Resumo
A literatura sobre as relações entre movimentos sociais e Estado produzida nos últimos anos no Brasil tem destacado a interpenetração entre política institucional e extrainstitucional. Boa parte dessa literatura parte da análise das relações entre movimentos sociais e Poder Executivo, destacando, em especial, o ativismo institucional de burocratas ativistas progressistas. Nesse artigo, busco contribuir para esse debate, ao analisar o ativismo institucional no Poder Legislativo a partir do confronto político estabelecido entre ativistas progressistas do movimento LGBT e ativistas conservadores do movimento cristão familista no Congresso Nacional entre 2003 e 2014. Para essa análise, realizei entrevistas com doze assessores e parlamentares envolvidos neste confronto político. Os resultados indicam a centralidade dos “assessores ativistas” e das frentes parlamentares para o ativismo institucional e os confrontos políticos no Poder Legislativo.
Palavras-chave: movimentos sociais; confrontos políticos; ativismo institucional; assessoria parlamentar; frentes parlamentares
Abstract
The literature on the relations between social movements and the State recently produced in Brazil has shown the interpenetration between institutional and extrainstitucional politics. Most of this literature analyses the relations between social movements and the Executive, focusing especially on the activism of progressive bureaucrat activists. This paper seeks to contribute to this debate, by analyzing institutional activism in the Legislative in the episode of contention between progressive LGBT movement activists and conservative familist movement activists in the Brazilian National Congress between 2003 and 2014. This analysis is based on twelve interviews with parliamentary advisors and parliamentarians involved in this conflict. The results point to the importance of “activist advisors” and parliamentary fronts for institutional activism and contentious politics in the Legislative.
Keywords: social movements; contentious politics; institutional activists; parliamentary advisors; parliamentary fronts
Introdução
No ano de 2012, o movimento cristão familista conquistou uma importante vitória em seu confronto político com o movimento brasileiro de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). A então presidenta Dilma Rousseff (do Partido dos Trabalhadores - PT) foi a público anunciar seu veto à distribuição do material didático produzido por organizações do movimento LGBT em parceria com o Ministério da Educação (MEC), no âmbito do projeto Escola sem Homofobia. O material havia sido alvo de intensa campanha de ativistas conservadores, que o denominaram de “kit gay”, sugerindo que seu objetivo era influenciar a sexualidade dos alunos das escolas brasileiras. Em pronunciamento à imprensa declarando seu veto, a presidenta adotou o enquadramento proposto por estes ativistas conservadores, afirmando que a nenhum órgão de governo seria permitido “fazer propaganda de opção sexual”.
A declaração da presidenta Dilma foi motivada pela forte oposição da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) à distribuição desse material didático nos bastidores do Congresso Nacional. Dias antes desse pronunciamento, assessores parlamentares da FPE tiveram acesso ao conteúdo do material. Maria3, assessora de um importante senador da denominada “bancada evangélica” e integrante de organizações do movimento cristão familista, era uma delas. De acordo com seu relato, logo após tomar conhecimento do material, convocou uma reunião com os parlamentares da FPE e mobilizou-os contra sua distribuição.
Nos dias seguintes, Maria e seus colegas de assessoria vinculados a esta frente traçaram a estratégia que seria utilizada para pressionar a chefia do Executivo contra o material. Percorreram os gabinetes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em busca de aliados e enviaram e-mails aos membros da FPE menos envolvidos com as atividades cotidianas da frente, para mobilizá-los para a ação. Dias depois, os deputados da FPE ameaçaram publicamente trancar a pauta de votações do plenário da Câmara dos Deputados caso o material fosse distribuído.
O resultado conquistado por esta mobilização coletiva, uma reunião com o então ministro da educação Fernando Haddad (PT), foi frustrante para os assessores e demais membros da FPE. Aos deputados da frente não foi garantida a influência prometida sobre o material em desenvolvimento. Eles se mobilizaram novamente. Declararam à imprensa que convocariam o então ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci (PT) - que dias antes havia sido foco de reportagens que denunciavam seu suposto enriquecimento ilícito - para prestar esclarecimentos à Câmara dos Deputados, caso a chefia do Executivo não atendesse a suas demandas. Dias depois, a presidenta Dilma vetaria a distribuição do material didático relacionado ao programa Escola sem Homofobia.
