Open-access Reflexões epistemológicas sobre o potencial emancipador da pedagogia da libertação para superar o modelo escolar no quefazer do(a) professor(a)

Epistemological reflections towards pedagogic emancipatory potential of deliverance to overcome educator's accomplishment classic scholar model

Resumos

Desde a criação, no século XIX, dos sistemas nacionais de educação que se foi consolidando um determinado modelo educativo, desenvolvido no contexto institucional e organizacional da escola, e por isso designado genericamente de modelo escolar de educação. As características hegemónicas deste modelo naturalizaram de tal forma os seus pressupostos educativos, que o que passa a ser legitimado como educação corresponde, em larga medida, ao seu modelo clássico de integração normativa, baseado numa concepção da prática educativa de caráter totalitário e impositivo. É pois, no âmbito da crítica à forma escolar elaborada no contexto das perspectivas críticas em educação, de que emana a pedagogia da libertação, que a problemática-chave deste texto está situada, instigando reflexões que se alongam para os campos da Filosofia, da Política e da Antropologia, e oferecendo subsídios para a pesquisa e para a prática de formação de educadores

pedagogia da libertação; pensamento crítico; emancipação social


Since 19th century the national education systems have been consolidating as a specific educational model, developed on the institutional and organizational school context, and therefore designated broadly as formal education. The hegemonic characteristics of this model have been naturalized their educational assumptions and they have been accepted now in the West scholar as the educational classic normative integration model based into an educational arrangement practice which hallmark is totalitarian and prescriptive. Thus, this paper shares the main recent criticisms of this classic scholar education model. In addition to, this work also envisages hope on the new theoretical proposals present in the critical perspectives of educational thought, raising reflections that go beyond philosophy, policy and anthropology fields of knowledge, and offering support to educational research and educators training.

liberation pedagogy; critical thoughts; social emancipation


Reflexões epistemológicas sobre o potencial emancipador da pedagogia da libertação para superar o modelo escolar no quefazer do(a) professor(a)

Epistemological reflections towards pedagogic emancipatory potential of deliverance to overcome educator's accomplishment classic scholar model

Rosanna BarrosI; José Barrientos RastrojoII

IDoutora em Educação pela Universidade do Minho; Professora Adjunta da Universidade do Algarve, ESEC, Campus da Penha-Estrada da Penha. E-mail: rmbarros@ualg.pt

IIDoutor em Filosofia Aplicada pela Universidade de Sevilha; Professor da Universidade de Sevilha DMCAFEFP, Facultad de Filosofia. E-mail: barrientos@us.es

Contato

RESUMO

Desde a criação, no século XIX, dos sistemas nacionais de educação que se foi consolidando um determinado modelo educativo, desenvolvido no contexto institucional e organizacional da escola, e por isso designado genericamente de modelo escolar de educação. As características hegemónicas deste modelo naturalizaram de tal forma os seus pressupostos educativos, que o que passa a ser legitimado como educação corresponde, em larga medida, ao seu modelo clássico de integração normativa, baseado numa concepção da prática educativa de caráter totalitário e impositivo. É pois, no âmbito da crítica à forma escolar elaborada no contexto das perspectivas críticas em educação, de que emana a pedagogia da libertação, que a problemática-chave deste texto está situada, instigando reflexões que se alongam para os campos da Filosofia, da Política e da Antropologia, e oferecendo subsídios para a pesquisa e para a prática de formação de educadores

Palavras-Chave: pedagogia da libertação - pensamento crítico - emancipação social.

ABSTRACT

Since 19th century the national education systems have been consolidating as a specific educational model, developed on the institutional and organizational school context, and therefore designated broadly as formal education. The hegemonic characteristics of this model have been naturalized their educational assumptions and they have been accepted now in the West scholar as the educational classic normative integration model based into an educational arrangement practice which hallmark is totalitarian and prescriptive. Thus, this paper shares the main recent criticisms of this classic scholar education model. In addition to, this work also envisages hope on the new theoretical proposals present in the critical perspectives of educational thought, raising reflections that go beyond philosophy, policy and anthropology fields of knowledge, and offering support to educational research and educators training.

Keywords: liberation pedagogy - critical thoughts - social emancipation.

Introdução

Desde a criação, no século XIX, dos sistemas nacionais de educação foi-se consolidando um determinado modelo educativo, desenvolvido no contexto institucional e organizacional da escola, e por isso designado genericamente de modelo escolar de educação. As características hegemônicas deste modelo, com cerca de duzentos anos de história, naturalizaram de tal forma os seus pressupostos educativos, que o que passa a ser legitimado como educação corresponde, em larga medida, ao seu modelo clássico de integração normativa, baseado numa concepção da prática educativa de caráter totalitário e impositivo (Barrientos Rastrojo, 2011). É pois, no âmbito geral da crítica à forma escolar clássica, oriunda do pensamento crítico e das construções teóricas que visam a sua superação, fortemente elaboradas no contexto das perspetivas críticas em educação de que emana a pedagogia da libertação, que a problemática-chave deste texto está situada.

No panorama internacional da educação em geral, e da educação social e permanente de adultos (ESPA) em particular (Barros, 2012a), a importância e a influência do pensamento de Paulo Freire para o debate que essa problemática suscita é fundamental. Sua obra representa um ganho epistemológico pela construção que oferece de um corpus teórico perspectivado criticamente, em que os pressupostos político-pedagógicos contêm as bases de ação e reflexão necessárias para submeter à análise crítica a prática educativa em qualquer nível da sua ação, tanto no campo da educação de adultos e idosos como no campo da educação de crianças e jovens.

Os contributos sólidos, as interrogações fundamentais e os desafios centrais que o pensamento freiriano coloca de maneira complexa revestem-se, em nossa ótica, de uma pertinência transversal para qualquer educador. São, na realidade, incontornáveis, quando se trata de assumir consequentemente a politicidade da educação, ou seja, de iluminar as relações entre poder e pedagogia, o que constitui, de resto um aspecto fundamental no mundo contemporâneo em que estão a decorrer processos de mudança social com uma amplitude considerável. Esses processos, associados a movimentos de reconfiguração acelerada das instituições sociais, nomeadamente o pós-fordismo na economia (implicando, como aponta Terrén (2000), a precarização e a diminuição do trabalho) e a pós-burocracia no Estado (implicando, como referem Formosinho, Ferreira e Machado [2000], uma reatualização das perspetivas tecnocráticas na administração pública); fizeram emergir uma nova condição societal, assente nos pressupostos neoliberais, que racionalizaram e transformaram em mercadoria novas esferas da vida social, com âmbitos antes protegidos pelas políticas sociais, com destaque para a educação e a escola. Em particular no contexto da educação escolar, tem sido identificado, principalmente a partir dos anos 1970 na Europa, "o insucesso escolar, o agravamento da 'indisciplina' dos alunos e o 'mal-estar' dos professores" (Barroso, 2000: 78). Menos frequentemente se tem debatido, porém, o essencial das mudanças observadas, que se relaciona com as novas lutas concorrenciais introduzidas na arena educativa, pautadas por uma nova matriz neoliberal de governação e regulação da educação e da escola, que reinventa quer o fracasso, quer a excelência a partir de rankings que emanam de interesses não debatidos democraticamente (Antunes e Sá, 2010; Afonso, 2012; Barros, 2012b).

