RESUMO
A pandemia trouxe vários desafios a toda estrutura social, requisitando a organização e desenvolvimento de políticas públicas para conduzir o quadro sanitário. Com relação à saúde, as ações inicialmente envolveram medidas não farmacológicas e preparação do sistema de saúde. No caso do Brasil, em março de 2020 foram deliberadas portarias específicas sobre a oferta de leitos UTI Covid-19. Em abril de 2020, o estado do Espírito Santo iniciou a estruturação dos hospitais referência para Covid-19 habilitando leitos em hospitais públicos de gestão direta e indireta, e em hospitais privados e filantrópicos. Assim sendo, o objetivo deste estudo é analisar a relação de compra e oferta de leitos exclusivos para Covid-19 pela rede SUS no estado do Espírito Santo. Os dados revelam uma rede com diferentes formatos jurídicos, com forte presença de setor filantrópico, seja por Organizações Sociais de Saúde (OSS) ou hospitais. Por fim, o estudo concluiu que a condução da rede hospitalar para leitos UTI Covid-19 ocorreu pela heterogeneidade de formatos jurídicos, com a participação da gestão pública direta substituída por diferentes tipos de gestão, condicionando o estado a reafirmar as contratualizações conforme lógica do mercado.
PALAVRAS-CHAVE
Número de leitos em hospital; Covid-19; Parcerias público-privadas
ABSTRACT
The pandemic brought several challenges to the entire social structure, demanding the organization and development of public policies to guide the health situation. With regard to health, actions so far have involved non-pharmacological measures and preparation of the health system. In the case of Brazil, in March 2020, specific ordinances were deliberated on the offer of COVID-19 ICU beds. In April 2020, the state of Espírito Santo began structuring reference hospitals for COVID-19, enabling beds in public hospitals under direct and indirect management, and in private and philanthropic hospitals. Therefore, the objective of this study is to analyze the relationship of purchase and supply of exclusive beds for COVID-19 by the SUS network in the State of Espírito Santo. The data reveal a network with different legal formats, with a strong presence of the philanthropic sector, whether by Social Health Organizations (OSS) or hospitals. Finally, the study concluded that the conduction of the hospital network for COVID-19 ICU beds occurred due to the heterogeneity of legal formats, with the participation of direct public management replaced by different types of management, conditioning the state to reaffirm the contractualizations according to market logic.
KEYWORDS
Hospital bed capacity; COVID-19; Public-private sector partnerships
Introdução
Para responder à pandemia, foram necessárias ações de caráter político, econômico e social que impactassem em toda estrutura social, requisitando assim a adaptação do modelo cultural que a população até então estava vivendo11 Vieira FS, Servo LM. Covid-19 e coordenação federativa no Brasil: consequências da dissonância federal para a resposta à pandemia. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):100-113. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/44SVpkjDHB6QcR5x4NtTNwf/?lang=pt#:~:text=Pondera%20que%20a%20coordena%C3%A7%C3%A3o%20federal,desses%20instrumentos%20pelo%20governo%20federal.
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Até mesmo países mais estruturados, no que se refere à disposição de serviços de saúde e sistemas universais, tiveram dificuldade em produzir respostas imediatas. No Brasil, o quadro se agravou por suas características geopolíticas e desigualdades socioeconômicas que atravessam todo território11 Vieira FS, Servo LM. Covid-19 e coordenação federativa no Brasil: consequências da dissonância federal para a resposta à pandemia. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):100-113. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/44SVpkjDHB6QcR5x4NtTNwf/?lang=pt#:~:text=Pondera%20que%20a%20coordena%C3%A7%C3%A3o%20federal,desses%20instrumentos%20pelo%20governo%20federal.
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Sob ponto de vista da saúde, as determinações demandavam uma articulação que rompesse com a disparidade na distribuição de recursos e abertura de leitos, assim como no acesso a insumos e equipamentos22 Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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. Mas, ao invés disso, as estratégias adotadas não foram consideradas eficazes22 Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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Quando a Covid-19 emergiu, as autoridades sanitárias desconheciam a existência de tratamento medicamentoso e imunizantes comprovados cientificamente, assim as ações consideradas eficazes eram em duas frentes, a saber: não farmacológicas (distanciamento, fechamento de fronteiras, uso obrigatório de máscaras, entre outros) e preparação do sistema de saúde para atendimento adequado e imediato à população33 Werneck GL, Bahia L, Moreira JP, et al. Mortes evitáveis por Covid-19 no Brasil. 2021. [acesso em 2022 jun 1]. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/especiais/mortes-evitaveis-por-covid-19-no-brasil/#:~:text=Estima%2Dse%20que%20cerca%20de,acima%20do%20esperado%20no%20per%C3%ADodo.
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. Todavia, nenhuma das duas foram implementadas de forma eficaz no Brasil, acarretando 305 mil mortes evitáveis de março de 2020 até março de 202133 Werneck GL, Bahia L, Moreira JP, et al. Mortes evitáveis por Covid-19 no Brasil. 2021. [acesso em 2022 jun 1]. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/especiais/mortes-evitaveis-por-covid-19-no-brasil/#:~:text=Estima%2Dse%20que%20cerca%20de,acima%20do%20esperado%20no%20per%C3%ADodo.
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Sobre a preparação do sistema de saúde, essa frente de trabalho buscava reduzir a letalidade da doença mediante ações que envolveriam leitos hospitalares (enfermaria e Unidade de Terapia Intensiva – UTI), recursos humanos, equipamentos, entre outros insumos estratégicos imediatos33 Werneck GL, Bahia L, Moreira JP, et al. Mortes evitáveis por Covid-19 no Brasil. 2021. [acesso em 2022 jun 1]. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/especiais/mortes-evitaveis-por-covid-19-no-brasil/#:~:text=Estima%2Dse%20que%20cerca%20de,acima%20do%20esperado%20no%20per%C3%ADodo.
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. Dentre essas, a oferta de leitos de UTI exclusivos para Covid-19 foi pauta em todo território brasileiro, e até mesmo regiões com maior disponibilidade e preparo foram impactadas pela alta demanda22 Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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. Se analisadas as diferenças regionais no Brasil, os estudos vão demonstrar a capacidade hospitalar até então para oferta dos serviços, ou seja, antes da pandemia, e as estratégias adotadas a partir dela.
O sistema de saúde brasileiro, em mais de trinta anos de existência, tem se mantido em funcionamento mesmo diante de um permanente quadro de subfinanciamento, desfinanciamento e reformas pelo Estado que impactam diretamente na oferta e na gestão dos serviços3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
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. As contratualizações surgem dentro desse contexto nos anos 90 para materializar a transferência dos serviços não exclusivos do Estado para a iniciativa privada2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022..