Este episódio - descrito a partir de relatos jornalísticos4 e de informantes de pesquisa - evidencia a intensa atuação de assessores parlamentares vinculados (direta ou indiretamente) a organizações de movimentos sociais, de forma articulada a frentes parlamentares, em episódios de confronto político no Congresso Nacional. A atuação de ativistas de movimentos sociais no interior das instituições políticas em defesa de suas causas não é uma novidade para a literatura sobre as relações entre movimentos sociais e Estado no Brasil.
Essa literatura tem descrito nos últimos anos processos marcados pela interpenetração entre política institucional e extrainstitucional, questionando assim os pressupostos da externalidade e da confrontação presentes em abordagens anteriores sobre esse tema. Pesquisadores têm demonstrado que os repertórios de ação dos movimentos sociais não se limitam a táticas extrainstitucionais de confrontação com o Estado e com governos, incluindo também diversas táticas institucionais de ação (ABERS; SERAFIM; TATAGIBA, 2014; ABERS; VON BÜLOW, 2011; ALBUQUERQUE, 2015; CARLOS, 2015a; 2015b; SILVA, 2015; TATAGIBA, 2010). Têm destacado, nesse sentido, a tática da ocupação de cargos na burocracia estatal por ativistas, que passam a defender as causas de um movimento social no interior das instituições políticas (ABERS; SERAFIM; TATAGIBA, 2014; ALBUQUERQUE, 2015; CAYRES, 2017; FERREIRA; LOTTA, 2016; RECH, 2016; SILVA; OLIVEIRA, 2011; TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016).
Boa parte dessas pesquisas, no entanto, tem limitado suas análises à atuação de ativistas institucionais no Poder Executivo, não tendo investigado de forma profunda a atuação desses ativistas no Poder Legislativo. Tais pesquisas também têm limitado em grande medida sua análise ao ativismo institucional progressista, secundarizando as relações contenciosas estabelecidas entre ativistas institucionais progressistas e conservadores no âmbito de confrontos políticos. Frente a esta lacuna, este trabalho busca responder à seguinte questão: de que forma ativistas institucionais atuam no Poder Legislativo para defender suas causas em confrontos políticos no Brasil?
Para responder a essa pergunta, analiso o caso do ativismo institucional no confronto político entre o movimento LGBT e o movimento cristão familista no Congresso Nacional entre 2003 e 2014. Confrontos políticos são episódios delimitados de política contenciosa, ou seja, formas de interação política nas quais
atores apresentam demandas que afetam os interesses de outros atores levando a esforços coordenados em defesa de interesses ou programas compartilhados e nas quais governos estão envolvidos como alvos ou iniciadores de demandas ou, ainda, como terceiros interessados (TILLY; TARROW, 2015, p. 7, tradução nossa).
O conceito de “confronto político” oferece, assim, uma análise relacional aos estudos de movimentos sociais, enfatizando que as características e dinâmicas da ação coletiva de determinado movimento devem ser analisadas como resultados do conjunto de relações de cooperação e conflito nos quais este movimento está inserido em determinado recorte espaço-temporal (BARCELOS; PEREIRA; SILVA, 2017). Este conceito destaca, ainda, que Estados e governos não são necessariamente alvos das ações de movimentos sociais, podendo estar atravessados por confrontos políticos, na medida em que seus membros podem ter posições distintas em relação às demandas neles disputadas. Assim, movimentos sociais podem estabelecer relações de cooperação ou conflito com atores estatais no âmbito de um confronto político (PEREIRA, 2018a)5.
Confrontos políticos podem estar baseados em relações contenciosas entre movimentos e contramovimentos, que, nestes casos, formam pares de movimentos opositores. Contramovimentos são entendidos como “redes de indivíduos e organizações que compartilham os mesmos objetos de interesse com os movimentos sociais aos quais se opõem” e que, simultaneamente a esses movimentos, “apresentam demandas concorrentes ao Estado em relação às suas políticas e competem pela atenção da mídia de massa e do público mais amplo” (MEYER; STAGGENBORG, 1996, p. 1632, tradução nossa).
