Resumo
Objetivo Compreender o coping dos profissionais de enfermagem no processo morte- morrer em neonatologia.
Método Estudo qualitativo na abordagem exploratória descritiva, participaram dez profissionais da enfermagem. Histórias rememoradas dos profissionais no cuidado do processo da morte e do morrer em neonatologia foi o meio para a coleta de dados. Organização, tratamento e análise dos dados fundamentado na análise de conteúdo de Bardin e no software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires.
Resultados Emergiram duas categorias da interface da análise e os fundamentos da Teoria Motivacional de Coping de Skinner, Equipe de enfermagem e a teoria motivacional de coping na morte em neonatologia; Ação regulatória de ameaça e o enfrentamento da morte em neonatologia. As estratégias de coping da equipe de enfermagem estudada mostram que os padrões cognitivos e respostas comportamentais referem-se à própria maneira de lidar com o cotidiano do sofrimento vivenciado em família, onde os profissionais buscam informação para ultrapassar a ameaça, num enfrentamento de desamparo e de fuga do acolhimento.
Conclusão Os processos autorreferenciais experienciados em situações estressantes por profissionais da enfermagem favorecem à empatia, o vínculo e a comunicação com a família de neonatos à morte. Os indicativos de fragilidade na formação mantêm-se predisponentes para as dificuldades no enfrentamento da morte-morrer.
Equipe de enfermagem; Unidades de cuidado intensivo neonatal; Atitude frente à morte; Morte; Recém-nascido
Resumen
Objetivo Comprender el coping de los profesionales de enfermería en el proceso muerte-morir en neonatología.
Métodos Estudio cualitativo de enfoque exploratorio descriptivo, donde participaron diez profesionales de enfermería. Las historias contadas por los profesionales sobre el cuidado del proceso de muerte y del morir en neonatología fue el medio para la recopilación de datos. La organización, el tratamiento y el análisis de los datos fue fundamentado en el análisis de contenido de Bardin y en el software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires.
Resultados Surgieron dos categorías de la interfaz de análisis y fundamentos de la teoría motivacional de coping de Skinner: Equipo de enfermería y la teoría motivacional de coping respecto a la muerte en neonatología y Acción reguladora de amenaza y el afrontamiento a la muerte en neonatología. Las estrategias de coping del equipo de enfermería estudiado muestran que los patrones cognitivos y las respuestas de comportamiento se refieren a la propria manera de lidiar con la cotidianidad del sufrimiento vivido en familia, donde los profesionales buscan información para superar la amenaza, en un enfrentamiento de desamparo y de fuga de la acogida.
Conclusión Los procesos autorreferenciales vividos en situaciones estresantes por profesionales de enfermería favorecen la empatía, el vínculo y la comunicación con la familia de neonatos a fallecer. Los indicios de fragilidad en la formación se mantienen predisponentes para las dificultades de afrontar la muerte-morir.
Grupo de enfermería; Actitud frente a la muerte; Muerte; Recién nacido
Abstract
Objective This understanding is essential to subsidize interventions of nursing professionals in order to care for families.
Method A qualitative study in descriptive exploratory approach involved ten nursing professionals. Recollected stories collected from professionals in the care of the process of death and dying in neonatology was the means for data collection. Data organization, treatment and analysis was based on Bardin’s content analysis and the software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires.
Results Two categories emerged from the analysis interface and the foundations of Skinner’s Motivational Theory of Coping, nursing staff and Motivational Theory of Coping in death in neonatology; Threat regulatory action and coping with death in neonatology. The coping strategies of the nursing team studied show that cognitive patterns and behavioral responses refer to the very way of dealing with the daily suffering experienced in the family, where professionals seek information to overcome the threat, a coping with helplessness and escape from welcoming.
Conclusion The self-referential processes experienced in stressful situations by nursing professionals favor empathy, bonding and communication with the family of infants. The indicators of frailty in training remain predisposing to difficulties in coping with death-dying.
