RESUMO
A Educação Permanente em Saúde, contemplada pelo Ministério da Saúde como política institucional, constitui um dos pilares de estratégico potencial de transformação dos processos no Sistema Único de Saúde. Este estudo transversal e descritivo obteve um painel brasileiro da Educação Permanente em Saúde, a partir de dados secundários do Ministério da Saúde, extraídos do censo de avaliação externa do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica no 2º Ciclo (2013), realizado com Equipes de Saúde da Família com adesão ao Programa no período (n=10.213/100%); 90% (n=9.184) das equipes afirmaram participar de atividades de Educação Permanente em Saúde, com maiores frequências das regiões Sudeste, Nordeste e Sul. As principais atividades de Educação Permanente em Saúde relatadas foram seminários, mostras, oficinas e grupos de discussão (n=8.243/80,71%), além de cursos presenciais (n=7.808/76,45%). Das opções ofertadas pelo Ministério da Saúde, a menos frequente foi a Rede Universitária de Telemedicina (n=475/4,65%); 87,62% (8.948) Equipes de Saúde da Família tiveram suas demandas de Educação Permanente em Saúde atendidas pela gestão. O instrumento apresenta robustez de dados e contempla diversos aspectos da gestão, incluindo elementos importantes de Educação Permanente em Saúde que podem nortear a tomada de decisão e interferir em políticas e programas próprios nos serviços.
PALAVRAS-CHAVE
Sistema Único de Saúde; Educação continuada; Avaliação em saúde
ABSTRACT
The Permanent Health Education, contemplated by the Ministry of Health as an institutional policy, is one of the pillars of strategic potential for the transformation of the processes in the Unified Health System. This cross-sectional and descriptive study investigated the Brazilian panorama of Permanent Health Education, from secondary data of the Ministry of Health, extracted from the external evaluation census of the National Program for Improving Access and Quality of Primary Care in the 2nd Cycle (2013), carried out with Family Health Teams, with adherence to the Program in the period (n=10.213/100%); 90% (n=9.184) of the teams responded to participate in Permanent Health Education activities, with greater frequency in the Southeast, Northeast and South regions; the main Permanent Health Education activities reported were seminars, shows, workshops and discussion groups (n=8.243/80.71%) in addition to presential courses (n=7.808/76.45%). Of the options offered by the Ministry of Health, the least frequent was the Telemedicine University Network (n=475/4.65%); 87.62% (8.948). Family Health Teams had their Permanent Health Education demands met by management. The instrument presents data robustness and contemplates several aspects of management, including important elements of Permanent Health Education that can guide decision making and interfere with their own policies and programs in the services.
KEYWORDS
Unified Health System; Continuing education; Health evaluation
Introdução
A Educação Permanente em Saúde (EPS) é definida pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) como um processo dinâmico de ensino e aprendizagem, ativo e contínuo, com a finalidade de análise e melhoramento da capacitação de pessoas e grupos, frente à evolução tecnológica, às necessidades sociais e aos objetivos e metas institucionais. A expansão do sistema de saúde brasileiro, iniciada na década de 1970, e a consequente necessidade de desenvolvimento de recursos humanos para o setor levaram ao surgimento de diversos programas de formação, que buscaram construir modelos político-pedagógicos comprometidos com a promoção do diálogo entre educação e formação de serviços de saúde11 Gigante RL, Campos GWS. Política de formação e educação permanente em saúde no Brasil: bases legais e referências teóricas. Trab. Educ. Saúde [internet]. 2016 [acesso em 2019 abr 10]; 14(3)747-763. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S198177462016000300747&lng=en&nrm=iso.
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Nesse sentido, o Sistema Único de Saúde (SUS), em um contexto mais específico da Atenção Básica (AB), por seu tamanho e abrangência, está presente na arena dos processos formativos no setor saúde como um lugar privilegiado de ensino e aprendizagem, especialmente em locais onde a assistência à saúde é prestada. Educar ‘pelo’ e ‘para’ o trabalho compreendem a assunção da EPS: onde há produção do cuidado visando à integração, à responsabilidade compartilhada e à resolução de problemas existe simultaneamente o cenário da produção pedagógica, pois é ali que se concentram os encontros entre trabalhadores e usuários22 Peixoto LS, Cortez EA, Cavalcanti ACD, et al. Educação Permanente, continuada e em serviço: desvendando seus conceitos. Rev. Enfermeria Global [internet]. 2013 [acesso em 2019 maio 11]; 12(1):307-323. Disponível em: http://scielo.isciii.es/pdf/eg/v12n29/pt_revision1.pdf.
