Resumos
O objetivo deste artigo é o desenvolvimento de um modelo de mensuração dos sentimentos de legitimidade policial da população paulistana. Identificamos que, na literatura nacional a respeito das atitudes públicas sobre as autoridades legais, pesquisas que se valem de desenhos de survey comumente adotam uma perspectiva operacionalista, negligenciando a lacuna existente entre os conceitos e as questões. Contribuímos substantivamente para esse campo desenvolvendo um modelo de mensuração de legitimidade policial, definida conceitualmente como um dever normativamente orientado de obedecer e um alinhamento moral com a polícia. Utilizando dados de um survey representativo de oito regiões da cidade de São Paulo em 2017, realizamos uma análise fatorial confirmatória de segunda ordem. Posteriormente,validamos essa medida por meio de um modelo de equações estruturais centrado no construto legitimidade. Implicações do conceito e da mensuração de legitimidade para a segurança pública são discutidas.
Legitimidade policial; Modelo de mensuração; Atitudes públicas sobre a polícia; Abordagem reflexiva; Segurança pública
The purposeof this paper is to develop a measurement model of the sentiments of police legitimacy among São Paulo citizens. National survey-based research on public attitudes towards the legal authorities commonly adoptsan operationalist approach, ignoring the gap between concepts and survey questions. We contribute substantively to this research field by developing a measurement model of police legitimacy, which is conceptually defined as a normatively grounded duty to obey the police and a moral alignment with the police. Using data from a representative survey of eight regions of the city ofSão Paulo in 2017, we performed a second-order confirmatory factor analysis. Subsequentely, we estimated a structural equation model centered on the legitimacy construct so as to validate the measure. Policy implications of both the concept and the measurement of police legitimacy are discussed.
Police legitimacy; measurement model; public attitudes towards the police; reflective approach; public security
L’objectif de cet article est de développer un modèle pour mesurer les sentiments de légitimité policière de la population de la ville de São Paulo. Nous avons identifié, dans la littérature nationale à propos des attitudes publiques à l’égard des autorités légales, que les recherches qui utilisent des schémas d’enquêtes adoptent habituellement une perspective opérationnaliste, négligeant la lacune existante entre les concepts et les questions. Nous contribuons de façon substantielle à ce domaine en développant un modèle de mesure de la légitimité policière, défini conceptuellement comme un devoir normatif orienté vers l’obéissance et un alignement moral avec la police. En utilisant des données d’une enquête représentative de huit régions de la ville de São Paulo en 2017, nous avons effectué une analyse factorielle confirmatoire d’un second ordre. Par la suite, nous avons validé cette mesure au moyen d’un modèle d’équations structurelles centré sur la construction de la légitimité. Des implications du concept et de la mesure de la légitimité pour la sécurité publique sont égalementabordées.
Légitimité policière; Modèle de mesure; Attitudes publiques à l’égard de la police; Approche réflexive; Sécurité publique
Introdução
Como mensurar os sentimentos de legitimidade policial da população paulistana? O objetivo deste trabalho consiste em discutir um modelo de mensuração de atitudes públicas em relação à polícia, particularmente no que concerne ao conceito de legitimidade. Buscamos, assim, contribuir para uma tradição de pesquisas que se valem de desenhos de survey para investigar temas relacionados à confiança nas autoridades legais.
Com frequência, criminólogos e estudiosos da sociologia da violência e da segurança pública se engajam em investigações a respeito das percepções do público sobre as autoridades legais. Temas como a confiança na polícia são, afinal, de interesse tanto científico quanto político, uma vez que podem ser considerados resultados socialmente desejáveis (Tyler, 2006). O presente trabalho se insere nessa tradição de investigações que buscam compreender as atitudes públicas em relação à justiça e à polícia.
Por conta do interesse na opinião pública, pesquisas nesse campo científico se valem majoritariamente de desenhos de survey (Oliveira Junior, 2011; Silva e Beato, 2013). A possibilidade de representar estatisticamente uma dada população é, afinal, particularmente importante quando o objetivo consiste em investigar atitudes públicas. No entanto, a aplicação de métodos de survey também traz alguns desafios – em particular relacionados ao processo de operacionalização de conceitos por meio de questões (Hox, 1997).
De que maneira operacionalizar construtos psicológicos como os sentimentos de confiança ou legitimidade da população na polícia? Ainda que haja um extenso debate metodológico a respeito de como lidar com a lacuna entre o que é definido em plano teórico e o que é mensurado em plano empírico (Jackson e Kuha, 2016), não encontramos na literatura nacional a respeito das atitudes públicas sobre a polícia algum estudo que não considere as questões de um survey como os próprios conceitos – isto é, os estudos no panorama brasileiro acabam por pressupor que não há lacuna alguma entre construtos psicológicos e respostas dadas a um questionário fechado. Buscamos, assim, contribuir para esse campo científico apresentando um modelo de mensuração (Bollen, 1989) do conceito de legitimidade policial (Jackson et al., 2014b) que efetivamente demonstra a relação entre o construto e seus indicadores observados.
Argumentamos que a abordagem reflexiva de mensuração, que pressupõe a existência de uma variável latente causando a associação entre indicadores, pode contribuir decisivamente nas pesquisas que se valem de desenhos de survey para investigar tópicos como os sentimentos de confiança e legitimidade na polícia. Nesse sentido, utilizando dados da segunda onda de um painel representativo de oito regiões da cidade de São Paulo coletados em 2017, apresentamos um modelo de mensuração das percepções de públicas de legitimidade policial como uma variável latente composta por duas dimensões: um dever normativo de obedecer às ordens da polícia e um alinhamento moral em relação a essa organização. Com o objetivo de validar a mensuração desse construto, testamos associações consensualmente estabelecidas pela literatura (Sunshine e Tyler, 2003; Jackson et al., 2012) por meio de um modelo de equações estruturais centrado na variável latente “legitimidade policial”. Ainda que concentrado no caso particular do campo de pesquisas sobre atitudes públicas sobre autoridades legais, este artigo pode ser de interesse metodológico no que se refere ao debate nacional sobre operacionalização de conceitos por meio de desenhos de survey.
O artigo se divide da seguinte maneira. Em primeiro lugar, fazemos uma discussão conceitual a respeito do campo de pesquisas sobre atitudes públicas em relação à polícia, com especial ênfase à conceptualização dos sentimentos associados à legitimidade policial. A segunda seção traz o debate sobre mensuração em desenhos de survey, discutin- do as principais abordagens de operacionalização de conceitos nas ciênciais sociais – também apresentamos uma revisão bibliográfica exemplificando essas abordagens no âmbito da criminologia e da sociologia da violência e da segurança pública. Na terceira seção, apresentamos os dados trabalhados e o modelo de mensuração de legitimidade policial em São Paulo, assim como testamos a validade desse modelo em relação a estudos internacionais nessa temática. Por fim, discutimos a importância de se problematizar efetivamente as relações entre o que é teórico e o que é empírico, bem como a relevância científica e política do conceito de legitimidade policial para a segurança pública.
Atitudes públicas em relação à polícia: conceptualização de legitimidade policial
Por que as pessoas obedecem às leis? Por que indivíduos decidem se conformar às normas estipuladas pelas autoridades e não se engajar em comportamentos delinquentes? A literatura criminológica especializada lista ao menos dois grandes mecanismos de aquiescência legal que poderiam ser incentivados por meio de políticas públicas de segurança. Por um lado, a partir da premissa de que indivíduos agem racionalmente, a teoria da dissuasão prevê que as pessoas deixarão de cometer delitos a partir de um cálculo de riscos, isto é, caso a certeza e a severidade da punição sejam superiores aos potenciais ganhos de um comportamento delinquente (Zanetic et al., 2016). Por outro lado, indivíduos podem se engajar em um comportamento de respeito às leis porque legitimam a autoridade legal – porque sentem que isso é o certo a se fazer (Tyler, 2006).
O tema da legitimidade se proliferou no âmbito da criminologia a partir da publicação do livro Why people obey the law, de Tom Tyler (2006). Nessa obra, o autor sugere que quando indivíduos confiam e desenvolvem um sentimento de dever em relação à autoridade, quando internalizam as normas sociais e sentem que devem obedecê-las, quando acreditam que o respeito a essas normas precede sua própria moralidade pessoal, eles tendem a obedecer às leis. A toda essa construção, dá-se o nome de legitimidade – no caso, legitimidade das leis, mas o mesmo princípio pode ser atribuído à polícia. Trata-se de um conceito de raízes sociopsi- cológicas associadas a como o indivíduo se coloca perante a sociedade da qual faz parte. Em um primeiro momento, Tyler definiu o conceito de legitimidade policial a partir de duas dimensões: dever de obedecer e confiança na polícia.
