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Saúde Socioambiental na Atenção Básica: conhecimento, formação e prática

RESUMO

A exposição humana às substâncias e aos compostos químicos nocivos é uma realidade global que torna cada vez mais necessária a promoção da saúde às pessoas e comunidades expostas em seus territórios. Considerando que a Saúde Socioambiental observa o movimento dos agentes nocivos na interface ambiente-saúde-sociedade, buscou-se analisar o conhecimento, a formação e a prática das equipes da Atenção Básica com relação à Saúde Socioambiental, com foco na redução do adoecimento devido à exposição e à intoxicação por esses agentes. Utilizou-se a escala do tipo Likert sem ponto central validada por um grupo de 11 especialistas e 3 profissionais da Atenção Básica. Garantiu-se a existência de mínima dispersão com a administração do estudo e o cálculo do coeficiente de correção linear de Pearson; e boa confiabilidade por meio do teste de coeficiente de confiabilidade de Spearman-Brown, em que foi usado o Split-Half Method. A pesquisa revelou haver situação de conforto na dimensão conhecimento, perigo na dimensão formação, e atenção na dimensão prática. A formação é a única dimensão que, no resultado geral, demanda mudanças imediatas. Ainda que as dimensões conhecimento e prática profissional se apresentem, respectivamente, em situação de manutenção e aprimoramento, essas não se originam de instituições formais de ensino.

PALAVRAS-CHAVE
Meio ambiente; Exposição ambiental; Atenção Primária à; Saúde; Substâncias perigosas

ABSTRACT

Human exposure to harmful chemical substances and compounds is a global reality that makes health promotion increasingly necessary for the people and communities exposed in their area. Considering that socio-environmental health observes the movement of pollutants at the environment-health-society interface, an attempt was made to analyze the knowledge, training, and practice of primary care teams in relation to socio-environmental health, focusing on the reduction of diseases due to exposure and poisoning by these substances. A Likert-type scale without a central point was used, validated by a group of 11 specialists and 3 primary care professionals. Minimal dispersion was ensured by the application of the survey and the calculation of Pearson’s linear correction coefficient and reliability was assessed by the Spearman-Brown’s reliability coefficient, using the split-half method. The survey showed that the knowledge dimension was generally classified as in a safe situation, the training dimension as in a danger situation, and the practical dimension as in an alert situation. Training was the only dimension that required immediate change in the overall results. Although the knowledge and professional practice dimensions were in a situation of maintenance and improvement, respectively, they are not acquired in formal educational institutions.

KEYWORDS
Environment; Environmental exposure; Primary Health Care; Hazardous substances

Introdução

A Saúde Socioambiental (SSA) se expressa a partir do tensionamento de aspetos ambientais, sociais e econômicos, expondo relações e condições do ambiente, da saúde e da sociedade que são determinantes no processo saúde-doença. Nesse sentido, o meio ambiente é entendido como um determinante social importante nesse processo, que, em condições inapropriadas, atinge pessoas e populações. Buscam-se, por meio de processos educativos, preventivos, assistenciais curativos, sociais, aproximações para a atenção integral, incluindo a SSA, na perspectiva da sua promoção11 Ferretti N. Saúde socioambiental e conselho local de saúde: um estudo no âmbito da Estratégia Saúde da Família no município do Rio Grande/RS. [dissertação]. Rio Grande: Universidade Federal do Rio Grande; 2009. 122 p. [acesso em 2021 out 5]. Disponível em: http://repositorio.furg.br/bitstream/handle/1/2402/nadia%20ferretti.pdf?sequence=1.
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,22 Castelo Branco J. Convenção de Estocolmo Sobre Poluentes Orgânicos Persistentes: Impactos Ambientais, Sociais e Econômicos Associados. [dissertação]. Diadema: Universidade Federal de São Paulo; 2016. [acesso em 2021 out 6]. Disponível em: https://repositorio.unifesp.br/handle/11600/46547.
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Substâncias químicas e seus compostos naturais podem gerar condições ambientais adversas e atingir os reinos vegetal, animal e mineral, podendo ser nocivas aos seres humanos. Da mesma forma, diversas substâncias sintetizadas pelo homem para as mais diversas finalidades podem ser nocivas e estar presentes em produtos alimentícios, de higiene, limpeza, vestuário, produtos farmacêuticos, que podem estar larga e globalmente presentes nos territórios, com taxas de contaminantes igualmente nocivos para o homem33 Organização Mundial da Saúde. Substâncias químicas perigosas à saúde e ao ambiente. Programa Internacional de Segurança Química. São Paulo: Cultura Acadêmica; 2008. [acesso em 2021 out 11]. Disponível em: https://www2.unesp.br/Home/costsa_ses/20110610_084213.PDF.
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Neste trabalho, focou-se a atenção na exposição humana às substâncias e aos compostos químicos nocivos, como a poluição em áreas contaminadas ou o uso e consumo de produtos e alimentos com teores elevados de agentes perigosos, em que se entende a necessidade de maior compreensão ecossistêmica, considerando a tríade ambiente-saúde-sociedade44 Augusto SGL. Inter-relações entre a Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador e a Atenção Básica de Saúde no SUS. In: Associação Brasileira de Saúde Coletiva. I Conferência Nacional de Saúde Ambiental. Rio de Janeiro: Abrasco; 2009. p. 105-108 [acesso em 2021 out 5]. Disponível em: http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_7832566.pdf.
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, sobretudo na atenção primária.