Nursing team; Intensive care units neonatal; Attitude to death; Death; Infant newborn
Introdução
As atitudes frente aos fatores estressores dos trabalhadores e profissionais da enfermagem, caracterizam determinadas maneiras de enfrentar e transpor situações de sofrimento. As estratégias de enfrentamento são denominadas coping. Trata-se dos esforços cognitivos e comportamentais para suportar e controlar eventos de sofrimento e estresse. O enfrentamento da equipe de saúde no processo de morte e o morrer de crianças em unidade de internação hospitalar leva os profissionais a enfrentarem e conduzirem diferentes modos de enfrentamento dessas situações limites.(1) A morte requer ser percebida como uma etapa natural da vida. E, a atenção no processo de educação profissional na área da saúde discutir e trazer abordagens para a prática assistencial qualificada nesta etapa vivencial. A resposta que cada pessoa apresenta frente a um acontecimento, evento de sofrimento e dor é compreendida como enfrentamento de maneira particular e única pelo ser humano. A morte, como uma experiência inegável da existência compõe-se de eventos que fazem emergir crenças, religiões, culturas, convicções humanas e vivências, fazendo com que cada ser humano desenvolva um modo próprio e particular de enfrentamento. Há descrição na literatura à associação do cuidado estritamente com a cura da doença. Apresentando postura de indiferença de alguns profissionais da equipe, sofrimento, luto mal vivido, falta de diálogo da equipe, a falta de conhecimento teórico e prático, como fatores que dificultam o direito do neonato de morrer dignamente. Evidenciando como fatores prejudiciais e de fragilidade ao luto dos familiares.(2)
As Unidades Neonatais apresentam-se como ambiente de grande suporte tecnológico, especializado e qualificado de assistência à saúde. Ligadas à rapidez e às informações clínicas e observacionais fidedignas. Isto requer conhecimento e habilidades específicas na atenção em neonatologia e atitudes humanizadas. A criação de vínculos ligada ao convívio, por vezes, prolongado, interfere na forma de assistência humanizada aos recém-nascidos e familiares. Neste cenário, a internação possui um dimensionamento que envolve as esferas físicas, psíquicas e sociais dos familiares e profissionais. As situações vivenciadas no ambiente hospitalar podem ser avaliadas como estressoras e necessitam ser discutidas para justificativa do evento, que atinge a vida dos profissionais e da equipe de enfermagem, nos aspectos socioprofissionais.(3) Ademais, a fadiga de compaixão limita o enfrentamento em momentos de fim de vida de um paciente.(4) Nesta perspectiva, a teoria motivacional de coping descreve que o comportamento humano é desenvolvido para responder a três necessidades psicológicas básicas: de ter competência, de estabelecer vínculos e de autonomia ou autodeterminação.(5)Essa teoria é uma proposta recente de análise do enfrentamento do estresse, considerando o coping uma ação regulatória que percebe qualquer evento como estressante a partir do momento que desafia ou ameaça as necessidades psicológicas básicas de relacionamento, de competência e de autonomia.(6)
A identificação dos estressores ocupacionais e suas estratégias de enfrentamento são relevantes, pois auxiliam a entender e selecionar estratégias de coping efetivas, repensando o processo de trabalho assistencial e tornando a rotina hospitalar mais produtiva e menos desgastante, transformando a qualidade da assistência prestada pela equipe de enfermagem, em especial quanto ao processo de morte e morrer em neonatologia por ser este um cenário de prematuridade pra vida e, também, para a morte. O que gera na equipe de enfermagem apego, esperança, frustração e dor.(7)
Diante disso, a proposta da Teoria Motivacional de Coping é conceber uma visão psicológica do desenvolvimento. O construto é compreendido como resultado de confluências de processos fisiológicos, genéticos e sociais específicos das fases vitais da vida. As respostas de coping devem ser compreendidas como competências intrínsecas associadas às características temperamentais, vínculos afetivos e o contexto que o indivíduo está inserido. O coping possui como perspectiva fatores de proteção ou vulnerabilidade, que estão interligados a sintomas psicopatológicos. Os indivíduos podem apresentar, assim, tendências internalizantes ou externalizantes, resultantes de formas mal adaptativas de reação ao estresse.(8) O indivíduo evita a ameaça e começa a desenvolver uma série de manobras de fuga, distanciamento e aceitação. Os esforços individuais, tanto de comportamento, quanto cognitivos, tem como objetivo auxiliar o indivíduo a administrar suas situações estressoras.