Ainda de acordo com as proposições originais de Tyler, o sentimento de legitimidade voltado à instituição policial seria de particular importância, uma vez que a polícia consiste justamente no braço do Estado ao qual é delegado o monopólio estatal da violência. Assim, uma maneira de se atingir resultados socialmente desejáveis – como o respeito público às leis e a disposição a cooperar com a polícia – envolveria incentivar sentimentos de legitimidade policial, influenciando a legitimação das leis e normas sociais. Nesse sentido, um papel central das políticas públicas de segurança seria o de incentivar de algum modo a legitimidade e a confiança nas instituições policiais.
Como? A obra de Tyler (2006) ficou particularmente famosa por outro conceito para além da noção de legitimidade policial: o de justeza procedimental. Esse conceito consiste no núcleo da proposta do criminólogo norte-americano. Os sentimentos de legitimidade policial estariam mais associados, para a população geral, ao processo do trabalho da polícia do que aos resultados entregues. Isto é, uma organização policial altamente eficaz não se traduziria necessariamente em uma organização legítima aos olhos do público; ao contrário, a melhor maneira de influenciar o processo de legitimação seria fazer com que os policiais, em suas interações diárias com os cidadãos, os tratassem de forma respeitosa, digna, transparente, explicando claramente o motivo daquela interação, conferindo-lhes voz para que expressem suas opiniões. Quando avaliam que a polícia atua dentro dos parâmetros de justeza procedimental, os cidadãos fortalecem seus sentimentos de legitimidade com relação à instituição policial e às leis, tornando-se mais propensos a um comportamento de aquiescência legal.
Desde a publicação do livro de Tyler, a teoria da justeza procedimental foi testada em uma série de contextos diferentes. Os estudos essencialmente se valem de desenhos de survey com amostras representativas de uma dada população e incluem questões que servem como indicadores de construtos como “percepção de justeza procedimental”, “percepção de eficácia”, “legitimidade policial” e “comportamento de respeito às leis”. Com isso, conseguem testar as associações entre essas variáveis. De maneira geral, as correlações ocorrem de modo bastante próximo ao teoricamente associado.1 Essa hipótese foi particularmente testada nos Estados Unidos por Sunshine e Tyler (2003) e Tyler et al. (2014), no Reino Unido por Jackson et al. (2012), Tankebe (2013) e Bradford (2014), na Austrália por Murphy et al. (2008), em Gana por Tankebe (2009), na África do Sul por Bradford et al. (2014), no Paquistão por Jackson et al. (2014a), entre muitos outros. No Brasil, o tema foi discutido conceitualmente por Zanetic et al. (2016) e a hipótese foi testada por Oliveira et al. (2017).
De particular importância, a proliferação de estudos nessa temática ao longo das últimas décadas também permitiu uma melhor conceptualização de legitimidade. Ainda que a comunidade científica não tenha encontrado consenso em alguns dos detalhes de operacionalização (ver, por exemplo, Bottoms e Tankebe, 2012; 2017; Tankebe, 2013; Tyler e Jackson, 2013), a maior parte dos criminólogos define “legitimidade” como “o direito de governar e o reconhecimento desse direito por parte dos governados” (Jackson e Bradford, 2010, p. 1; ver também Beetham, 1991, e Coicaud, 2002). Isso significa que, seguindo essa definição, o con- ceito possui duas dimensões: o direito de governar, isto é, a autoridade possui o direito de comandar e os governados devem obedecer a esses comandos mesmo que discordem de sua motivação; e o reconhecimento desse direito por parte dos governados, ou seja, a legitimidade envolve também a justificativa do exercício do poder, o que adiciona um elemento de alinhamento moral entre público e autoridade (Jackson e Bradford, 2010; Jackson et al., 2014b).
Dada a definição conceitual, evidencia-se o problema-norte do presente artigo: como mensurar algo tão abstrato? Nosso objetivo consiste no desenvolvimento de um modelo de mensuração que, a partir de um desenho de survey, capte a definição teórica de legitimidade policial em suas duas dimensões. Evidentemente, existe uma lacuna fundamental entre qualquer definição conceitual e dadas observações empíricas – tal lacuna, ainda que condicional à complexidade do conceito, sempre existirá independentemente da estratégia adotada (Jackson e Kuha, 2016). Ainda assim, há distintas estratégias para lidar com essa questão. A próxima seção busca resumir uma parte do debate sobre mensuração e operacionalização antes de apresentar propriamente o desenvolvimento de um modelo de mensuração de legitimidade policial.
Entre conceitos e questões
O emprego de técnicas de survey como instrumento de coleta de dados em pesquisas científicas é bastante comum nas disciplinas das ciências sociais. Por seu potencial generalizante, normalmente representando estatisticamente uma dada população, ao mesmo tempo que configura a possibilidade de trabalhar com dados primários, essa abordagem analítica é amplamente utilizada em pesquisas de áreas como a sociologia e a ciência política.
Ao elaborar questões a serem aplicadas em um survey, analistas frequentemente não estão interessados nas respostas diretas às perguntas elaboradas, mas em suas implicações mais abstratas. Conforme argumenta Hox (1997, p. 48), mesmo em casos como intenção de voto ou ocupação do respondente, o interesse do analista deve consistir em problemas tais qual a predição de uma dada eleição ou em localizar o entrevistado em alguma escala de status socioeconômico. Isto é, o interesse primário de uma pesquisa científica que se vale de um desenho de survey envolve investigar “conceitos que estão inseridos em uma teoria mais geral que apresenta uma visão sistemática do que o fenômeno sendo estudado” (Hox, 1997, p. 49).
Evidentemente, há situações em que a correspondência entre a questão formulada e o interesse teórico do analista é mais simples – é o caso de construtos como cor/raça autorreportada ou idade. Em outros, o processo de operacionalização revela complexidade – é o caso de construtos como confiança institucional ou, nosso interesse particular, legitimidade policial. De todo modo, em quaisquer situações o analista deve partir de uma estratégia de mensuração (Bollen, 1989). Hox (1997) traz uma revisão interessante de um ponto de vista epistemológico a respeito de algumas estratégias possíveis de tradução de construtos teóricos em variáveis observáveis que (presumidamente) lhes representem.2
Uma perspectiva bastante adotada é a chamada operacionalismo (ver Bridgman, 1927). Resumidamente, ela consiste na estratégia de adotar o conceito como o construto: cada variável observável (isto é, cada questão no questionário) coincide integralmente com aquilo que se objetiva mensurar, ou seja, assume-se que não há qualquer lacuna entre a abstração de interesse científico e os dados empíricos captados por um instrumento de survey. A definição operacional é o conceito – assim, qualquer mudança operacional (nas questões, por exemplo) leva a um novo construto teórico (Hox, 1997). Além de partir de pressupostos inflexíveis e por vezes não realistas, essa perspectiva ignora possíveis erros de mensuração.
Críticos da visão operacionalista buscam justamente enfatizar a diferença entre construtos teóricos e variáveis observáveis. De maneira geral, eles sustentam que variáveis observadas servem como espécies de indicadores de um construto, mas sua tradução nunca será integral (Idem). O modelo de mensuração, nesse sentido, serve justamente para explicitar esse processo de definição operacional – de acordo com Bollen (1989), um modelo de mensuração é definido por um processo de quatro etapas: definição conceitual; identificação das dimensões que compõem o conceito; formação de medidas; e especificação das relações entre medidas e o construto (Idem, p. 180). Na perspectiva operacionalista, essas etapas não seriam necessárias posto que a definição conceitual é o próprio construto.
Entre aqueles que criticam a visão operacionalista, há um determinado consenso a respeito de duas possíveis abordagens de mensuração em pesquisas de survey: a formativa e a reflexiva (Jackson e Kuha, 2016). A abordagem formativa sugere que um ou mais itens de um questionário formam um construto – implica, em termos de ordenamento causal, que os indicadores determinam o construto. A abordagem reflexiva, por outro lado, sugere que as variáveis observadas refletem um construto teórico – implica, em termos de ordenamento causal, que os indicadores são determinados pelo construto. Em plano teórico, ambas as abordagens podem seguir os quatro passos de Bollen para desenvolver um modelo de mensuração. A diferença estaria apenas na última etapa: na especificação das relações entre as medidas e o construto.
No âmbito da abordagem formativa, Bollen e Baultry (2011) sugerem ao menos duas estratégias para relacionar os construtos e seus indicadores. Em primeiro lugar, os autores argumentam pela existência de indicadores causais – seriam aqueles que determinam diretamente a variável latente. Um exemplo empírico seria um índice de exposição a eventos estressantes causado por indicadores como mudança de emprego, mudança de residência ou a experiência de um divórcio. Uma mudança em algum desses indicadores causaria uma mudança no índice de exposição a eventos estressantes, e não o contrário.