A SSA é um campo eminentemente interdisciplinar que demanda a integração de diferentes áreas do conhecimento para a sua compreensão. Da mesma forma, a SSA constitui um campo de pensamento e atuação interprofissional, uma vez que demanda a atenção das diferentes áreas profissionais, especialmente da saúde. Pode-se observar que todo o espectro da exposição e o movimento dos agentes químicos perigosos no ambiente, no organismo animal e humano, e o movimento de pessoas e populações, uma vez atingidas, demandam uma abordagem também interdisciplinar e interprofissional. Para Radicchi e Lemos55 Radicchi ALA, Lemos AF. Saúde Ambiental. Belo Horizonte: Coopmed; 2009. [acesso em 2020 jul 11]. Disponível em: https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/3913.pdf.
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Também consensual é o reconhecimento da necessidade de se superarem os paradigmas monodisciplinares no tratamento do tema ambiental por meio de um sistemático esforço de construção de posturas interdisciplinares que signifiquem, efetivamente, interação e partilhamento, socialização de linguagens, conceitos, métodos, visão entre as ciências sociais e humanas e as ciências físicas e da vida e que devem tomar como ponto de partida a procura por referenciais e categorias filosóficas comuns coerentes.

O avanço nessa área vem desde a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, com os avanços no campo dos Direitos Humanos, aprofundados com a criação da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1948, e do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), em 1972. Outro ponto de avanço foi a realização de conferências internacionais em que se iniciaram formulações de convenções e tratados internacionais, e a criação de instâncias participativas, com mandato executivo para tratar da questão química, como a Intergovernmental Forum on Chemical Safety (IFCS) e a Strategic Approach to International Chemicals Management (SAICM).

Esses espaços e instrumentos legais, entre outras questões ambientais e de saúde, buscam o controle de mais de 160 milhões de produtos químicos, dos quais, cerca de 40 a 60 mil estão presentes no comércio mundial. Esse controle se faz necessário em função das estimativas da Organização Mundial da Saúde66 Organização Mundial da Saúde. Compendium of WHO and other UN guidance on health and environment. Geneva: WHO; 2022. [acesso em 2022 abr 11]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1416445/retrieve.
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, de que 24% das mortes são atribuíveis a riscos ambientais.

A OMS revela, ainda, que, aproximadamente, 7 milhões de mortes prematuras todos os anos por acidente vascular cerebral, cardiopatia isquêmica, doença pulmonar obstrutiva crônica, câncer do pulmão e infecções respiratórias agudas são devidas aos efeitos combinados da poluição do ar ambiente (exterior) e do ar interior (doméstico). Os elementos nocivos da poluição são as substâncias químicas livres ou adsorvidas no material particulado.

A despeito desses avanços no controle, as questões ambientais não são habitualmente curriculares na educação básica, sendo geralmente introduzidas de forma transversal77 Brasil. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica. Brasília, DF: Ministério da Educação; 2013. [acesso em 2021 out 10]. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=13448-diretrizes-curiculares-nacionais-2013-pdf&Itemid=30192.
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e nos cursos de graduação, que, na sua maioria, possuem um forte enfoque disciplinar88 Pereira KAB, Bittar M, Grigoli JAG. Transversalidade e a interdisciplinaridade em educação ambiental: uma reflexão dentro da escola. Campo Grande: Universidade Católica Dom Bosco; [2007]. [acesso em 2021 out 5]. Disponível em: https://docplayer.com.br/storage/26/7731151/1657204111/y6A3mzADgbc0IFeZYGaZyQ/7731151.pdf.
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. Isso pode ter relação com a pouca resolubilidade na complexa questão saúde-ambiente, sobretudo no que concerne à exposição humana aos agentes químicos nocivos presentes cotidianamente nos mais variados territórios e compartimentos ambientais.

Criadas em 1999, no âmbito da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), passando a ser geridas pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) em 2004, a Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental (CGVAM) e a Coordenação Geral de Saúde do Trabalhador (CGST), do Ministério da Saúde, desenvolveram diversas atividades afins no campo da saúde ambiental, resultando na primeira Conferência Nacional de Saúde Ambiental, no ano de 2009. Dessa experiência se vem buscando aprofundar os estudos para a melhoria da atenção às pessoas e populações atingidas pela exposição e intoxicação às substâncias e aos compostos químicos.