Isso posto, há que se referir aqui que a abordagem crítica de Paulo Freire encontra-se disseminada ao longo de uma obra vasta e polifacetada, construída ao longo de mais de trinta anos, em que a obra e o percurso de vida, bem como os contextos em que ela decorre, interpenetram-se de tal forma que nos parece impossível falar de um sem falar dos outros. Neste texto, a reflexão centrar-se-á seletivamente em alguns dos aspectos políticos da abordagem político-pedagógica de Paulo Freire, em que o conceito de conscientização é a chave mestra. Os pressupostos desse conceito basilar são elaborados no âmbito de um pensamento que tem duas características fundamentais: é um pensamento complexo por excelência, na medida em que conecta, no mesmo mapa temático, abordagens antropológicas e sociológicas, teológicas e políticas, filosóficas e epistemológicas; e é um pensamento dialético, na medida em que há nele um permanente respeito pela totalidade da realidade que se quer desvelar, ou seja, a sua abordagem assume sempre a unidade dialética contraditória que existe no real. Um real que Freire sublinha, recorrentemente nos seus textos, que não deve ser abordado, dicotomizando as suas contradições, mas apenas os seus antagonismos.

Este é, a nosso ver, um aspecto marcante do seu pensamento crítico, principalmente visível nos seus últimos escritos, em que a sua reflexão procura explicitar a união dialética1 entre entidades contraditórias, por exemplo: entre subjetividade e objetividade, ou entre saber e ignorância. Nos anos 1980 e 1990 ganha, de igual modo, proeminência a articulação dialética entre uma "linguagem da crítica", que denuncia as injustiças socias, e uma "linguagem da possibilidade", que anuncia novas possibilidades no trato justo da questão social, e que estão, explicitamente desde então, presentes de modo transversal no universo temático do pensamento freiriano. Nosso argumento, neste texto, centra-se na ideia de que este universo temático contém, em si, o potencial emancipador necessário para o(a) professor(a) que busque possibilidades de redesenhar as "novas/velhas" oportunidades dos adultos e dos educandos, em geral, nas escolas, cursos técnicos2 e universidades de hoje. Uma escola, técnica e universidade inscritos num tempo de crise, fortemente mediatizada e de amplo impacto na escala mundial, nacional, regional e local.

O pontencial emancipador da pedagogia da libertação

O eixo de abordagem político-pedagógico que orienta, em Freire, toda a reflexão sobre educação, é elaborado em redor de dois grandes temas geradores: a dominação e a libertação; e em torno de um núcleo fundamental de temáticas, às quais Freire retorna dialeticamente no processo de construção do seu pensamento, dentre as quais se podem salientar, por exemplo, a história, a cultura, a democracia, a utopia, o conhecimento e sabedoria ou a ética. Ora, do diálogo que Freire estabelece com as suas influências teóricas resultaria um entendimento original e crítico da educação. Um entendimento pioneiro com um profundo impacto no campo da educação social e permanente de adultos (Barros, 2012a) que, em grande medida, encontra-se condensado na relação entre o seu conceito de politicidade da educação e o seu conceito de história como possibilidade.

Trata-se de uma ideia central e estruturante que, para ser compreendida nas implicações que tem na construção de um entendimento sobre a educação como uma forma de intervenção no mundo (seja contribuindo para reproduzir a ordem social, seja contribuindo para a sua transformação), implica que se atenda, antes de mais nada, à forma como Freire conceitualiza a noção de história e de consciência histórica, que nos seus termos se assenta num duplo pressuposto: primeiro, que o Homem é um ser histórico, incompleto e em projeto3, e a sua subjetividade, desde que não domesticada, tem um papel interferente na história4. Como Freire afirmou, ao reconhecer a historicidade dos homens, reconhecem-se os mesmos homens como "seres que estão sendo, como seres inacabados, inconclusos, em e com uma realidade que, sendo histórica, é igualmente inacabada" (Freire, 2001a: 72). O segundo pressuposto, complementar do primeiro, entende que os seres humanos são-no 'em situação', nas palavras de Freire: os homens "se encontram enraizados em condições tempo-espaciais que os marcam e a que eles igualmente marcam (...) [os Homens] serão tanto mais quanto não só pensarem criticamente sobre sua forma de estar, mas criticamente atuem sobre a situação em que estão" (id., ibid.: 101)5. É pois, essencialmente da problematização suscitada pelo binômio consciência de si/consciência do mundo, que se desenvolve a ideia da história como possibilidade, por meio da qual Paulo Freire recusa o determinismo próprio da matriz marxista clássica, e afasta igualmente a compreensão mecânico-positiva-linear da história, própria da matriz neoliberal, ou de um certo pós-modernismo reacionário como também a chama (hoje claramente dominante), que concebe a história como um futuro inexorável, perante o qual não há outra alternativa senão adaptar-se. Freire alerta-nos, no entanto, para a necessidade de dialetizar reflexão e ação no tratamento crítico da história como possibilidade, quando afirma que,

(...) esta inteligência da história, que descarta um futuro predeterminado não nega, porém, o papel dos fatores condicionantes a que estamos homens e mulheres submetidos (...) reconhece a importância da decisão como ato que implica ruptura, a importância da consciência, da subjetividade e da intervenção crítica dos seres humanos na reconstrução do mundo. (Freire, 1997a: 97).

Como nota Lima, ao criticar o que designou de uma educação indecisa, ou seja, "uma educação a que falta a decisão ou deliberação dos atores educativos (...) uma educação subordinada e frequentemente alienada" (Lima, 2007: 1), a poderosa constatação que faz Freire de que "como seres humanos somos condicionados, mas não determinados (...) permite problematizar o presente e o futuro, desnaturalizando-os, bem como atribuir protagonismo e responsabilidade à autonomia e à decisão" (id., ibid.: 4)6.

História e liberdade surgem, assim, no universo temático nuclear da filosofia político-pedagógica de Paulo Freire, como temáticas interrelacionadas, em que a emersão crítica da realidade situacional em que os oprimidos se encontram imersos, permite-lhes a sua libertação. Há, como afirma Mayo, nos escritos de Freire, toda uma teoria do sujeito (Mayo, 1999: 90), na qual se defende que, para serem sujeitos da sua libertação, é necessário que os oprimidos saibam reconhecer o sentido da história, para nela se inserirem criticamente, como sujeitos que fazem e refazem o mundo, como o próprio Freire coloca: "da imersão em que se achavam, emergem, capacitando-se para se inserirem na realidade que se vai desvelando. Desta maneira, a inserção é um estado maior que a emersão e resulta da conscientização da situação. É a própria consciência histórica. Daí que seja a conscientização o aprofundamento da tomada de consciência, característica, por sua vez, de toda emersão" (Freire, 2001a: 102). Ora, essas assunções, em torno da ideia da história como possibilidade, têm consequências substantivas em nível social e político, pois abrem espaço para a práxis transformadora7 , que uma vez iniciada, por parte dos oprimidos, poderá levar à superação da situação de opressão, num processo de engajamento orientado para a dissolução das estruturas sociais que antes impediam o processo de emancipação social, ou seja, de pronúncia ativa do mundo.