Neste artigo, analiso as interações contenciosas entre ativistas institucionais do movimento LGBT e do movimento cristão familista no Congresso Nacional. No que se refere ao movimento LGBT, desde a década de 2000, ativistas têm ampliado as demandas apresentadas junto ao governo federal - antes restritas, em grande medida, à área da saúde - a partir de enquadramentos nos quais os conceitos de “direitos humanos” e “homofobia” têm centralidade e que sugerem que a violência e a discriminação homofóbicas são fatores que inviabilizam a efetivação de direitos básicos da população LGBT. A partir deste enquadramento, o movimento LGBT defendeu ao longo da década de 2000 o desenvolvimento de políticas públicas de prevenção e combate à discriminação e à violência homofóbicas e a aprovação de leis que reconhecessem direitos de pessoas LGBT - como a criminalização da homofobia, a união civil, o casamento e a adoção para casais formados por pessoas do mesmo sexo, bem como o reconhecimento do nome social (CARRARA, 2010; DE LA DEHESA, 2010; FACCHINI, 2003; FACCHINI; FRANÇA, 2009; PEREIRA, 2016; RAMOS; CARRARA, 2006).
A oposição a essas demandas é uma das pautas de organizações cristãs conservadoras que têm atuado fortemente no cenário político brasileiro nos últimos anos. Esta rede de associativismo cristão conservador é composta por organizações evangélicas, como o Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política (FENASP), que buscam articular nacionalmente conselhos políticos locais de igrejas evangélicas6, e por grupos conservadores vinculados a outras religiões cristãs, tais como a “Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família” (predominantemente católica) e o “Movimento Nacional da Cidadania pela Vida - Brasil sem Aborto” (cujos membros são fiéis de diversas religiões cristãs). Suas demandas são enquadradas como uma defesa da liberdade religiosa e de culto - em sua interpretação, ameaçada por iniciativas como a criminalização da homofobia - e como uma defesa “da vida e da família”. No que se refere ao enquadramento de “defesa da vida”, sugere-se que demandas como a descriminalização do aborto ameaçariam o suposto “direito dos nascituros”. Já em relação ao enquadramento de “defesa da família”, seus ativistas argumentam que a homossexualidade é uma doença que ameaça a família heterossexual - entendida como a unidade de sustentação moral da sociedade - ou ainda que as decisões sobre temas como a educação sexual são prerrogativas exclusivas das famílias (DANTAS, 2011; DUARTE, 2011; MACHADO, 2015; NATIVIDADE, 2006; NATIVIDADE; OLIVEIRA, 2009). Em decorrência de seus enquadramentos, que a partir de uma definição restritiva de “família” se opõem aos direitos reprodutivos e à diversidade dos arranjos familiares enquanto dimensões fundamentais da cidadania, denomino aqui esta rede de “movimento cristão familista” - embora seus ativistas não adotem tal denominação -, a partir das reflexões propostas por Mello (2006).
Ativistas institucionais vinculados a esses dois movimentos e que atuaram no Congresso Nacional entre os anos de 2003 e 2014 envolvendo-se em relações contenciosas entre si foram entrevistados no decurso desta investigação para responder ao problema de pesquisa. Os resultados desta pesquisa indicam, em primeiro lugar, a centralidade dos “assessores ativistas” para o ativismo institucional no Poder Legislativo. Em segundo lugar, tais resultados indicam que o ativismo institucional nas instituições legislativas pode ser articulado a partir das frentes parlamentares, que assim se configuram como atores coletivos que estabelecem interlocução com movimentos sociais e protagonizam confrontos políticos no Poder Legislativo.
Para apresentar estes achados, este artigo está dividido da seguinte maneira. Na próxima seção, apresento o debate da literatura nacional sobre ativismo institucional. Na seção seguinte, apresento os dados e métodos utilizados na pesquisa empírica que embasa este artigo. A seguir, defino a noção de “assessores ativistas” e apresento a importância destes atores no confronto político analisado. Na seção seguinte, descrevo atuação destes atores de forma articulada a frentes parlamentares no caso em estudo. Por fim, apresento as considerações finais sobre os achados da pesquisa.