Tanto em âmbito nacional quanto internacional, políticas importantes vêm sendo desenvolvidas para a atenção às doenças de origem ambiental. É na atenção primária, no seu contato direto com o território, com os ambientes, que 80% dos problemas de saúde têm sido resolvidos99 Campos RTO, Ferrer AL, Gama CAP, et al. Avaliação da qualidade do acesso na atenção primária de uma grande cidade brasileira na perspectiva dos usuários. Saúde debate. 2014 [acesso em 2020 jul 27]; 38(esp):252-64. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/sdeb/v38nspe/0103-1104-sdeb-38-spe0252.pdf.
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No entanto, ainda não há políticas eficazes para redução e eliminação da exposição humana às substâncias e aos compostos químicos nocivos nesses territórios, bem como das mais variadas formas de contato. Da mesma forma, há carência de procedimentos específicos para diagnóstico e tratamento dos seus efeitos na saúde e para o cuidado social necessário às pessoas e populações atingidas. Entende-se que são necessárias ações mais complexas e efetivas de vigilância em saúde ambiental e socioassistencial para a promoção de uma mudança de paradigma com relação à exposição química humana.

Embora exista um centro de controle de intoxicações na região deste estudo, a Baixada Santista, no estado de São Paulo, esse é voltado para atendimento por telefone, com prestação de esclarecimentos à população que o procura e auxílio aos profissionais de saúde nos primeiros socorros, com prescrição do tratamento terapêutico adequado para cada tipo de substância tóxica1010 Brasil. Ministério da Saúde. Disque-intoxicação. Anvisa. 2020. [acesso em 2021 fev 12]. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/agrotoxicos/disque-intoxicacao.
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A Atenção Básica (AB), com a possibilidade de vínculo, aproximação, acolhimento, escuta e prática interprofissional esperada na atenção primária e na estratégia da saúde da família, pode desempenhar um papel ímpar na dinâmica socioambiental e psicossocial das comunidades, com uma abordagem em saúde integral mais qualificada, sobretudo com relação a uma segurança química na prática centrada na pessoa com vistas à promoção da saúde.

Tomando por base tais constatações e o conhecimento acumulado sobre os efeitos da exposição a agentes químicos nocivos à saúde humana, entende-se que pode ser aprimorada a atuação prática na atenção à saúde na perspectiva da SSA nos territórios, fazendo parte de uma vigilância em saúde mais ostensiva, a fim de controlar, reduzir e eliminar o adoecimento por essas causas. Radicchi e Lemos55 Radicchi ALA, Lemos AF. Saúde Ambiental. Belo Horizonte: Coopmed; 2009. [acesso em 2020 jul 11]. Disponível em: https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/3913.pdf.
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relembram que:

A atuação do setor saúde no ambiente depende de atuação intra e intersetorial baseada no conhecimento do assunto, o que não é nem um pouco simples, até mesmo pela interdisciplinaridade que é exigida para a sua caracterização. Não podemos esquecer também que o setor saúde, principalmente a equipe de Saúde da Família, baseada na sua atuação direta no território, tem um papel muito importante na identificação dessas situações de risco, de forma a promover essa atuação intra e intersetorial com vistas a eliminar ou reduzir os riscos destacados, como forma de promoção e prevenção da saúde dos grupos populacionais relacionados direta ou indiretamente com as adversidades ambientais percebidas.

Neste artigo, objetiva-se analisar o conhecimento, a formação e a prática das equipes da AB com relação à SSA, com foco na redução do adoecimento devido à exposição e à intoxicação por substâncias e compostos químicos nocivos. Parte-se da hipótese de que os profissionais da AB não possuem um conhecimento formal e sistematizado em SSA e não receberam uma formação específica sobre a temática. Consequentemente, a prática de atenção à SSA não acontece de maneira efetiva com vistas aos objetivos de promoção da saúde no SUS.

Metodologia

Uma pesquisa exploratória e descritiva, com abordagens qualitativa e quantitativa, permeou esta investigação, conduzida junto à AB e à Estratégia Saúde da Família (ESF) dos municípios de Santos, São Vicente e Cubatão, que, juntos, representam 50% da população da região metropolitana da Baixada Santista, SP (região que engloba nove municípios e comporta uma população total de 1.865.397 de habitantes)1111 Brasil. Ministério da Economia. Cidades Cubatão, Santos, São Vicente - SP, 2010, 2017, 2019. Brasília, DF: IBGE; [s.d.]. [acesso em 2019 nov 17]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/.
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Nos três municípios, foram visitadas 86 Unidades Básicas de Saúde, das quais, 3 são de serviços específicos odontológicos, em 79 localidades, contando com a participação de 869 profissionais (44,04% do efetivo informado). Desses, 42,58% foram agentes de saúde, 29,80% técnicos e 27,62% profissionais graduados1212 Brasil. Ministério da Saúde. e-Gestor AB. Brasília, DF: Ministério da Saúde; [s.d.]. [acesso em 2021 nov 20]. Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/.
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Busca-se compreender que conhecimentos os profissionais da AB possuem sobre a SSA, considerando os aspectos da exposição e da intoxicação química em seus territórios (ambiente, produtos, alimentos), tangenciando temas como: fontes, rotas e pontos de exposição, contato e vias de penetração; intoxicação crônica e a cronicidade das intoxicações; patologias decorrentes da exposição; repercussões dos consequentes danos sociais e econômicos desencadeados pelo processo de intoxicação; acesso e conhecimento sobre o conteúdo de Convenções Internacionais a respeito da temática.

