Open-access Envelhecimento e isolamento social: uma revisão integrativa

Envejecimiento y aislamiento social: una revisión integradora

Resumo

Objetivo:  Analisar os conceitos disponíveis na literatura sobre o isolamento social de pessoas idosas.

Métodos:  Métodos: Revisão de literatura do tipo integrativa baseada na perspectiva teórica do ageísmo. Os dados foram coletados nos meses de março a maio de 2019, nas bases LILACS, MEDLINE, EBSCO e Web of Science. Utilizou-se o cruzamento das palavras-chave “Older adult” e “Elderly”, com os descritores controlados “Aged”, “Social Isolation” e “Loneliness”, registrados no Medical Subject Headings (MeSH), com o uso do operador booleano AND. A amostra final foi composta por 18 artigos.

Resultados:  O isolamento social da pessoa idosa relaciona-se com a ausência ou inadequação da família, amigos e redes sociais gerais; isolamento não significa necessariamente solidão; a operacionalização do conceito de isolamento social necessita de padronização para uma melhor mensuração; há fatores de risco já identificados e possíveis consequências; há intervenções, mas insuficiente informação se elas se baseiam em evidências; descreve-se a relação entre isolamento e solidão e apresentam-se fatores protetivos, porém com baixo nível de evidência.

Conclusão:  Conclui-se que há necessidade de criação de instrumentos para operacionalizar o conceito de isolamento social, uma vez que os estudos apresentam uma heterogeneidade de conceitos e embasamentos teóricos.

Descritores Envelhecimento; Idoso; Ageísmo; Isolamento social; Solidão; Comportamnto social

Resumen

Objetivo:  Analizar los conceptos disponibles en la literatura sobre el aislamiento social de personas mayores.

Métodos:  Métodos: Revisión integradora de literatura basada en la perspectiva teórica del edadismo. Los datos fueron recopilados entre los meses de marzo y mayo de 2019, en las bases LILACS, MEDLINE, EBSCO y Web of Science. Se utilizó el cruce de las palaras clave “Older adult” y “Elderly”, con los descriptores controlados “Aged”, “Social Isolation” y “Loneliness”, registrados en el Medical Subject Headings (MeSH), con el operador booleano AND. La muestra final estuvo compuesta por 18 artículos.

Resultados:  El aislamiento social de la persona mayor se relaciona con la ausencia o falta de capacidad de la familia, amigos y redes sociales generales. Aislamiento no significa soledad necesariamente. La funcionalidad del concepto de aislamiento social necesita estandarización para obtener una mejor medición. Existen factores de riesgo ya identificados y sus posibles consecuencias. Hay intervenciones, pero sin suficiente información si se basan en evidencias. Se describe la relación entre aislamiento y soledad y se presentan factores protectores, pero con bajo nivel de evidencia.

Conclusión:  Se concluye que hay una necesidad de crear instrumentos para operacionalizar el concepto de aislamiento social, dado que los estudios presentan una heterogeneidad de conceptos y fundamentos teóricos.

Descriptores Envejecimiento; Anciano; Ageísmo; Aislamiento social; Soledad; Conducta social

Abstract

Objective:  To analyze the concepts available in the literature about the social isolation of older people.

Method:  This was an integrative literature review with basis on the theoretical perspective of ageism. The data were collected from March to May 2019, in LILACS, MEDLINE, EBSCO and Web of Science databases. The crossing of keywords “Older adult” and “Elderly” were used, with the controlled descriptors “Aged,” “Social Isolation,” and “Loneliness” registered in the Medical Subject Headings (MeSH), using the Boolean operator AND. The final sample consisted of 18 articles.

Results:  The social isolation of older person is related to absence or inadequacy of family, friends and general social networks; isolation does not necessarily mean loneliness; operationalization of the social isolation concept needs standardization for a better measurement; risk factors was already identified with possible consequences; interventions are available, but there is insufficient information whether they are based on evidence; the relationship between isolation and loneliness is described and protective factors are presented, but with a low level of evidence.

