se observa a compressão de suas taxas de lucro, enseja reflexões a respeito das possibilidades e limites da existência de coalizões de classe de tipo desenvolvimentistas no Brasil contemporâneo.
Com efeito, se uma coalizão de classe desenvolvimentista pressupõe uma associação entre burocracia pública, trabalhadores e empresários que se opõe aos interesses dos capitalistas rentistas (Bresser-Pereira, 2016BRESSER-PEREIRA, L. (2016) “Reflexões sobre o Novo Desenvolvimentismo e o Desenvolvimentismo Clássico”. Revista de Economia Política, v. 36, n. 2, p. 237-268.), o material empírico aqui apresentando atesta, de fato a existência de um empresariado industrial ciente do processo de desenvolvimento brasileiro que atua, diante disso, em defesa de uma política econômica entendida como competitiva para o sucesso do setor no país. Nesse sentido, foi possível identificar uma aproximação da agenda do IEDI com o novo desenvolvimentismo, que enxerga não apenas a necessidade do fortalecimento da indústria para o sucesso do desenvolvimento nacional, mas também a proeminência da política macroeconômica para isso. Embora certamente não se trate de uma confluência total entre IEDI e o novo desenvolvimentismo (como vimos, por exemplo, mesmo a defesa de uma taxa de juros “competitiva” avança e recua em momentos determinados entre 2003 e 2016), entendemos que a forma pela qual os empresários ligados ao instituto se colocaram diante do câmbio, juros, lucros e salários - sobretudo na importância conferida a esses quatro pontos ao longo do período - revela a existência de uma afinidade eletiva, em sua lógica característica baseada na atração e repulsa entre ideias e uma base social, entre os dois.
Entretanto, a consideração da ação desses empresários ao longo do governo Dilma, seja em relação às suas queixas a respeito da “intervenção” na economia brasileira, quanto em relação às suas queixas a respeito das taxas de lucros e salários a partir de então, enseja reflexões a respeito dos limites da coalizão acima referida. Com efeito, se os empresários da indústria se colocam, de fato, em oposição aos rentistas na defesa de taxas de câmbio e juros “competitivas”, na medida em que se estabelece um conflito distributivo entre capital e trabalho no país, esses mesmos empresários se colocam em confronto direto com os trabalhadores, minando o próprio futuro coalizão. Em resumo, nesse duplo movimento, como esperamos ter demonstrado, atesta-se a importância conferida à política macroeconômica por parte dos empresários da grande indústria brasileira e a ação por eles empreendida para a sua definição no Brasil contemporâneo.
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» https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2007/iedi_na_imprensa_iedi_culpa_cambio_valori zado_e_china_por_taxa_alta_do_desemprego_ao_longo_de_2007.html
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1
Versões anteriores deste trabalho foram apresentadas no 5th Workshop on New Developmentalism: Economics and Political Economy of New Developmentalism, no 2nd SDMRG International Workshop, no 13° Workshop Empresa, Empresários e Sociedade, e no GT 34 Estado e Burguesia no Brasil do 47° Encontro Annual da Anpocs. O autor agradece os valiosos comentários recebidos pelos colegas nestes diferentes eventos. . O autor agradece também a revisão e as sugestões realizadas pelo parecerista anônimo da Revista de Economia Política que auxiliaram de forma significativa o aperfeiçoamento do trabalho para esta versão do texto final.
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2
O foco sobre a interação dos empresários industriais com política macroeconômica responde, de um lado, à relevância que a política macro ganhou em debates a respeito da caracterização do primeiro ciclo de governos do PT como desenvolvimentistas. De outro lado, busca dar conta ao fato de que a própria pesquisa empírica conduzida junto a esses agentes apontou para uma relevância sensível desta mesma política macro em seus discursos sobre políticas econômicas (industriais inclusive) e o desenvolvimento brasileiro, em geral, entre 2003 e 2016.
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3
Disponível em: https://iedi.org.br/imprensa/. Acesso em: 5 maio 2021.