Em termos de teoria política, há, nestes pressupostos freirianos, importantes implicações filosófico-conceptuais, na medida em que, por meio desse tipo de processo de conscientização, social e político, emergem, com maior clareza, as contradições sociais, os termos e os modos da opressão dos setores populares pelas estruturas e elites sociais8. Uma elite dominadora que, recorrendo a mecanismos diversos de controle e de ocultação das possibilidades que a história em si contém enquanto devir, ou seja, enquanto acontecimento humano, representa, na verdade, uma minoria muito bem-sucedida a impedir a efetiva participação política e social da maioria (Barros, 2012c). Neste âmbito, lembre-se, igualmente, a ideia da educação como base da democracia desenvolvida por John Dewey, na qual o desenvolvimento do pensamento crítico e a análise das experiências capacitam o sujeito para construir uma vida mais autônoma e mais livre dos constrangimentos provocados pelo poder (Dewey, 1997)9.

Ora, ao se assumir, ao longo da sua obra, como adepto de uma concepção de democracia radical, construída com base na ideia de participação como forma de ingerência nos processos de decisão, Freire critica e recusa as teorias elitistas de democracia e, de acordo com Lima, "não poupou as lideranças de tipo dirigista e vanguardista, bem como todas as formas de 'domesticação' (a conquista, o slogan, a propaganda...) e todo o tipo de organizações burocráticas e oligárquicas" (Lima, 2007: 1).

Freire, ao problematizar o real e teorizar acerca de uma pedagogia que é a do oprimido, vai contribuir, de uma forma pioneira, no âmbito do corpus teórico da educação social e permanente de adultos, para desocultar esses mecanismos que relacionam pedagogia e poder10, inclusive criando todo um novo vocabulário filosófico-conceptual que permite ao mundo dos oprimidos adquirir visibilidade. Neste contexto, Freire denuncia que "o que interessa ao poder opressor é enfraquecer os oprimidos mais do que já estão, ilhando-os, criando e aprofundando cisões entre eles, através de uma gama variada de métodos e processos. Desde os métodos repressivos da burocratização estatal, à sua disposição, até as formas de ação cultural por meio das quais manejam as massas populares, dando-lhes a impressão de que as ajudam" (Freire, 2001a: 138-139). Ora, é precisamente neste âmbito que Paulo Freire pode ser considerado um dos mais significativos filósofos da libertação, engajado na construção de uma nova teoria da ação cultural que sirva aos interesses dos oprimidos, ou seja, da larga maioria dos desapossados e esfarrapados deste mundo, homens e mulheres impedidos de adquirir uma consciência histórica que lhes permita realizar a vocação ontológica da espécie humana, que consiste na sua humanização. Diversas vezes, Freire colocaria esta questão nos seus vários escritos, num dos quais pode ler-se por exemplo: "esta vocação para o ser mais que não se realiza na inexistência de ter, na indigência, demanda liberdade, possibilidade de decisão, de escolha, de autonomia" (Freire, 1997b: 10).

A inclusão de alguns aspectos de influência marxista e neomarxista na análise freiriana da realidade manifesta-se, também, com um certo matizado gramsciano, em particular nesta linha da sua argumentação, em que Freire reelabora as suas ideias, esclarecendo o processo político de conscientização. Ao fazê-lo, considera dialeticamente o contexto teórico e o contexto concreto em que tal processo se desenrola, ou seja, procura compreender a dialeticidade que existe entre infra e supraestrutura, explicitando as classes sociais como a área na qual a opressão dos homens é levada a cabo. Isso lhe permite, consequentemente, identificar, em termos conceituais, consciência histórica com consciência política e esta, por sua vez, com consciência de classe e com consciência revolucionária (Freire, 1990). O seu compromisso, no entanto, não é com a construção de uma sociedade sem classes, mas sim, como vimos, com a construção de uma sociedade radicalmente democrática (Zambrano, 1996; Zimanke, 2005).

Numa democracia radical, há justiça social e há sujeitos em interação, pelo que a finalidade de uma "verdadeira revolução", que Freire atribui a "homens radicais", implica precisamente transformar a realidade opressora, possibilitando a passagem dos seres humanos da condição de objetos ao estatuto de sujeitos. Trata-se de uma transformação que ocorre primeiro no nível da consciência, e que implica o movimento da classe em si para uma classe para si, onde os oprimidos desenvolvem gradualmente, quer um sentido de identidade coletiva e um reconhecimento da sua opressão, quer uma ideologia contra-hegemônica que lhes permite refletir criticamente para desmistificar as ideias criadas pelas classes dominadoras e organizarem a ação, de uma forma muito específica: para consumar o processo da libertação coletiva, tanto dos oprimidos como dos opressores, "gerando de seu ser menos a busca do ser mais de todos" (Freire, 2001a: 34). Neste particular, Freire desenvolve a ideia gramsciana de intelectual orgânico, reconhecendo um papel para "a liderança verdadeiramente revolucionária", mas concebendo fundamentalmente os oprimidos como os protagonistas da sua própria conscientização e libertação. Há, nestes pressupostos políticos da abordagem freiriana, uma rejeição de todo um vanguardismo de matriz leninista, que tende, ao invés, a privilegiar a intelligentsia como a única fonte viável da ideologia e da ação contra-hegemônicas. No universo temático do pensamento de Paulo Freire, encontramos, por isso, em diversos momentos, na teorização acerca da ação libertadora, uma conceção da relação entre intelectuais e classes populares, em que o compromisso e engajamento dos primeiros com a causa da libertação implicam o seu total encontro solidário com os homens impedidos de ser mais. Paulo Freire entende que a verdadeira revolução, que pretende transformar a realidade desumanizante dos homens "nem pode ser feita para o povo pela liderança, nem por ele, para ela, mas por ambos, numa solidariedade que não pode ser quebrada" (Freire, 2001a: 126) e esclarece fortemente, ainda a este respeito, que "o compromisso, próprio da existência humana, só existe no engajamento com a realidade, de cujas 'águas' os homens verdadeiramente comprometidos ficam 'molhados', ensopados. Somente assim o compromisso é verdadeiro" (Freire: 1999a: 19). E é aqui que reside o potencial emancipador da pedagogia da libertação para superar o modelo escolar no quefazer do(a) professor(a).

Por uma epistemologia do quefazer do(a) professor(a)

O vocabulário político das ideias freirianas, que caracterizam o processo de conscientização que a sua filosofia propõe, deixa clara a sua opção política a favor dos oprimidos. O tipo de engajamento que nela defende nega o imobilismo e exige radicalidade de todos os intervenientes, na medida em que "ser um revolucionário significa opormo-nos à opressão e à exploração e ser a favor da libertação das classes oprimidas, em termos concretos e não em termos idealistas" (Freire, 2001a: 54).