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3 Franco TB. Produção do cuidado e produção pedagógica: integração de cenários do sistema de saúde no Brasil. Interface (Botucatu) [internet]. 2007 [acesso em 2019 jan 9]; 11(23):427-438. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141432832007000300003&lng=en.
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-44 Merhy EE. Educação Permanente em Saúde em movimento. [internet] 2014. [acesso em 2019 jan 10]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=o-nApG0Wgks/.
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De acordo com Ceccim55 Ceccim RB. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário. Interface - Comunic. Saúde, Educ. [internet]. 2005 [acesso em 2019 jan 20]; 9(16):161-178. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v9n16/v9n16a13.pdf.
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(161):
A identificação Educação Permanente em Saúde está carregando, então, a definição pedagógica para o processo educativo que coloca o cotidiano do trabalho – ou da formação – em saúde em análise, que se permeabiliza pelas relações concretas que operam realidades e que possibilita construir espaços coletivos para a reflexão e avaliação de sentido dos atos produzidos no cotidiano. A Educação Permanente em Saúde, ao mesmo tempo em que disputa pela atualização cotidiana das práticas, segundo os mais recentes aportes teóricos, metodológicos, científicos e tecnológicos disponíveis, insere-se em uma necessária construção de relações e processos, que vão do interior das equipes em atuação conjunta – implicando seus agentes –, às práticas organizacionais – implicando a instituição e/ou o setor da saúde –, e às práticas interinstitucionais e/ou intersetoriais – implicando as políticas nas quais se inscrevem os atos de saúde.
Dessa forma, é evidente a disputa no cenário político das esferas governamentais por propostas educativas ascendentes, indutoras de mudanças nos serviços de saúde e que levem em consideração a micropolítica dos contextos locais. A complexidade do trabalho em saúde e o excesso de atribuições dos diversos profissionais da AB não podem ser aprendidos por meio de formações pontuais66 Queiroz DM, Silva MRF, Oliveira LC. Educação Permanente com Agentes Comunitários de Saúde: potencialidades de uma formação norteada pelo referencial da Educação Popular e Saúde. Interface (Botucatu) [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 10]; 18(supl2):1199-1210. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v18s2/1807-5762-icse-18-s2-1199.pdf.
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A Educação Permanente (EP) promove e produz sentidos (daí, a incorporação dos conceitos de aprendizagem significativa e problematização): uma ressignifica o cotidiano do agir formativo em saúde; a outra compreende que a aprendizagem ocorre no processo ação-reflexão-ação, caracterizada pelo compromisso e autoimplicação dos atores envolvidos77 Ceccim RB, Feuerwerker LCM. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Physis [internet]. 2004 [acesso em 2019 set 9]; 14(1):41-65. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/physis/v14n1/v14n1a04.pdf.
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Além disso, busca a valorização do trabalho e do trabalhador, a participação dos profissionais no processo ensino-aprendizagem e nas transformações compreendidas no mundo do trabalho88 Barth P, Aires M, Santos JL, Ramos F. Educação permanente em saúde: concepções e práticas de enfermeiros de unidades básicas de saúde. REE [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 10]; 16(3):604-11. Disponível em: https://revistas.ufg.br/fen/article/view/22020.
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Constitui estratégia indispensável e necessária para a transformação da realidade da AB, na reinvenção do trabalho e consequente mudança de práticas99 Bomfim E, Oliveira B, Rosa R, et al. Educação permanente no cotidiano das equipes de saúde da família: utopia, intenção ou realidade? Fund. Care Online [internet]. 2017 [acesso em 2019 set 10]; 9(2):526-535. Disponível em: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/5464/pdf.