Ativismo institucional no Brasil
O problema de pesquisa e o objeto de análise delineados neste artigo podem ser analisados a partir de ampla variedade de debates teóricos da ciência política e das ciências sociais de forma mais ampla. A atuação de assessores e frentes parlamentares, por exemplo, se apresenta como um objeto de análise relevante para estudos legislativos e estudos sobre a burocracia. Neste trabalho, busco inserir essa temática em um debate contemporâneo específico das ciências sociais brasileiras: aquele sobre movimentos sociais e instituições políticas.
As principais tradições teóricas consolidadas em meados século XX no campo de estudos dos movimentos sociais partiram de uma rígida distinção entre movimentos e Estados. Embora plurais, as chamadas Teorias dos Novos Movimentos Sociais (TNMS) sugerem que movimentos sociais seriam reações de resistência às novas dinâmicas de dominação e exploração do capitalismo contemporâneo, que teriam ampliado as lógicas do mercado e do Estado capitalista para a vida cotidiana dos sujeitos. Nesse sentido, os “verdadeiros” movimentos sociais apresentariam uma orientação antissistêmica e de rejeição às dinâmicas burocráticas estatais (MELUCCI, 1989; TOURAINE, 1989). Já a chamada teoria do processo político (TPP) parte da definição de movimentos sociais como atores coletivos que não possuem acesso às instituições políticas e que, assim, precisam mobilizar táticas extrainstitucionais de ação para influenciar o Estado em direção a seus interesses e crenças, estabelecendo, assim, relações de conflito com as instituições políticas (MCADAM, 1999; TILLY, 1978).
Tais abordagens teóricas reproduzem, assim, dois pressupostos em sua análise das relações entre movimentos sociais e Estado: os da externalidade e da confrontação. Assumem, portanto, a ideia de que movimentos sociais são (ou devem ser) atores coletivos completamente isolados das instituições políticas que necessariamente estabelecem relações de confronto com o Estado e com seus membros. Tais pressupostos têm sido identificados e criticados pela literatura nacional (ABERS; VON BÜLOW, 2011; CAYRES, 2017; SILVA, 2015; TATAGIBA, 2010) e internacional (GOLDSTONE, 2003) sobre o tema.
Opondo-se a esses pressupostos, a literatura nacional sobre as relações entre movimentos sociais e Estado tem destacado que ativistas não mobilizam apenas táticas extrainstitucionais de confronto - como passeatas, greves e ocupações -, recorrendo frequentemente também a táticas institucionais de ação, como a presença em orçamentos participativos, conselhos e conferências de políticas públicas e outros canais de participação institucionalizada. Esta literatura tem questionado, ainda, a ideia de que a participação em arenas institucionais resulta necessariamente em uma “cooptação” dos movimentos, demonstrando empiricamente que os repertórios de um movimento social podem combinar táticas institucionais e extrainstitucionais, de confronto e de cooperação em suas rotinas de interação com o Estado (ABERS; SERAFIM; TATAGIBA, 2014; ALBUQUERQUE, 2015; CARLOS, 2015a; 2015b). Em oposição à ideia de “cooptação” dos movimentos sociais como resultado necessário da ação por vias institucionais, a literatura brasileira também tem demonstrado que movimentos são capazes de influenciar políticas públicas por meio desse tipo de ação em dadas circunstâncias, analisando as condições e os mecanismos que possibilitam seu sucesso nesse processo (DOWBOR; CARLOS; ALBUQUERQUE, 2018; CARLOS; DOWBOR; ALBUQUERQUE, 2017; LAVALLE et. al., 2017).