Também foi investigado como esse conhecimento é aplicado na prática profissional, bem como a existência de políticas e procedimentos específicos para atuação em demanda de danos e doenças causadas pela exposição às substâncias, aos compostos e produtos químicos; as dificuldades técnicas e profissionais para identificar e encaminhar casos suspeitos; a investigação do processo de adoecimento dos usuários quanto à origem em sua ocupação profissional; a existência de conhecimento e acesso à rede de diagnóstico e monitoramento de populações em estado de vulnerabilidade e expostas às substâncias químicas.

Por fim, investigaram-se as disponibilidades técnicas e profissionais para identificar e encaminhar casos suspeitos ou confirmados; a realização de histórico espacial e temporal no processo de acompanhamento específico do caso e as possibilidades reais de cooperação entre os profissionais.

Para abordagem do público-alvo, foi adotada uma escala atitudinal do tipo Likert, um instrumento psicométrico de medição. Para a elaboração e aplicação dessa escala, bem como para a análise dos dados, adotou-se o organograma de Pasquali1313 Pasquali L. Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In: Pasquali L, organizador. Instrumentação psicológica: fundamentos e práticas. Porto Alegre: Artmed; 2010., que utiliza três procedimentos: Teórico, Experimental e Analítico.

A escala foi elaborada com quatro alternativas, não possuindo um ponto neutro (p. ex., não sei). A escolha da ausência do ponto neutro se deu para evitar o ‘viés da tendência central’, isto é, quando os respondentes, por fadiga ou para evitar se comprometerem com uma opinião, selecionam uma opção intermediária incontroversa1414 Achilleas Kostoulas. Applied Linguistics & Language Teacher Education. How to use Likert scales effectively. 2014 [acesso em 2020 jul 24]. Disponível em: https://achilleaskostoulas.com/2014/02/03/designing-better-questionnaires-using-likert-scales/.
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. Essa opção garantiu uma maior consistência interna da escala, bem como sua estabilidade e validade1515 Pasquali L. Teoria e Métodos de Medida em Ciência do Comportamento. Laboratório de Pesquisa em Avaliação e Medida, Instituto de Psicologia. Brasília, DF: UnB; INEP; 1996..

A sistematização da base teórica e os objetivos da pesquisa conduziram à identificação de três dimensões: conhecimento, formação e prática dos profissionais da AB, com a elaboração da escala a partir dos 12 critérios apresentados por Pasquali1515 Pasquali L. Teoria e Métodos de Medida em Ciência do Comportamento. Laboratório de Pesquisa em Avaliação e Medida, Instituto de Psicologia. Brasília, DF: UnB; INEP; 1996.,1616 Pasquali L. Princípios de Elaboração de Escalas. In: Gorenstein C, Wang Y-P, Hungerbühler I. Instrumentos de avaliação em saúde mental. Porto Alegre: Artmed; 2016., quais sejam: comportamento, objetividade e desejabilidade, simplicidade, clareza, relevância, precisão, amplitude, equilíbrio, variabilidade, modalidade, tipicidade e credibilidade.

Na elaboração das assertivas, atribuiu-se maior pontuação às respostas concordantes com o melhor conhecimento, formação e prática dos profissionais a respeito de SSA1717 Ritz MRC. Qualidade de vida no trabalho: construindo, medindo e validando uma pesquisa. [dissertação]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2000. 112 p. [acesso em 2020 maio 7]. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/296827867.pdf.
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. A escala foi validada por um grupo de 11 juízes, composto por profissionais de reconhecido saber na área, dois com pós-doutorado, seis com doutorado, dois com mestrado e um graduado. Desse grupo, sete são professores universitários, quatro graduados em medicina, dois em engenharia, um em direito e um em química (com licenciatura em história e geografia).

Os juízes analisaram as 30 assertivas inicialmente propostas e randomizadas da escala, selecionando as opções quanto à ‘dimensão’ a que pertencia, à ‘pertinência’ e à ‘clareza’. No formulário, ao final de cada assertiva com as opções, havia um espaço destinado à justificativa nos casos em que as respostas aos itens pertinência e clareza fossem inadequadas ou totalmente inadequadas.

Considerou-se que assertivas com índice de concordância ≥ a 70% seriam mantidas sem necessidade de ajustes; nas com índice < que 70%, o item seria mantido, fazendo-se as adequações propostas; e as assertivas com índice < que 40% seriam eliminadas.

Os juízes realizaram diversas contribuições à semântica das assertivas, melhorando significativamente o fator clareza e, por conseguinte, a qualidade do instrumento. Essas contribuições foram, também, determinantes para a inclusão de mais uma assertiva à escala final. Essa nova versão foi submetida à avaliação semântica realizada por um grupo de três juízes, um agente, um técnico e um profissional graduado de um dos serviços participantes, que apresentaram contribuições, resultando na substituição de duas palavras. Como resultado, obteve-se a versão final da escala (quadro 1).