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4
O “ensaio desenvolvimentista” do governo se baseou, no plano macroeconômico, na redução da taxa básica de juros e na desvalorização cambial e, no campo da política industrial executada no âmbito do Plano Brasil Maior, na proteção ao produto nacional, no uso intensivo do BNDES, desonerações ao setor produtivo, na execução de um plano de infraestrutura e na reforma do setor elétrico (Singer, 2016SINGER, A. (2016) “A (falta de) base política para o ensaio desenvolvimentista”. In: A. SINGER; LOUREIRO, I. (Org.). As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo .). A estratégia, que pode ser entendida como uma resposta do Governo Federal às reivindicações do empresário industrial nacional (Carvalho, 2018CARVALHO, L. (2018) Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia.), foi logo abandonada por esses agentes que deixam de apoiá-la para se colocar, finalmente, contra o próprio governo (Singer, 2018SINGER, A.. (2018) O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras.; Boito, 2018BOITO JR, A. (2018) Reforma e crise política no Brasil. Campinas: Editora Unicamp; São Paulo: Editora Unesp.).
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5
Cf. entre outros, por exemplo, Porto (2020PORTO, T. (2020) “Coalitions for development: a new-developmentalist interpretation for the abandonment of industrial capitalista from PT political coalition”. Brazilial Journal fo Political Economy, v. 40, n. 2, p. 355-375.).
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6
Para a lista completa das atuais empresas que compõem o conselho do instituto, cf. https://iedi.org.br/artigos/iedi/conselho/conselho_do_iedi.html.
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7
Para uma discussão aprofundada da relação do IEDI com a abertura comercial, internacionalização da economia e inserção às cadeias globais de valor, cf. Aguiar e Micussi (2022AGUIAR, T.; MICUSSI, P. (2022) “Transnational Corporations and Capitalists from the Global South: Natura & Co. and the IEDI”. Latin American Perspectives, 49(5), 86-99. https://doi.org/10.1177/0094582X221114824, 2022
https://doi.org/10.1177/0094582X22111482... ). -
8
Atualmente, o conselho do IEDI conta com 42 empresas, das quais 34 de capital aberto. Dessas, de acordo com a publicação Valor 1000, seis delas são líderes em seus setores de atuação no Brasil (Suzano, Weg, Vale, Votorantim, Natura e Braskem), três ocupam a segunda posição (Ambev, Klabin e Gerdau), e outras catorze figuram entre as dez primeiras em seus respectivos ramos. Das firmas de capital aberto do IEDI, 68% estão entre as dez maiores companhias de seu setor. Se levarmos em conta a comparação das empresas do IEDI apenas com suas outras brasileiras - isto é, excluindo-se as empresas estrangeiras que atuam em seus ramos no país -, vemos que 85% dessas firmas (ou 29 das empresas de capital aberto) figuram entre as dez primeiras em seus respectivos rankings setoriais.
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9
Segundo o empresário: “A interferência no câmbio não é um direito, mas uma obrigação do Estado. Se não interferir, a autoridade estará se omitindo. Todos os países do mundo intervêm no câmbio. Da mesma forma que o Copom se reúne para interferir nos juros, o BC também tem a obrigação de reduzir a dependência externa do país. Essa política é tão séria quanto a de combate à inflação” (Barros, 2003BARROS, G. (2003) “Crise cambial está a caminho, diz empresário”. Folha de S.Paulo, 4.03.2003. Disponível em: < Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u66668.shtml >. Acesso em: 14 jun. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/folha/dinh... , on-line). -
10
Ela aparece, por exemplo, nas análises do IEDI a respeito do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no começo de 2007. Sobre isso, o instituto recomendou a desoneração da folha de pagamentos para reduzir os custos de produção de modo a compensar a perda de competitividade de setores afetados pelo câmbio. Cf. Folha de S.Paulo (2007FOLHA DE S. PAULO. (2007) “Indústria vê timidez e cobra corte de imposto”. Folha de S.Paulo , 13.6.2007. Disponível em: <Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1306200703.htm >. Acesso em: 16 jun. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinhei... ), Trevisan (2007TREVISAN, C. (2007) “Pacote não garante crescimento maior”. Folha de S.Paulo , 21.1.2007. Disponível em: <Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2101200704.htm > . Acesso em: 16 jun. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinhei... ) e Araújo (2007ARAÚJO, M. (2007) “Setor privado espera “pacote” com ressalvas”. DCI, 22.01.2007. Disponível em: <Disponível em: https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2007/iedi_na_imprensa_setor_privado_espera_pac ote_com_ressalvas.html >. Acesso em: 16 jun. 2019.