Além da ação em canais de participação política institucionalizada, estudos têm destacado que ativistas de movimentos sociais, em diversos casos, mobilizam a tática da ocupação de cargos na burocracia estatal, agindo no interior das instituições políticas com o intuito de influenciar o desenvolvimento e a implementação de políticas públicas por um governo em direção a suas causas (ABERS; SERAFIM; TATAGIBA, 2014; ALBUQUERQUE, 2015; CAYRES, 2017; FERREIRA; LOTTA, 2016; RECH, 2016; SILVA; OLIVEIRA, 2011; TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016). Na trajetória destes ativistas, é possível observar um “trânsito institucional”, ou seja, sua circulação em organizações de movimentos sociais, partidos políticos e instituições públicas (SILVA; OLIVEIRA, 2011), ou ainda uma “múltipla filiação”, ou seja, sua presença concomitante em organizações de movimentos sociais e órgãos da administração pública (TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016). Em muitos casos, ainda, burocratas agem no interior das instituições políticas em defesa das causas de um movimento social mesmo sem apresentar vínculos prévios com organizações deste movimento (ABERS, 2015; 2019).
Dessa forma, a literatura nacional tem destacado a ação de indivíduos na defesa de causas de movimentos sociais no interior das instituições políticas, apresentando vínculos prévios com organizações de movimentos sociais ou não7. Para definir este fenômeno, tais pesquisadores têm mobilizado o conceito de “ativismo institucional”.
Os estudos sobre ativismo institucional no contexto brasileiro foram estimulados, em grande medida, pelo fluxo de ativistas de movimentos progressistas para o interior de órgãos do Poder Executivo no nível federal possibilitado pela chegada do Partido dos Trabalhadores (PT) ao poder, com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva em 2002. Nesse sentido, tais trabalhos priorizaram a análise do ativismo institucional em órgãos do Poder Executivo, destacando a ação dos “burocratas ativistas”, pessoas que se aproximam de governos “a ponto de ir trabalhar neles, com o intuito específico de promover ações em benefício de causas pelas quais militam” (FERREIRA; LOTTA, 2016, p. 15) em ministérios e secretarias de governo. Esses estudos priorizaram, ainda, a análise do ativismo institucional de movimentos progressistas no interior desses órgãos. Assim, estudos recentes sobre o ativismo institucional no Brasil apresentam duas importantes lacunas.
Em primeiro lugar, no âmbito deste debate, poucos estudos se dedicaram à análise do ativismo institucional no interior de instituições legislativas. Nesse sentido, destaca-se o trabalho de Carone (2018), que analisou a atuação de uma coalizão de organizações do movimento feminista no processo de tramitação da Lei Maria da Penha no Congresso Nacional. A autora indica que esta coalizão influenciou tanto o processo de formação da agenda, quanto o texto do projeto ao longo de sua tramitação, a partir de uma atuação próxima a parlamentares e assessoras aliadas no âmbito das comissões legislativas.
No entanto, mesmo no referido estudo, não é destacada a ação de ativistas institucionais que ocupam cargos públicos no interior das instituições legislativas e que nelas atuam em defesa das causas de um movimento social. Se servidores públicos do Poder Executivo federal têm tido um papel fundamental na defesa de políticas públicas, conforme a literatura brasileira sobre ativismo institucional tem demonstrado, é possível supor que uma dinâmica semelhante possa ser observada no Poder Legislativo. De fato, conforme indica Perna (2010) em sua análise sobre mecanismos digitais de participação política da Câmara dos Deputados, servidores públicos do Poder Legislativo federal podem atuar na defesa da formulação e implementação de políticas públicas como as de e-participação.
Em segundo lugar, a literatura brasileira recente sobre esse tema tem dedicado especial atenção ao ativismo institucional progressista. Assim, ao criticar o pressuposto da confrontação no estudo das relações entre movimentos sociais e Estado, e dedicar especial atenção às relações de cooperação entre estes atores, tem obscurecido a análise de relações de conflito que antagonizam redes de cooperação entre Estado e sociedade que atravessam as diversas instituições políticas, tais como aquelas estabelecidas entre movimentos e contramovimentos.
Frente a essas lacunas, o presente trabalho busca analisar o ativismo institucional no Poder Legislativo a partir do caso do confronto entre o movimento LGBT e o movimento familista no Congresso Nacional entre 2003 e 2014. Na próxima seção, descrevo os dados e métodos da pesquisa empírica que dá base a este artigo e, a seguir, destaco a importância de assessores ativistas e das frentes parlamentares para o ativismo institucional em órgãos do Poder Legislativo em nível federal.