Em segundo lugar, Bollen e Baultry argumentam pela existência de indicadores compostos. Trata-se dos casos em que os indicadores contribuem para a formação de uma variável composta por sua combinação linear – parte-se do pressuposto de que os indicadores determinam perfeitamente o construto.
Analistas que se valem da abordagem formativa de mensuração normalmente partem de uma perspectiva crítica ao operacionalismo. Isto é, sustentam que as variáveis observáveis que formam um dado construto teórico são, na verdade, indicadores empíricos que buscam representar aquilo que definiram em termos abstratos. Ainda assim, a utilização de indicadores compostos acaba por aproximar o analista de uma lógica operacionalista. Isso porque, ao sustentar que indicadores (xi) formam linearmente um construto (ξ1), argumentam que
Ou seja, o construto teórico é definido diretamente pelas variáveis observáveis . Tal qual em relação à perspectiva operacionalista, possíveis críticas a essa abordagem envolvem justamente a desconsideração de erros de mensuração e o fato de que uma mudança em uma das questões impacta diretamente a definição conceitual em tela.
Grande parte das investigações conduzidas por meio de análises de survey parte dessa abordagem de mensuração. Em particular no cenário nacional, é comum que as pesquisas considerem construtos psicológicos como variáveis manifestas. Em pesquisas de algum modo relacionadas ao tema da legitimidade policial, por exemplo, não foram encontrados artigos brasileiros que não tenham adotado a abordagem formativa de mensuração com indicadores compostos.
É o caso da investigação conduzida por Silva e Beato (2013). Com dados do survey “Vitimização e percepção de medo em Belo Horizonte e Minas Gerais”, realizado em 2009, os autores procuraram investigar os fatores que impactam a noção latente de confiança na polícia no estado de Minas Gerais – ainda que os autores não definam seu problema em termos de “legitimidade policial”, há uma correspondência temática. Para mensurar a ideia de confiança na polícia, Silva e Beato utilizaram-se de uma questão do survey que perguntava diretamente: “Por favor, gostaríamos que o/a Sr/a. dissesse o quanto confia em cada uma das seguintes instituições listadas a seguir: polícia”, a partir da qual o entrevistado deveria atribuir uma nota de 0 a 10 (Silva e Beato, 2013, p. 134). As notas dadas pelos respondentes, tratadas como uma variável contínua, formariam a concepção abstrata de confiança na polícia. Isto é, não houve o desenvolvimento de um modelo de mensuração que tenha partido de uma definição conceitual; ao contrário, eles acabaram seguindo uma estratégia operacionalista.
Outro exemplo pode ser encontrado em Oliveira Junior (2011), que procurou compreender as relações entre a avaliação do desempenho policial e a confiança na polícia no Brasil. Para operacionalizar a avaliação do desempenho policial, o autor criou um índice aditivo com base em sete questões do survey, cada uma concebida a partir de uma mesma escala ordinal de quatro classes de respostas (de 0 = “discorda plenamente” a 3 = “concorda plenamente”). Atribuindo valores às respostas dessa escala, foi criado um índice que varia entre 0 e +21, estruturado com base na soma das respostas das questões. Essa estratégia implica que essas sete questões do survey formam a ideia de avaliação do desempenho policial, todas com o mesmo grau de importância.
Já a variável “confiança na polícia” foi operacionalizada como uma variável binária a partir de três questões do survey a respeito da confiança nas polícias Civil, Militar e Federal. As questões perguntavam diretamente aos entrevistados sua confiança em relação às instituições mencionadas a partir de uma escala ordinal com quatro classes de respostas (“confia muito”, “confia”, “confia pouco” e “não confia”). Foram atribuídos valores a essas respostas (“confia muito” e “confia” = +1; “confia pouco” e “não confia” = 0), os quais foram somados gerando um índice que varia de 0 a 3, de acordo com o qual o autor considerou que somente os indivíduos que somaram 3 pontos confiavam na polícia, o que serviu de critério para a formação de uma variável binária de confiança (Oliveira Junior, 2011). Novamente, não houve o desenvolvimento de um modelo de mensuração que tenha partido de uma definição conceitual – ainda que não tenha utilizado apenas um item para operacionalizar cada construto, o autor também acaba por utilizar uma perspectiva operacionalista.
Ceratti e colegas (2015) também investigaram os condicionantes da confiança institucional a partir de dados de survey – em particular, da confiança nas Forças Armadas. Baseados nos dados do survey “Sistema de indicadores de percepção social: defesa nacional”, realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os autores operacionalizaram esse conceito a partir de uma única questão: “O quanto o/a Sr/a. confia nas Forças Armadas: totalmente, muito, razoavelmente, pouco ou nada?” (Ceratti et al., 2015). A resposta direta a essa pergunta foi tratada como o construto “confiança nas Forças Armadas”.
Mais próximo do conceito que buscamos operacionalizar aqui, Wolfe e colegas (2016) apresentam uma investigação a respeito da legitimidade policial em que buscaram testar empiricamente as hipóteses sugeridas por Tyler (2006). O trabalho teve como objetivo testar a generalidade da hipótese da justeza procedimental em diferentes contextos sociais. Para tanto, utilizaram-se de uma amostra de 1681 cidadãos residentes em quatro bairros de uma cidade grande no Sudeste estadunidense (Wolfe et al., 2016).
Os autores elaboraram questões para mensurar os conceitos de “justeza procedimental”, “justiça distributiva”, “eficácia policial” e “legitimidade policial” (esta definida a partir das dimensões “dever de obedecer” e “confiança”), entre outros. Assim, duas questões sobre a disposição do entrevistado em obedecer às ordens policiais e uma questão sobre a confiança depositada na instituição definem, em sua totalidade, o construto teórico “legitimidade policial”.
Seguindo a mesma lógica e sempre a partir de uma escala ordinal de concordância, “justiça distributiva” e “eficácia policial” foram operacionalizadas como índices aditivos de dois itens e “justeza procedimental” foi operacionalizada a partir da soma de quatro itens. Todos esses índices foram trabalhados como variáveis contínuas – tendo sido realizados modelos de regressão linear para estimar o efeito de “justeza procedimental” sobre “dever de obedecer” e sobre “confiança” com a inclusão das outras variáveis de controle (Wolfe et al., 2016).
Outro trabalho que lida com o conceito de legitimidade e que buscou operacionalizá-lo por meio de uma pesquisa de survey foi desenvolvido pelo próprio Tyler juntamente com colegas (Tyler et al., 2014). Essa pesquisa teve o objetivo de investigar o efeito da avaliação que jovens (entre 18 e 26 anos) da cidade de Nova York fizeram sobre o tratamento policial recebido imediatamente após terem sido submetidos a paradas policiais. A amostra foi estratificada por aglomerados urbanos e os dados foram coletados via contato telefônico com base em informações fornecidas pelo Departamento de Polícia de Nova York. Participaram desse survey 1.261 jovens (Tyler et al., 2014, pp. 760-761).
O questionário aplicado por Tyler et al. buscou mensurar os conceitos de “legitimidade policial” (aqui definido a partir de três dimensões: confiança, dever de obediência e alinhamento normativo), “cooperação”, “eficácia policial” e “justeza procedimental”, entre outros. Para criar a variável “legitimidade”, um índice aditivo foi adotado a partir de 25 itens que perguntavam o nível de concordância (1 = “discorda fortemente” a 4 = “concorda fortemente”) dos entrevistados com afirmações. Em seguida, o índice foi trabalhado como uma variável contínua. O mesmo procedimento foi adotado para os outros conceitos, sempre com escalas ordinais de quatro categorias.
Há diversos outros estudos encontrados tanto na literatura internacional (Reisig et al., 2013; Tankebe, 2009) quanto na literatura nacional (Cardia, 1997; Zanetic, 2016) que partem de uma abordagem formativa de mensuração em tópicos amplamente relacionados à confiança pública nas instituições policiais. Ainda que tratem as variáveis observáveis como indicadores empíricos, assim enfatizando sua postura crítica ao operacionalismo, esses estudos, ao ignorarem eventuais erros de mensuração e não problematizarem de fato a lacuna entre o que é abstrato e o que é empírico no estudo sobre crenças e atitudes, acabam adotando uma perspectiva operacionalista, isto é, sustentam que há uma coincidência completa entre o construto teórico que buscam investigar e os indicadores empíricos observados.
Uma abordagem alternativa de mensuração consiste na reflexiva. A ideia, nesse caso, é inverter a ordem causal entre indicadores e conceitos e supor que, na verdade, as variáveis observadas é que são determinadas pelo construto – indicadores altamente correlacionados seriam, portanto, um reflexo da existência de uma variável não manifesta, isto é, uma variável latente.