https://iedi.org.br/artigos/imprensa/200... ). -
11
A título de ilustração, a indústria de transformação, que respondeu no seu auge por 35,9% do PIB brasileiro em 1985, caiu para 12,9% do PIB em 2022. Nos primeiros treze anos de governos do PT, ela foi de 16,9% a 12,5% do PIB entre 2003 e 2016, de acordo com dados CNI base no IBGE (https://industriabrasileira.portaldaindustria.com.br/grafico/total/producao/#/industria-total). Por sua vez, em relação à sua participação no emprego formal no país, a indústria de transformação respondia por 27,1% dele em 1986, caindo a marca de 18,1% em 2003 e 15,5% em 2016, conforme dados da FIESP (2018FIESP. (2018) Panorama da indústria de transformação. Disponível em: <Disponível em: https://www.fiesp.com.br/arquivo-download/?id=248686 >. Acesso em: 20 jun. 2019.
https://www.fiesp.com.br/arquivo-downloa... ). -
12
Sobre isso, o empresário do ramo têxtil Ivo Rosset deu a seguinte declaração em entrevista para o autor: “O câmbio alto me prejudica um pouco [...] o câmbio alto inibe a importação de manufaturados chineses. Aí sim é câmbio 100% na veia […]. O mercado de confecção, o manufaturado no Brasil é enorme, o consumo é enorme. E a quantidade de produto manufaturado que vinha da China era uma coisa absurda […]. Havia uma concorrência quase desleal” (Ivo Rosset em entrevista ao autor em 14 de julho de 2020). Opinião no mesmo sentido pode ser observada na seguinte declaração do empresário Eugênio Staub: “Tanto o governo FHC quanto o governo Lula como o governo Dilma prejudicaram demais a indústria no país. Principalmente por causa de política cambial com o real sobrevalorizado que começou com o Gustavo Franco em 1994. Isso foi mortal” (Eugênio Staub em entrevista ao autor em 21 de julho de 2020).
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13
O fato se evidencia, por exemplo, nas seguintes declarações de conselheiros do IEDI: “[Houve] políticas equivocadas, excesso de controle e política industrial. Hoje eu tenho dúvidas [...]. Eu acho que o caminho é mais políticas macroeconômicas compatíveis com a industrialização e política tecnológica” (Eugênio Staub em entrevista ao autor em 21 de julho de 2020). Ou ainda: “Eu não preciso de uma política industrial. Eu preciso de uma política de país [...]. Eu não quero privilégio industrial nenhum, zero! [...]. De forma global, eu diria que, ao se criar as macrocondições, os espaços são encontrados” (Conselheiro do IEDI em entrevista ao autor em 22 de junho de 2020). O empresário Dan Ioschpe deu declaração no mesmo sentido ao comentar que: “Eu tenho uma visão de que a política industrial por si só não é o fator predominante. Eu tendo a achar que ela terá maior ou menor sucesso se tiver subsidiária a uma agenda horizontal mais ampla que comece com a condução da trajetória macroeconômica do país” (Dan Ioschpe em entrevista ao autor em 16 de outubro de 2020).
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14
De acordo com declaração de Ivocny Ioschpe no início do Governo Lula, por exemplo: “O Lula está preso numa gaiola de conservadorismo. E a culpa é da própria elite, que, nas eleições de 2002, alimentou um temor irracional em relação ao que o Lula poderia fazer. Foi por isso que, dois meses antes de eleito, ele assinou a tal Carta ao Povo Brasileiro, com as diretrizes de política econômica que têm sido seguidas. “Como o mercado financeiro aplaudiu, o governo ficou refém do conservadorismo” (Attuch, 2004ATTUCH, L. (2014) “Ivoncy Ioschpe: “Lula está na gaiola dos conservadores”” IstoÉ Dinheiro, 30.06.2004. Disponível em:<Disponível em:https://iedi.org.br/artigos/imprensa/2004/iedi_na_imprensa_ivoncy_ioschpe_lula_esta_na_gaiola_dos_conservadores.html >. Acesso em: 14 jun. 2014.