Dados e Métodos
Este trabalho integra um projeto de pesquisa mais amplo desenvolvido no âmbito do doutoramento de seu autor (PEREIRA, 2018a). Nesse projeto, foi analisado o confronto político entre o movimento LGBT e o movimento cristão familista no período entre o início do primeiro Governo Lula (PT) e o final do primeiro Governo Dilma (PT), buscando compreender os processos que transformaram os resultados políticos deste confronto a partir do primeiro Governo Dilma em favor dos ativistas conservadores.
Tendo em vista este objetivo, foi analisado o confronto político entre esses movimentos no interior do Congresso Nacional, bem como as formas mediante as quais esses confrontos afetaram a chefia do Executivo e a burocracia a ela subordinada, fechando oportunidades para ativistas LGBT. Em particular, a análise desse confronto no Congresso Nacional foi realizada por meio de doze entrevistas com assessores e parlamentares ligados à Frente Parlamentar de Defesa da Cidadania LGBT (FPLGBT) ou à FPE. As entrevistas foram realizadas entre os meses de março e julho de 2017. Algumas delas foram realizadas presencialmente, enquanto outras foram realizadas por meio do uso de ferramentas de videoconferência como o Skype e chamadas de vídeo de redes sociais. Os informantes foram identificados pelo pesquisador a partir do método “bola de neve”, encerrando-se a fase de realização de entrevistas a partir do critério de saturação das informações obtidas para os perfis desejados.
O Quadro 01 resume as caraterísticas desses entrevistados no que se refere a seus vínculos associativos e a seus vínculos com as instituições legislativas federais. Desde já, é possível destacar que a trajetória de muitos destes informantes é marcada pelo trânsito institucional e pela múltipla filiação (SILVA; OLIVEIRA, 2011; TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016).
No caso dos vínculos associativos, destacam-se, por um lado, as filiações a organizações do movimento LGBT e do movimento familista, registrando-se também a presença de relações com outras organizações de movimentos sociais e vínculos pastorais com igrejas evangélicas. Porém, mesmo indivíduos sem vínculos associativos prévios com organizações de movimentos sociais, porventura, se identificam fortemente com as causas de um movimento social e agem no interior das instituições políticas para defendê-las, sendo aqui também considerados ativistas institucionais. Já no caso dos vínculos com o Congresso Nacional, foram entrevistados uma parlamentar e onze assessores parlamentares, incluindo assessores de partidos políticos e de parlamentares, assessores com vínculos permanentes com as instituições legislativas e que exerciam cargos de livre nomeação, bem como assessores ligados à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal. No caso dos atores relacionados à FPLGBT, destacam-se os vínculos com o PT. Já no caso daqueles ligados à FPE, os vínculos partidários são variados.
O roteiro de entrevista utilizado abrangeu diversas questões relacionadas aos objetivos mais amplos do projeto de pesquisa no qual este trabalho se insere. Em relação aos objetivos deste artigo, destaca-se que foram propostas questões relacionadas à trajetória dos entrevistados, bem como às táticas utilizadas pela assessoria parlamentar e pelas frentes parlamentares analisadas com o objetivo de influenciar processos legislativos e políticas públicas. Todas as entrevistas foram transcritas e posteriormente analisadas por meio de procedimentos indutivos e dedutivos de análise de conteúdo (BARDIN, 1977) auxiliados por um software de análise qualitativa de dados.
Assessores ativistas
Conforme descrito no Quadro 01, a trajetória de boa parte dos assessores parlamentares entrevistados vinculados à FPE e à FPLGBT foi marcada pelo trânsito institucional e pela múltipla filiação (SILVA; OLIVEIRA, 2011; TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016). Ademais, mesmo entre os entrevistados que não tiveram vínculos com organizações de movimentos sociais em sua trajetória, alguns atuaram fortemente em defesa de causas com as quais simpatizam dentro do Congresso Nacional no período de abrangência desta pesquisa, reproduzindo fenômeno semelhante ao demonstrado pela literatura sobre ativismo na burocracia do Poder Executivo (ABERS 2015; 2019).