Ainda que não observáveis empiricamente, argumenta-se que faz sentido teórico que esses construtos latentes existam e que tenham efeitos sobre o mundo empírico. Trata-se de uma espécie de abordagem dedutiva de mensuração: supõe-se teoricamente que uma dada variável latente existe e tem efeitos sobre uma determinada gama de indicadores manifestos. Ainda teoricamente, supõe-se que esse construto latente é responsável por causar a variabilidade e a correlação entre os indicadores. Ao formular o desenho de pesquisa, coleta-se dados a respeito desses indicadores; em seguida, testa-se um modelo de mensuração em que uma variável latente (ξ1) é responsável (sozinha3) pela correlação entre esses indicadores (xi ):
Vê-se, assim, que a abordagem reflexiva de mensuração, ao incorporar métodos de modelagem de variáveis latentes (no caso, análise fatorial confirmatória), leva em consideração possíveis erros de mensuração (δi ) e diferentes cargas fatoriais para diferentes indicadores (λi ). Trata-se de se orientar explicitamente por um modelo conceitual prévio, em vez de se orientar diretamente pelos dados, o que permite a discussão teórica a respeito daquilo em que consistem os construtos e seus indicadores manifestos (Jackson e Kuha, 2016). Conforme Bollen e Bauldry (2011) argumentam, o pressuposto de que há um construto psicológico subjacente aos indicadores empíricos é particularmente adequado em modelos de mensuração de crenças e atitudes – como, justamente, os sentimentos de legitimidade policial.
Alguns estudos inseridos na temática da legitimidade e confiança na polícia adotam essa abordagem de mensuração, ainda que configurem mais uma exceção do que uma regra. Em particular, os trabalhos de Sunshine e Tyler (2003), sobre as relações entre cidadãos e a polícia nos Estados Unidos, e de Jackson e colegas (2012), sobre o Reino Unido, fundamentam-se nesse escopo metodológico. No Brasil, não encontramos investigação nessa temática que não tenha adotado uma abordagem formativa de mensuração – e nosso objetivo consiste justamente em contribuir para a literatura nacional apresentando um modelo de mensuração dos sentimentos de legitimidade policial em São Paulo a partir de uma abordagem reflexiva.
Sunshine e Tyler realizaram uma análise de survey na cidade de Nova York em 2001 com questões que buscaram mensurar os conceitos de “justeza procedimental”, “legitimidade policial”, “respeito às leis” e “cooperação com a polícia”, entre outros. Todos esses construtos foram mensurados por meio de uma análise fatorial confirmatória incorporada em um modelo de equações estruturais. Em vez de testar separadamente as duas hipóteses – o efeito da avaliação do contato sobre os sentimentos de legitimidade policial e o efeito desses sentimentos sobre resultados socialmente desejáveis, como disposição em cooperar com a polícia e em obedecer às leis –, Sunshine e Tyler (2003) elaboraram um modelo de equações estruturais com uma análise de caminhos para toda a proposição teórica simultaneamente.
O outro trabalho, desenvolvido por Jackson et al. (2012), buscou investigar o papel das instituições legais no comportamento de deferência às leis no Reino Unido. Diferentemente dos trabalhos discutidos até aqui, os autores propuseram uma abordagem reflexiva de mensuração: ao tratar tais concepções abstratas – “justeza procedimental”, “legitimidade policial”, “percepção de risco”, entre outras – como variáveis latentes, pressupõem que são construtos não observáveis que causam a correlação entre os itens do questionário, isto é, os itens refletem um conceito estabelecido teoricamente por meio de uma análise fatorial confirmatória. As variáveis utilizadas no modelo não são, assim, índices aditivos simples, mas consistem em fatores latentes obtidos a partir da matriz de correlação entre os itens do questionário.
É importante pontuar que, embora a modelagem de variáveis latentes seja preferível no desenvolvimento de um modelo de mensuração de construtos psicológicos, como sugerimos aqui, ela não elimina a lacuna existente entre aquilo que é observável e aquilo que é teórico. Conforme os críticos da perspectiva operacionalista já sustentavam, tal lacuna nunca deixará de existir: um conceito, como tal, é definido no plano abstrato e, por definição, não coincide integralmente com indicadores observados no plano empírico. Sustentamos que é possível desenvolver um modelo de mensuração que, levando em consideração essa lacuna, otimize o processo de operacionalização. No entanto, essa ainda é uma discussão teórica e que não pode ser resolvida simplesmente por conta da aplicação de uma dada técnica estatística. Conforme argumentamos, ainda que o emprego de técnicas de modelagem de variáveis latentes seja o mais próximo do ideal, ele em si não resolve essa questão fundamental. Além disso, tais técnicas podem ser mal utilizadas.
Isso fica evidente no debate entre Tankebe (2013) e Jackson e Kuha (2014). No plano conceitual, Tankebe realiza uma crítica bastante interessante ao modo como a legitimidade policial vem sendo conceitualmente definida a partir da tradição de pesquisas iniciada em Tyler (2006). Para o autor, uma dimensão fundamental dos sentimentos de legitimidade consiste nos valores compartilhados entre público e autoridade – as expectativas normativas do público são o núcleo do conceito. Tais expectativas, que podem variar de sociedade para sociedade, de maneira geral incluem o tratamento dos policiais dentro dos parâmetros da justeza procedimental. Isto é, Tankebe rebate a teoria de que a percepção de justeza procedimental tem um impacto positivo no processo de legitimação – a percepção de justeza procedimental, entre outras dimensões, é a legitimidade policial (Bottoms e Tankebe, 2012; Tankebe, 2013).
Trata-se de uma posição razoável e que traz dissenso à comunidade científica. O conceito de legitimidade policial estaria, assim, aberto a discussões. A estratégia que Tankebe utiliza para sustentar sua definição conceitual, entretanto, é curiosa. O autor elabora uma análise fatorial confirmatória, demonstrando como seu modelo tem um bom ajuste aos dados, o que confirmaria que legitimidade policial é um produto das quatro dimensões que ele propõe (Tankebe, 2013). Porém, pode uma análise fatorial confirmatória confirmar a definição conceitual de um construto? Conforme Jackson e Kuha sustentam, “a resposta a essa pergunta é claramente não, [pois] isso permanece uma reivindicação conceitual” (Jackson e Kuha, 2014, p. 26). Os autores afirmam:
Legitimidade é um construto não observável. Não se pode mensurá-la diretamente; deve-se inferir tanto sua existência quanto seu significado. Inicia-se com um conjunto de reivindicações conceituais sobre sua natureza; coleta-se dados de survey que indicam os domínios presumidos de seu significado; e se utiliza alguma técnica estatística como a análise fatorial confirmatória para avaliar a dimensionalidade subjacente dos itens [...]. Mas a análise fatorial confirmatória não diz nada diretamente a respeito dos domínios da “legitimidade” [...] (Jackson e Kuha, 2014, pp. 26-27, tradução nossa).
Nosso objetivo neste artigo é apresentar um modelo de mensuração de legitimidade policial tal qual definida na segunda seção do texto (“Atitudes públicas em relação à polícia: conceptualização de legitimidade policial”), isto é, a partir das dimensões do direito de governar e do reconhecimento desse direito por parte dos governados. Isso não significa que tenhamos resolvido o problema da lacuna entre o que é empírico e o que é teórico – nossas medidas não representam os sentimentos de legitimidade em si. O que propomos é justamente um modelo que, levando em conta a natureza abstrata do tópico da legitimidade policial, capte melhor seus reflexos empíricos e nos permita estudá-la empiricamente.
Este estudo
Um modelo de mensuração de legitimidade policial em São Paulo
Essa abordagem nos aproxima do desenvolvimento de um modelo de mensuração mais rigoroso, tal qual sugerido por Bollen (1989; Bollen e Bauldry, 2011). O autor indica que o desenvolvimento de um modelo de mensuração segue quatro etapas ordenadas: conferir significado ao conceito; identificar as dimensões e as variáveis latentes que as representem; formular as medidas; e especificar as relações entre as medidas e as variáveis latentes (Bollen, 1989, p. 180). Nesta seção, aplicamos as propostas de Bollen para desenvolver um modelo de mensuração dos sentimentos públicos de legitimidade policial na cidade de São Paulo.
Utilizamos, para isso, dados da segunda onda de um painel desenvolvido no âmbito de uma pesquisa no Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), coletados entre janeiro e março de 2017. A amostra, representativa de oito regiões do município de São Paulo selecionadas após uma análise de cluster entre os setores censitários (ver Nery et al., 2015), conta de 928 participantes (77% dos 1.200 participantes da primeira onda, cujos dados foram coletados em 2015). O instrumento em questão busca trazer o debate a respeito da legitimidade policial para o contexto brasileiro, particularmente para o contexto paulistano.