As atitudes frente aos fatores estressores dos trabalhadores e profissionais da enfermagem, caracterizam determinadas maneiras de conduzir e transpor situações de sofrimento. Aponta-se para a emergência de pesquisas acerca da morte de crianças em terapia intensiva e ampliação do conhecimento dos profissionais de enfermagem e de saúde de como lidar com o sofrimento alheio e na perspectiva infantil.(9) O que, diante do exposto, remete ao objetivo deste estudo compreender o coping dos profissionais de enfermagem no processo da morte e do morrer em neonatologia.
Métodos
Estudo de abordagem qualitativa, exploratória-descritiva, utilizada em pesquisas que englobam compreensão e interpretação que se referem ao objeto em questão. Foi desenvolvido em Hospital Universitário do Sul do Brasil, na Unidade Neonatal, que recebe recém-nascidos de risco sob cuidados intensivos e assistência multiprofissional contínua. A unidade compõe-se de 12 leitos ativos, equipe de 11 enfermeiros e 40 técnicos de enfermagem. Participaram do estudo seis enfermeiros e quatro técnicos de enfermagem. Esta amostra por conveniência seguiu os critérios de inclusão dos participantes: ser enfermeiro e técnico em atividade no período da pesquisa, inserido na escala de trabalho nos turnos instituídos de atividade da unidade, com participação da assistência profissional no processo de morte e/ou óbito neonatal na unidade. E, critérios de exclusão: enfermeiros e técnicos de enfermagem afastados, em licença de saúde, licença maternidade e férias. Conduzida a coleta de dados após apresentação da pesquisa aos profissionais, assinados os Termos de Consentimentos Livre e Esclarecido. Apresentado formulário, com cabeçalho orientador para informações de características do profissional e para a contação de história do evento vivenciado de morte de um neonato. Duas modalidades de opção para a participação dos respondentes, via oral ou escrita, para nortear a contação foram feitas algumas questões para envolver os respondentes na rememoração sobre a temática: Qual o significado da morte para você? Como você se sentiu quando ocorreu o evento da morte? Que coisas passaram em sua mente? Como você descreve o vínculo com o paciente e família? Como você enfrentou a situação? Utilizou-se um diário de campo, para registro da pesquisadora de observações experienciadas durante a coleta dos dados. O diário de campo permitiu observações e registros de situações vividas durante a coleta dos dados. A média de tempo para devolutiva da contação da história escrita foi de sete dias e as orais o tempo médio foi de quinze minutos. A coleta de dados, realizada pelas pesquisadoras, ocorreu entre setembro e outubro de 2019 na própria unidade de trabalho do profissional, conforme disponibilidade da equipe. As histórias impressas pelos participantes retornaram às pesquisadoras via e-mail ou em pasta própria arquivada na unidade. O relato das informações foi gravado e ao final transcrito, para serem validadas pelos respondentes. Duas histórias foram oralmente contadas, e oito foram descritas, sem duplicidade de resposta dos participantes na modalidades apresentadas. Para designar as entrevistas e proporcionar o anonimato dos respondentes foi utilizada a letra E (Enfermeira/o) e T (Técnica/o) seguida do número correspondente à ordem da realização das entrevistas (E1, E2, T3...). Para análise utilizou-se o software IRAMUTEQ (Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires com o intuito de objetivação dos dados e fidedignidade da pesquisa. Dentre as suas possibilidades, verificam-se as estatísticas textuais clássicas, tais como identificar a quantidade e frequência de palavras, palavras únicas (coeficiente de Hapax), bem como encontrar palavras em consonância com as classes gramaticais identificas. No que tange às análises de dados textuais simples utilizou-se por meio o IRAMUTEQ na realização de cálculos de frequências de palavras, os quais são apresentados em nuvem de palavras. Este software permitiu identificar as entrevistas que continham uma aproximação textual, palavras de repetição e que se interligavam.