Conclusion:  Instruments to operationalize the concept of social isolation need to be created, as the studies present heterogeneity of concepts and theoretical bases.

Keywords Aging; Aged; Ageism; Social isolation; Loneliness; Social behavior

Introdução

O processo de envelhecimento populacional já é uma realidade no Brasil. Pela primeira vez, a maioria das pessoas pode esperar viver até os 60 anos ou mais.(1) No entanto, viver mais não significa viver melhor. A dinâmica das cidades e de trabalho, os novos arranjos de moradia e família, o crescente culto ao individualismo e mudanças nos valores tradicionais da sociedade influenciam de modo desigual e contraditório na qualidade de vida das pessoas.(2,3)

Entre os fatores que têm se destacado como um potencial problema de saúde pública encontra-se o isolamento social.(4) Este pode ser definido como um estado no qual indivíduos experimentam cada vez menos envolvimento social do que gostariam com outras pessoas. Isso interfere na sua qualidade de vida. Refere-se à objetiva separação de outros indivíduos, ocasionando ausência ou poucas interações sociais no dia a dia.(5) Este fenômeno, embora possa ser experimentado em qualquer fase da vida, é mais prevalente entre pessoas idosas, com estimativa em torno de 10% a 43%, a depender do percurso histórico e das condições de vida.(6) A vivência do isolamento pode ocorrer conjuntamente com a sensação subjetiva de solidão ou mesmo pode gerá-la como consequência.(7) Esta realidade tem demonstrado ser um problema multifacetado. Há estudo que afirma que ela está associada ao aumento da mortalidade por todas as causas.(8)

No Brasil, cujas territorialidades são marcadas por expressivas variabilidades nas condições de vida de pessoas idosas, como as características sociais, econômicas, demográficas, culturais e ambientais heterogêneas, os impactos na interação social podem ser bastante diferentes e, consequentemente, a longevidade e a qualidade de vida dos adultos idosos. O entendimento dessa problemática contribui para ampliar a promoção de políticas que busquem espaços de sociabilidade e de interação entre idosos, famílias e cuidadores e, mais que isso, a fim de ressignificar a formação dos profissionais de saúde para o cuidado.

A magnitude do envelhecimento populacional é crescente e influenciada por diferentes fatores, e está relacionada com desiguais e contraditórias formas de viver a idade avançada, tendo a interação social como um marcador para a qualidade de vida. Este estudo teve como objetivo analisar os conceitos disponíveis na literatura sobre o isolamento social de pessoas idosas

Métodos

Realizou-se uma revisão integrativa de literatura composta por seis etapas.(9) No primeiro momento, adotou-se a pergunta de pesquisa: Quais conceitos e perspectivas estão disponíveis na literatura acerca do isolamento social de pessoas idosas? Na segunda etapa, estabeleceram-se os critérios de inclusão: (i) apresentar fatores que contribuem para o isolamento social de idosos; (ii) abordar aspectos relacionados aos fatores de risco à saúde; (iii) apresentar perspectivas de abordagem sobre o isolamento social de pessoas idosas; iv) artigos nas línguas inglesa, espanhola e portuguesa. Os critérios de exclusão foram: (i) artigos de revisão; (ii) textos, cartas, teses, dissertações e artigos não indexados em revistas científicas; (iii) não apresentar no artigo o conceito ou definições de isolamento social; (iv) abordar exclusivamente a solidão.