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. Portanto, faz-se necessária a adoção de instrumentos que permitam a avaliação in loco dos dispositivos instituídos, participação e demandas de EPS, de modo a fornecer os subsídios para processos decisórios, o financiamento e a formulação de políticas amparadas pelos princípios e diretrizes do SUS.
A EPS contribui para a melhoria da formação profissional e favorece o fortalecimento do SUS, bem como assegura o desenvolvimento de trabalhadores e instituições de saúde, qualificando a gestão dos sistemas e serviços1010 Ricaldoni CAC, Sena RR. Educação permanente: uma ferramenta para pensar e agir no trabalho de enfermagem. Rev. Latino-Am. Enfermagem [internet]. 2006 [acesso em 2019 set 10]; 14(6):837-842. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010411692006000600002&lng=en.
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O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) foi criado em 19 de julho de 2011, através da Portaria nº 1.654 Gabinete do Ministro/Ministério da Saúde (MS), como resultado de um processo de negociação e pactuação das três esferas do SUS, em debates que formularam soluções para a criação de um programa que permitisse a ampliação do acesso e da melhoria da qualidade da AB em todo o País1111 Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica. Manual Instrutivo: Saúde Mais Perto de Você - Acesso e Qualidade. Brasília, DF: MS, 2011..
Diante dos inúmeros desafios colocados pela realidade, o PMAQ-AB propõe como modelo de avaliação de desempenho dos sistemas de saúde a indução de diversas iniciativas para a garantia de um padrão de qualidade em nível nacional, regional e local. Entre seus objetivos específicos, destacam-se:
IV – Promover a qualidade e inovação na gestão da AB, fortalecendo os processos de autoavaliação, monitoramento e avaliação, apoio institucional e ‘educação permanente nas três esferas de governo’1111 Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica. Manual Instrutivo: Saúde Mais Perto de Você - Acesso e Qualidade. Brasília, DF: MS, 2011.(8).
O PMAQ-AB é um avanço do MS, que busca o estabelecimento da cultura de avaliação no País e necessita de qualificação e articulação, com planejamento e formulação de políticas em consonância com os processos decisórios dos atores envolvidos1212 Felisberto E, Albuquerque LC, Albuquerque AC. Avaliação na Estratégia Saúde da Família: os sentidos da institucionalização dessa prática. In: Sousa MF, Franco MS, Mendonça AVM, organizadores. Saúde da família nos municípios brasileiros: os reflexos dos 20 anos no espelho do futuro. Campinas: Saberes, 2014. p. 811-843..
É composto por três fases, em um ciclo contínuo de melhoria do acesso e da qualidade das equipes: Fase 1: Adesão e contratualização; Fase 2: Certificação (na qual está a avaliação externa); e Fase 3: Recontratualização. Além destas, compõe-no um conjunto de ações desenvolvidas durante todo o ciclo, chamado de Eixo Estratégico Transversal de Desenvolvimento, composto por cinco pilares: autoavaliação; apoio institucional; monitoramento de indicadores de saúde; EP e cooperação horizontal1313 Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ): Manual Instrutivo 3º Ciclo (2015-2016) [internet]. Brasília, DF: MS: 2015. [acesso em 2019 dez 20]. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/documentos/Manual_Instrutivo_3_Ciclo_PMAQ.pdf.
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O programa é permeado pela lógica da EPS em todas as suas fases, desde a adesão das equipes até a recontratualização. Há um espaço privilegiado de produção coletiva de iniciativas para o trabalho, e a possibilidade de desenvolvimento articulado dos diversos atores da AB com vistas à ampliação da resolutividade e do acesso no território. Aqui, a relação dialética (educação e trabalho) se evidencia com a aprendizagem significativa e a permeabilidade à realidade do território onde as equipes agem para a promoção de mudanças e não apenas para o cumprimento de metas e indicadores.