A primeira etapa do desenvolvimento de tal modelo consiste em uma definição teórica, isto é, em explicar em termos simples e concisos o significado de um conceito (Bollen, 1989) – no caso, do conceito de “legitimidade policial” tal qual elaborado acima. Como explicamos, estamos nos referindo ao sentimento, individual, de que a autoridade policial tem o direito ao poder e que deve ser obedecida – tal dever de obediência se dá normativamente, “porque isso é o certo a se fazer” (Jackson e Bradford, 2010), em oposição a uma obediência por fins instrumentais (Tyler, 2006). A internalização das normas sociais manifestada por esse sentimento de dever moral e de concordância normativa com a autoridade é a definição de legitimidade da polícia.
Evidencia-se, assim, que a definição conceitual exclui algumas dimensões que outros estudos ou mesmo o senso comum poderiam incluir ao se tratar de legitimidade da polícia. Por exemplo, ela não se refere à legalidade: o fato de agentes policiais agirem dentro ou fora dos parâmetros estabelecidos por lei, aos olhos do público, é irrelevante à sensação individual de que força policial goza de legitimidade para exercer sua autoridade. Isso vale também para a confiança institucional: ao delimitarmos nosso conceito de legitimidade policial, não estamos nos referindo à ideia de que um dado cidadão confia ou não nessa instituição.
Essa delimitação nos leva ao segundo passo sugerido por Bollen: a identificação de dimensões que representem o conceito em questão. Como as dimensões “legalidade” e “confiança” foram excluídas, quais dimensões compõem o construto? Partindo da definição de que legitimidade policial envolve tanto o direito de governar quanto o reconhecimento, por parte dos governados, desse direito, vemos que há duas dimensões: (1) o sentimento de dever obedecer; e (2) o alinhamento normativo com a polícia (Jackson et al., 2014b).
Em primeiro lugar, uma das dimensões do conceito de legitimidade policial envolve a internalização de uma obrigação moral de obedecer aos comandos da autoridade. Trata-se da disposição em obedecer à polícia voluntariamente e porque se acredita ser o certo, em oposição a uma disposição em obedecer por conta do poder coercitivo da instituição. Em segundo lugar, a outra dimensão envolve valores compartilhados entre cidadãos e autoridade, no sentido de que as expectativas normativas de ambos os polos dessa relação coincidem.
A identificação das dimensões do conceito é particularmente importante na formulação das medidas. Em vez de elaborar questões que busquem abordar diretamente o conceito de modo mais abstrato, Bollen argumenta que faz mais sentido mensurar indicadores de cada uma dessas dimensões – e partir delas para mensurar o construto. Nesse sentido, o questionário do survey supramencionado foi elaborado a fim de conter questões que servissem como indicadores empíricos de “dever de obedecer à polícia” e “alinhamento normativo com a polícia”.
Partindo de uma abordagem reflexiva de mensuração, a estratégia adotada, quando do desenvolvimento do questionário, foi realizar tanto questões que, hipoteticamente, estariam relacionadas entre si por serem causadas por uma variável latente denominada “dever de obedecer a polícia” quanto questões que estariam sendo causadas por uma variável latente denominada “alinhamento moral com a polícia”. Ou seja, questões cujas respostas refletiriam aspectos relacionados ao que definimos teoricamente como sendo as dimensões do conceito de legitimidade policial. Esta é a terceira etapa sugerida por Bollen: formação das medidas. As seguintes questões foram realizadas:
DEVER NORMATIVO DE OBEDECER À POLÍCIA
(Escala de concordância: concorda totalmente / concorda em parte / não concorda nem discorda / discorda em parte / discorda totalmente)
DO1 – É o seu dever fazer o que a polícia diz, mesmo que não entenda ou concorde com suas razões
DO2 – É o seu dever fazer o que a polícia diz, mesmo quando não gosta da forma como é tratado pela polícia
ALINHAMENTO NORMATIVO COM A POLÍCIA
Agora gostaria que o(a) sr(a) me dissesse se a polícia no seu bairro:
(Escala de frequência: sempre / quase sempre / às vezes / raramente / nunca)
AN1 – Age de acordo com o que o (a) sr(a) acha que á certo.
AN2 – Tem as mesmas expectativas que você sobre a sua comunidade.
AN3 – Defende valores que são importantes para uma pessoa como você.
Como a pesquisa em questão não parte de uma abordagem formativa de mensuração, não há a expectativa de que esses itens formem as noções abstratas de “dever normativo de obedecer a polícia” e “alinhamento moral com a polícia”, ou mesmo que todos eles formem a ideia de “legitimidade policial”. Ao contrário, partindo do pressuposto de que se trata de um construto elaborado em plano abstrato, com possíveis efeitos sobre o mundo empírico, a pesquisa assume que esses seis itens são explicados pela variável latente em questão. Assim, a associação entre os itens refletiria aspectos da “legitimidade policial”.
Essa discussão nos aproxima da quarta etapa do processo de elaboração de um modelo de mensuração sugerido por Bollen: especificação das relações entre os indicadores e o construto. Se estivéssemos adotando uma abordagem formativa com indicadores compostos, essa etapa seria cumprida apontando a soma entre as respostas – criando um índice de 0 a +20, por exemplo. Entretanto, conforme argumentamos, essa abordagem acabaria nos aproximando de uma perspectiva operacionalista de mensuração, como se o conceito de legitimidade policial fosse o próprio índice criado.
Ao contrário, adotamos uma abordagem reflexiva de mensuração no âmbito do quadro teórico da modelagem de equações estruturais e tratamos o construto “legitimidade policial” (ηlegitimidade) como uma variável latente definida, por meio de uma análise fatorial confirmatória com base em duas outras variáveis latentes, “dever de obeder” (ξdever) e “alinhamento normativo” (ξalinhamento), cada qual impactando seus indicadores, sempre a partir de cargas fatoriais específicas (λij). Os resultados desse modelo de mensuração podem ser vistos na Figura 1.4
Essencialmente, a análise fatorial confirmatória realiza um modelo de regressão para cada indicador observável, tendo sempre a variável latente como variável explicativa – assume-se ainda que a variabilidade dos indicadores explicada por esses modelos de regressão é sempre integral (R2 = 1), além de não se permitir associações entre os itens manifestos (uma vez que isso seria afirmar que há outros fatores responsáveis por sua associação que não a variável latente em questão, o que contradiz o modelo de mensuração). Convencionalmente, seleciona-se o indicador manifesto que melhor representa (conceitualmente) a variável latente e, ao restringir sua carga fatorial a 1, trata-o como variável de referência para a escala latente (Bartholomew et al., 2008).
O modelo geral da análise fatorial confirmatória é um teste de uma teoria. Nesse sentido, as medidas de ajuste dos dados à hipótese devem ser avaliadas com o intuito de adotar ou não esse modelo. Assim, alguns testes são convencionalmente realizados nesse intuito. Os mais comuns são o Comparative Fit Index (CFI) e o Tucker-Lewis Index (TLI), ambos comparando a matriz de covariância observada com o modelo estimado e ambos variando de 0 a 1 – sendo 1 o ajuste perfeito. Tradicionalmente, adotam-se e como critérios de aceitação. Outros testes estimam a probabilidade do erro tipo II do modelo geral: o Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) e o Standardized Root Mean Square Residual (SRMR) são os mais comuns, ambos variando de 0 a 1 – tradicionalmente, adota-se RMSEA ≤ 0.08 e SRMR ≤ 0.06 como critérios de aceitação do modelo.
O modelo de mensuração de “legitimidade policial” apresenta ótimos valores de ajuste. Todas as cargas fatoriais são estatisticamente diferentes de zero (ao nível de significância de 99%). Tanto o CFI quanto o TLI são próximos de 1, ao passo que RMSEA e SRMR são próximos de 0. Em outras palavras, o modelo de mensuração da variável latente “legitimidade policial” tem ajuste aceitável. Isso significa que a hipótese de que os indicadores manifestos apresentados de fato não refletem esse fator não observável – conceitualmente denominado “legitimidade policial” – pode ser rejeitada. Trata-se, pois, de um modelo de mensuração que parte de uma abordagem reflexiva, assumindo a centralidade da teoria na operacionalização dos conceitos.