Quadro 1
Escala tipo Likert, versão final randomizada

O instrumento foi disponibilizado a todos os profissionais da AB, objetivando atender a, no mínimo, 100 sujeitos por fator/dimensão, ou 10 sujeitos para cada item do instrumento, totalizando 310 participantes1313 Pasquali L. Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In: Pasquali L, organizador. Instrumentação psicológica: fundamentos e práticas. Porto Alegre: Artmed; 2010.. A coleta de dados teve início em julho e término em novembro de 2019, diretamente nas Unidades Básicas de Saúde, por meio de formulários impressos que continham 18 perguntas para a caracterização dos participantes e as 31 assertivas da escala.

Para assegurar a existência de mínima dispersão de respostas, foi utilizado o estudo e o cálculo do coeficiente de correção linear de Pearson, descartando-se as assertivas que obtiveram uma correção linear inferior a 0,30 na primeira administração e de 0,20 na segunda administração.

A confiabilidade da escala foi aferida por meio do teste de coeficiente de confiabilidade de Spearman-Brown, usando o Split-Half Method, em função de uma única aplicação do instrumento junto ao público-alvo. Para a validação das assertivas, foi utilizado o cálculo de correção linear de Pearson, atingindo um coeficiente de confiabilidade de 88% (0,84 para os agentes, 0,90 para os técnicos e 0,86 para os graduados).

As médias das dimensões e das assertivas individualmente foram classificadas em três níveis: ‘perigo’, para as assertivas com média entre 1 e 1,99, indicando situações que requeriam mudanças imediatas; ‘alerta’, para as assertivas com pontuação entre 2 e 2,99, com situações que indicavam aprimoramento; e ‘conforto’, para as assertivas com pontuação entre 3 e 4, situação que requeria apenas manutenção.

Aplicaram-se o teste de Kruskal-Wallis e, como suporte nessa tarefa, o software ‘AS’, que retorna com comparações múltiplas e controle da FWER (family-wise error rate): 0,05 pelo método de Bonferroni. Comparações múltiplas com controle de FWER, pelo método de Bonferroni, evitaram a probabilidade de cometerem-se erros do tipo I (rejeitar a hipótese zero, quando ela é verdadeira) ou do tipo II (aceitar a hipótese zero, quando ela é falsa).

Para as comparações entre os três grupos, foi aplicado o teste de Mann-Whitney com suporte do software ‘MTB’, um teste não paramétrico que testa a hipótese nula contra a alternativa e possibilita a realização do teste par-a-par da população (agente/técnico - agente/graduados - técnicos/graduados).

O presente trabalho seguiu os procedimentos éticos para sua consecução, sendo submetido ao Conselho de Ética da Unifesp, via plataforma Brasil, recebendo aprovação em 12/02/2019. Foi também submetido à aprovação das Secretarias de Saúde de Santos, São Vicente e Cubatão, sendo aprovado. Todos os participantes leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Obtiveram-se respostas de 869 profissionais da AB dos municípios investigados, que, após análise e eliminação das inconformidades (rasuras, respostas duplas, sem respostas), totalizaram uma população de 732 escalas preenchidas. Dessas, 77% dos agentes comunitários de saúde, 92% dos técnicos e 75% dos graduados se declararam do sexo feminino. Quanto à formação, 43% dos agentes e 70% dos técnicos possuíam nível superior; entre os graduados, 12% possuíam mestrado e 1% doutorado.

Entre os agentes, 62,70% declaram possuir nível técnico ou superior, 17,84% nível básico ou médio e 19,46% não responderam. Entre os técnicos, 78,60% se declararam da área de enfermagem, 19,84% da saúde bucal, 1,56% da área de farmácia. Entre os graduados, 19,67% se declararam da área da medicina, 42,26% da enfermagem, 24,27% da odontologia, 2,93% da farmácia, 1,67% da psicologia, 1,26% do serviço social, 0,84% da nutrição, 0,84% da fisioterapia, 0,84% da pedagogia e 5,44% de outras profissões.

Na análise conjunta das 31 assertivas, a dimensão conhecimento foi classificada em situação de conforto, com média de 3,05; a dimensão formação foi classificada em situação de perigo, com 1,97; e a dimensão prática foi classificada em situação de alerta, com uma média de 2,26 (gráfico 1). Ainda na análise conjunta das 31 assertivas, 19,35% encontram-se em situação de conforto; 40,38% em situação de alerta; e 32,27% em situação de perigo.