A avaliação e a prática da EPS passam a percorrer o mesmo caminho, pois a pactuação dos indicadores exigirá a reinvenção e a reformulação dos processos de trabalho e funcionamento do serviço:
Esse é o momento para que as equipes a serem avaliadas pelo PMAQ-AB demandem, proponham e desenvolvam ações de educação permanente combinadas com as necessidades e ofertas de acordo com o momento e com o contexto dessas equipes, atribuindo maior sentido, valor e efetividade. [...]. Essa capacidade de repensar e refletir sobre o cotidiano laboral na Atenção Básica é o prelúdio da EPS acontecendo na primeira fase do PMAQ-AB1414 Ribeiro DT, Nascimento DT, Cunha FM, et al. O PMAQ-AB como umas das estratégias de estímulo à Prática da Educação Permanente em Saúde. In: Gomes LB, Barbosa MG, Ferla AA, organizadores. A Educação Permanente em Saúde e as Redes Colaborativas (Conexões para a produção de saberes e práticas). Porto Alegre: Rede Unida; 2016. p. 129-141.(135).
Além do exposto, os dados obtidos no censo de avaliação externa com as Equipes de Atenção Básica (eAB) na fase de certificação podem fornecer importantes subsídios para gestores, pesquisadores e formuladores de políticas públicas em nível local, regional e nacional.
Objetivos
Obter um painel brasileiro de participação, dispositivos e atendimento a demandas de EPS das Equipes de Saúde da Família (EqSF) na AB, a partir da análise dos dados secundários do MS, extraídos do censo de avaliação externa do PMAQ-AB no 2º Ciclo (2013).
Material e métodos
Trata-se de um estudo transversal descritivo, com a análise de dados secundários obtidos no 2º Ciclo do PMAQ-AB. Foram avaliadas as respostas obtidas no censo de avaliação externa das EqSF, no 2º Ciclo (2013), utilizando as variáveis do instrumento de avaliação externa relacionadas à EPS no módulo II – Entrevista com o profissional de saúde na unidade de saúde, conforme o quadro 1. As variáveis selecionadas foram coletadas por pesquisadores/professores das universidades/institutos de ensino e pesquisa na etapa de avaliação externa (módulo II – Entrevista com o profissional da eAB) no Ciclo 2 do PMAQ-AB. Utilizam-se os seguintes critérios de inclusão: EqSF com adesão ao PMAQ-AB e participação no censo de avaliação externa do MS (n=10.213/100%). Foram excluídas (364/3,44%) equipes pelo fato de não terem recebido os censores do MS à época de avaliação. Os dados, de acesso livre e disponíveis em http://aps.saude.gov.br/ape/pmaq/ciclo2/ foram tratados de acordo com a frequência simples e o percentual de distribuição das variáveis. Foram utilizados filtros e tabelas dinâmicas em Microsoft Excel®, cruzando os dados obtidos a partir das variáveis selecionadas. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, mediante o parecer consubstanciado no 2.943.879, de 05 de outubro de 2018.
Resultados
Foram utilizados dados secundários coletados no 2º Ciclo do PMAQ-AB na fase de avaliação externa, no ano de 2013. Os dados foram coletados por pesquisadores vinculados às universidades pertencentes à rede de pesquisa do PMAQ-AB. Neste estudo, foram consideradas as EqSF, sendo a amostra de n=10.213. Na primeira questão selecionada (ES-II.7.1), se a equipe participa de ações de EP organizadas pela gestão municipal, obteve-se o seguinte panorama nacional:
Nesse censo, 90% das equipes (n=9.184) entrevistadas responderam afirmativamente sobre a participação em atividades de EP. Cerca de 10% (n=991) responderam que não participavam de ações de EP e 38 (0,37%) equipes não souberam ou não responderam.
Analisando os dados por região, pode-se observar que a Sudeste (n=3.949/43% das EqSF entrevistadas), a Nordeste (n=2.112/23% da amostra) e a Sul (n=1.561/17% do total) foram as que mais responderam de forma afirmativa sobre a participação em ações de EP. O número de EqSF nessas regiões com adesão ao PMAQ-AB é maior do que nas outras entrevistadas no período da coleta.
As equipes que responderam de forma negativa às ações de EP foram (n=991/9,7%), e a frequência se repetiu.