Possivelmente, a criação de um índice aditivo de legitimidade policial a partir dos mesmos cinco itens levaria a um construto empiricamente próximo à variável latente estimada acima. Isto é, a diferença entre os escores dos indivíduos dados pelos dois métodos poderia não ser muito grande – afinal, normalmente a correlação entre índices aditivos e construtos latentes é estimada acima de 0,8.7 Entretanto, há uma importante diferença teórica. Conforme argumentam Jackson e Kuha (2016), é fundamental que considerações teóricas guiem o modelo de mensuração; como se trata aqui de um campo de pesquisas envolvendo construtos psicológicos como confiança e percepções subjetivas não diretamente observáveis, é importante que não se considere as medidas o próprio fenômeno a ser mensurado, mas indicadores cuja correlação é causada pelo fenômeno subjacente.
Assim, é importante para o campo de estudos a respeito de atitudes públicas sobre autoridades legais que se reflita criticamente a respeito das estratégias de mensuração. O modelo de mensuração de legitimidade policial aqui desenvolvido consiste em um passo nesse sentido, pois, conforme argumentado, trata-se de um modelo de mensuração de um construto psicológico que não acaba em uma estratégia operacionalista.
Além disso, o emprego de técnicas relacionadas à modelagem de variáveis latentes produz outros ganhos do ponto de vista estatístico na comparação com a formação de um índice aditivo. O mais importante deles diz respeito aos erros de mensuração. A estimação simultânea de um modelo de mensuração (em que indicadores manifestos e variáveis latentes são causalmente ligados) e de um modelo estrutural (em que variáveis, incluindo as latentes, são direcionalmente ligadas entre si via análise de caminhos) garante maior eficiência estatística, com erros-padrão reduzidos. Essa estimação simultânea é realizada por meio de um modelo de equações estruturais (ver adiante). Por outro lado, o uso de indicadores compostos em dois passos separados – em que o primeiro consiste na criação do índice aditivo e o segundo, no uso desse índice em modelos como os de regressão – desconsidera possíveis erros de mensuração e, por conseguinte, superestima erros-padrão em testes de hipóteses.
Outro ganho do emprego de técnicas relacionadas à modelagem de variáveis latentes diz respeito à possibilidade de estudos comparativos, em especial comparações entre países. Conforme Jackson (2018) argumenta, embora a produção internacional sobre julgamentos públicos a respeito da legitimidade da polícia e das leis seja extensa, comparações transnacionais ainda são majoritariamente inviáveis — em parte por conta das distintas estratégias de mensuração. Por causa da possibilidade de impor restrições aos parâmetros e da estimação de cargas fatoriais, modelos envolvendo variáveis latentes são particularmente úteis em estudos comparativos.
Uma vez desenvolvido e testado o modelo de mensuração – seguindo as sugestões de Bollen (1989) passo a passo e adotando claramente uma abordagem reflexiva de mensuração (Jackson e Kuha, 2016; Bartholomew et al., 2008) –, uma pergunta importante deve ser feita: esse modelo de fato mensura o que foi teoricamente definido como “legitimidade policial”? Em outras palavras, qual a validade do modelo desse modelo de mensuração? Trata-se de uma discussão de cunho teórico e que nunca será totalmente resolvida – afinal, um construto nunca será integralmente válido justamente porque representa um conceito desenvolvido em plano abstrato. Ainda assim, existem algumas estratégias possíveis para tentar avaliar a validade de determinado construto.
Avaliando a validade do modelo de mensuração
A afirmação de que uma dada variável mede aquilo que ela deve medir (isto é, sua validade) depende do estabelecimento de um consenso no campo científico a respeito dos seus atributos teóricos e empíricos. Num exemplo corriqueiro, uma régua produz medidas válidas de distância, entre outros motivos, porque existe um consenso (que, no caso, vai além de um campo científico) a respeito do significado e da escala de medidas de distância. É possível fazer afirmações similares no caso de conceitos como “legitimidade policial”?
Com a ressalva de que a validação de um modelo de mensuração é bastante complexa, Bollen (1989) lista uma série de estratégias possíveis para atestar a validade de uma variável latente. Três dessas estratégias são especialmente interessantes para avaliar a validade do modelo de mensuração de legitimidade policial: validade por conteúdo, validade por critério e validade do construto.
Validade por conteúdo
A validade por conteúdo é realizada teoricamente. Dada a definição conceitual daquilo que se busca mensurar, há uma coincidência entre o construto mensurado e seu conceito? A validação por conteúdo de um determinado modelo de mensuração é parte fundamental do processo. Entretanto, há uma limitação importante: não se trata de uma estratégia implementada empiricamente. Sustentamos, por exemplo, que o modelo de mensuração de legitimidade policial aqui desenvolvido é válido em relação a seu conteúdo – os indicadores refletem, separadamente, os dois construtos psicológicos que compõem a nossa definição conceitual, ou seja, um alinhamento normativo entre cidadãos e polícia e um dever normativamente fundamentado de obedecer à polícia. Mas essa sustentação teórica dependeria de um consenso na literatura a respeito da própria definição de legitimidade policial – conforme buscamos demonstrar, tal consenso inexiste na literatura. Dada a dificuldade de definições conceituais consensualmente estabelecidas nas ciências sociais, chegar à validade por conteúdo é particularmente complexo.
Validade por critério
A validade por critério é o grau de correspondência entre os indicadores manifestos (xi) e uma determinada variável escolhida como critério (C1), normalmente mensurada por sua correlação. Por exemplo, caso se tenha um modelo de mensuração cujo objetivo consiste em estimar os salários de uma determinada empresa a partir de alguns critérios como salário autorreportado, esse modelo de mensuração poderia ser validado pela correlação entre o salário autorreportado (e os outros indicadores) e o próprio salário real fornecido pela empresa.
Evidentemente, essa validação também é particularmente complexa por estarmos tratando de construtos psicológicos – não há qualquer variável que possa ser utilizada como critério quando o objetivo do modelo de mensuração consiste nos sentimentos públicos em relação à legitimidade da autoridade policial. Nesse sentido, quaisquer modelos de mensuração de construtos psicológicos são limitados no que se refere à validade por critério.
Ainda assim, alguma validação é possível. Conforme discutimos, julgamentos em relação à legitimidade da autoridade policial são distintos dos sentimentos de confiança na polícia, mas por certo esses dois atributos tendem a estar positivamente correlacionados (Jackson e Gau, 2016). Isto é, indivíduos que confiam na polícia tendem a legitimá-la mais fortemente. Além disso, também mencionamos que tais julgamentos de legitimidade não devem se confundir com percepções de legalidade e má-conduta de policiais – mas é sensato supor que cidadãos que compartilham um senso de moralidade com a polícia e que possuem um dever normativamente orientado de obedecer às ordens dessa autoridade tendem a ter percepções positivas do trabalho policial.
Portanto, uma maneira de indicar alguma validade do modelo de mensuração de legitimidade policial com base em um critério envolve comparar a distribuição dos escores individuais da variável latente estimada com as respostas às perguntas de confiança e percepção de má conduta policial. Considerando a extensão dos escores de legitimidade policial de -1.68 a +1.07, com média zero e desvio-padrão igual a 069, vê-se na Tabela 1 que cidadãos que dizem não confiar na polícia possuem um valor médio bastante inferior quando comparado com o valor médio atribuído àqueles que dizem confiar muito na polícia: -0.27 e 0.45, respectivamente.
A Tabela 1 mostra como os escores da variável latente “legitimidade policial” aumentam conforme os respondentes do survey respondem mais positivamente à pergunta a respeito de sua confiança na polícia, comportando-se conforme teoricamente esperado8. Nesse sentido, contribui, ainda que não decisivamente, para a validação da medida por critério.
Por sua vez, a Tabela 2 mostra as médias de escores de legitimidade policial caindo conforme os respondentes sugerem maior percepção de má conduta policial – enquanto os entrevistados que afirmam que nunca ouviram falar de policiais do bairro aceitando suborno possuem um valor médio de 0.21, aqueles que sugerem que policiais sempre aceitam suborno possuem um valor médio de -0.18. Isto é, há uma correspondência negativa entre a variável latente “legitimidade policial” e a percepção pública a respeito do aceite do suborno por parte de policiais, conforme esperado. Essa relação também contribui, ainda que não decisivamente, para a validade por critérios do modelo de mensuração de legitimidade policial.
Validade do construto
Conforme Bollen argumenta, é comum nas ciências sociais que conceitos sejam dissensualmente formulados, tornando a validade por conteúdo particularmente difícil de ser aplicada. Além disso, é comum que não existam critérios apropriados para determinadas medidas, o que faz com que a validação por critérios também apresente restrições à sua aplicação – o exercício aqui realizado consiste numa aproximação às medidas cujos resultados são teoricamente esperados e cuja utilização é amplamente documentada (em particular no que se refere à confiança da polícia). Nesse sentido, às situações tais como o caso do construto psicológico associado aos sentimentos públicos de que a polícia é uma autoridade legítima, Bollen sugere que seja utilizada a validade do construto. Trata-se, essencialmente, de testar associações teoricamente relevantes com o construto – a medida em questão se relaciona com outras variáveis de uma maneira consistente com aquilo que seria teoricamente previsto? Por exemplo: pressupondo que “inteligência” é um fator que evolui positivamente entre crianças com o passar de sua idade, uma maneira de avaliar um dado modelo de mensuração dessa variável latente seria analisá-la comparativamente com crianças de, por exemplo, zero a dez anos: se houver uma correlação positiva, tem-se uma evidência da validade dessa medida. Evidentemente, esse teste não é determinístico em sua avaliação, mas configura uma estratégia interessante para sustentar a validade de um dado modelo de mensuração.