(10) A partir da organização, passou-se à segunda etapa do tratamento dos dados, a análise das histórias à luz da Teoria Motivacional de Coping. Estruturado um quadro com as estratégias cognitivas de coping e descritos os processos regulatórios de desafio e de ameaça e analisado conforme Bardin.(11) Perpassou a análise pelas três fases descritas de leitura das relações da nuvem de palavras, histórias transcritas, a Teoria Motivacional de Coping e observações do diário de campo. A pesquisa atendeu aos aspectos éticos da Resolução n.466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) considerando o respeito pela dignidade humana e pela proteção devida aos participantes de pesquisas científicas envolvendo seres humanos. Apresenta aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEPSH) de uma Universidade do sul do país, sob protocolo nº 3.419.006/2019 e CAEE nº 05869518.7.0000.0121. O método deste estudo seguiu os critérios indicados para pesquisa qualitativa, descritos no checklist Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ).(12)
Resultados
Da análise léxica dos vocábulos emergiram na nuvem de palavras, a partir do software IRAMUTEQ, a similitude e frequência de aparição dos vocábulos: Bebê 39 vezes (situação, acreditar); Morte 30 vezes (nascer, vida, filho, sentimento, triste) e, Família 22 vezes (óbito, pai, mãe, vida, equipe, vínculo, dor, morrer e cuidado) (Figura 1).
Da relação entre os resultados dos vocábulos, as estratégias cognitivas de coping apresentadas nas histórias de Enfermeiras e Técnicos de Enfermagem têm-se, das 12 estratégias cognitivas de coping, seis referentes as ações regulatórias de desafio: acomodação, negociação, resolução de problemas, busca de informação, autoconfiança e busca de apoio; e quatro ações regulatórias de ameaça: oposição, desamparo, delegação e fuga. E, revela a análise das temáticas relacionadas aos comportamentos dos participantes caracterizados em desafios e ameaças. O desfecho do processo de coping referente à resiliência aparece ao final da discussão. Dessa relação, emergem duas categorias de análise.
1° categoria - Equipe de enfermagem e a teoria motivacional de coping na morte em neonatologia, aqui é evidenciada as ações internas e externas dos profissionais da equipe de enfermagem no enfrentamento da morte de crianças na neonatologia. E, as nuances emocionais, técnicas e psicológicas do cuidado à morte no espaço do cuidado e as famílias. Registra-se fragmentos de algumas das histórias orais e escritas, que revelam estratégias adotadas para vivenciar o processo de morte junto ao neonato e família.
“Cada um enfrenta conforme sua religião, sua vivência. Isso eu acho que facilita, eu sou espírita, minha religião interfere bastante no enfrentamento da vida, inclusive na morte… o fato de acreditar que nada é por acaso, que morrer não acabou me ajuda muito. Só que eu não consigo passar isso pra família, até porque eu não ache que seja a minha função” (E6).
“O que sempre procuro fazer é conversar com os pais, estimular o toque no bebê, colocá-lo no colo dos pais, mesmo quando o quadro clínico se encontra instável, libero as visitas, pergunto se querem trazer alguém para rezar ou batizar e falo que a missão do bebê está sendo cumprida, quando percebo que a família é religiosa… Todos esses cuidados ajudam a diminuir um pouco o nosso sofrimento, trazendo a sensação de que pudemos contribuir com uma morte digna, com uma assistência de qualidade na finitude de uma criança recém-nascida e com minimização do sofrimento dos familiares, que podem participar do processo, despedir-se e realizar os rituais necessários, para que seus corações se confortem por terem realizado o que estava ao seu alcance.” (E2).