A segunda questão selecionada (G-II.7.2) buscou identificar de quais ações de EP as EqSF participaram. De acordo com os dados coletados, em síntese, na tabela 1, pode-se concluir que, no panorama brasileiro, a participação em ações de EP, das EqSF, se materializou principalmente através de seminários, mostras, oficinas e grupos de discussão (n=8.243/80,71%), além de cursos presenciais (n=7808/76,45%). Das opções ofertadas pelo MS, a menos frequente foi a Rede Universitária de Telemedicina (Rute) (n= 475/1,32%). Algumas equipes informaram não participar de nenhuma ação de EP (n=577/1,61%). Na região Sudeste, que contemplou a maior parte da amostragem, foi observado também que muitas equipes responderam utilizar recursos como troca de experiência (3.033/16,42%), cursos de educação a distância (2.310/12,5%), Telessaúde (1.754/9,49%) e Universidade Aberta do SUS (Unasus) (1.261/6,83%) como recursos de EPS.
A terceira questão (G-II.7.10) buscou investigar se as demandas e necessidades de EP das EqSF eram contempladas, ou seja, se as ofertas de ações formativas oferecidas pela gestão consideravam a real necessidade dos trabalhadores da AB. De forma geral, pode-se afirmar que as necessidades formativas da maior parcela dos trabalhadores foram atendidas pela gestão.
Discussão
O PMAQ-AB surge em consonância com os direitos duramente conquistados nos movimentos de Reforma Sanitária e com o enorme significado do SUS e, particularmente, da AB, ordenadora do cuidado e coordenadora das redes de atenção em saúde: um enorme mapa humano de três dimensões em transformação, esta que se define como conceito-chave para a materialização da EPS nos processos de trabalho, nas práticas, na produção de novos conhecimentos e no protagonismo de todos os atores envolvidos no sistema de saúde (trabalhadores, gestores e usuários).
Os dados aqui descritos revelam um panorama nacional e por região das ofertas de EP, da participação das EqSF nessas atividades e da opinião destas equipes sobre a contemplação de suas necessidades formativas. Uma avaliação desse 2º Ciclo revela que 90% das equipes afirmaram participar de alguma atividade de EP, o que demonstra uma ampliação, se comparada aos dados tratados por pesquisadores do MS em 20121515 Pinto HA, Ferla AA, Ceccim RB, et al. Atenção Básica e Educação Permanente em Saúde: cenário apontado pelo Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB). Divulg. saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 9]; (51):145-160. Disponível em: http://cebes.org.br/site/wp-content/uploads/2014/12/Divulgacao-51.pdf.
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Da mesma forma, a adesão e participação das equipes nas regiões Sudeste, Nordeste e Sul em atividades de EP promovidas pela gestão se revelou maior do que nas outras pesquisadas. É importante salientar que a destinação dos recursos financeiros liberados pelo MS (ou Fundo Nacional de Saúde) às EqSF é de responsabilidade da gestão municipal, que decide onde serão alocados os incentivos financeiros.
Outro fator que deve ser considerado é a descontinuidade do desenvolvimento de melhorias nos processos de trabalho, ocorridos com inúmeras substituições dos gestores e dos trabalhadores em saúde, promovendo rupturas nas ações de qualificação do serviço1616 Flôres GMS, Weigelt LD, Rezende MS, et al. Gestão pública no SUS: considerações acerca do PMAQ-AB. Saúde debate [internet]. 2018 [acesso em 2019 set 9]; 42(116):237-247. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042018000100237&lng=pt.
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. Alguns estudos demonstram a necessidade de melhor estruturação das ações da gestão com vistas à implementação de mudanças em programas municipais e estaduais de EP1717 Barbosa MR. Análise do 1 Ciclo do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ AB) em um município de médio porte [dissertação] [internet]. Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora; 2014. 105 p. [acesso em 2019 set 11]. Disponível em: http://www.ufjf.br/pgsaudecoletiva/files/2014/02/Disserta%C3%A7%C3%A3o-Milena-Rocha-Barbosa.pdf.
18 Rizzotto MLF, Gil CRR, Carvalho M, et al. Força de trabalho e gestão do trabalho em saúde: revelações da Avaliação Externa do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica no Paraná. Saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 8]; 38(esp):237-251. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042014000600237&lng=en.
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-1919 Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, et al. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 8]; 38(esp):94-108. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042014000600094&lng=en.