Nesse sentido, para avaliar a validade da mensuração de “legitimidade policial” que sugerimos, podemos testar sua associação com outras variáveis colocadas pela literatura especializada. Por exemplo, conforme discutimos, fortes sentimentos de legitimidade em relação à instituição policial estariam positivamente associados a um comportamento de deferência às leis. Conforme sugere Tyler (2006; Sunshine e Tyler, 2003) e outros estudiosos verificam em diversas localidades (Jackson et al., 2012; Murphy et al., 2008), tal associação independe das percepções de risco de sanção em caso de descumprimento das normas. Desse modo, aferir a validação da nossa mensuração de legitimidade policial envolveria testar a hipótese de que há um efeito significativo e positivo sobre o comportamento de respeito às leis, efeito que se mantém estatisticamente maior do que zero mesmo com a inclusão de uma covariável referente à percepção de risco.
Além disso, a literatura indica que cidadãos apresentam sentimentos mais fortes de legitimidade quando esperam que a polícia aja dentro dos parâmetros da justeza procedimental – oferecendo um processo de tomada de decisões de alta qualidade, o que envolve neutralidade, voz, tratamento justo e digno, transparência e demonstração de confiança, entre outros aspectos (Zanetic et al., 2016). Assim, de acordo com a proposta de Tyler (2006), espera-se uma associação significativa e positiva entre a percepção de justeza procedimental e um construto válido de legitimidade policial. Além disso, a proposta desse campo de pesquisas é que a avaliação do processo pelo qual a polícia age é mais fundamental para a legitimação da instituição do que a avaliação dos resultados entregues – isto é, o efeito da percepção de justeza procedimental sobre legitimidade policial deve ser maior do que o efeito da percepção de eficácia policial (Tyler, 2006; Jackson et al., 2012).
Tem-se, pois, um complexo modelo teórico a respeito da legitimidade policial. Esse modelo está resumido na Figura 2. De um lado, o construto tem duas variáveis preditoras; de outro, ele próprio é preditor de outro construto, o qual apresenta uma covariável. Tyler (2006) sugere que as seguintes relações devem ser significativas e positivas: o efeito de justeza procedimental sobre legitimidade policial (e deve ser maior do que o efeito de eficácia) e o efeito de legitimidade sobre respeito às leis.
Evidentemente, o teste dessa teoria contra os dados empíricos que estamos analisando não consiste em uma perfeita avaliação da validade do construto. Afinal, o contexto brasileiro (ou da cidade de São Paulo) pode apresentar distinções do contexto anglo-saxão em que a hipótese da justeza procedimental foi extensivamente testada. O teste dessa hipótese com dados observacionais significa também que não estamos efetivamente isolando os efeitos estimados, de modo que a possibilidade de variáveis endógenas não observáveis ou não incluídas ofuscando as essas associações é real. Apesar dessas limitações, sustentamos a viabilidade desse teste para a validação do modelo de mensuração, uma vez que as semelhanças e especificidades do contexto paulistano no tocante aos julgamentos públicos sobre a legitimidade policial demonstradas em Oliveira et al. (2017) nos permitem pressupor os mecanismos do modelo conceitual da Figura 2. Além disso, a literatura internacional tem inferido causalidade no âmbito da teoria da justeza procedimental (ver, por exemplo, Pósch, 2017).
Uma vez que os cinco fatores apresentados no modelo conceitual podem ser considerados construtos, cada qual com seu próprio modelo de mensuração, e que as relações entre eles estão dispostas em um formato de caminhos, a estratégia metodológica ideal para contrapor o diagrama da Figura 2 a dados empíricos consiste na modelagem de equações estruturais. Como o survey com que estamos trabalhando conta com ao menos três perguntas que refletem cada uma dessas variáveis latentes,9 essa estratégia foi adotada. O resultado do modelo de equações estruturais está na Figura 3 (resultados detalhados no Apêndice 2).
É necessário enfatizar que nosso foco aqui é a validade do modelo de mensuração de legitimidade policial em São Paulo, para o qual estamos pressupondo o modelo teórico elaborado por Tyler (2006). Evidentemente, encontrar relações que contrariem as expectativas originais não necessariamente indica que a variável latente mensurada não seja válida – poderia significar, por exemplo, que a hipótese tyleriana não se verifique nesse contexto. Este não é, entretanto, nosso objetivo neste artigo.10 Limitamo-nos a discutir a mensuração desse construto a partir do modelo teórico resumido na Figura 2. Nesse sentido, a leitura que fazemos dos resultados dispostos na Figura 3 busca apenas responder à pergunta referente à adequação da variável latente “legitimidade policial” tal qual proposto pela literatura criminológica especializada.
As flechas que ligam os construtos a seus indicadores representam cargas fatoriais (todas disponíveis no Apêndice 1), ao passo que as flechas entre as próprias variáveis latentes representam a parte estrutural do modelo – espécies de modelos de regressão. A flecha curva e bidirecional indica covariância.
O ajuste geral do modelo é bastante eficiente, com e Todos os modelos de mensuração também são estatisticamente significantes, conforme se pode verificar no Apêndice 2. A covariância entre as duas variáveis latentes exógenas (“justeza procedimental” e “eficácia”) é estatisticamente distinta de zero a um nível de significância de 99% .
Em termos mais substantivos, conforme sugerido por Tyler (2006), fica evidente como o principal preditor da legitimidade policial é a percepção de processos justos, não de resultados desejados. Isto é, ao passo que a justeza procedimental tem efeito substantivo sobre a legitimidade da polícia (=0,92), a percepção de eficácia essencialmente não altera o reconhecimento da instituição como legítima ( =0,13, mas possivelmente zero na população). Ainda seguindo a literatura (Jackson et al., 2012; Tankebe, 2013), a legitimidade policial é um eficiente preditor do comportamento de desrespeito às leis (=-0,175), diferentemente da percepção de risco de sanção, que não apresentou significância estatística.
Esses resultados convergem com o que foi teoricamente proposto por Tyler (2006) – a variável latente “legitimidade policial” comportou-se exatamente conforme previsto pela teoria: fortemente associada à percepção de justeza procedimental, associação essa mais substantivamente significativa do que a encontrada com relação à percepção de eficácia; e fortemente associada ao comportamento de deferência às leis, diferentemente da percepção de risco de sanção. Conforme argumentam Jackson e Kuha (2016), nenhum modelo estatístico seria capaz de validar de fato a mensuração de uma variável latente como “legitimidade policial”. Trata-se de um construto cuja existência e seu significado devemos inferir. Ainda assim, é possível estabelecer critérios objetivos para avaliar um modelo de mensuração de uma variável latente no âmbito de uma determinada teoria. Seguindo os critérios estabelecidos por Bollen (1989) e as definições conceituais de Jackson et al. (2014b) no âmbito da teoria sugerida por Tyler (2006), podemos concluir pela validade do modelo de mensuração apresentado a respeito dos sentimentos de legitimidade policial em São Paulo.
Considerações finais
Neste artigo, buscamos contribuir para o campo nacional de pesquisas a respeito de atitudes públicas sobre as autoridades legais apresentando um modelo de mensuração dos sentimentos de legitimidade policial da população paulistana. Com base na definição conceitual de legitimidade como dois estados psicológicos conectados, um dever normativamente fundamentado de obedecer e um alinhamento moral com a polícia, desenvolvemos uma análise fatorial confirmatória a partir de cinco indicadores e dois fatores para mensurar a variável latente que representa esse sentimento de internalização das normas e leis.