A busca dos artigos foi realizada nas bases de dados Web of Science, EBSCO, LILACS e MEDLINE, estas duas últimas por intermédio de consulta na Latin American and Caribbean Center on Health Sciences Information. A busca no EBSCO incluiu a base de dados CINAHL e, os achados foram apresentados como quantitativo total da EBSCO, no período de março a maio de 2019. Foram consultados por intermédio do cruzamento das palavras-chave “Older adult” e “Elderly”, com os descritores controlados “Aged”, “Social Isolation” e “Loneliness”, registrados no Medical Subject Headings (MeSH), utilizando-se MESH + All fields, com o uso do operador booleano AND. Utilizou-se o termo “elderly” (idoso), considerado preconceituoso segundo a perspectiva teórica que embasa o ageísmo, porque o DECS e o MESH ainda apresentam vários artigos que utilizam esse descritor quando tratam do envelhecimento. Não houve limite de ano de publicação. O estudo seguiu as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses (PRISMA).

Identificou-se um total de 216 dados de seleção, sendo 82 da Web of Science, 48 da EBSCO, 2 da Lilacs e 84 da Medline. A primeira etapa do processo de seleção de literatura incluiu a leitura dos títulos e os resumos dos estudos, sendo excluídos 148 títulos por não cumprirem o objeto da pergunta orientadora e os critérios de inclusão descritos. Um total de 23 artigos achava-se em duplicidade e foram removidos. Posteriormente, procedeu-se à leitura completa de 45 artigos selecionados. Após aplicação dos critérios de exclusão, obteve-se como amostra final um total de 18 artigos (Figura 1). No decorrer das etapas, as eventuais discordâncias na seleção de artigos foram resolvidas por dois juízes com conhecimento no tema da pesquisa, que validaram a escolha dos artigos selecionados na amostra final.

Figura 1
Base de dados e estratégia de busca selecionada

A seguir, procedeu-se a uma nova leitura na íntegra dos artigos da amostra, a partir de formulário pré-estruturado, em que constam: autores, ano, local, delineamento do estudo, conceito de isolamento social, escalas utilizadas e principais resultados referentes ao isolamento social. Após a sistematização, procedeu-se à análise qualitativa(10) com leitura dos achados e extração dos fragmentos, conforme apresentados nos resultados e nas considerações finais. Utilizou-se para apoio à análise o software Iramutec 0.7 alpha 2. Por fim, consideraram-se os aspectos éticos, a autoria das ideias, os conceitos e as definições presentes nos artigos.

Resultados

Foram selecionados 18 artigos na amostra final; todos estavam escritos na língua inglesa (28% originários dos EUA, 28% da Inglaterra e os demais, 5,5% cada: Índia, Holanda, Itália, Japão, Malásia, Países Baixos e Taiwan). O ano de publicação variou de 2009 a 2019. O ano com maior número de publicações foi 2013, com 22%.

Os estudos analisados indicam como fatores associados ao risco de isolamento social de pessoas idosas tanto questões individuais quanto sociais, podendo ser assim elencados:

  1. Fatores relacionados à saúde física e mental do indivíduo: pessoas com dependência física ou comprometimento funcional, surdez ou perda auditiva, doenças neurológicas e doenças de longa duração limitadas;(1121)

  2. Fatores sociodemográficos e baseados em iniquidades sociais: ser mulher, solteiro ou viúvo, vivenciou perda de pessoas ou entes próximos, desempregado ou economicamente dependente, com baixa escolaridade, baixa competência em saúde, baixo poder de decisão, baixa renda familiar, sem filhos, menor tamanho de arranjo familiar, com pouca ou ausente vinculação religiosa, morar em área rural e questões geográficas, baixa mobilidade e acesso a transportes, sem acesso a um sistema de previdência social, morar em locais de cuidado residenciais ou instituições de longa permanência, estar hospitalizado;(15,17,18,20,2127)

  3. Fatores contextuais e estruturais: como políticas econômicas e sociais que produzem e mantêm desigualdades socioeconômicas que limitam a oportunidade de participação em atividades sociais.(18)

Todos os artigos apresentaram alguma definição conceitual para isolamento social, conforme apresentado no quadro 1.