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O PMAQ-AB procura também integrar as ofertas de atividades de EPS e apoiar os processos de qualificação intraequipes através das mudanças ocorridas no programa. Os dados tratados mostram que a participação das EqSF em ações de EP ocorrem principalmente através de seminários, mostras, oficinas e grupos de discussão (n=8.243/80,71%). O protagonismo dos trabalhadores da saúde nas ações formativas e educativas se evidencia através das tecnologias leves e leves-duras2020 Merhy EE, Chakkour M, Stéfano E, et al. Em busca de ferramentas analisadoras das tecnologias em saúde: a informação e o dia a dia de um serviço, interrogando e gerindo trabalho em saúde. In: Merhy EE, Onocko R, organizadores. Agir em saúde: um desafio para o público. São Paulo: Hucitec; 2006. p. 113-150. utilizadas no cotidiano do trabalho na AB. As reuniões de equipe, a construção de projetos terapêuticos, grupos educativos, interconsultas, oficinas e o matriciamento, entre outros recursos, denotam a troca de saberes e a dinâmica de uma enorme riqueza para a produção de cuidado e conhecimento no âmbito do SUS.
Na atual conjuntura política, devem ser consideradas as inúmeras dificuldades enfrentadas em um contexto de subfinanciamento histórico do sistema, de rupturas e descontinuidades de alguns programas e de uma onda de retrocessos promovida pelo abissal congelamento dos gastos em saúde e pela austeridade fiscal. Além disto2121 França T, Pierantoni C, Belisario AS, et al. A capilaridade da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde no Brasil. Atas-Investig. Qualit. Saúde [internet]. 2016 [acesso em 2019 set 10]; (2):66-75. Disponível em: https://proceedings.ciaiq.org/index.php/ciaiq2016/article/view/738/725.
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, outros fatores, tais como a opção de alguns gestores que privilegiam a produção (metas) em detrimento da inclusão de profissionais de saúde em iniciativas de formação e EP, e a precariedade de infraestrutura (espaço, computadores, internet e dispositivos móveis) impõem às equipes a criação de estratégias contingentes para reinvenção do trabalho e da própria realidade. Assim, em uma realidade complexa e multifacetada, se reconhece a necessidade de maiores investimentos e qualificação do trabalhador da AB.
A oferta de cursos presenciais foi a segunda resposta mais frequente (n=7.808/21,74%), demonstrando que a prática formativa hegemônica2222 Almeida Filho NM. Contextos, impasses e desafios na formação de trabalhadores em Saúde Coletiva no Brasil. Ciênc. Saúde Colet . [internet]. 2013 [acesso em 2019 ago 20]; 18(6):1677-1682. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381232013000600019&lng=en.
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(da formação pontual, transmissiva e de caráter transitório) ainda não foi rompida e que, dada a sua complexidade, a EP necessita de um aprofundamento, assim como a compreensão do seu significado para gestores e trabalhadores de saúde.
Algumas equipes informaram não participar de nenhuma ação de EP (n=577/1,61%), o que revelou um dado preocupante sob vários aspectos, que necessitam de mais clareza: podem advir da falta de compreensão sobre o significado de EPS, da ausência de ofertas pela gestão, da sobrecarga de trabalho e/ou do desinteresse dos trabalhadores/gestores, o que demanda uma aproximação com a realidade dessas equipes.
A terceira questão buscou investigar se as demandas e necessidades de EP das EqSF foram contempladas, ou seja, se as ofertas de ações formativas oferecidas pela gestão consideraram a necessidade dos trabalhadores da AB. A participação ativa e o protagonismo dos trabalhadores da AB nos processos decisórios é um pressuposto da EPS e os dados coletados mostraram que a maior parte das equipes (n=8.949/87,62%) respondeu que teve suas necessidades atendidas pela gestão.
Rizzotto et al.1818 Rizzotto MLF, Gil CRR, Carvalho M, et al. Força de trabalho e gestão do trabalho em saúde: revelações da Avaliação Externa do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica no Paraná. Saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 8]; 38(esp):237-251. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042014000600237&lng=en.