https://iedi.org.br/artigos/imprensa/200... , on-line, grifos nossos). -
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De acordo com Pedro Wongtschowski, presidente do IEDI entre 2015 e 2017: “Eu me lembro que nós dizíamos […] que [era] a diferença entre o céu e o inferno. O paraíso dos banqueiros era o câmbio baixo e os juros altos, e o paraíso dos industriais era o contrário, o câmbio alto e os juros baixos. Então nós convivemos durante tempos longos demais com juros definitivamente altos demais” (Pedro Wongtschowski em entrevista ao autor em 6 de abril de 2020). Sobre o mesmo assunto, de acordo com o empresário Ivo Rosset: “A taxa de juros era absurda, era desproporcional. Taxa de juros mais reoneração da folha gerou uma desindustrialização, sem dúvida nenhuma [...]. Já discuti com alguns presidentes de Banco Central e sempre disse: o que segura inflação não são os juros, não adianta colocar os juros lá no espaço para conter a inflação. A inflação se contém com oferta” (Ivo Rosset em entrevista ao autor em 14 de julho de 2020).
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Em relação à Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada no primeiro semestre de 2008, a expectativa do IEDI era de que ela pudesse representar melhores avanços ao setor produtivo nacional do que a PITCE. Em 2010, após um ano de seu lançamento, a visão do IEDI sobre o sucesso da PDP parecia refletir os diagnósticos proferidos pelo instituto um ano antes quando de seu anúncio: bom papel cumprido pelo BNDES na facilitação do crédito via modalidades específicas, apesar do alto custo desses recursos, devido aos juros excessivamente altos. Entretanto, a despeito disso, a crise financeira internacional de 2008 alterou essencialmente as expectativas e avaliações do instituto em relação ao sucesso da PDP. Dessa forma, muitas das declarações de membros do IEDI em 2009, por exemplo, buscaram apontar a dificuldade de cumprimento das metas fixadas a partir das políticas anunciadas no ano anterior.
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Isso pode ser visto em entrevista de José Roberto Ermírio de Moraes em dezembro de 2012: “É a primeira vez que vejo um alinhamento muito forte de todos na busca da retomada da competitividade da indústria brasileira” (RIBEIRO, 2012RIBEIRO, I. (2012) “Resultado deve ser melhor que em 2012”. Valor Econômico , 19 dez. 2012. Disponível em: < Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/12/19/resultado-deve-ser- melhor-que-em-2012.ghtml >. Acesso em: 13 maio 2021.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2... , on-line). Já o empresário Pedro Passos afirmou que: “Esse é um governo muito próximo da indústria. Existe um diálogo aberto” (Landim, 2012LANDIM, R. (2012) “Governo precisa de agenda de reformas de longo prazo.” O Estado de S. Paulo, 29.4.2012. Disponível em: <Disponível em: https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,governo-precisa-de-agenda-de-reformas-de-longo-prazo-imp-,866789 >. Acesso em: 13 maio 2021.
https://economia.estadao.com.br/noticias... , on-line). -
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A diminuição dos spreads foi motivo de significativa tensão entre o governo e o setor financeiro, no que Singer (2016SINGER, A. (2016) “A (falta de) base política para o ensaio desenvolvimentista”. In: A. SINGER; LOUREIRO, I. (Org.). As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo .) identificou como a “batalha dos spreads”.
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A seguinte entrevista de Pedro Passos é elucidativa a esse respeito: “O empresariado apoia a briga contra o tamanho do spread no Brasil. Não há dúvida de que pagamos muitos juros e parte disso é porque as margens (de lucro dos bancos) são altas [...]. Mas a melhor forma de fazer isso é criar os incentivos necessários para que o mercado financeiro se mobilize nessa direção. Não pode haver briga do governo com um setor” (O ESTADO DE S. PAULO, 2012, on-line).
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Em relação à redução da tarifa da energia elétrica, em entrevista realizada em dezembro de 2012, Passos afirmou que: “A briga com o setor de energia era necessária e o próximo passo será a cunha tributária, que é enorme [...]. O peso do ICMS sobre energia, por exemplo, é um problema muito sério [...]. A direção está correta, mas o risco é ferir a imagem do País e espantar investidores” (Istoé Dinheiro, 2012ISTOÉ DINHEIRO. (2012) “O Brasil pode e deve criar marcas globais”. Istoé Dinheiro. Disponível em: <Disponível em: https://www.istoedinheiro.com.br/noticias/entrevistas/20091125/brasil-pode-deve-criar-marcas-globais/147408 >. Acesso em: 29 abr. 2021.