Trata-se de promover por todos os meios, dos quais a educação social e permanente de adultos ocupa um lugar estratégico, como procuraremos explicitar em seguida, a convivência democrática, mas confiando simultaneamente na capacidade do homem conscientizado para empreender uma mudança radical em suas condições de vida, tomando a leitura crítica da história como uma forma de reivindicar identidade e poder11. No método de alfabetização de adultos proposto por Paulo Freire, gera-se conscientização política mediante a forma como é colocada no centro do trabalho educativo a relação dialética entre subjetividade e objetividade, que, alicerçada no respeito pelos valores e comportamentos históricos e culturais das populações, desperta nelas a necessidade de um quefazer, que nos termos freirianos é um fazer com reflexão, direcionado para um processo de emancipação, e viabilizado por uma tomada de consciência essencialmente pedagógica, ética e política, e por isso está imbricada e implicada numa prática educativa propiciadora de uma práxis em que possamos aprender a ler certo o mundo (Freire e Macedo, 1994; Freire, 2000).

No conceito de politicidade da educação, em torno do qual consideramos que o pensamento crítico e radical de Paulo Freire está estruturado, as categorias do diálogo e da comunicação servem de base para o desenvolvimento dos pressupostos pedagógicos da sua abordagem político-pedagógica. Neste âmbito, o seu conceito de dialogicidade contém as ideias principais com as quais Freire elabora uma teoria da educação e da ação cultural que é também uma teoria do conhecimento e da sabedoria. A práxis educativa freiriana incorporou sempre, desde o início da sua ação alfabetizadora, o objetivo de contribuir para desenvolver e aumentar a democracia, porque partiu do pressuposto epistemológico de que a prática educativa nunca é neutra, e de que o(a) educador(a)/professor(a) tem de estar ciente, quer trabalhe na alfabetização ou na pós-alfabetização, na escola/ técnica ou universidade ou fora dessas instituições, de que o processo educativo que operacionaliza em sua prática profissional irá contribuir para incluir ou excluir o educando. Como afirma Freire,

um educador reacionário opera metodologicamente diferente de um educador revolucionário (...) um caminha com o objeto na mão, o objeto de conhecimento tanto quanto possível possuído por ele e por sua classe; o outro não se considera possuidor do objeto de conhecimento, mas conhecedor de um objeto a ser desvelado e também assumido pelo educando.(Gadotti, Freire e Guimarães, 1995: 64-65).

Possuidor de uma clareza teórico-pedagógica acerca das estreitas relações entre educação e política, Freire seguiu sempre o seu impulso democrático, tomando partido por uma educação para a responsabilidade política e social que, abrindo caminho para a pronúncia do mundo pelos oprimidos, contribuísse para o processo da sua emancipação ideológico-cultural, condição para a sua libertação econômico-social e política.

Daí a importância concedida, nas práticas pedagógicas freirianas, às experiências de debate e de análise dos problemas reais dos educandos, como ponto de partida do trabalho metodológico realizado na educação social e permanente de adultos, sendo aqui que reside o seu potencial emancipador para redesenhar a prática educacional no quefazer do(a) professor(a), especialmente num contexto de crise estrutural como o que vivemos atualmente em contexto de globalização neoliberal e reestruturação do capitalismo, feito em prol da concentração do capital e maximização de lucros, e do consequente aprofundamento radical das desigualdades sociais e dos abusos ecológicos.

Em termos gerais, a educação na abordagem freiriana é pensada como um conceito dinâmico, que pressupõe uma ação, eminentemente humana, realizada por um sujeito que interatua com outros sujeitos e com o mundo, num processo de construção do conhecimento, que é intersubjetivo e dialógico. Trata-se, antes de tudo, de encarar o diálogo como condição de conhecimento, numa relação pedagógica concebida essencialmente em termos antiautoritários. O diálogo na pedagogia da libertação de Freire é mais do que uma forma técnica ou um recurso tático, é fundamentalmente uma categoria ética, que se distingue da relação antidialógica da pedagogia tradicional, sobretudo pela promoção do inter-reconhecimento dos sujeitos dialógicos, numa ação-reflexão de "dizer a palavra verdadeira" em que se afirmam os valores democráticos e a reciprocidade da dignidade humana. Do seu carácter ético deriva, para Freire, que o diálogo é uma exigência existencial, pois como sublinha "se é dizendo a palavra com que, 'pronunciando' o mundo, os homens o transformam, o diálogo se impõe como caminho pelo qual os homens ganham significação enquanto homens (...) [o diálogo] é um ato de criação" (Freire, 2001a: 79). É assim que, na pedagogia freiriana, o diálogo ético adquire um valor central, mas multiforme, de sentido psicológico, metodológico, epistemológico e político, que lhe é conferido pela dialogicidade do ser humano, visto como ser de comunicação e de relação. Aqui, é de salientar que o fundador da filosofia para crianças, Mattew Lipman, chegaria a esta mesma conclusão (Lipman, 1988: 47-84; Lipman, Sharp e Oscayán, 1998: 305-338).

Na educação problematizadora12, que Freire contrapõe à tradicional educação escolar por si designada de educação bancária, a interação entre o sujeito e o objeto do conhecimento é entendida não como dualismo, mas como uma unidade dialética que possibilita a criação do sujeito cognoscente e a recriação do mundo. A proposta inovadora que Freire faz no campo da alfabetização de adultos nasce de uma abordagem educacional que encara a pedagogia como um ato político e um ato de conhecimento e, por conseguinte,como um ato criador. Ele próprio afirmaria, em diversos momentos da sua obra, dos quais se pode destacar por exemplo este que

para mim seria impossível engajar-me num trabalho de memorização mecânica dos ba-be-bi-bo-bu, dos la-le-li-lo-lu. Daí que também não pudesse reduzir a alfabetização ao ensino puro da palavra, das sílabas ou das letras. Ensino em cujo processo o alfabetizador fosse 'enchendo' com suas palavras as cabeças supostamente 'vazias' dos alfabetizados. (Freire, 2000: 19).

Freire rebela-se contra o trabalho pedagógico domesticador, assente na lógica da cartilha, que coisifica os educandos e os impede de "pensar certo". Eleafirma, por isso, que "não basta saber ler que Eva viu a uva. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho" (id., ibid., 41).

Na abordagem político-pedagógica de Paulo Freire o princípio fundamental de diferenciação entre uma educação libertadora, que é essencialmente problematizadora, e uma educação dominadora, que é principalmente bancária, assenta na conceção da relação educador-educandos. Em termos genéricos, a primeira distingue-se da segunda pela transformação da real assimetria desta relação em simetria ética, um processo que ocorre sobretudo por meio do diálogo ético. Este diálogo ético é também a ética do método, que assim entendido faz surgir a impossibilidade epistemológica da pura transmissão de conhecimentos, na medida em que quem aprende já não pode ser visto como absolutamente ignorante e gnoseologicamente passivo. Por isso, o diálogo e a pergunta (Barrientos-Rastrojo,2013) é condição de conhecimento e sabedoria na educação problematizadora. Aqui reside, em nosso entender, a radicalidade crítica e democrática da pedagogia freiriana, segundo a qual o saber é patrimônio de todos, dos excluídos e das classes poderosas, dos educadores e dos educandos, o que implica considerar, no processo educativo, o "saber de experiência feito" que todo o educando tem, pois, como afirma Freire "ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os Homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo" (Freire, 2001a: 68).