A religião surge como forma de entendimento sobre a finitude da vida e auxilia na aceitação do processo de morte-morrer. Mesmo diante de fato doloroso para os familiares, o modo como o profissional acolhe os familiares conforta a família. Contudo, esses profissionais sofrem e se frustram diante da morte do neonato.
“Impotência, os questionamentos (Por quê? Será que fizemos algo errado? Será que demoramos?) São as mortes mais difíceis, já havia vínculo e veio de surpresa (apesar de sabermos que sempre existe esta possibilidade) (E4).”
“Sempre tento manter-me “forte” na frente da família, transmitir segurança, mas já chorei junto ao atestar óbito. Empatia com cada família independente do tempo (prematuro extremo ou RN a termo).” (T1)
“O pai gritava em desespero e dizia que não acreditava mais em Deus pois havia orado muito em toda gestação e Deus não havia feito nada por eles. Tive muita pena da situação, e infelizmente ele não tinha condições de ouvir nada e não se permitia ser consolado. De maneira geral percebo a fragilidade do assunto e o quanto é difícil encará-lo.” (E3)
2° categoria – Ação regulatória de ameaça e o enfrentamento da morte em neonatologia, revela as atitudes e sentimentos diferentes da equipe, considerando a gravidade clínica e o prognóstico do neonato. Aqui transparece que a equipe percebe o desfecho do neonato, em razão das condições clínicas de internação. A equipe cria estratégias quanto a esse desfecho, procura um certo distanciamento do neonato, que sabem não irá evoluir bem. Observa-se nos pronunciamentos.
“Às vezes, o bebê de UTI NEO, prematuro extremo, quando ele vai a óbito, para gente pode ser até o desfecho esperado. A gente sabe que só ia se prolongar por muito mais tempo e ia ter um desfecho ruim.” (E1)
“A condição do bebê tem relação com o sentimento que mobiliza a gente. Se é um bebê viável, a gente sofre mais. Se é um bebê que a gente acha que ia ficar com sequelas, a gente sofre menos.” (E1)
“Prematuros extremos, síndromes incompatíveis com a vida, malformações múltiplas são “mais aceitáveis” a morte, porque enquanto profissional e não sendo da rede familiar conseguimos agir com razão, entender fisiologicamente o motivo.” (T1)
“O sofrimento é intenso e nós, profissionais que estamos em contato direto com o paciente e familiares, sofremos junto. Algumas vezes não sabemos o que falar, o que fazer e como abordar.” (E2)
Discussão
No que tange ao processo saúde-doença, a morte se mostra como a realidade de outra pessoa, distante da realidade individual do profissional. Assim, observa-se, que os profissionais lidam com a morte e o processo do luto criando suas próprias estratégias para vivenciar esse momento. Mesmo, que muitas vezes, família e colegas tenham a impressão, que valorizam na assistência, a especificidade do tratamento e cuidado fisiológico, técnico e tecnológico da doença.
Os profissionais da enfermagem mostram-se essenciais às necessidades de competência, vínculo e autonomia trabalhadas, haja vista o período que permanecem vivenciando e desenvolvendo o cuidado profissional junto a essa clientela. Profissionais da área da saúde têm se beneficiado de estudos das “atitudes humanas”, construindo um arcabouço teórico para a utilização prática com a finalidade de ampliar a relação dessas atitudes à assistência no processo da morte e do morrer, na dor e no sofrimento.(4)Assim, os profissionais da enfermagem apresentam mecanismos de reatividade e regulação, que se constroem ao longo do tempo.
O estudo enfatiza que a informação-conhecimento sobre a morte e o morrer é frágil no período de formação acadêmica. Os achados corroboram com o descrito na Teoria Motivacional de Coping, que os processos autorreferenciais influenciam nas estratégias para o enfrentamento de situações estressantes. Nesse universo de enfrentamento, a negociação em acordo com a teoria motivacional de coping se dá em colocar-se no lugar do outro, perceber que os acontecimentos referentes à vida e à morte podem acontecer a qualquer pessoa, em qualquer lugar, a qualquer momento.