Quadro 1
Síntese das definições conceituais sobre isolamento social e principais conclusões segundo ano, país de publicação e delineamento do estudo

Já a análise de similitude possibilita decifrar as conexões entre as palavras do corpus textual, favorecendo inferir a construção do texto e dos temas relevantes. A figura 2 apresenta uma análise de similitude e descreve as palavras “social”, “organização” e “falta”, que auxiliaram na identificação do campo representacional das definições atribuídas ao isolamento social. Os resultados indicaram três campos: (i) ausência de contatos e apoio social; (ii) falta familiar; e (iii) falta de envolvimento/organização regular em redes de amigos. A solidão foi fracamente vinculada aos conceitos atribuídos ao isolamento social.

Figura 2
Análise de similitude

Para a aferição do isolamento social, três artigos utilizaram a Escala de Redes Sociais de Lubben (LSNS), um artigo utilizou a Escala UCLA Loneliness associada a perguntas subjetivas, e todos os demais estudos criaram índices ou instrumentos próprios, representando 78% dos artigos. Os atributos vinculados à criação desses instrumentos derivaram, principalmente, de: avaliação de status marital; número de filhos; relação familiar; atividade religiosa; participação em grupos (sociais, voluntariado); frequência de contatos; arranjos de moradia e análise geográfica. Entre os principais temas apresentados nos resultados, tem-se avaliação de fatores associados ao: risco de isolamento; possíveis consequências; intervenções às pessoas idosas isoladas; relação entre isolamento e solidão; e possíveis fatores protetivos.

Discussão

A partir da análise dos artigos incluídos foi possível identificar um conceito mais geral sobre isolamento social de pessoas idosas, vinculado, de forma objetiva, à escassez de relações humanas e contatos regulares com pessoas, quer sejam familiares, quer sejam amigos ou membros da comunidade. Nesses casos, o indivíduo, no cotidiano de sua vida, interage com um número menor de pessoas do que gostaria, sua rede social é reduzida e conta com insuficiência de apoio social ‒ emocional, informativo e instrumental. Relaciona-se com o histórico de vida e o contexto de organização social. Nessa perspectiva, o isolamento não se refere àqueles que se desconectaram voluntariamente, mas a possíveis barreiras que dificultam ou impedem a conexão social.

Algumas pesquisas destacaram a relação do isolamento social com os fatores emocionais.(12,17,2122) Para eles, o conceito de isolamento é vinculado à falta de interação social objetiva e apresenta-se relacionado com uma percepção subjetiva de isolamento emocional. Esses conceitos aproximam a ausência ou a escassez de interação social do sentimento ou percepção de solidão.

Apesar dessa aproximação conceitual entre isolamento e solidão, estudos(12,14,2426) sustentam que os construtos são diferentes e não estão necessariamente correlacionados. A solidão não depende da quantidade de interações sociais, configurando-se como uma experiência altamente subjetiva. Já o isolamento está diretamente relacionado à diminuição objetiva das redes sociais.(29) Considerando essas diferenças, os autores indicam a necessidade de distinção dos problemas nas pessoas idosas, para uma intervenção mais específica e direcionada, uma vez que suas consequências à saúde podem ser distintas.(2426)

Entretanto, todas as definições analisadas constatam que, no caso de isolamento social, o número de relacionamentos interpessoais é significativamente diminuído ou mesmo ausente. As formas de medir o isolamento social ainda apresentam um déficit de padronização operacional e este pode ser uma das razões pelas quais foram encontradas diferentes abordagens conceituais sobre o isolamento e poucos estudos com medidas validadas para além das escalas de solidão. A maioria dos artigos não apresenta a operacionalização do conceito de maneira a favorecer a mensuração do fenômeno; apenas um artigo(19) discute a importância da questão cultural a ser usada na construção conceitual e a ser usada para programas de intervenção de redução do isolamento social de pessoas idosas.