Na saúde, as contratualizações com o setor privado têm se expandido para oferta dos serviços e desdobrado em diferentes configurações da entrada do setor privado por dentro do setor público, acarretando em conflitos de interesses, imbricados com pilares de sustentação do Sistema Único de Saúde (SUS) e caracterizando-se como formas de terceirização do setor público2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.. Desse modo, mesmo diante do avanço da pandemia, a oferta de serviços públicos no Brasil já era marcada por forte presença do setor privado. A necessidade de respostas imediatas na pandemia, diante das condições já existentes na gestão dos serviços de saúde, condicionou o Estado brasileiro a dialogar diretamente com o empresariado da saúde que já estava inserido no âmbito organizacional do Estado2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
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. Embora estejamos falando de um país, é necessário o aprofundamento sobre as diferentes realidades regionais e os caminhos utilizados para enfrentamento do quadro emergencial de saúde pública.
Sobre o estado do Espírito Santo, um estudo realizado em 2020 pelo Núcleo de GeoSaúde do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo mapeou os leitos hospitalares e respiradores, mostrando um cenário preocupante, visto que 30% dos municípios não possuíam leitos de internação, e, os que possuíam, eram em sua maioria concentrados na região central da Grande Vitória44 Medina J. Pesquisa mapeia número de leitos hospitalares e respiradores no Espírito Santo. 2020. [acesso em 2022 maio 8]. Disponível em: https://coronavirus.ufes.br/conteudo/pesquisa-mapeia-numero-de-leitos-hospitalares-e-respiradores-no-espirito-santo#:~:text=De%20acordo%20com%20a%20pesquisa,)%20e%20Serra%20(192).
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. O estudo mostrou ainda a disponibilidade de respiradores no estado por esfera jurídica, sendo: 37% na rede pública, 35% em hospitais filantrópicos e 26% na rede considerada privada44 Medina J. Pesquisa mapeia número de leitos hospitalares e respiradores no Espírito Santo. 2020. [acesso em 2022 maio 8]. Disponível em: https://coronavirus.ufes.br/conteudo/pesquisa-mapeia-numero-de-leitos-hospitalares-e-respiradores-no-espirito-santo#:~:text=De%20acordo%20com%20a%20pesquisa,)%20e%20Serra%20(192).
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Diante dos expostos, o objetivo deste estudo é analisar a relação de compra de leitos exclusivos em hospitais privados e filantrópicos, assim como a oferta desses leitos em hospitais públicos de gestão direta e indireta no estado do Espírito Santo, no período de fevereiro de 2020 até fevereiro de 2021.
Alguns dados colocam o estado como destaque nacional, entre eles, em 2020, sete estados do Brasil tiveram a maioria dos leitos de UTI Covid-19 no SUS, um deles o Espírito Santo, o segundo maior na oferta entre os destacados55 Campos FC, Canabrava CM. O Brasil na UTI: atenção hospitalar em tempos de pandemia. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(4):146-160. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bxcgdZJbz3D4tKDztZdXF7b/?lang=pt.
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. Além disso, junto com Sergipe, tornou-se destaque nacional pela alta letalidade em estabelecimentos públicos pelos pacientes hospitalizados (73%)33 Werneck GL, Bahia L, Moreira JP, et al. Mortes evitáveis por Covid-19 no Brasil. 2021. [acesso em 2022 jun 1]. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/especiais/mortes-evitaveis-por-covid-19-no-brasil/#:~:text=Estima%2Dse%20que%20cerca%20de,acima%20do%20esperado%20no%20per%C3%ADodo.
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, a maior parte desses leitos em um hospital público com gestão indireta. Por isso é necessário maior aprofundamento sobre a letalidade nesses estados e óbitos por internação e natureza jurídica nos estabelecimentos, o que pode desdobrar em outros estudos. Todavia é possível afirmar que a estratégia da gestão estadual para ofertar leitos foi o investimento em diferentes formatos para administração e organização dos serviços, entre eles, credenciamento em rede filantrópica, hospitais geridos por Organizações Sociais de Saúde (OSS) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips), e, também, por meio da criação da Fundação Estatal Pública de Direito Privado66 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2020-2023). [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-planejamento.
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Tal condução expressa um sistema de parcerias que antecede a pandemia de Covid-19, podendo ser observada pela composição hospitalar do SUS no estado, a qual possuía 113 unidades hospitalares em 2019, sendo somente 31,8% consideradas de esfera estadual, municipal ou federal, as demais eram credenciadas mediante sistema de parcerias66 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2020-2023). [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-planejamento.
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. As contratualizações na saúde no estado do Espírito Santo emergiram no ano de 2007 e a partir de então o avanço deste modelo se preponderou para a expansão dos serviços, atribuindo a essa estratégia o aperfeiçoamento na oferta de serviços públicos3333 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2016-2019). 2016. [acesso em 2022 set 22]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/Planejamento/PES%20-%20Plano%20Estadual%20de%20Saude_2016-2019-1.pdf.
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. Assim, frente a pandemia que demandou uma ampla disponibilidade de leitos para tratamento pelo quadro ocasionado pelo vírus, é de suma importância entender a organização e cooperação estabelecida pela rede público-privada dentro da realidade deste estado.
Metodologia
Trata-se de um estudo descritivo-exploratório de abordagem qualitativa. O recorte temporal estabelecido foi de fevereiro de 2020 até fevereiro de 2021, ou seja, a partir da Portaria nº 188, de 03 de fevereiro de 2020, que declarou a emergência de saúde pública no território nacional em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus77 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 188, de 3 de fevereiro de 2020. Declara Emergência em Saúde Pública de importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus. Diário Oficial da União. 5 Fev 2020., e da Lei nº 13.079, de 6 de fevereiro de 2020, que criou medidas para enfrentamento a Covid-1988 Brasil. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Diário Oficial da União. 7 Fev 2020.. Mediante essas deliberações, as ações começaram a ser realizadas para conduzir o quadro sanitário.
Amparados por essas legislações e pela Lei Complementar Estadual nº 946, os gastos públicos no Espírito Santo seguiram por meio da possibilidade de dispensação de licitação e flexibilização da Lei Geral de Licitações e Contratos99 Espírito Santo. Contratos e execução de despesas – Covid-19. [acesso em 2022 abr 28]. Disponível em: https://coronavirus.es.gov.br/contratos-e-execucao-de-despesas.
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. Além disso, o período estabelecido de análise é marcado pela ausência do processo de vacinação e terapia medicamentosa com eficácia comprovada cientificamente.
Para construção do estudo foi realizada a diferenciação de leitos de acordo com a esfera jurídica. Em hospitais de gestão indireta, foram considerados os hospitais públicos que são geridos por organizações sociais e fundação pública de direito privado que, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), estão regulamentados por legislações da administração indireta, como: contratação da força de trabalho, regras de compras e contratos e fiscalização da administração pública1010 Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Fundação Pública. 2016. [acesso em 2022 jun 28]. Disponível em: https://www.conass.org.br/guiainformacao/fundacao-publica/#:~:text=A%20Funda%C3%A7%C3%A3o%20p%C3%BAblica%20de%20direito,de%20estado%20na%20%C3%A1rea%20social.
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. Já a distinção dentro do setor privado foi por hospitais com fins lucrativos e sem fins lucrativos.