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, analisando dados da gestão do trabalho e EPS no estado do Paraná, revelam que, apesar de 80,4% dos entrevistados afirmarem existir ações de EP, apenas 58,1% dos trabalhadores afirmavam que as ações de atendiam às demandas da equipe, revelando uma contradição com o pressuposto da EP, que deve surgir com a plena demanda e participação dos trabalhadores. Comparando-se a afirmação dos autores com os dados do 2º Ciclo naquele estado, verifica-se uma evolução na relação entre as demandas dos trabalhadores e gestão, pois 85% (n=535) das equipes afirmaram participar de ações de EPS e apenas 2,99% (n=16) equipes não tiveram suas necessidades formativas contempladas.
No Mato Grosso do Sul, um estudo2323 Machado JFFP, Carli AD, Kodjaoglanian VL, et al. Educação Permanente no cotidiano da Atenção Básica no Mato Grosso do Sul. Saúde debate [internet]. 2015 [acesso em 2019 ago 19]; 39(104):102-113. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042015000100102&lng=en.
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sobre as ações de EPS demonstrou uma posição privilegiada da capital sobre os municípios do interior e constatou a necessidade de se debruçar sobre os problemas inerentes à política de EPS. Após avaliação das respostas das equipes participantes, não se pode afirmar se houve mudanças significativas nos processos durante o período, pois a amostra avaliada no estudo não apresenta EqSF (n=27) aderentes ao PMAQ-AB na capital.
A despeito da quantidade de dados sobre EP colhidos em um processo avaliativo pioneiro e inovador2424 Pinto HA, Sousa ANA, Ferla AA. O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica: várias faces de uma política inovadora. Saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 7]; 38(esp):358-372. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042014000600358&lng=en.
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,2525 Pinto HA, Sousa A. O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica: Reflexões sobre o seu desenho e processo de implantação. RECIIS [internet]. 2012 [acesso em 2019 set 10]; 6(2):1-19. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/492/1142.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
, o instrumento utilizado para o estabelecimento de políticas e processos decisórios da gestão demonstra uma modesta apropriação do significado de EP, o que deve ser objeto de novos estudos com abordagem metodológica qualitativa nos municípios onde há adesão ao programa. Diversos trabalhos convergem para a relevância de investimentos que fortaleçam a participação e o comprometimento de forma articulada com os interesses e necessidades dos trabalhadores do SUS1515 Pinto HA, Ferla AA, Ceccim RB, et al. Atenção Básica e Educação Permanente em Saúde: cenário apontado pelo Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB). Divulg. saúde debate [internet]. 2014 [acesso em 2019 set 9]; (51):145-160. Disponível em: http://cebes.org.br/site/wp-content/uploads/2014/12/Divulgacao-51.pdf.
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16 Flôres GMS, Weigelt LD, Rezende MS, et al. Gestão pública no SUS: considerações acerca do PMAQ-AB. Saúde debate [internet]. 2018 [acesso em 2019 set 9]; 42(116):237-247. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010311042018000100237&lng=pt.
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http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
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.
Considerações finais
Através das variáveis selecionadas do instrumento de avaliação externa, pôde-se identificar que o Programa investigou os processos formativos de forma macropolítica quando foram consideradas as grandes regiões geopolíticas brasileiras, e de forma micropolítica quando se debruçou sobre o lócus intraequipes nas Unidades Básicas de Saúde. De forma geral, obteve-se um painel da EPS, em que quase a totalidade das equipes aderentes ao PMAQ-AB afirmou participar de ações de EP, tendo suas necessidades formativas contempladas pela gestão. O instrumento apresenta robustez de dados e contempla diversos aspectos da gestão, incluindo elementos importantes de EPS que podem nortear a tomada de decisão e interferir em políticas e programas de EPS nos serviços. Dada a posição privilegiada da EP, particularmente no SUS, recomendam-se maiores investimentos em pesquisas educacionais, que considerem outras variáveis não inclusas devido aos limites e à aplicabilidade do instrumento.
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Suporte financeiro: não houve
Referências
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
08 Maio 2020 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 2020
Histórico
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Recebido
29 Abr 2019 -
Aceito
13 Set 2019