No Brasil, um artigo publicado(30) a partir do Estudo Longitudinal de Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil) evidencia que os aspectos de participação social e percepção de vizinhança são influenciados por características urbanas. Situações urbanas como dificuldades de cruzamento de ruas e acessibilidade ao transporte coletivo foram identificados como barreiras para a participação social. Tais aspectos expressam a heterogeneidade das situações enfrentadas pelas pessoas idosas, o acesso ao direito às cidades e as diferenças entre os países.

Entre as consequências do isolamento social na vida da pessoa idosa destacam-se: maior risco por problemas de saúde, redução do bem-estar e aumento da mortalidade.(2325,27) Outros achados também podem ser considerados, tais como: prejuízo para saúde cognitiva e comprometimento da saúde mental;(2526) ampliação dos riscos para depressão e ansiedade;(26) redução da atividade física diária e maior tempo sedentário;(26) pior qualidade do sono;(11) maior chance de desenvolver doenças cardiovasculares(24) e sensação de vida insatisfatória.(21)

As consequências podem ser ainda mais impactantes, conforme um estudo realizado no Japão, que detém o maior número de pessoas idosas do mundo contemporâneo. Estima-se que estas irão representar 40,5% da população em 2055. Tem sido identificada a chamada morte solitária como uma das consequências do isolamento social.(1,31)

Esta morte solitária acontece quando um indivíduo morre sozinho em casa e isso passa despercebido pelos outros. O corpo do falecido pode ser deixado sem vigilância por dias, meses ou mesmo anos. É considerado um desfecho trágico e representa, simbólica e concretamente, o isolamento social que parte da humanidade está vivenciando.(31)

A literatura estudada revela que o isolamento social é potencialmente evitável e que as intervenções capazes de preveni-la ou atuar na sua superação possuem múltiplas dimensões. Programas destinados a prevenir o isolamento social são mais eficazes quando utilizam os recursos existentes na comunidade; são feitos sob medida, de acordo com as necessidades do indivíduo e têm como alvo pessoas que podem compartilhar experiências semelhantes.(22) Nesse sentido, os artigos assinalam a necessidade de delimitar bem as singularidades dos indivíduos para se realizar a intervenção.

No estudo realizado em Alabama(13), identificou-se, por exemplo, que a frequência de uso da internet tem o potencial de afetar indivíduos que sofrem de solidão, mas não modificam as percepções de isolamento. No estudo indiano, evidenciou-se que assistir a TV, ouvir rádio e utilizar computador também não foram associados à conexão social.(28) O contato face a face parece ser o caminho para intervir positivamente no isolamento.

Na pesquisa realizada nos Países Baixos(19) evidenciou-se que pessoas idosas, com nível de interação baixo há muito tempo, necessitam de maiores motivações e suporte do que aquelas que vivem em isolamento recente, situacional. Diante disso, observa-se que as intervenções devem considerar desde relacionamentos mal resolvidos até a reconstrução de laços e vínculos, com intervenções por meio de atividades sociais e grupos de apoio, investindo numa sociabilidade ativa.

Os estudos analisados também apontam fatores protetivos contra a escassez de relações sociais: trabalho voluntário, atividades culturais, férias, esportes, leitura, hobbies, compras, ser cristão ativo e possuir filhos, trabalho e ou aposentadoria foram considerados preditores de sucesso para a conexão social das pessoas idosas.(18,28)

Esses países, assim como o Brasil, devem buscar soluções alternativas para pessoas idosas se manterem empregadas ou aposentadas, com sistema de previdência estruturado, provisão e alocação de recursos de saúde e comunitários adequados, acesso a oportunidades de interação social e conectividade comunitária e configuração de cidades criativas e interativas que planejam espaços para convívio intergeracional e que possibilitem novas modalidades de interação humana, de forma a afetar positivamente o isolamento vivido pelas pessoas idosas.