No que se refere às legislações, foram realizadas consultas no ‘portal coronavírus’ do estado e da Secretária Estadual da Saúde do Espírito Santo (Sesa), em ambos selecionados a guia ‘Legislações’, dentro dela analisadas as principais normativas referentes à organização da rede de hospitais para Covid-19.
Os contratos com hospitais privados foram retirados do portal coronavírus do ES, entretanto, só havia registros das contratualizações realizadas no mês de maio, com vigência de 03 meses. Todos os contratos foram baixados e salvos em pastas específicas e posteriormente analisados. Também foram realizadas coletas no portal transparência do estado do Espírito Santo, sendo planilhados (Excel) os gastos de março de 2020 até fevereiro de 2021 exclusivos para Covid-19 e neles foram identificados os recursos para leitos.
Quanto ao número de hospitais credenciados, na parte descritiva da organização, foram consideradas as portarias, mas no que se refere aos dados numéricos, esses foram retirados dos censos para leitos Covid-19 (de junho/20 até fevereiro/21). Os dados de abril e maio foram solicitados via ouvidoria à Sesa, não sendo repassados com o rigor de detalhes quanto aos obtidos a partir de coleta manual. Para o número de leitos disponibilizados por tipo e esfera jurídica, os dados também foram retirados dos censos coletados.
Esses censos eram disponibilizados diariamente, sem criação de série histórica no portal. Desta forma, a coleta foi diária de junho de 2020 até o final de fevereiro de 2021. No entanto, para sistematização dos dados foi considerado o último censo do mês.
Quanto aos leitos habilitados pelo Ministério da Saúde, eles foram obtidos por consultas ao Fundo Nacional de Saúde (FNS), selecionando as transferências via bloco de custeio e investimento para o Fundo Estadual de Saúde (grupo coronavírus – Covid-19 em ambos blocos). Todo recurso dessa seleção constava como crédito extraordinário. Pelas portarias, foi identificado quais foram para leitos e quais foram destinados para outras ações.
Os termos aditivos realizados com a Organização Social de Saúde (OSS) que realiza a gestão do hospital estabelecido como referência dentre os demais foram obtidos no portal da própria OSS.
A técnica de análise definida para o material foi a análise temática. O método consiste na contagem de itens ou temas dentro das categorias criadas, conforme colocado por Bardin1111 Bardin L. Análise de conteúdo. 4. ed. Lisboa: Edições 70; 2003.. Aqui foi definida a categoria ‘leitos Covid-19’ e, dentro dela, a identificação por esfera jurídica e/ou gestão, sendo em hospitais privados e filantrópicos, assim como a oferta desses leitos em hospitais públicos de gestão direta e indireta no estado do Espírito Santo. Os leitos também foram diferenciados de acordo com as modalidades enfermaria e UTI.
Resultados
Planejamento e implantação de hospitais e leitos exclusivos para Covid-19 pela gestão estadual do estado do Espírito Santo
A oferta de leitos para Covid-19 no estado do Espírito Santo foi projetada por fases (I-V) e tipos de leitos (UTI, isolamento, enfermaria e enfermaria isolamento). A implantação foi entre março e julho de 2020, estimando gradativamente o alcance de até 1.609 leitos específicos para Covid-19 ao final desse último mês66 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2020-2023). [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-planejamento.
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. Para tal, hospitais foram definidos para compor a Rede de Hospitais Referência para Tratamento de Covid-19.
A Portaria nº 038-R, de 20 de março de 2020, credenciou os seis primeiros hospitais1212 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 038-R, de 20 de março de 2020. Determina as Referências Hospitalares ao tratamento do COVID-19 e reorganizar os fluxos, os atendimentos e os serviços de saúde em virtude da decretação do estado de emergência em Saúde Pública no Espírito Santo em razão do surto de Coronavírus (COVID-19). [acesso em 2022 jun 10]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20038-R%20-DEFINIR%20AS%20REFER%C3%8ANCIAS%20HOSPITALARES.pdf.
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. Ao longo do mesmo mês, portarias foram publicadas para organização de todas as unidades hospitalares na rede SUS/ES. Mas foi em 26 de abril de 2020, por meio da Portaria nº 071-R, que o Plano de Atenção Hospitalar Covid-19/ ES, também denominado ‘Programa Leitos para Todos’ foi instituído1313 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 071-R, de 26 de abril de 2020. Institui no âmbito do Plano de Atenção Hospitalar COVID-19/ES, “Programa Leitos Para Todos”. [acesso em 2022 jun 12]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20071-R%20-%20PROGRAMA%20DE%20LEITOS.pdf.
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O programa traçou como estratégia o credenciamento de leitos em hospitais de rede própria, filantrópica e privada, assim garantindo atendimento a todos os pacientes com quadro grave de Sars-CoV-21313 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 071-R, de 26 de abril de 2020. Institui no âmbito do Plano de Atenção Hospitalar COVID-19/ES, “Programa Leitos Para Todos”. [acesso em 2022 jun 12]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20071-R%20-%20PROGRAMA%20DE%20LEITOS.pdf.
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. As Portarias nº 072-R, de 30 de abril de 2020, e nº 082-R, de 13 de maio de 2020, definiram as regras e valores para contratação de leitos em UTI e enfermarias em hospitais privados com fins lucrativos e filantrópicos1414 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 072-R, de 30 de abril de 2020. Define regras e valores para contratação de leitos de UTI e enfermaria para atendimento exclusivo de pacientes COVID-19, na rede privada com fins lucrativos. [acesso em 2022 jun 28]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20072-R%20-%20CONTRATOS%20EMERGENCIAIS%20LEITOS%20PARA%20TODOS.pdf.
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,1515 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 082-R, de 13 de maio de 2020. Define regras e valores para remuneração dos leitos de UTI nos hospitais filantrópicos contratualizados pela SESA para atendimento exclusivo de pacientes suspeitos e/ou confirmados COVID-19. [acesso em 2022 jul 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20082-R%20-%20VALOR%20UTI%20FILANTR%C3%93PICOS.pdf.
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Para os hospitais com fins lucrativos, foi definida a diária de um leito UTI Covid-19 exclusivamente para o SUS em R$ 1.600,00, independente de ocupação, mas com acréscimo de R$ 1.500,00 por dia quando o leito estivesse ocupado. No caso de leitos em enfermaria, foi definida a diária no valor de R$ 715,00 até a alta. Ambas as situações independentes de confirmação para Covid-191414 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 072-R, de 30 de abril de 2020. Define regras e valores para contratação de leitos de UTI e enfermaria para atendimento exclusivo de pacientes COVID-19, na rede privada com fins lucrativos. [acesso em 2022 jun 28]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20072-R%20-%20CONTRATOS%20EMERGENCIAIS%20LEITOS%20PARA%20TODOS.pdf.
https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coron...