Gráfico 1
Classificação geral das dimensões - Municípios: São Vicente, Santos, Cubatão. SP/Brasil

Em análises mais detalhadas por dimensão, iniciando pelo conhecimento, observam-se cinco assertivas em situação de conforto, com pontuações médias de 3,74; 3,71; 3,74; 3,56; 3,78, uma assertiva em situação de alerta, com pontuação média de 2,42, e duas assertivas em situação de perigo, com pontuações médias de 1,92 e 1,53 (gráfico 2). Aplicou-se o teste de hipótese de Kruskal-Wallis, considerando-se as respostas dos três grupos de profissionais. O teste apresentou um qui-quadrado de 4,912128092, dois graus de liberdade e P-valor de 0,085771882, concluindo que as diferenças entre as medianas não são estatisticamente significativas. Os agentes, técnicos e graduados concordaram conjuntamente cinco vezes em situação de conforto, uma vez em situação de alerta e uma vez em situação de perigo; discordaram apenas uma vez em situação de perigo, mas com pontuações bem próximas aos limites.

Gráfico 2
Média geral por grupos de profissionais na dimensão conhecimento

A dimensão formação, em uma situação geral de perigo, não apresentou nenhuma assertiva em situação de conforto, quatro em situação de alerta, com pontuações médias de 2,56; 2,06; 2,01; 2,02, e quatro em situação de perigo, com pontuações médias de 1,86; 1,74; 1,66; 1,84 (gráfico 3). Pelo teste de hipótese de Kruskal-Wallis, considerando as respostas dos três grupos, foram obtidos um qui-quadrado de 70,39659708, dois graus de liberdade e P-valor de 5,17098E-16, concluindo que as diferenças entre as medianas são estatisticamente significativas entre agentes e técnicos e agentes e graduados.

Gráfico 3
Média geral por grupos de profissionais na dimensão formação

Nessa dimensão, os agentes, técnicos e graduados concordaram conjuntamente apenas três vezes em situação de perigo. Entende-se que se obteve acentuada diferença, portanto, um nível baixo de concordância entre os profissionais, devido à pontuação elevada dos graduados em relação aos agentes em assertivas específicas, tais como conhecer doenças que podem ser causadas pela exposição, locais e fontes de exposição, situação que pode ter sido amenizada devido à percentagem alta de profissionais graduados atuando na função de agentes e técnicos.

A análise da dimensão prática, em situação geral de alerta, apresentou uma assertiva em situação de conforto, com pontuação de 3,81, dez em situação de alerta, com pontuações médias de 2,50; 2,37; 2,82; 2,66; 2,07; 2,00; 2,12; 2,23; 2,34; 2,09, e quatro em situação de perigo, com pontuações médias de 1,31; 1,94; 1,75; 1,91 (gráfico 4). Pelo teste de hipótese de Kruskal-Wallis, foram obtidos um qui-quadrado de 7,648232363, dois graus de liberdade e P-valor de 0,021837728, concluindo que as diferenças entre as medianas são estatisticamente significativas entre técnicos e graduados. Nessa dimensão, os agentes, técnicos e graduados concordaram conjuntamente uma vez na situação de conforto, nove vezes em situação de alerta, e duas vezes em situação de perigo.

Gráfico 4
Média geral por grupos de profissionais na dimensão prática

Discussão

Entende-se que a escala tipo Likert propiciou uma boa aproximação com a temática, analisando as dimensões em conjunto e por nível de formação, o que, dialogando com o referencial teórico, permitiu melhor compreensão dos fenômenos.

Observou-se que os três níveis de profissionais da AB estudados (agentes, técnicos, graduados) apresentam conhecimentos de que há presença de agentes químicos nocivos nos mais variados compartimentos ambientais, assim como em produtos e alimentos, e que a exposição humana a eles pode causar adoecimento. No entanto, eles não possuem um conhecimento sistematizado sobre SSA, bem como sobre as doenças que podem ser desenvolvidas em decorrência da exposição e de seus agravos. Concordam que populações estão expostas, mas que as pessoas não têm conhecimento dessa situação nem dos meios de identificação de riscos de forma que possam evitá-los ou reduzi-los.

A pesquisa mostrou, também, que os profissionais não acessam e nem são informados sobre o conteúdo das convenções internacionais, como a de Estocolmo, sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, e a Convenção de Minamata, sobre mercúrio, cujos objetivos são a proteção da saúde humana e do meio ambiente.

Existem lacunas na formação profissional sobre locais e fontes de exposição aos agentes químicos nocivos, assim como sobre suas vias de penetração no organismo e as patologias decorrentes disso. Tais conteúdos e suas relações não são adequadamente desenvolvidos, tanto na formação inicial como na continuada. Essa percepção ocorre para todos os níveis de formação (agentes, técnicos e graduados).

Os profissionais expressam, também, que, apesar da relevância de se aumentar a atenção à saúde das pessoas nos territórios, é necessário aumentar a frequência com que se abordam e discutem, em reuniões técnicas, essas temáticas, bem como a frequência de publicação de materiais didáticos e a realização de palestras e afins. Salientam, ainda, a necessidade de uma política específica para a disseminação de conhecimentos nessa área.

Entre as várias ações no âmbito da formação e do desenvolvimento dos profissionais da AB, está a capacitação para reconhecimento e manejo de casos de intoxicação, destacando a necessária prevenção e identificação de casos de exposição crônica, promoção de mudanças nos currículos de cursos das diversas áreas afins e promoção de uma formação transdisciplinar integrando as áreas da saúde, educação, meio ambiente e ciências.