A validade desse modelo de mensuração foi avaliada por meio de testes de associações consensualmente estabelecidas pela literatura especializada. Por exemplo, a literatura sustenta que a expectativa de que policiais ajam dentro dos parâmetros da justeza procedimental é forte preditora das percepções de legitimidade dessa instituição, assim como a legitimidade é forte preditora de um comportamento de respeito às leis. Para essa avaliação da validade do construto, desenvolvemos um modelo de equações estruturais – a variável latente “legitimidade policial” se comportou exatamente conforme o hipotetizado pela literatura, fortalecendo o argumento de que se trata de uma medida válida.11
O campo de pesquisas em que nos inserimos se vale majoritariamente de desenhos de survey que buscam mensurar construtos psicológicos como crenças e atitudes (Oliveira Junior, 2011; Silva e Beato, 2013). No entanto, ainda não lhe foi incorporado o debate metodológico a respeito das distintas abordagens de mensuração que buscam modelar variáveis latentes considerando a lacuna que existe entre o desenvolvimento teórico dos conceitos e coleta de dados empíricos por meio de questões. A maior parte dos trabalhos acaba adotando uma abordagem formativa com indicadores que compõem linearmente um índice, o que culmina em uma perspectiva operacionalista que, conforme argumentamos, considera as medidas como o próprio fenômeno que se busca mensurar.
Ainda que os resultados empíricos apresentados por pesquisas anteriores sejam de suma importância para o campo de pesquisas sobre atitudes públicas em relação ao sistema de justiça criminal, é preciso refletir criticamente a respeito de suas estratégias de mensuração. Cada situação demanda um modelo diferente, uma vez que, a depender do construto em questão, os indicadores devem ser causais, compostos ou resultantes (reflexivos). Quando o índice diz respeito a um construto psicológico ligado a crenças e atitudes, a adoção de uma abordagem reflexiva de mensuração é teoricamente mais robusta – o que é essencial para que se possa avançar nos estudos que tratam de atitudes públicas sobre autoridades legais.
Nesse sentido, contribuímos substantivamente para esse campo de pesquisas ao apresentar, até onde pudemos verificar, o primeiro modelo de mensuração de legitimidade policial no Brasil. Trata-se de um conceito central para o desenvolvimento de políticas públicas que vão além da dissuasão (Zanetic et al., 2016). A polícia, afinal, precisa que a população a legitime para exercer seu trabalho, ao mesmo tempo em que a população demanda a realização de um trabalho policial eficaz na manutenção da ordem pública. Mensurar mais robustamente os sentimentos e as expectativas do público em relação às instituições legais é, pois, o primeiro passo para se compreender a natureza das relações entre cidadãos e autoridade e, assim, contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas de segurança voltadas ao incentivo da legitimidade das leis.
Apêndice 1 – Questões utilizadas
JUSTEZA PROCEDIMENTAL
A polícia no seu bairro:
(Escala de frequência: sempre / quase sempre / às vezes / raramente / nunca)
1. Trata com respeito todas as pessoas: ricos e pobres, negros e brancos.
2. Explica claramente porque revista ou prende as pessoas.
3. Toma decisões que são justas e imparciais.
4. Dá atenção às informações que as pessoas trazem.
5. Assume e corrige seus próprios erros.
6. Trata bem pessoas como você.
EFICÁCIA
Como o/a Sr./a avalia o trabalho da polícia no seu bairro em relação à/ao:
(Escala de avaliação: muito bom/bom/nem bom nem ruim/ruim/muito ruim)
1. Diminuição do tráfico de drogas.
2. Diminuição do assalto à mão armada.
3. Atendimento às chamadas de emergências (190).
4. Atendimento na delegacia de polícia.
5. Investigação de crimes.
6. Manifestações / protestos
7. Manter as ruas do bairro tranquilas.
ALINHAMENTO NORMATIVO COM A POLÍCIA
Agora gostaria que o/a Sr./a me dissesse se a polícia no seu bairro:
(Escala de frequência: sempre / quase sempre / às vezes / raramente / nunca)
1. Age de acordo com o que o (a) sr(a) acha que á certo.
2. Tem as mesmas expectativas que você sobre a sua comunidade.
3. Defende valores que são importantes para uma pessoa como você.
DEVER NORMATIVO DE OBEDECER A POLÍCIA
Agora gostaria que o/a Sr./a me dissesse se concorda com cada uma das frases abaixo:
(Escala de concordância: concorda totalmente / concorda em parte / não concorda nem discorda / discorda em parte / discorda totalmente)
1. É o seu dever fazer o que a polícia diz, mesmo que não entenda ou concorde com suas razões
2. É o seu dever fazer o que a polícia diz, mesmo quando não gosta da forma como é tratado pela polícia
3. Você só obedece a polícia por medo (codificação invertida)
PERCEPÇÃO DE RISCO
O o/a Sr./a acredita que seria pego/a pela polícia ou alguma autoridade caso tomasse alguma dessas atitudes:
(Escala de frequência: sempre / quase sempre / às vezes / raramente / nunca)
1. Tentasse subornar um guarda de trânsito ou rodoviário para evitar multa?
2. Comprasse produtos falsificados ou piratas?
3. Usasse sinal de TV a cabo sem pagar por isso?
4. Comprasse produtos sem nota fiscal para reduzir o preço?
5. Pagasse o médico ou dentista particular sem recibo?
6. Pegasse algum produto de uma loja sem pagar por ele?
7. Desrespeitasse vagas ou assentos preferenciais para idosos ou deficientes físicos?
DESRESPEITO ÀS LEIS
Alguma vez na vida o/a Sr./a
(Sim / não)
1. Tentou subornar um guarda de trânsito ou rodoviário para evitar multa?
2. Comprou produtos falsificados ou piratas?
3. Usou sinal de TV a cabo sem pagar por isso?
4. Comprou produtos sem nota fiscal para reduzir o preço?
5. Pagou o médico ou dentista particular sem recibo?
6. Pegou algum produto de uma loja sem pagar por ele?
7. Já desrespeitou vagas ou assentos preferenciais para idosos ou deficientes físicos?
Apêndice 2 – Anexo Estatístico
BIBLIOGRAFIA
- BARTHOLOMEW, David; STEELE, Fiona; MOUSTAKI, Irini & GALBRAITH, Jane. (2008), Analysis of multivariate social science data 2. ed. Londres, CRC Press.
- BEETHAM, David. (1991), The legitimation of power Londres, Macmillan.
- BOLLEN, Kenneth. (1989), Structural equations with latent variables Nova York, John Wiley & Sons.
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1
Por se tratar de desenhos observacionais, os estudos não se engajam em inferência causal e se limitam a correlações condicionais. Ver, no entanto, Pósch (2017).
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2
Evidentemente, estratégias de operacionalização de construtos teóricos se iniciam na elaboração do questionário, o que inclui uma série de etapas – como pré-testes. O foco de nossa análise, no entanto, consiste na modelagem dos indicadores após sua formulação.
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3
O que significa que o modelo assume que a correlação entre os resíduos é zero.
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4
Os códigos em R e Mplus necessários para replicação de todas as análises apresentadas neste artigo estão disponíveis mediante solicitação.
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5
Convencionalmente, as variáveis latentes são representadas por elipses, ao passo que os indicadores manifestos são representados por retângulos.
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6
Por se tratar de uma análise fatorial confirmatória de segunda ordem, o seguinte item (representado como “A” na figura) foi incluído como terceiro indicador da variável latente “legitimidade policial” para que o modelo seja identificado (sem alterações substantivas): “Você só obedece a polícia por medo” (escala likert, concorda totalmente – discorda totalmente).
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7
No caso, a correlação entre o fator derivado da análise fatorial confirmatória e um índice aditivo foi estimada em r=0.9.
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8
Evidentemente, essa medida de um item não representa o construto psicológico “confiança na polícia”, conforme buscamos extensamente argumentar. Nosso objetivo com essa análise não consiste em validar a mensuração do construto “legitimidade” a partir de sua correlação com o construto “confiança”, afinal um outro modelo de mensuração seria necessário para isso. Nosso objetivo aqui consiste exclusivamente em demonstrar como os escores da variável latente “legitimidade policial” aumentam conforme os respondentes do survey respondem mais positivamente à pergunta a respeito de sua confiança na polícia.
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9
A relação de questões utilizadas pode ser encontrada no Apêndice 1.
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10
Para uma discussão substantiva a respeito do teste da teoria da justeza procedimental em São Paulo, ver Oliveira et al. (2017).
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11
Para uma discussão mais substantiva dos resultados do teste da hipótese da justeza procedimental com dados similares, ver Oliveira et al. (2017).
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Este artigo foi realizado como parte projeto do Centro de Pesquisa, Ensino e Difusão da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Cepid-Fapesp 2013-07923-7) “Building Democracy Daily: Human Rights, Violence and Institutional Trust”, desenvolvido no Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP). Agradecemos ao apoio da Fapesp para a realização deste trabalho. Também agradecemos a colegas do NEV-USP por sua atenciosa leitura de versões preliminares deste artigo, em especial à pesquisadora Ariadne Natal. Finalmente, agradecemos aos pareceristas anônimos da RBCS pelos valiosos e enriquecedores comentários.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
18 Fev 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
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Recebido
16 Ago 2017 -
Aceito
21 Ago 2018