. Em hospitais filantrópicos, o leito UTI Covid-19 teve a diária definida por R$ 1.600,00 (conforme estabelecido pela Portaria nº 082-R, de 13 de maio de 2020)1515 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 082-R, de 13 de maio de 2020. Define regras e valores para remuneração dos leitos de UTI nos hospitais filantrópicos contratualizados pela SESA para atendimento exclusivo de pacientes suspeitos e/ou confirmados COVID-19. [acesso em 2022 jul 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20082-R%20-%20VALOR%20UTI%20FILANTR%C3%93PICOS.pdf.
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Os contratos de maio de 2020 com essas unidades hospitalares, privada e filantrópica, revelam a antecipação do valor de 90% para a reserva das vagas por 3 meses, podendo ser prorrogado. Além dos valores previstos com relação a diária, também foram calculados e repassados recursos para sessões de hemodiálise nos casos de leitos de UTI exclusivos para Covid-1999 Espírito Santo. Contratos e execução de despesas – Covid-19. [acesso em 2022 abr 28]. Disponível em: https://coronavirus.es.gov.br/contratos-e-execucao-de-despesas.
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Em março, abril e agosto, portarias foram publicadas sobre as referências e contrarreferências das Unidades de Atenção Hospitalar. A Portaria nº 160-R, de 10 de agosto de 2020, colocou cerca de 30 hospitais para atendimento a Covid-19, entre eles hospitais privados e filantrópicos1616 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 160-R, de 10 de agosto de 2020. Dispõe sobre referências e contrarreferências das Unidades de Atenção Hospitalar, durante o Estado de Emergência pública pelo Covid-19. [acesso em 2022 jul 27]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20160-R%20-%20REFERE%CC%82NCIAS%20HOSPITALARES%20-%20COVID%20MAIO.pdf.
https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coron...
. O gráfico 1 abaixo dispõe do número de hospitais estabelecidos como referência para Covid-19 pela Sesa, de acordo com a esfera administrativa e/ou jurídica.
Unidades hospitalares credenciados para leitos SUS Covid-19 de acordo com esfera jurídica de abril de 2020 a fevereiro de 2021
É possível perceber, através do gráfico 1, que a maior parte dos hospitais credenciados foram filantrópicos e públicos de gestão direta, mas quando considerada a totalidade, os hospitais com gestão direta perdem espaço para os demais formatos jurídicos.
Conforme dados do Plano Estadual de Saúde – PES (2020-2023), a composição da rede hospitalar SUS-ES até 2019 era, em sua maioria, de hospitais privados (34%), seguidos pelos filantrópicos (33%), hospitais estaduais (16%), municipais (14%) e federal (0,7%)66 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2020-2023). [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-planejamento.
https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-...
. Já dados do DataSUS mostram uma rede, nesse mesmo ano, composta por hospitais filantrópicos (44%), estaduais e/ou federal (24%), municipais (24%) e empresariais (5%)1717 Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Estabelecimento por tipo de atendimento prestado - internação - Espírito Santo. [acesso em 2022 jun 22]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?cnes/cnv/atintes.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
. Diferença significativa quanto ao setor considerado privado no PES e empresarial pelo DataSUS. Mas, com relação ao setor considerado filantrópico, esses estabelecimentos têm forte presença na rede, independente da fonte.
Em 2020, quando credenciados os hospitais para rede Covid-19 pela gestão estadual, o gráfico 1 mostra uma priorização pelos hospitais filantrópicos, que já eram significativos dentro da rede, seguidos pelos hospitais públicos de gestão direta que são colocados no PES como elegíveis para administração de fundações e/ou organizações sociais66 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde. Plano Estadual de Saúde do Estado do Espírito Santo (2020-2023). [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-planejamento.
https://saude.es.gov.br/instrumentos-de-...
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Nos casos de hospitais públicos com administração indireta, a gestão estadual fez termos aditivos com organizações que realizavam a administração dos hospitais para atendimento da demanda Covid-19 e criou normativas operacionais sobre cessão de funcionários, criação de gabinete de crise nos estabelecimentos para condução interna, aprovou normas técnicas no ambiente hospitalar e manejo clínico de pacientes com Covid-191818 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Legislação. Portarias. [acesso em 2022 jul 27]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/legislacao-portarias.
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Outra normativa de extrema importância foi a Portaria nº 055-R, de 02 de abril de 2020, a qual dispôs sobre vaga zero para transferência de pacientes com síndrome respiratória grave, segundo a qual os pacientes devem ser encaminhados para a melhor hierarquia disponível de acordo com a referência pelo serviço, sendo de responsabilidade exclusiva dos médicos reguladores da urgência o encaminhamento para a vaga, de preferência que realizasse contato telefônico prévio, bem como, detalhamento de quadro clínico e justificativa do encaminhamento1919 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 55, de 02 de abril de 2020. Dispõe sobre “vaga zero” para as transferências de pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave - SRAG, durante o Estado de Emergência Pública pelo COVID-19. [acesso em 2022 jun 25]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20055-R%20-%20VAGA%20ZERO.pdf.
https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coron...
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Contrapartida do Ministério da Saúde na disponibilidade de leitos SUS/ES para Covid-19 no estado do Espírito Santo
O Ministério da Saúde também habilitou leitos UTI na gestão estadual. Os primeiros foram em 15 de abril de 2020, pela Portaria nº 815, a qual habilitou 68 leitos UTI Tipo II – Covid-19 por meio de repasse do Fundo Nacional de Saúde (FNS) para o Fundo Estadual de Saúde (FES). O repasse compõe a ação orçamentária do Programa de Trabalho – Enfrentamento da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional Decorrente do Coronavírus2020 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 815, de 15 de abril de 2020. Habilita leitos da Unidade de Terapia Intensiva - UTI Adulto Tipo II - COVID-19, e estabelece recurso do Bloco de Custeio das Ações e Serviços Públicos de Saúde, a ser disponibilizado ao Estado do Espírito Santo. Diário Oficial da União. 16 Abr 2020.. Posteriormente, foram identificadas cerca de 15 portarias publicadas com habilitação e prorrogação de leitos UTI no estado do Espírito Santo pelo Ministério da Saúde, as quais seguiram o mesmo fluxo de transferência que a primeira portaria.
O valor definido para um leito de UTI exclusivo para Covid-19, até então, pelo Ministério da Saúde foi de R$ 1.600,00, conforme Portaria nº 414, de 18 de março de 2020, que autorizou a habilitação de leitos2121 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 414, de 18 de março de 2020. Autoriza a habilitação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva Adulto e Pediátrico, para atendimento exclusivo dos pacientes COVID-19. Diário Oficial da União. 9 Abr 2020..
A tabela 1 abaixo mostra o número de leitos no Espírito Santo, bem como valores repassados e as unidades hospitalares em que foram habilitados. Todos os recursos estavam classificados como créditos extraordinários, totalizando cerca de R$ 120.280.000,00 de abril até dezembro de 2020.