Entende-se que sem o pensamento e uma atuação complexa, sem a união de saberes1818 Morin E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2. ed. São Paulo: Cortez; 2000. e sem uma atuação interprofissional1919 Batista NA, Rossit RAS, Batista SHSS, et al. Educação Interprofissional na Formação em Saúde: a experiência da Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada Santista, Santos, Brasil. Interface - Com. saúde educ. 2018 [acesso em 2020 dez 8]; (2):1705-15. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0693.
https://doi.org/10.1590/1807-57622017.06...
, a promoção da saúde não expressa todo seu potencial e a efetiva segurança química na contemporaneidade.

Na prática, independentemente do nível de formação, os profissionais expressam falta de procedimentos para identificação das formas e vias de exposição às substâncias químicas ambientais, assim como do consumo de alimentos ou do uso de produtos contaminados ou com níveis elevados de substâncias e compostos químicos não adequadamente testados ou perigosos. Faltam procedimentos ou protocolos para casos suspeitos de estarem relacionados a exposição às substâncias químicas, prejudicando o encaminhamento para o diagnóstico. Referem, ainda, que há escassez de anotações nos prontuários dos usuários de maneira que se possa ter e manter dados que permitam estabelecer um histórico de vida e exposição dos usuários.

Esses dados remetem a uma maior discussão da SSA no âmbito da própria Política Nacional de Atenção Básica, expressa na Portaria nº 2.436/20172020 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 22 Set 2017. [acesso em 2022 jul 15]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html#:~:text=Aprova%20a%20Pol%C3%ADtica%20Nacional%20de,%C3%9Anico%20de%20Sa%C3%BAde%20(SUS).
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, que deve considerar:

[...] a pessoa em sua singularidade e inserção sociocultural, buscando produzir a atenção integral, incorporar as ações de vigilância em saúde - a qual constitui um processo contínuo e sistemático de coleta, consolidação, análise e disseminação de dados sobre eventos relacionados à saúde - além disso, visa o planejamento e a implementação de ações públicas para a proteção da saúde da população, a prevenção e o controle de riscos, agravos e doenças, bem como para a promoção da saúde.

Importante também refletir sobre os apontamentos de Radicchi e Lemos55 Radicchi ALA, Lemos AF. Saúde Ambiental. Belo Horizonte: Coopmed; 2009. [acesso em 2020 jul 11]. Disponível em: https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/3913.pdf.
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ao salientarem que, no enfrentamento dos determinantes socioambientais e na prevenção dos agravos decorrentes da exposição humana a ambientes adversos, promover a saúde humana e

colaborar na proteção do meio ambiente pode se dar também por meio de um conjunto de ações específicas e integradas que envolvam organizações governamentais e não-governamentais da sociedade civil55 Radicchi ALA, Lemos AF. Saúde Ambiental. Belo Horizonte: Coopmed; 2009. [acesso em 2020 jul 11]. Disponível em: https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/3913.pdf.
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.

Augusto44 Augusto SGL. Inter-relações entre a Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador e a Atenção Básica de Saúde no SUS. In: Associação Brasileira de Saúde Coletiva. I Conferência Nacional de Saúde Ambiental. Rio de Janeiro: Abrasco; 2009. p. 105-108 [acesso em 2021 out 5]. Disponível em: http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_7832566.pdf.
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salienta que, na AB, o conceito de território deveria ter um sentido mais amplo que aquele restrito à organização das atividades prescritas à sua equipe, com critérios de cobertura estabelecidos, em que até a esperada horizontalidade mediante a articulação das redes sociais locais não ocorre, avançando pouco no seu potencial de cumprir as ações relacionadas à promoção, proteção e cuidados da saúde e à prevenção das situações de risco presentes no ambiente onde vivem e trabalham as pessoas.

Nesse sentido, Rigotto et al.2121 Rigotto RM, Porto MFS, Folgado CAR, et al. Conhecimento científico e popular: Construindo a ecologia do saber. In: Carneiro FF, Augusto LGS, Rigotto RM, et al., organizadores. Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. São Paulo: Expressão Popular; 2015. p. 193-410. comentam sobre a importância do diálogo com saberes dos territórios, por meio de uma aliança necessária, solidária e confiante, entre técnicos, cientistas atuantes em universidades e Organizações Não Governamentais (ONGs), com populações e movimentos sociais, para superar a pretensa superioridade, objetividade e neutralidade de certas práticas que promovem uma verdadeira epistemologia da cegueira.

Para superar esse modelo, o autor propõe a participação social efetiva na construção de um plano nacional de enfretamento ao uso dos agrotóxicos e seus impactos na saúde e no meio ambiente, e alerta para os desafios toxicológicos com ampliação da rede de laboratórios de referência, novos indicadores de exposição, avaliação de múltipla exposição e a formação e capacitação de profissionais para os serviços de saúde.