Deste modo, na educação problematizadora não se valorizam os tradicionais pacotes standard de conhecimento, mas os conteúdos que são propostos pelos participantes, pelo que o conhecimento é algo que se produz dinamicamente e em contexto, residindo aqui, em nosso entender, o substrato que o(a) professor(a) pode usar para transformar o trabalho da escola e da educação escolar em oportunidades de emancipação coletiva e de conscientização por um novo modo de vida para o século XXI, verdadeiramente marcado por uma atitude antibelicista pela paz mundial, pela cidadania democrática e pela justiça social. Esta lógica pressupõe que é necessário levar em conta, de forma particularmente cuidadosa, a relação dialética que existe entre linguagem e pensamento (Gadamer, 2000), na medida em que, para que o conhecimento seja possível, terá de ser, em primeiro lugar, comunicável. Atendendo ao fato que, como lembra Freire, a linguagem do educador "corre o risco de perder o contacto com o concreto. Quanto mais somos assim, mais distantes estamos da massa das pessoas, cuja linguagem, pelo contrário, é absolutamente ligada ao concreto. Devido a isso, nós, intelectuais, primeiro descrevemos os conceitos, enquanto as pessoas primeiro descrevem a realidade, o concreto" (Freire e Schor, 2000: 131). Reesultam, então, daqui, pelo menos dois princípios ético-pedagógicos, constituintes da própria relação educador-educandos, isso no âmbito de uma educação que procure contribuir para a libertação dos indivíduos e dos grupos. Trata-se sobretudo de ter presente, por um lado, o princípio segundo o qual se reconhece aos educandos o direito de partir de uma atitude curiosa da sua história e do mundo para se envolverem gradualmente numa análise crítica da realidade; e por outro lado, o princípio segundo o qual se exige, do educador, que parta da realidade dos educandos, respeitando a diferença e o princípio da "consciência máxima possível", em cada momento do movimento de ida e volta entre o abstrato e o concreto, que todo o ato de pensar implica.

A deontologia da filosofia educacional freiriana reconhece ainda, como fundamental, sempre no âmbito de uma relação pedagógica entre educador e educandos, que procure constituir-se em prol da autonomia, que se tome dialeticamente a tensão entre liberdade e autoridade, uma tensão característica, no fundo, de qualquer situação educacional. Tanto mais assim é quanto mais se admite que, no âmbito quotidiano da vida social e cultural, são poucos os encontros humanos que estejam isentos de uma certa opressão, qualquer que esta seja, uma vez que as pessoas, sobretudo devido à classe social, ao gênero sexual ou à etnicidade, tendem a ser vítimas e/ou causadoras de opressão. Surge assim, como imperiosa, na relação pedagógica democrática, a necessidade de estabelecer limites, sem os quais facilmente a liberdade se pode corromper em licenciosidade e a autoridade pode degenerar em autoritarismo, como alerta Freire quando lembra que "de modo geral, os autoritários consideram, amiúde, o respeito indispensável à liberdade como expressão de incorrigível espontaneísmo, e os licenciosos descobrem autoritarismo em toda manifestação legítima de autoridade" (Freire, 1997b: 122). Daqui decorre que, na abordagem político-pedagógica de Paulo Freire, nem a politicidade nem a diretividade, consubstanciais à natureza do fenômeno educacional, impõem à função de educar um dever de impossível neutralidade.

Este âmbito da abordagem teórico-pedagógica freiriana é fundamental porque ilumina a importância da auto-reflexividade na postura epistemológica do professor(a). Assim, em sua proposta, Freire sublinha que é imprescindível que se clarifiquem opções políticas mediante uma reflexão-ação que assuma explicitamente a politicidade da educação e, por conseguinte a impossibilidade da sua neutralidade, pois como ele próprio nos coloca a questão: "é ingénuo conceber o nosso papel em abstrato como uma matriz de métodos neutros" (Freire, 1990: 60).

Outras considerações

Conceber o conhecimento como um ato dialógico, simultaneamente político e gnoseológico, implica também, como não poderia deixar de ser, atender às características básicas que um educador deverá possuir e desenvolver em sua prática profissional, humanista e progressista, que nos termos do pensamento freiriano significa: ser um educador democrático e solidário com a causa dos oprimidos. Paulo Freire desafiou os educadores de crianças, jovens, adultos e idosos a que ousassem assumir a politicidade da educação, convidando-os a pensar criticamente acerca da sua prática educativa, qualquer que fosse a modalidade da sua ação. Ao longo da sua obra, em diversos momentos teorizou sobre os três tipos de educadores que podem existir em função da sua própria tomada de consciência, acerca do papel da educação e do papel da sua prática; e os dois paradigmas principais em que se pode alicerçar o seu referencial teórico-ideológico de atuação. Refere-se assim, ao educador ingênuo, ao educador astuto e ao educador crítico, e ao paradigma reacionário da adaptação social por oposição ao paradigma radical da transformação social.

Neste mapeamento político-pedagógico, que a sua abordagem educacional oferece, Paulo Freire não só contribui para a clarificação da relação de interioridade que existe entre política e educação, visibilizando as conexões entre pedagogia e poder, como também propõe afincadamente a superação dos pressupostos inerentes ao modelo tradicional da educação formal escolar, por si designado de educação bancária, debatendo-se, na sua práxis político-educativa, esperançosa e amorosamente, por uma visão radicalmente democrática da educação, da sociedade e do mundo.

Do universo temático geral da filosofia freiriana, e em especial daquilo que escreveu no seu último livro: Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa, podemos retirar algumas das características básicas que um(a) educador(a)/professor(a) verdadeiramente comprometido(a) com a luta radical, orientada por valores éticos e democráticos, deverá possuir e desenvolver, e que se constituem no âmbito do pensamento freiriano como exigências radicais. Assim, por exemplo, o educador crítico que trabalhe em prol de uma educação problematizadora deverá ter presente a necessidade de ser: tolerante, opondo-se a qualquer tipo de discriminação; amoroso, promovendo a busca pelo ser mais de todos; esperançoso, sabendo encetar uma espera que é pacientemente impaciente; dialógico, exercendo a escuta do outro para assim poder falar com ele; coerente, que forneça, pelo exemplo, um testemunho ético dos pressupostos que defende, e realista, ciente dos limites existentes num dado momento.

Paulo Freire, o educador e o pensador, foi taxativo na explicitação do comprometimento ético-político da sua práxis, afirmando:

sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de direita ou de esquerda. Sou professor a favor de luta constante contra qualquer forma de discriminação, contra a dominação econômica dos indivíduos ou das classes sociais (Freire, 1997b: 155).

A pedagogia de Paulo Freire é, por conseguinte, uma pedagogia do sujeito, do diálogo e da liberdade, é uma educação como prática da liberdade, uma conceção problematizadora, crítica, dialógica e libertadora, que se opõe radicalmente à educação como instrumento de opressão, uma concessão bancária, nutricionista, digestiva, antidialógica e domesticadora.

Ora, sabendo-se comprometido com esse perfil, o educador crítico humanista, isto é, o progressista radical, sabe que não trabalha para o outro, nem sobre o outro, mas sim com o outro, e é fundamental para si o respeito pela identidade cultural dos educandos e pela sua dignidade humana. Tal enfoque distingue-se da educação progressista liberal porque reforça a importância da intersubjetividade na história e a centralidade do paradigma do sujeito, isso na medida em que o sujeito emerge ao ser reconcetualizado não como uma identidade individualista e autossuficiente, mas sim como intersubjetividade humanista e, portanto, como um ser pleno de comunicação. Daqui infere-se toda a pertinência do princípio dialógico freiriano como pressuposto pedagógico base de uma educação problematizadora.