Levanta-se como possibilidade analítica, para aprofundamento futuro, a análise entre isolamento social e o construto ageísmo.(32) O ageísmo possibilita entender que a narrativa social cravada nas falas populares e nos âmbitos societários mais amplos consolida cotidianamente uma visão de envelhecimento numa perspectiva negativa. Preconceitos e estereótipos disseminados no seio da sociedade interferem na vivência plena da velhice e têm o potencial de interferir na formulação eficaz de políticas que enfrentem os desafios do envelhecimento na contemporaneidade, entre eles, o isolamento social. A própria teoria do desengajamento social como parte do ciclo da vida da pessoa idosa, conforme proposta por Cumming e Henri(33), apresenta um fundo teórico conceitual do envelhecimento que se aproxima do ageísmo e carece de revisão teórica e análise mais profunda.

Um estudo coreano(34) acrescenta uma nova dimensão aos estudos sobre isolamento social quando aponta que o conceito deve também ser pensado na perspectiva da solidão étnica e da diáspora, no qual indivíduos estão isolados por força de uma experiência de migração, perseguição política ou mesmo abandono. É a experiência de um isolamento por força de uma injustiça ou de subjugação, associado a uma impossibilidade de ser escutado. Essa visão corrobora a possibilidade de relação entre ageísmo, isolamento social e iniquidade social, deixando em aberto possibilidades de novos estudos.

As escalas de identificação do isolamento social carecem de padronização para permitir mensurar e comparar fenômenos entre países. Apesar de existir a escala validada de Lubben, a maior parte dos artigos criou índices próprios para medição que permitem incluir questões conjunturais e culturais de cada região. A heterogeneidade entre idosos e entre países e suas populações sugere cautela na análise do isolamento social identificado nos estudos.

Devido ao limitado número de bases consultadas e à não inclusão de literatura cinza, não foi possível identificar estudos oriundos de países da América Latina e Caribe, que possuem maior proximidade geográfica, cultural e social com o Brasil.

Conclusão

Conclui-se que as pesquisas sobre isolamento social de pessoas idosas apresentam lacunas ao descrever os instrumentos adotados, a operacionalização das bases epistemológicas e as perspectivas teóricas do conceito adotado. Os estudos evidenciaram uma heterogeneidade de métodos na tentativa de abordar a multidimensionalidade do isolamento social de pessoas idosas, suas implicações, consequências e fatores protetivos. A presente pesquisa permitiu compreender que o isolamento social é multifacetado e que a pessoa idosa isolada não apresenta características homogêneas. Esse conjunto de características distintas, com diferentes meios de detectar e intervir no problema, evidencia a necessidade de intensificar e especificar as estratégias para minimizar esse problema societário e ampliar a construção de programas baseados em evidências, com monitoramento e avaliação de sua efetividade para grupos heterogêneos. A solidão e o isolamento foram identificados como dois constructos distintos que não necessariamente estão correlacionados em suas implicações. O isolamento, independentemente de outros fatores, é capaz de influenciar negativamente nos desfechos de saúde, satisfação e bem-estar de modo singular. As escalas de identificação do isolamento social carecem de padronização para permitir mensurar e comparar fenômenos entre países. Apesar de existir a escala validada de Lubben, a maior parte dos artigos criou índices próprios para medição que permitem incluir questões conjunturais e culturais de cada região. A diversidade cultural dos países e suas populações sugere cautela na análise do isolamento social identificado nos estudos. A ampliação do papel e da função social da pessoa idosa precisa ser ressignificada, e a sociedade necessita superar a separação dessas pessoas na dinâmica das cidades, incluindo-as organicamente. A alocação de recursos na saúde, o enfrentamento ao ageísmo, o sistema de previdência e soluções criativas nas cidades podem colaborar para esse enfrentamento.

Agradecimentos

À Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) pelo financiamento do Projeto de pesquisa coordenado por Leides Barroso Azevedo Moura.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    12 Set 2019
  • Aceito
    01 Jun 2020
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