Alonzo e Costa2222 Aguilar Alonzo HG, Costa AO. Bases da toxicologia ambiental e clínica para atenção à saúde: exposição e intoxicação por agrotóxicos. São Paulo: Hucitec; 2019. salientam que, sem percebermos, estamos expostos às substâncias, aos produtos e contaminantes químicos (medicamentos, gasolina, agrotóxicos), portanto, são necessárias a formulação e a implementação de políticas para a concretização de práticas de promoção da saúde, incluindo prevenção, recuperação, reabilitação e vigilância. Salienta, também, que, no processo de trabalho, essas práticas são integradas e contínuas, mas que, por questões didáticas, são apresentadas de forma separada. O autor enfatiza o cuidado integral, tendo em vista que, para discutir o monitoramento ambiental, é necessário um olhar ampliado e uma análise conjunta de indicadores que mostrem a inter-relação de saúde e ambiente, e acrescenta que as fontes de dados e os setores envolvidos ainda estão distantes de um modelo para essa abordagem.

Entende-se que os resultados da presente pesquisa vão ao encontro das reflexões de Augusto44 Augusto SGL. Inter-relações entre a Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador e a Atenção Básica de Saúde no SUS. In: Associação Brasileira de Saúde Coletiva. I Conferência Nacional de Saúde Ambiental. Rio de Janeiro: Abrasco; 2009. p. 105-108 [acesso em 2021 out 5]. Disponível em: http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_7832566.pdf.
http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/d...
, Rigotto et al.2121 Rigotto RM, Porto MFS, Folgado CAR, et al. Conhecimento científico e popular: Construindo a ecologia do saber. In: Carneiro FF, Augusto LGS, Rigotto RM, et al., organizadores. Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. São Paulo: Expressão Popular; 2015. p. 193-410. e Alonzo e Costa2222 Aguilar Alonzo HG, Costa AO. Bases da toxicologia ambiental e clínica para atenção à saúde: exposição e intoxicação por agrotóxicos. São Paulo: Hucitec; 2019., sinalizando na direção do necessário fortalecimento da Promoção da Saúde na ampliação da vigilância, sobretudo na AB, com vistas a uma atenção integral de saúde que incorpore um olhar mais atento e crítico sobre as substâncias químicas e seu preparo, especialmente distribuídas como mercadoria ou contaminantes nos mais variados produtos.

Nessa seara, é importante formar e capacitar os profissionais da AB para conhecerem como as substâncias são extraídas, usadas como produtos ou utilizadas como matérias-primas nos mais variados processos, permitindo a síntese de novos produtos e compostos químicos, dos quais, muitos são distribuídos sem que se tenha um exame toxicológico completo. Além disso, conhecer os locais, meios de exposição e contato, como se introduzem no organismo: inalados, ingeridos ou absorvidos através da pele, como se distribuem no corpo e atingem órgãos-alvo, quais os sintomas e como se estabelece o processo de adoecimento. E, por fim, quais são os meios que pessoas e populações possuem para buscar ajuda e o quanto esses meios estão preparados para prestar a assistência necessária.

Nesse processo, um ponto importante é o monitoramento com uma equipe treinada para coletar dados nos territórios, introduzi-los no sistema e analisá-los de maneira que se possa tomar decisões, visando, sobretudo, à prevenção, e a que se busque o caminho da efetiva proteção ambiental e da saúde de pessoas e populações.

Conclusões

As respostas trazidas por esta investigação sinalizam:

A SSA requer profissionais com um olhar mais atento para a exposição humana às substâncias e aos compostos químicos nocivos.

Existe necessidade de uma abordagem mais ampliada, interdisciplinar e interprofissional para a questão ambiente-saúde-sociedade com relação à exposição e ao processo de intoxicação química, na atenção à SSA.

O processo formativo em SSA na AB, tanto inicial como permanente, deve preparar profissionais para uma prática mais atenta e para uma atuação mais eficiente e eficaz.

É necessária a disponibilização de procedimentos de atenção e monitoramento para acompanhar, nos territórios, os casos suspeitos de exposição a agentes químicos nocivos.

Enfim, esta pesquisa apontou como necessário aumentar a atenção relacionada à exposição química nos territórios, sugerindo mudanças imediatas com vistas à implantação de um sistema mais ágil e operacional de informação e acompanhamento de populações no que diz respeito à exposição química; bem como na elaboração de políticas de educação permanente que contemplem essas discussões, com reuniões de discussão de casos e elaboração e disponibilização de materiais instrucionais sobre SSA nos equipamentos da AB.

Entende-se que a formação e a capacitação dos profissionais para uma atenção integral à saúde que considere a prevenção e a precaução para a segurança química têm que atingir, da mesma forma, todos os profissionais da AB (agentes, técnicos e graduados), assim como na atenção secundária e terciária, propiciando que todos tenham acesso ao mesmo conhecimento e à mesma compreensão dos fenômenos, de suas raízes e de como tratá-los, guardando em cada um dos níveis de formação a prática diferenciada efetiva da ação profissional que lhes cabe no âmbito de suas atuações.

  • Suporte financeiro: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) processo nº 88882.430888/2019-01
  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Nov 2021
  • Aceito
    23 Abr 2022
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