Número de leitos UTI Covid-19 habilitados pelo governo federal no estado do Espírito Santo de acordo com esfera jurídica
As verbas foram direcionadas para hospitais específicos e corresponderam a pagamentos de leitos por 90, 60 ou 30 dias. Todos os valores repassados correspondem ao descrito nas portarias que originaram os recursos, com exceção de 3 Portarias (nº 1.728 de 17/07/2020, nº 3.142 de 19/11/2020 e nº 3.448 de 17/12/2020), as quais o valor previsto é superior ao repassado, não havendo justificativa sobre o não repasse. A perda equivaleu a R$ 2.880.000,00 para o estado.
Dos 1.216 leitos que foram habilitados e/ou prorrogados durante o ano de 2020 conforme descritos na tabela 1, 758 foram em hospitais públicos com gestão indireta, desses, 743 leitos em um único hospital. Do montante de R$ 120.280.000,00 repassados, R$ 67.492.000,00 foram para a gestão indireta (56% do valor total).
Os demais leitos foram 44 em hospitais públicos de gestão direta (equivale a 5% do montante), 239 em hospitais privados com fins lucrativos (20%) e 175 em hospitais filantrópicos (17% do recurso).
Leitos exclusivos para Covid-19 no estado do Espírito Santo durante o primeiro ano de emergência em saúde pública pelo Sars-CoV-2
Sob o ponto de vista da análise dos contratos, o portal coronavírus do ES divulgou o valor de R$ 45.493.499,46 em contratos firmados com hospitais privados no mês de maio de 202099 Espírito Santo. Contratos e execução de despesas – Covid-19. [acesso em 2022 abr 28]. Disponível em: https://coronavirus.es.gov.br/contratos-e-execucao-de-despesas.
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. A tabela 2 mostra a distribuição desse recurso de acordo com especialidades.
Os contratos para ‘Covid-19’ na tabela 2 foram com 5 instituições de fins lucrativos (contratos nº 044, nº 061, nº 063, nº 081 e nº 083), todas com leitos para UTI, enfermaria e recursos para hemodiálise, estimando que cerca de 30% dos pacientes em UTI Covid-19 precisavam de sessões. Além disso, todos estipulam os acréscimos em cima dos leitos UTI Covid-19 em caso de ocupação. Dos 359 leitos, 109 foram leitos UTI e 250 de enfermarias. Já os leitos ‘Não Covid-19’ na tabela referem-se a 09 leitos em UTI e 49 em enfermarias, os cálculos colocam a diária de UTI em R$ 1.690,00 e enfermaria de R$ 715, 00. Os leitos na tabela 2 descritos como Enfermarias Covid-19 tratam-se do pagamento pela reserva de 15 leitos em um hospital privado da região da Grande Vitória.
Todos os contratos tinham como duração três meses e, embora não tenha sido publicado sobre a renovação desses contratos no portal, os censos sobre leitos Covid-19 pela gestão estadual de saúde do ES mostram que mesmo não sendo de forma contínua, após julho de 2020, os hospitais que foram estabelecidos como exclusivos para leitos Covid-19 continuaram participando da rede de hospitais referência99 Espírito Santo. Contratos e execução de despesas – Covid-19. [acesso em 2022 abr 28]. Disponível em: https://coronavirus.es.gov.br/contratos-e-execucao-de-despesas.
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No portal transparência do Espírito Santo, os recursos para compra de leitos com hospitais privados ocorreram de maio de 2020 até fevereiro de 20212222 Espírito Santo. Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo. [acesso em 2022 jul 10]. Disponível em: https://transparencia.es.gov.br/Despesa.
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, totalizando cerca de R$ 70.500.847,11 distribuídos por 7 hospitais; um hospital específico ficou com 60% desse recurso, o qual ficou responsável pela maior parte dos leitos de enfermaria dentro da rede.
Dentro dos recursos exclusivos para Covid-19 na saúde da gestão estadual do Espírito Santo, foi possível identificar cerca de R$ 313 milhões pagos de março de 2020 até fevereiro de 2021 a 19 instituições sem fins lucrativos2222 Espírito Santo. Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo. [acesso em 2022 jul 10]. Disponível em: https://transparencia.es.gov.br/Despesa.
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. É difícil afirmar a empregabilidade dos recursos, pois no portal transparência não constam os contratos, mas um resumo do pagamento. Grande parte desse recurso refere-se a contratos e termos aditivos, seguido por leitos, compra de equipamentos, insumos e indenizações.
Dessas 19 instituições, uma ficou com aproximadamente 68% desse recurso, a mesma é uma organização social da saúde que faz a gestão de um hospital público no estado, o com maior número de leitos UTI para Covid-19.
Quanto à análise específica por tipos de leitos, UTI e enfermaria, até julho/2020 houve um crescimento gradativo do número de leitos, entre agosto e novembro de 2020 um decréscimo se comparado a julho e em dezembro/2020 uma retomada do crescimento de leitos, conforme consta no gráfico 1. Embora se esperasse um número maior de leitos em UTI, a distribuição de leitos por tipo não revela uma diferença significativa na quantidade. Mas há de se considerar que um leito UTI Covid-19 valia mais que o dobro de uma enfermaria, quando ocupado o valor praticamente quadruplicava.
Quando apurado sobre o número total de leitos por esfera jurídica de acordo com o tipo de leito, UTI ou enfermaria, os censos revelaram que a maioria dos leitos UTI ficaram na categoria de hospitais públicos de gestão indireta e em filantrópicos. Já os leitos em enfermaria ficaram no setor privado, seguido de hospitais públicos de gestão direta e/ou hospitais filantrópicos. O gráfico 2 mostra o número de leitos por tipo e esfera jurídica por mês.
Número de leitos hospitalares credenciados para leitos SUS Covid-19 de acordo com esfera jurídica de junho de 2020 a fevereiro de 2021
Os dados no gráfico 2 mostram uma forte tendência à terceirização, fenômeno pelo qual o serviço é ofertado pelo Estado, mas não necessariamente por meios próprios, manifestando-se por meio de parcerias, gestão de serviços por OSS, entre outros2323 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab. Educ. Saúde. 2016 [acesso em 2023 jan 6]; 19(1):1-20. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75czCSqYzjjhRgk/.
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. Os leitos UTI e/ou enfermarias, quando considerados em sua totalidade, estão majoritariamente no serviço filantrópico e/ou em hospitais com gestão por OSS e/ou setor privado (enfermaria).
Discussão
A primeira constatação do estudo é que a estratégia pela abertura de leitos Covid-19 em hospitais, seja público, privado ou filantrópico pela gestão estadual do Espírito Santo favoreceu o crescimento de incentivos ao setor privado.
Os dados apresentados, associados aos do DataSUS, mostram que para essa estratégia foram credenciados apenas 06 novos estabelecimentos para internação (em 2019 eram em 85, 2020 eram em 89 e 2021 em 91)1717 Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Estabelecimento por tipo de atendimento prestado - internação - Espírito Santo. [acesso em 2022 jun 22]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?cnes/cnv/atintes.def.
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. Quanto aos leitos hospitalares, até 2019 a maior parte estava sob responsabilidade da esfera pública (2.822 públicos, 113 empresariais e 2.267 sem fins lucrativos)1717 Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Estabelecimento por tipo de atendimento prestado - internação - Espírito Santo. [acesso em 2022 jun 22]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?cnes/cnv/atintes.def.