Com efeito, é com todo esse significativo conjunto de conceitos-chave, que animam o universo temático da filosofia político-pedagógica de Paulo Freire em torno dos seus temas geradores, a dominação e a libertação, que Freire elabora, de forma complexa e dialética, toda uma metateoria da educação em que reflete acerca das formas pelas quais o pedagógico, pensado a partir da relação pedagógica entre educador e educando, e o político, equacionado a partir das relações sociais e culturais de produção e reprodução de poder, se relacionam. Como vimos em sua abordagem político-pedagógica, é o seu conceito de conscientização que alicerça os seus pressupostos políticos, e é o seu conceito de dialogicidade que alimenta os seus pressupostos pedagógicos, sendo o seu conceito de politicidade da educação, que justifica os contornos da sua ética democrática e radical. Daí que se possa afirmar, como faz Lima, que "toda a pedagogia freiriana pode ser interpretada como uma pedagogia da autonomia, orientada para a formação de sujeitos capazes de decisões livres, conscientes e responsáveis, tornando-se assim 'presenças marcantes no mundo'" (Lima, 1999: 69).

A visão radicalmente democrática da educação, da sociedade e do mundo, que Paulo Freire sempre colocou em primeiro plano no horizonte justificativo da sua práxis tem, não obstante, dado motivo a críticas diversas que se focalizam na ideia de que o trabalho de Freire representa uma visão idealista e utópica da sociedade. No entanto, se não é rigoroso negar que existiu num momento inicial do seu pensamento, como o próprio Freire admite, uma certa ingenuidade idealista, também não é legítimo ignorar que o desenvolvimento posterior da sua obra supera claramente essa insuficiência inicial. Freire assinala essa viragem quando afirma, por exemplo, que "após 1964, tornei-me mais consciente dos limites da educação na transformação política da sociedade" (Freire e Schor, 2000: 44).

Há, assim, a assinalar, como aspectos comprovativos do caráter não idealista da abordagem político-pedagógica freiriana, pelo menos dois fatos: um diz respeito ao sucesso dos programas de alfabetização que foram conduzidos segundo os pressupostos freirianos um pouco por todo o mundo e que atestam sobre a sua utilidade efetiva, já evidente na experiência-piloto de Angicos; o outro está relacionado com a consciência de que não há prática educativa e política que não esteja submetida a certos limites, um aspecto repetidamente asseverado por Paulo Freire, o educador e filósofo da educação e o administrador político da educação municipal da cidade de São Paulo. Com efeito, Freire recusou quer o voluntarismo quer o espontaneísmo por considerar, precisamente, que ambos menosprezam os limites reais da prática educativa e política.. Sobre um e outro, Freire afirmou criticamente que

(...) o voluntarismo é idealista, pois se funda na compreensão ingênua de que a prática e a sua eficácia dependem apenas do sujeito, de sua vontade e de sua coragem (...) o espontaneísmo é irresponsável, porque implica a anulação do intelectual como organizador, não necessariamente autoritário, mas organizador sempre. (Freire, 1997a: 46).

É desse modo que o pensamento de Freire advoga insistentemente não um mero ativismo, mas sim uma práxis que contribua para a transformação efetiva das estruturas de opressão. Entretanto o faz o com a consciência crítica da tensão dialética que existe entre permanência e mudança, e com a clarividência de que a educação, se não pode tudo neste projeto democrático, pode sempre algo, desde que se concentre na compreensão histórica dos processos sociais concretos que a tomada do conceito de cultura, no seu sentido antropológico, pressupõe. É neste sentido, também, que o pensamento de Paulo Freire é eminentemente político, pois, em sua abordagem a política, o poder e a educação constituem entre si uma unidade indissolúvel, como afirma Lima a este propósito

se fazer educação é fazer política, deixa portanto de ser possível ser exclusivamente educador(a), ser só professor(a), apenas ensinar, não cuidando das implicações ou mesmo alienando as responsabilidades éticas, morais, profissionais, etc., da ação política que a atividade educativa desempenhada sempre constitui. (Lima, 1999: 67).

Trata-se ainda de um pensamento que quer promover, conjuntamente, a compreensão dos limites da prática educativo-política com a consciência crítica de que isso implica, indiscutivelmente, como sublinha Freire, "a claridade política dos educadores com relação ao seu projeto" (Freire, 1997a: 46) ou seja, requer que o educador assuma a politicidade da educação13. Freire explica, com a sua clareza habitual, que

não posso reconhecer os limites da prática educativo-política em que me envolvo se não sei, se não estou claro em face de a favor de quem pratico. O a favor de quem pratico me situa num certo ângulo, que é de classe, em que diviso o contra quem pratico e, necessariamente, o por que pratico, isto é, o próprio sonho, o tipo de sociedade de cuja invenção gostaria de participar. (id., ibid.: 47).

Pode-se concluir que estamos perante um pensamento engajado na ação, com um universo temático amplo que, a nosso ver, contribui para a heurística do clássico debate sociológico que problematiza a relação entre agência e estrutura, e concorre criticamente para o desenvolvimento de um corpus teórico-conceptual aberto, tanto no âmbito geral da teoria social e educacional, como no próprio âmbito da teoria política. Não deixando de ser verdade que há um legado político-pedagógico significativo na obra de Paulo Freire, há, no entanto, também aqui, um conjunto de críticas a assinalar, que se têm dirigido particularmente ao caráter coloquial dos seus escritos e ao seu estilo, de aspecto afirmativo geral, presente numa grande parte das formulações e declarações que Freire apresenta sobre a pedagogia. Segundo Beisiegel (1996), isso acontece efetivamente, por exemplo, em relação ao seu método alfabetizador, sobre o qual Freire não elabora mais do que o estritamente necessário para assegurar a efetivação dos princípios que o método encerra, sem nunca chegar a prescrever todos os detalhes e pormenores técnicos da sua aplicação. Não obstante, sustentamos que este fato, na verdade, não contradiz seus pressupostos teórico-pedagógicos, mas está em profunda coerência com as características de um pensamento complexo e dialético (Gerhardt, 1996: 153-170). Parece-nos, também, que é a sua recusa em dogmatizar o seu método de alfabetização e pós-alfabetização que lhe confere uma singular perenidade e universalidade, na medida em que, como ele próprio referiu, em diversos momentos, a sua filosofia político-pedagógica só tem legitimidade se for recriada criticamente e reinventada contextualmente, porque apenas desse modo poderá ser posta a serviço da libertação e não a serviço da domesticação.