https://www.istoedinheiro.com.br/noticia... , on-line, grifo nosso). Os empresários Pedro Wongtschowski e Décio da Silva, em entrevistas ao autor, proferiram declarações no mesmo sentido. -
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Sobre a questão da “intervenção na economia”, em entrevista concedida ao autor, Dan Ioschpe afirmou: “Outro tema, que talvez tenha sido um dos dois assuntos essenciais da fase do ministro Mantega, [é] a questão […] [da] intervenção no domínio econômico. Este é um tema muito complicado […]. Quando você sugere que intervirá no domínio econômico, e você toma decisões que deveriam, na maior parte dos casos, estarem sendo tomadas pela competição, pela média do relacionamento das empresas, você passa uma sinalização muito complicada [...]. Nisso a leitura do pequeno e do médio empresário é igual à do grande, ele diz: nesse ambiente, vai sobrar pra mim. Daqui a pouco, vão dizer que no meu açougue eu não posso cortar a carne da forma X ou Y, vendendo a preço H… Então eu não invisto [...]. Isso acaba criando um ciclo perverso, de redução do crescimento, com a redução do crescimento, cai a arrecadação de impostos” (Dan Ioschpe em entrevista ao autor em 16 de outubro de 2020, grifo nosso). O receio da classe industrial ante a intervenção na economia por parte do Estado já havia sido notado por Singer (2016SINGER, A. (2016) “A (falta de) base política para o ensaio desenvolvimentista”. In: A. SINGER; LOUREIRO, I. (Org.). As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo .).
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A este respeito, cf. (Micussi, 2021MICUSSI, P. (2021) Empresário industrial e governos do PT: o caso do IEDI (2003 - 2016). 2021. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. ).
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Em Rocha (2015) é possível avaliar a evolução e o crescimento dos gastos de pessoal no valor da transformação industrial a partir de 2004 no Brasil.
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Como por exemplo em: “Em primeiro lugar, não será possível superar a crise da indústria sem a redução do ‘custo Brasil’, o que exige aprofundar os investimentos em infraestrutura e agilizar as reformas tributária e trabalhista” (Passos, 2014PASSOS, P. (2014) “A indústria que queremos”. Folha de S.Paulo , 29.8.2014. Disponível em: <Disponível em: https://m.folha.uol.com.br/colunas/pedropassos/2014/08/1507599-a-industria-que-queremos.shtml >. Acesso em: 19 abr. 2021.
https://m.folha.uol.com.br/colunas/pedro... , on-line). A despeito de tais declarações, quando questionado posteriormente pelo autor sobre as disputas envolvendo os níveis de salário nesse período, Passos atenuou a importância da questão. -
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De acordo com as entidades: “O crescimento dos salários acima da produtividade do trabalho seria um dos fatores explicativos do fraco desempenho do setor [industrial] [...]. Em suma, as evidências são muito fortes no sentido do descolamento entre a produtividade do trabalho e os salários pagos na indústria [...]. Em conjunto com outros fatores, disto resultou a letargia da indústria de transformação, arrastando consigo os investimentos e a atividade econômica do país como um todo” (Francini e Souza, 2014FRANCINI, P.; SOUZA, R. (2014) “Produtividade, salários e a crise da indústria”. Valor Econômico, 24.9.2014. Disponível em: <Disponível em: https://valor.globo.com/opiniao/coluna/produtividade-salarios-e-a-crise-da-industria.ghtml >. Acesso em: 19 abr. 2021.
https://valor.globo.com/opiniao/coluna/p... , on-line). -
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Para uma discussão a respeito da forma como as mudanças na taxa de lucros e salários influenciaram a ação dos empresários da indústria pela aprovação da reforma trabalhista em 2017, cf. Micussi e Aguiar (2023MICUSSI, P.; AGUIAR, T. (2023) “Lucros, greves e salários: a grande burguesia industrial pela aprovação da reforma trabalhista no Brasil.” Revista de ciências sociais - política & trabalho, (58). https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/64704.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol... ).
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JEL Classification: E60; O1; P00; Z13.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
22 Abr 2024 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2024
Histórico
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Recebido
11 Jan 2023 -
Aceito
28 Ago 2023