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Em 2020 e 2021, o número de leitos por esfera jurídica foi alterado, ocorrendo uma redução dos leitos SUS no setor público e aumento nos demais formatos jurídicos (em 2020 eram 2.288 leitos em estabelecimentos públicos, 499 em empresariais e 2.378 com os estabelecimentos sem fins lucrativos. Já em 2021 foram para 2.335 leitos no público, 629 em empresariais e 2.492 sem fins lucrativos)1717 Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Estabelecimento por tipo de atendimento prestado - internação - Espírito Santo. [acesso em 2022 jun 22]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?cnes/cnv/atintes.def.
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. Os dados corroboram com os números encontrados em cenário nacional, no qual o setor privado se fortaleceu durante a pandemia por meio de contratualizações para oferta de serviços públicos3434 Correia M, Santos V, Alves P. A mercantilização da saúde no enfrentamento da Covid-19: o fortalecimento do setor privado. Rev. Humanidades e Inovação. 2021 [acesso em 2023 jan 6]; (8):1-18. Disponível em: https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/5358#:~:text=Resumo,do%20SUS%20p%C3%BAblico%20e%20estatal.
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Historicamente, embora não idealizado, o empresariado da saúde garantiu sua participação de forma complementar no SUS, entretanto, na prática, o que tem ocorrido é a complementaridade invertida, fenômeno pelo qual o setor privado é responsável por grande parte da oferta de serviços públicos3434 Correia M, Santos V, Alves P. A mercantilização da saúde no enfrentamento da Covid-19: o fortalecimento do setor privado. Rev. Humanidades e Inovação. 2021 [acesso em 2023 jan 6]; (8):1-18. Disponível em: https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/5358#:~:text=Resumo,do%20SUS%20p%C3%BAblico%20e%20estatal.
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.
O processo de implantação do SUS mostra que o avanço da opção liberalizante de mercado foi incentivado pelo Estado e tornou-se inerente aos governos dos anos 2000 para o crescimento do capital privado no setor saúde. Logo, estrategicamente, a saúde foi considerada campo permissível entre as principais políticas sociais a serem ofertadas pelo setor privado em nome do SUS, mediante financiamento público direto2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.. Para tanto, como comprovado por estudos anteriormente mencionados, quando o Estado reduz sua participação direta na oferta de serviços, a sobrevivência é determinada pela regra mercadológica2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
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, tal qual como se confirmou na pandemia de Covid-19.
A opção por contratualizações geralmente decorre por diferentes instrumentos jurídicos, os mais comuns são contratos de gestão e termos de parceria, e podem ocorrer por órgãos públicos ou entidades de direito privado, incluindo OSS2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.. Se, por um lado, essas iniciativas são defendidas sob discurso de eficiência, facilidade de contratação de funcionários, agilidade e flexibilidade no serviço público, por outro, a alta rotatividade de profissionais, problemas de transparência, falta de instrumentos que comprovem essa eficiência, precarização do serviço público e desresponsabilização do Estado são apontados como desvantagem ao SUS e ataque a princípios como transparência e participação social garantidos na Constituição Federal de 19882323 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab. Educ. Saúde. 2016 [acesso em 2023 jan 6]; 19(1):1-20. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75czCSqYzjjhRgk/.
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,2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
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,3232 Fernandes LEM. Gestão de recursos humanos em hospitais sob contrato com organizações sociais de saúde. [dissertação]. [Vitória]: Universidade Federal do Espírito Santo; 2017. 156 p. [acesso em 2023 jan 6]. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/handle/10/10116.
http://repositorio.ufes.br/handle/10/101...
.
Outra constatação é o crescimento da participação de instituições sem fins lucrativos que já respondiam por parte significativa da rede hospitalar1717 Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Estabelecimento por tipo de atendimento prestado - internação - Espírito Santo. [acesso em 2022 jun 22]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?cnes/cnv/atintes.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
. O gráfico 1 mostrou que desde o início a participação das instituições filantrópicas foi priorizada para compor a rede de hospitais referência para Covid-19. A parceria da gestão estadual do Espírito Santo deixou lacunas quanto às regras de contratualização com essas instituições.
Quando o SUS precisar recorrer à iniciativa privada, as instituições sem fins lucrativos devem ser consideradas prioritárias2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022., o que tem favorecido o crescimento dessas organizações que hoje já se configuram como a maior parte da rede ofertada de serviços. Dados do Ministério da Saúde revelam que, em 2018, 1.627 hospitais filantrópicos prestavam serviços ao SUS no Brasil e correspondiam a 49% dos atendimentos e 41,5% das internações hospitalares, a maior parte desses hospitais nas regiões Sudeste (42%) e Sul (36,1%)2727 Instituto Brasileiro das Organizações Sociais de Saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Boas Práticas na Gestão em Parceria com o Terceiro Setor na Saúde (2018). [acesso em 2022 jul 12]. Disponível em: https://www.conass.org.br/biblioteca/boas-praticas-na-gestao-de-parceria-com-o-terceiro-setor-na-saude/.
https://www.conass.org.br/biblioteca/boa...
. Em 2020, com a pandemia em curso, o Ministério da Saúde contemplou 1.651 entidades filantrópicas (Santas Casas e outros hospitais) que participavam de forma complementar ao SUS com R$ 2,2 bilhões em duas parcelas para adaptação de estruturas físicas, aquisição de equipamentos, compra de medicamentos, insumos e suprimentos para a pandemia2828 Brasil. Ministério da Saúde. Fundo Nacional da Saúde. Santas casas e hospitais filantrópicos recebem R$ 1,6 bi do governo. [acesso em 2022 jul 13]. Disponível em: https://portalfns.saude.gov.br/santas-casas-e-hospitais-filantropicos-recebem-r-16-bi-do-governo/#:~:text=O%20Governo%20do%20Brasil%2C%20por,da%20pandemia%20da%20COVID%2D19.
https://portalfns.saude.gov.br/santas-ca...
. Aproximadamente 14 instituições foram contempladas no Espírito Santo por estarem contratualizadas ao SUS pela gestão estadual. Assim, as contratualizações da gestão estadual de saúde do estado do Espírito Santo com essas instituições corroboram um movimento em ascensão de âmbito nacional da saúde2323 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab. Educ. Saúde. 2016 [acesso em 2023 jan 6]; 19(1):1-20. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75czCSqYzjjhRgk/.
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,3131 Brasil. Presidência da República. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, DF: Presidência da República, Câmara da Reforma do Estado, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado; 1995..
É necessário o aprofundamento sobre a forma de consolidação das instituições sem fins lucrativos que discursam como modelo operante para o SUS (maior parte do atendimento), mas também são associadas à saúde suplementar2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.. De modo geral, o que se observou foi que os leitos mais caros ficaram, em sua maioria, com o setor filantrópico (organização social e/ou por um hospital). Já os menos onerosos estiveram com a administração direta e com instituições consideradas com fins lucrativos. Além disso, como apontado por estudo2323 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab. Educ. Saúde. 2016 [acesso em 2023 jan 6]; 19(1):1-20. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75czCSqYzjjhRgk/.
https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75...