Na condição de pais de crianças recém natas, a empatia se faz presente na assistência dos profissionais da enfermagem. Refletida por meio do toque e do concentrar-se nas crenças e na religiosidade. Mostra-se enquanto necessidade solicitada pelos pais, seja em forma de oração, objetos de sacramentos religiosos que são uma simbologia significativa como cuidado holístico que privilegia o físico, emocional, mental, espiritual e social de todo o processo de cuidado.(13)
As ações regulatórias de resolução de problemas e de busca de informação dentro da teoria motivacional de coping se mostram neste estudo pela capacidade dos profissionais em apresentarem-se resilientes, compararem suas próprias trajetórias de vida e das crianças à morte e suas famílias. Não omitem que há um sofrimento silencioso, mas relutam a ele por meio de ações que disponibilizem aos pais momentos para a compreensão do processo de perda pela morte. Nas ações de coping, desenvolvidas pela equipe de enfermagem, observa-se que há uma autonomia nas escolhas de estratégias utilizadas, seja pela fragilidade de informações e conhecimentos acerca de como lidar e enfrentar processos de estresse, morte e morrer de crianças e famílias, seja pela inexistência de redes de apoio no ambiente profissional.(14)
A religiosidade/espiritualidade se apresenta significativamente importante na compreensão e relativização do sofrimento frente à morte e ao morrer. Em que, nesse processo de finitude a espiritualidade está ligada à dimensão sagrada, ao divino, ou seja, ao que dá sentido à vida para as pessoas. Enquanto a religiosidade está relacionada à institucionalização e ao sistema de crenças, que aproxima o ser humano do sagrado.(15)
Considera-se, que na ação regulatória de desafio, fundamentada na teoria motivacional de coping, os profissionais de enfermagem abordaram estratégias de coping que trazem a termo um desfecho positivo. O desfecho centrado na resiliência, de modos adaptativos de comportamentos, sentimentos e emoções para a assistência aos recém-nascidos, evidencia que a equipe de enfermagem tem condições para enfrentar de forma positiva às adversidades. Considerando as estratégias de enfrentamento utilizadas pelos profissionais como positivas a uma condição de estabilidade para o trabalho, frente à morte em neonatologia, reflete a resiliência, o que denota uma adaptação pelo processo e ambiente de trabalho e as influências sociais adquiridas no viver cotidiano.(16) A morte do neonato é interpretada como interrupção no seu ciclo biológico e isso provoca na equipe de enfermagem o sentimento de impotência, frustração, tristeza, dor, sofrimento e angústia. Os sentimentos que estão subjetivamente interligados com o luto são inúmeros, relacionados a tristeza, ansiedade e medo, o que evidencia a necessidade de estratégias de apoio às famílias e equipes.(17)
Os profissionais da área da saúde precisam ter conhecimentos e práticas voltadas para as ciências humanas e sociais de modo complementar. É perceptível a necessidade da equipe de desenvolver habilidades de comunicação adequada e estabelecer bom uso dela durante o processo de morte dos neonatos. A abertura à participação dos pais nesse processo tem importância destacada na literatura, pois os momentos pós óbito são os mais importantes para os familiares e os que marcam suas memórias, podendo assim serem momentos tristes diante do ocorrido ou traumáticos.(17)
A equipe de enfermagem, na prática, apresenta dificuldades profissionais e pessoais que acabam interferindo no cuidado e na dinâmica de assistência prestada aos pacientes. Algumas dessas dificuldades dizem respeito a sentimentos de angústia relacionada à possibilidade de morte dos pacientes. A literatura científica aborda como a aceitação, por parte dos profissionais, diante da morte infantil, é dificultosa e apresenta obstáculos.(16)