Trata-se de uma abordagem teórico-pedagógica de síntese, de confluência, de articulação ecológica dos temas que, artificialmente, fronteiras acadêmicas, paradigmáticas, geopolíticas e culturais tendem a insularizar, em lugar de articular. Isso posto, e não se tratando, como enfatizamos ao longo deste texto, de um pensamento político-pedagógico definitivo, normativo ou prescritivo, parece-nos que cabe aos professores e aos intelectuais contemporâneos, inscritos na matriz teórica da pedagogia crítica e da pedagogia radical, continuar o debate teórico-pedagógico contido na problemática-chave. Esta opõe uma educação bancária a uma educação problematizadora, com a dupla finalidade de, por um lado, não deixar desvirtuar os traços diacríticos da proposta crítica e radical freiriana em versões psicologizadas, tecnologizadas ou instrumentais, conceitualmente pós-modernizadas ou mesmo liberalmente humanizadas (ver McLaren, 1998; Apple, 1998; Nóvoa, 1998; Lima, 1998, 2000, 2012); e, por outro lado, reinventar a teoria educacional de Freire, estabelecendo diálogos teóricos mais aprofundados com outras propostas críticas, como as da Teoria Crítica, as de Gramsci, ou as de Habermas. Tudo isso para descobrir, numa análise comparativa, complementaridades e novos arranjos conceituais que, sem descaracterizar a matriz crítica das propostas de origem, possam enriquecê-las, levando o seu potencial compreensivo sempre mais além, reconstruindo a crítica em termos ontológicos, metodológicos e epistemológicos (ver, por exemplo, Mayo, 1999; Morrow e Torres, 2002; Barros e Choti, 2014).

As novas pedagogias críticas inspiradas por Freire não poderão negligenciar o fato de que a perspetiva crítica e radical do pensamento freiriano emerge, de forma exemplar e coerente, do conjunto da sua vida e obra, e portanto da sua práxis. Trata-se de um projeto político-pedagógico, que provou ter sucesso no auxílio efetivo à libertação de desapossados, um pouco por todo o mundo, incluindo no mundo ocidental, como refere Jarvis "no ocidente e no Reino Unido, os educadores de adultos comunitários e radicais não têm dúvidas quanto à aplicabilidade da abordagem de Freire" (Jarvis, 1987: 276).

Da vida e obra de Paulo Freire resulta um testemunho e um legado em prol de um humanismo radical que nos inspira, como cidadãos em busca de valores cívicos e democráticos, ao mesmo tempo que nos lembra como educadores e investigadores que a educação deve ser entendida em sua plenitude como projeto que contribui para a libertação e como ato de reconhecimento e conhecimento. Na verdade, há a assinalar uma "inteireza" na sua vida e obra que prima por uma coerência profunda e uma integridade ética, sempre presentes nas esferas públicas em que se moveu Paulo Freire: o educador, o cientista, o intelectual e o político, bem como nas esferas privadas, como os inúmeros testemunhos de amigos e familiares corroboram Gadotti et al., 1996).

A abordagem político-pedagógica de Paulo Freire autoriza-nos a recusar, em nossa própria práxis, a neutralidade da educação e , na medida em que a sua profunda crítica está alicerçada num compromisso vivido no plano educacional, social e político e testemunhado cientificamente em suas propostas teórico-pedagógicas. Estamos, assim, em pleno acordo com Carlos Alberto Torres quando este afirma que "na confusão do mundo atual, os educadores podem estar com Freire ou contra Freire, mas não sem Freire" (Torres, 1998: 65). Se Giroux (1994) estiver "pensando certo", como nos parece que está, quando afirma a atual necessidade de redefinir criticamente a natureza do trabalho dos educadores como intelectuais transformadores, então é igualmente necessário desconstruir as visões despolitizadas da educação que circulam atualmente de forma hegemônica ao abrigo do paradigma da aprendizagem ao longo da vida, que veio substituir, numa fórmula híbrida, os ideais do paradigma da educação permanente (Barros, 2011). O atual paradigma hegemônico emanado de instâncias supranacionais, como a União Europeia ou o Banco Mundial, faz hoje a apologia da aprendizagem útil, subordinada a prioridades exógenas, definidas estrategicamente, por think thanks em termos meramente funcionais e adaptativos à chamada nova economia. Como refere Hake, "aprender para ganhar é o nome do jogo da aprendizagem ao longo da vida no século XXI" (2006: 35).

Para pensar a escola, as escolas ténicas, as universidades e a educação de hoje interessa-nos, portanto, manter o contato reflexivo com a abordagem teórico-pedagógica de Paulo Freire, na medida em que a ele reconhecemos um papel estratégico na defesa da passagem de uma cultura de respostas a uma cultura de problemas, bem como um poderoso potencial temático que serve como quadro teórico-conceptual a partir do qual se pode refletir criticamente sobre a importância do(a) professor(a) trabalhar ou não com uma agenda contra-hegemônica em prol da reconstrução da democracia numa época de crise como a atual, ou seja, em outras palavras, interpretando as possibilidades em aberto que resultam do ato de pensar as ações educativas e as práticas pedagógicas como ações políticas.