,2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/v...
,3232 Fernandes LEM. Gestão de recursos humanos em hospitais sob contrato com organizações sociais de saúde. [dissertação]. [Vitória]: Universidade Federal do Espírito Santo; 2017. 156 p. [acesso em 2023 jan 6]. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/handle/10/10116.
http://repositorio.ufes.br/handle/10/101...
, dificuldade em transparência sobre a aplicabilidade e direcionamento dos recursos públicos para essas instituições se apresentaram no estudo diante das lacunas dos contratos realizados.
Outro apontamento associado às instituições sem fins lucrativos são as OSS, visto que muitas delas possuem dupla qualificação2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.. O Hospital Estadual Dr. Jayme Santos Neves (HEJSN), referência dentro da rede de hospitais para Covid-19, foi responsável pela maior parte dos leitos de UTI. Ele é gerido por uma OSS que pertence a uma rede de hospitais filantrópicos. De acordo com a OSS que administra o hospital, o HEJSN foi o segundo maior hospital do Brasil em atendimento Covid-19, disponibilizando entre 193 a 250 leitos UTI por mês2424 Associação Evangélica Beneficente Espírito Santense. Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves. [acesso em 2022 jul 11]. Disponível em: http://www.evangelicovv.com.br/aebes-unidades/hejsn.
http://www.evangelicovv.com.br/aebes-uni...
. Em determinados meses, chegou a disponibilizar entre 279 a 286 leitos (de dezembro de 2020 a fevereiro de 2021)2424 Associação Evangélica Beneficente Espírito Santense. Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves. [acesso em 2022 jul 11]. Disponível em: http://www.evangelicovv.com.br/aebes-unidades/hejsn.
http://www.evangelicovv.com.br/aebes-uni...
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As OSS emergiram no Brasil após a Reforma do Estado de 1995 e visam a gestão e provisão de serviços de saúde2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3131 Brasil. Presidência da República. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, DF: Presidência da República, Câmara da Reforma do Estado, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado; 1995.. Vinculadas à produção não lucrativa de serviços, algumas pesquisas colocam as OSS como forma de terceirização e mercantilização da saúde2323 Druck G. A terceirização na saúde pública: formas diversas de precarização do trabalho. Trab. Educ. Saúde. 2016 [acesso em 2023 jan 6]; 19(1):1-20. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/ZzrBrfcK75czCSqYzjjhRgk/.
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. Entre as críticas a esse modelo constam o direcionamento de grandes quantias por meio de termos aditivos2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3131 Brasil. Presidência da República. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, DF: Presidência da República, Câmara da Reforma do Estado, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado; 1995..
O repasse financeiro para os leitos do HEJSN foi direcionado para a OSS que realiza a gestão do hospital. Foram identificados cerca de 10 termos aditivos dentro do recorte temporal estudado entre a Sesa com a OSS; os quais alteraram recursos, adicionaram novos recursos financeiros para implantação de medidas sanitárias, alteraram tabelas de metas de acordo com atendimento Covid-19 e não Covid-19, acrescentaram recursos por emenda parlamentar, entre outros. Esses termos aditivos foram para custeio (aproximadamente R$ 260 milhões) e investimento (cerca de R$ 18 milhões2525 Associação Evangélica Beneficente Espírito Santense. Contratos e Termos aditivos do Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves. [acesso em 2022 julho 11]. Disponível em: http://www.evangelicovv.com.br/institutional/627-contratos-e-aditivos.
http://www.evangelicovv.com.br/instituti...
).
Nos recursos financeiros para custeio, foram consideradas somatórias por paciente em dias nos leitos Covid-19 (meta mensal de 8.953 saídas hospitalares) e não Covid-19 (285 saídas hospitalares), juntos firmaram cerca de R$ 24 milhões por mês, de julho de 2020 até fevereiro de 20212424 Associação Evangélica Beneficente Espírito Santense. Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves. [acesso em 2022 jul 11]. Disponível em: http://www.evangelicovv.com.br/aebes-unidades/hejsn.
http://www.evangelicovv.com.br/aebes-uni...
. De acordo com a Sesa o valor fixado foi calculado em 86,28% para manutenção das despesas gerais hospitalares atreladas a Covid-19, e 13,72% às despesas não Covid-19.
A opção da gestão estadual em atribuir hospitais públicos a OSS é preocupante pela complexidade que é o SUS; lacunas de transparência, inserção de termos aditivos no contrato e problemas com fiscalização pela passividade em correções de irregularidades são alguns dos pontos frágeis desse modelo3232 Fernandes LEM. Gestão de recursos humanos em hospitais sob contrato com organizações sociais de saúde. [dissertação]. [Vitória]: Universidade Federal do Espírito Santo; 2017. 156 p. [acesso em 2023 jan 6]. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/handle/10/10116.
http://repositorio.ufes.br/handle/10/101...
. As críticas a essas parcerias se estendem aos demais formatos na saúde que devem ocorrer por complementariedade e não substitutiva2929 Vaccaro SB, Gomes TS. Terceirização da gestão na Saúde Pública. [Rio de Janeiro]: Editora Fiocruz; 2022.,3030 Cegatti F, Carnut L, Mendes A. Terceirizações na área da saúde no Brasil: reflexos no SUS, nas políticas sociais e nos trabalhadores. J Manag Prim Health Care. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; (12):1-41. Disponível em: https://www.jmphc.com.br/jmphc/article/view/978#:~:text=Foi%20efetuada%20busca%20sistematizada%20no,sobre%20os%20trabalhadores%20do%20sistema.
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,3232 Fernandes LEM. Gestão de recursos humanos em hospitais sob contrato com organizações sociais de saúde. [dissertação]. [Vitória]: Universidade Federal do Espírito Santo; 2017. 156 p. [acesso em 2023 jan 6]. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/handle/10/10116.
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,3434 Correia M, Santos V, Alves P. A mercantilização da saúde no enfrentamento da Covid-19: o fortalecimento do setor privado. Rev. Humanidades e Inovação. 2021 [acesso em 2023 jan 6]; (8):1-18. Disponível em: https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/5358#:~:text=Resumo,do%20SUS%20p%C3%BAblico%20e%20estatal.