A Teoria Motivacional do Coping, neste estudo, mostrou que o desamparo e a fuga dos profissionais demonstram a falta de atributos psicológicos que os ajudem a acompanhar o estágio final de pacientes neonatos. Os profissionais podem deixar de lado as limitações, sentimentos e percepções dos pacientes e, desta forma, acabar não oferecendo o cuidado necessário ou digno, não proporcionando a estes um dos cuidados que lhes são conferidos, a assistência emocional. Estudos mostram que, diante da morte de um neonato e/ou criança, os envolvidos emocionalmente vivenciam diversos sentimentos, sendo um deles a impotência, que acaba sendo o mais comum entre os profissionais.(18) As dificuldades de lidar com este processo na assistência ressalta a necessidade da preparação da equipe e a de refletir sobre a formação profissional, sendo necessárias discussões e abordagens em relação ao cuidado ao paciente fora da possibilidade terapêutica de cura.(9) As tentativas dos profissionais da enfermagem em dispensar um cuidado e uma atenção de humanidade, possibilita significar a dor e o sofrimento. Diante do que, o enfrentamento dos profissionais está relacionado com o vínculo e o reconhecimento compassivo, para além da doença física. É centrar o cuidado/assistência de enfermagem na compreensão de aspectos pessoais das famílias que vivenciam o processo da morte.(15)
O tempo de contato com os pacientes neonatos, os acompanhamentos, as evoluções dos casos clínicos e a convivência com a família acabam resultando em uma maior dificuldade de aceitação da morte, resultando em sofrimento, seja pela dor das famílias e do vínculo adquirido, seja pelos diferentes modos de enfrentamento dessa situação por parte do profissional e do familiar. As dificuldades em aceitar os enfrentamentos do outro cria um distanciamento para o cuidado do profissional ao familiar. Dessa forma, o convívio nem sempre é suficiente para estabelecer um vínculo afetivo de forma que haja entendimento das estratégias de coping dos profissionais no que tange à perda do outro e que resulte em sofrimento, fazendo parte da rotina dos profissionais de enfermagem, que acompanham o sofrimento dos pacientes neonatos que recebem o cuidado, compartilhando com os familiares os momentos de dor, sofrimento e tristeza. Em uma Unidade Neonatal esse envolvimento acaba sendo ainda mais intenso para ambas as partes.
As limitações de um estudo, que trata do enfrentamento diante da morte e do morrer de neonatos não se desenrola livre de dificuldades. Desde a abordagem do espaço e das pessoas para entrar no cenário de pesquisa até o processo de contação e rememoração das histórias vivenciadas e suas intensidades. Isto, pois, traz à tona as próprias limitações pessoais em acordo com as individualidades, crenças e cultura.
Conclusão
Considera-se que o coping da equipe de enfermagem é diretamente proporcional ao processo de aprendizagem vivencial e profissional, ligado ao conjunto de crenças e abordagens da espiritualidade de cada indivíduo. Verificou-se que, a partir da utilização da teoria motivacional de coping entrelaçada às entrevistas e observações, a socialidade dos profissionais enquanto indivíduos partícipes de uma comunidade, além laboral, influencia fortemente a assistência a ser prestada aos pacientes e famílias no processo morte e morrer na neonatologia. A compreensão do coping dos profissionais da enfermagem, frente à morte e ao morrer na unidade neonatologia, reflete as categorias elencadas no universo da Teoria Motivacional de Coping. Dos 12 padrões de estratégias cognitivas, as respostas comportamentais que se integram enquanto ameaças e desafios, da lacuna de aprendizado de estratégias para lidar com a morte no processo de formação, perpassa pela comparação aos acontecimentos próprios com a morte até a forte utilização de fatores religiosos e espirituais. Trazem a termo como enfermeiros e técnicos de enfermagem lidam com processos estressores do sofrimento e da dor no evento de morte de crianças e o luto de suas famílias. E, que a caracterização de tempo de trabalho e idade aparecem como fatores que determinam enfrentamentos.
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Editado por
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Editor Associado (Avaliação pelos pares): Ariane Ferreira Machado Avelar (https://orcid.org/0000-0001-7479-8121) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Mar 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
17 Ago 2020 -
Aceito
25 Mar 2021