Recebido: 27/02/2013

Aprovado: 21/01/2014

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NOTAS

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  • 1
    Segundo Foulquié (1966), no desenvolvimento do conceito de dialética há a registrar vários contributos, de maneira que não existe uma dialética, mas diversas conceções de dialética, embora, em todas as formas filosóficas da dialética, haja um caráter comum, que é o seu dinamismo, um dinamismo que contrasta com as bases de uma argumentação assente na lógica, cujo caráter é mais estático. Ora, de acordo com Morrow e Torres (2002), o conceito de dialética no pensamento freiriano evoca sobretudo as contribuições teóricas da dialética hegeliana, marxista e científica. Assim, genericamente, podemos referir, com base nestes autores, que da influência da dialética hegeliana no pensamento freiriano sobressai, especialmente, a ideia de que os equilíbrios percebidos pelas nossas experiências finitas são apenas e essencialmente provisórios; enquanto da influência da dialética marxista no pensamento freiriano se destaca, especialmente, a ideia de que os Homens, não podendo, no geral, viver sem trabalhar, sempre se dividiram ao longo do tempo em dominadores e dominados, pelo que há um lugar de destaque para o papel ativo que o conflito de classes e a consciência de classe têm a desempenhar na história (cf. Morrow e Torres, 2002: 18-30). De um ponto de vista integrador, também se pode inferir uma perspectiva hermenêutica em Freire no sentido gadameriano. Por um lado, se Gadamer urbaniza a Heidegger, segundo Habermas, é porque retoma o diálogo com a tradição precedente, pois, de fato, a tradição exprime-se pela linguagem (Gadamer, 1993: 434). Esta conexão com o que é dado, para lá de discursos desconectados com a história, é análoga ao tipo de educação dialógica de Freire. Basta prestarmos atenção a como se desenvolve a educação a partir dos temas geradores para nos apercebermos que, no ato de leitura, são ensinadas muito mais do que palavras, conseguindo, assim, distinguir tal vinculação (Freire, 2000: 22-30). Por outro lado, a difusão de novos horizontes insta ao desenvolvimento de um diálogo que matiza não só a relação entre o conhecido e o cognoscente como também entre as próprias instâncias de conhecimento, ou seja, o sujeito e o objeto. Quando dois sujeitos se predispõem para o diálogo, há um subil desaparecimento de ambos. Embora ainda mantenham uma certa entidade e ação, destaca-se o seu carácer de espectadores de uma circunstância que criaram e que, ao mesmo tempo, os supera (Gadamer, 1993: 461-486).
  • 2
    No Brasil, é possível fazer um curso técnico juntamente com o curso médio, em diversas áreas específicas. Os cursos técnicos, em geral, iniciam no 2º e 3º ano do ensino médio, ou no final deste. As escolas técnicas propõem, em geral, um curso que é completado após um ano e meio de estudos. Há, ainda, os cursos superiores de tecnologia, com a duração média de dois anos e meio, devidamente regulamentos pelo Ministério da Educação, que se destinam aos egressos do ensino médio.
  • 3
    Tal como advertia Ortega y Gasset, a vida humana não possui natureza predefinida, mas é um projeto que se há de ir fazendo (Ortega 1997: 25)
  • 4
    A conscientização de Freire é concomitante com as ideias da criação de uma consciência do sujeito na sociedade contemporânea de María Zambrano. Essa consciência social pertenceu, durante muito tempo, a uma oligarquia, mas agora estende-se a todo o povo. Daqui resultando que agora a história é produto de todos e de cada um desde que desenvolva em si essa consciência social (Zambrano 1996: 19-21).
  • 5
    Segundo María Zambrano, esse modo de atuar crítico não deve, porém, converter-se em alucinação, em que a ânsia, juntando-se à frustração, conduza a um delírio no qual a própria realidade se confunde com a ilusão. Neste ponto, iria passar da consciência de si para um endeusamento de si, que é análogo à atitude de opressor presente na obra de Freire, assim sendo, "quando se atinge poder é necessário desfazer-se da ânsia para que o seu exercício alcance plenamente o nível moral (...) aquele que chega ao poder (...) tem, ao mesmo tempo, que desprender-se desse poder à medida que o exerce" (Zambrano 1996: 89).
  • 6
    Gadamer explica como a linguagem transporta, em si, todo um mundo, e seguindo esta premissa, a educação é educar-se, lembra que a aprendizagem de um idioma não depende exclusivamente da aprendizagem de uma sintaxe ou da memorização de um conjunto de termos, mas exige a entrada da língua no mundo dos usos dos que a criaram e que a utilizam (Gadamer, 2000; 1993:526-547).
  • 7
    Segundo María Zambrano, a consciência histórica é a que permite ao ser humano sair do seu naufrágio existencial. E lembra-nos que, até a época contemporânea, os únicos a usufruírir desta capacidade eram os membros das classes altas. Foi só com a chegada da democracia que esta se estendeu ao povo, na medida em que, só por meio do ato de tomar conta da realidade é que o poder deixa de se concentrar, apenas, nas mãos de uma aristocracia (Zambrano, 1996: 19-20).
  • 8
    Diego Ruiz Curiel desenvolveu há uns anos a ideia de "impositores desconhecidos". Vale a pena salientar, a este respeito que, para ele, por exemplo, o objetivo da orientação filosófica consiste em ajudar a pessoa a tomar conta de todo um conjunto de pensamentos não refletidos conscientemente e que modelam os sentimentos, os valores e as atitudes (Ruiz Curiel 2003: 135-142). Também, o especialista em filosofia aplicada canadiano Peter Raabe se tem referido a pensamentos não refletidos como o centro do quefazer nesta profissão (Raabe 2001).
  • 9
    Neste particular, pode referir-se que, seria sobretudo desde os anos 1960, que a sociedade norte americana descobriu, no seu geral, as limitadas capacidades de racionalização crítica dos seus cidadãos. Nas palavras de Richars Paul: "deveremos concluir que a maioria doa americanos são incapazes de pensar criticamente, ou teremos, antes, de admitir a hipótese de que sócio-educativamente a sociedade não tem sido desafiada para pensar por si própria, ou seja, para além dos níveis de consciência primários? Julgo que seremos, afinal, apenas como William J. Lederer nos caracterizou no seu best-seller dos anos sessenta: A Nation of Sheep" (Paul, 1993: 45). Por sua vez, Kingley, com base em Chaffee, fez o seguinte diagnóstico: "Já não se trata que os Estados Unidos sejam escandalosamente ignorantes. O problema é que ali parece acreditar-se no direito democrático à ignorância. Pois, por todo o país (...), por exemplo, as pessoas expressam a sua indignação face ao muito que se gasta em ajudas exteriores, sem fazer a mínima ideia do que realmente representa essa ajuda (1%). E nem se trata de que estejam desinformadas, simplesmente as pessoas expressam opiniões veementemente acerca disto numa base de total abstinência em ir procurar informação (...). É um estado tal em que, basicamente, parecem estar todos num rebanho e ninguém se pergunta duas vezes acerca da mesma coisa, nem acerca do miolo ou âmago das coisas ou se, o que à primeira vista achamos sobre algo corresponderá, de fato, a crenças adequadas (Chaffe, 2000:47). Esta chamada de atenção acabou por originar o nascimento, naquele contexto, de algumas instituições preocupadas em alterar estas circunstâncias nos futuros cidadãos. Foi assim que nasceu, por exemplo, o programa para a infância e a juventude de Matthew Lipman, destinado a estender a todos as possibilidades críticas do pensamento, oriundas da filosofia. Trata-se do célebre programa de filosofia para crianças (Lipman, Sharp y Oscayan, 1992). Por seu turno seria, também, fundado, a partir daqui, o próprio Critical Thinking do professor Richard Paul.
  • 10
    Michel Foucault desvelaria, também, a influência do poder noutros campos. Recorde-se, por exemplo, Doença mental e personalidade (Foucault, 2002a), bem como os dois volumes da sua História da loucura (Foucault, 2002b; 2002c) que desocultaram como a psiquiatria tem sido um meio de controle da sociedade na modernidade, mais do que uma ferramenta científica de cuidado e de cura de patologias psíquicas.
  • 11
    Blas Zambrano, pai de María Zambrano, desenvolveu um intenso labor nesta linha, mais tarde ampliada por Paulo Freire. Com efeito, o seu quefazer como professor não se limitou ao campo da educação primária, mas visou, igualmente, pessoas adultas. Recorde-se a sua participação ativa em La Obra, uma instituição que tinha como objetivo promover a libertação de constrangimentos políticos por meio de uma capacitação educativa do operariado (Zambrano, 1998).
  • 12
    A problematização é, por exemplo, um dos temas-chave da teoria e da metodologia de Oscar Brenifie, sendo de referir que o seu processo crítico pode ser, frutiferamente, aplicado tanto na educação de crianças como na de adultos. Tal educação exigiria, como passo básico, a problematização, tal como nos pressupostos freirianos: transformar o discurso ideológico assumido de forma acrítica no ponto de partida para a tomada de consciência do mundo que nos rodeia e dos princípios que nos governam inadvertidamente (Brenifier, 2005 y 2011).
  • 13
    A este respeito, poderemos referir que Giner de los Ríos, fundador da Institución Libre de Enseñanza, baseando-se no espirito de krausismo que entrou na Espanha por meio de Julián Sanz del Río, estabeleceria uma corrente de pensamento que vinculou educação e emancipação política (Giner, 2004:211-660; Marco, 2002). Esse itinerário viria a ser seguido por diversos professores do princípio do século XX, como Blas Zambrano (Marset, 2004:67-102) ou Bernardino Machado, em Portugal.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Jul 2014
    • Data do Fascículo
      Set 2014

    Histórico

    • Aceito
      21 Jan 2014
    • Recebido
      27 Fev 2013
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