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A associação do setor público com o privado é uma realidade nacional, mas são relações que possuem interesses econômicos claros, pois embora o setor privado se coloque como parceiro e defensor da saúde para todos, em 2020, quando surgiu no Brasil a proposta de unificação de leitos, medida que previa a utilização de leitos privados pelo SUS por meio de um sistema nacional, representações do setor privado se colocaram contrárias a iniciativa sob diversos argumentos como o valor insatisfatório (a diária de um leito era de R$ 1.600,00) e a preocupação com falta de leitos para os clientes22 Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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. Países como Austrália, Espanha, Irlanda e Reino Unido, que unificaram leitos com o setor privado, foram avaliados como experiências exitosas para o atendimento à população22 Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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No Espírito Santo não houve falta de leitos, visto que a estratégia para medidas e credenciamentos de novos leitos era planejada semanalmente de acordo com a matriz de risco3535 Espírito Santo. Secretária de Estado da Saúde, Subsecretaria de Vigilância em Saúde, Centro de Operações de Emergências Covid-19. Novo Coronavírus Covid-19, Informe Epidemiológico Consolidado 2020. Vitória: SESA; 2020. [acesso em 2022 out 26]. Disponível em: https://coronavirus.es.gov.br/Media/Coronavirus/Boletins/CONSOLIDADO%202020-1.pdf.
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, o que revela a resiliência da política de saúde pública frente a crise pela Covid-19. Entretanto, um leito UTI Covid-19 ocupado possuía uma diária de R$ 3.100,00, fora os casos em que eram realizadas hemodiálises, assim como pagamento para garantia de leitos, Covid-19 e enfermaria, independente de ocupação1414 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 072-R, de 30 de abril de 2020. Define regras e valores para contratação de leitos de UTI e enfermaria para atendimento exclusivo de pacientes COVID-19, na rede privada com fins lucrativos. [acesso em 2022 jun 28]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20072-R%20-%20CONTRATOS%20EMERGENCIAIS%20LEITOS%20PARA%20TODOS.pdf.
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,1515 Espírito Santo. Secretaria de Estado da Saúde. Portaria nº 082-R, de 13 de maio de 2020. Define regras e valores para remuneração dos leitos de UTI nos hospitais filantrópicos contratualizados pela SESA para atendimento exclusivo de pacientes suspeitos e/ou confirmados COVID-19. [acesso em 2022 jul 1]. Disponível em: https://saude.es.gov.br/Media/sesa/coronavirus/Portarias/PORTARIA%20082-R%20-%20VALOR%20UTI%20FILANTR%C3%93PICOS.pdf.
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Assim, se analisada a longevidade da aplicação do recurso, embora o estado tenha investido na reforma de hospitais públicos, parte significativa dos recursos do SUS foram para seus parceiros e caso o estado atualmente precisasse enfrentar um pico pandêmico, estaria novamente condicionado a rede existente de serviços do mercado privado.
Se por um lado, a opção da gestão estadual poderia estar condicionada a compra de leitos durante a pandemia, já que se tratava do formato operante até então; por outro, repensar o plano hospitalar nos moldes e investimentos estatais poderia vir a ocupar a pauta do planejamento estratégico da saúde. Ao invés disso, ainda em 2020, o estado investiu em novas parcerias, substituiu algumas OSS de gestão hospitalar por novas instituições, entre elas, a fundação pública de direito privado, criada pelo próprio estado.
Quando o SUS completou 30 anos, Paim3636 Paim JS. Sistema Único de Saúde (SUS) de 30 anos. Ciênc. saúde coletiva. 2018 [acesso em 2023 jan 6]; 23(6):1-6. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/Qg7SJFjWPjvdQjvnRzxS6Mg/abstract/?lang=pt.
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lançou a pergunta ‘o SUS vai acabar?’. Como resposta, foi colocado que, embora todos os empecilhos, o SUS acabou tornando-se funcional ao empresariado da saúde que se alimenta de seus recursos. De igual forma, no estado no qual focamos nosso estudo, o atendimento pelo SUS tem se expandido, entretanto, por meio do aumento de parcerias com o setor privado.
Considerações finais
No Brasil, os governos que sucederam a implantação do SUS não buscaram banir o direito à saúde, mas torná-la produto de um Estado neoliberal funcional à lógica de mercado. Os diversos ataques aos serviços públicos desencadearam estratégias como a terceirização que se apresenta em diferentes formatos, ou seja, pelas OSS, Oscips, empresas públicas de direito privado, parcerias, empresas privadas, entre outras. Não se trata de um movimento homogêneo, mas composto por um segmento mercadológico.
A região Sudeste é composta por diferentes representações do setor privado inseridas no SUS e atuando por livre iniciativa. No estado do Espírito Santo não é diferente, a pluralidade de formatos jurídicos e contratualizações são postas como plano de modernização hospitalar. Esse plano colocou que condicionar os hospitais a apenas uma transição gerencial (para OSS) não seria a melhor opção. Desta maneira, a estratégia foi manter alguns contratos de gestão com as OSS e ao mesmo tempo criar uma fundação. Com a pandemia e os novos recursos, essas iniciativas foram fortalecidas, acarretando em aumento de leitos hospitalares no setor filantrópico, privado e recursos repassados às OSS.
Essa diversidade dificulta até mesmo o controle da gestão e a condiciona a parcerias conforme um ordenamento mercadológico. Outro ponto a ser considerado é o formato de gestão que acaba não aparecendo dentro do estabelecimento público, ou seja, nem todos os hospitais públicos são de gestão direta e até mesmo o hospital federal que também participou da rede é gerido por uma empresa hospitalar (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH).
Portanto, o trabalho conclui que a relação de compra de leitos exclusivos para Covid-19 em hospitais privados, filantrópicos e oferta em serviços públicos de gestão direta e indireta ocorreu conforme regra mercadológica, ou seja, a opção pela pluralidade de formatos jurídicos no SUS refletiu na pandemia pela necessidade e/ou decisão de reafirmar essas contratualizações.
Os leitos hospitalares no estado já mostravam um crescimento do setor filantrópico, a pandemia fortaleceu um caminho que já estava sendo percorrido. Com isso, o setor filantrópico, seja pela organização social dentro do serviço público ou compra de leitos, era e continua sendo o formato jurídico com forte participação nos leitos SUS. Quanto às instituições com fins lucrativos (privadas), embora não seja a com maior participação, na pandemia houve aumento significativo de credenciamento dos leitos SUS.
Assim sendo, quando analisada a longevidade desse investimento para o SUS, os repasses a esses formatos não reduziram as discrepâncias e tampouco permitiram que este legado de serviços ampliados ou recursos aplicados fossem revertidos de forma definitiva aos serviços públicos. Além disso, entregar a oferta da saúde pública a diferentes formatos jurídicos torna o Estado refém de seus parceiros, desdobrando-se em diversas fragilidades que foram apontadas no estudo e que caminham na contramão do SUS constitucional. E, caso fosse enfrentado um novo pico pandêmico, a gestão estaria condicionada a atender as regras desse mercado.
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Suporte financeiro: não houve
Referências
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2Costa DC, Costa R, Bahia L, et al. Oferta pública e privada de leitos e acesso aos cuidados à saúde na pandemia de COVID-19 no Brasil. Saúde debate. 2020 [acesso em 2023 jan 6]; 44(esp4):232-247. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/39jsyjTLxGZHFQXrs4VVMRS/?lang=pt.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
14 Abr 2023 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 2023
Histórico
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Recebido
18 Jul 2022 -
Aceito
07 Set 2022