Esses dois perfis de assessores são considerados aqui como “assessores ativistas”, ou seja, indivíduos que ocupam cargos de assessoria parlamentar tendo como um de seus principais objetivos e motivações a promoção de ações que beneficiem as causas pelas quais militam, tendo vínculos prévios com organizações de movimentos sociais ou não9. Assessores ativistas buscam trabalhar junto a parlamentares cujos projetos vão, ao menos em parte, ao encontro das causas nas quais acreditam. Isso ocorre na medida em que, conforme apresentado posteriormente, o vínculo dos deputados e senadores com as causas de um movimento afetam as possibilidades de ação dos assessores em sua defesa. Assessores ativistas também tendem a se apresentar publicamente como defensores das causas que defendem nas instituições legislativas, definindo sua militância como traço fundamental de sua identidade. Leandro, um dos entrevistados vinculados à FPLGBT, por exemplo, alega com orgulho ter sido “um dos primeiros assessores assumidos” do Senado mesmo sem ter vínculos prévios com organizações do movimento LGBT.
É possível contrastar os assessores ativistas com outro perfil de assessoria identificado na pesquisa empírica: os “assessores profissionais”10. Diferentemente dos assessores ativistas, aqueles indivíduos aqui classificados como “assessores profissionais” buscam em suas atividades nas instituições legislativas principalmente as oportunidades de carreira disponíveis que melhor lhes atendam, em alguns casos até mesmo aceitando trabalhar junto a parlamentares cujos projetos contrariam fortemente suas crenças. Ainda, tais assessores nem sempre revelam no ambiente de trabalho suas crenças e projetos políticos.
Essa tipologia pode ser exemplificada brevemente a partir da comparação entre a trajetória de duas assessoras vinculadas à FPE: Renata e Maria. Renata buscou oportunidades de trabalho no Congresso Nacional após uma mudança inesperada de sua cidade na região Sul do Brasil para a capital federal. Seu primeiro vínculo com as instituições legislativas foi sua atuação como fotógrafa junto a um senador que não possuía relação com nenhuma das frentes aqui analisadas. Renata, porém, se viu envolvida indiretamente com o confronto estudado neste artigo quando se apaixonou por uma colega de gabinete. Sabendo da relação entre as colegas de trabalho, o senador as demitiu. Nos meses seguintes, desempregada, Renata passou a vender doces nos gabinetes do Congresso Nacional. Foi a partir desta atividade que encontrou sua segunda oportunidade de trabalho nesse ambiente: começou a trabalhar como designer freelancer de um deputado da FPE e, logo, foi contratada como sua assessora.
Quando a qualidade de seu trabalho se tornou conhecida por outros membros da FPE, Renata passou a trabalhar também como freelancer para outros parlamentares evangélicos. Em um desses trabalhos, por exemplo, Renata preparou um post para as redes sociais de uma deputada da FPE. Nele a parlamentar repudiava o beijo dado entre as personagens interpretadas pelas atrizes Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg em uma novela da Rede Globo em 2015. Ao contar essa história, Renata, lésbica e assessora parlamentar de um deputado evangélico, considera: “É uma coisa muito conflitante de como eu vivo. Mas eu sei separar bem as coisas”. Quando perguntei a ela como fazia para suportar as pressões do trabalho com parlamentares cujas pautas se opõem à sua própria sexualidade, Renata me respondeu com apenas uma palavra: “profissionalismo”.
A trajetória de Renata pode ser contrastada à de Maria, também assessora de um parlamentar vinculado à FPE. Pastora evangélica, Maria militou fora das instituições políticas nas áreas da educação e dos direitos da criança e do adolescente. Ao longo da década de 1990, atuou junto a parlamentares cristãos como “assessora voluntária”, conforme ela mesma definiu. Em 1998, foi contratada oficialmente como assessora de um senador evangélico fortemente envolvido no confronto em torno dos direitos LGBT. Neste período, participou de organizações como o FENASP e o Movimento Brasil sem Aborto, passou a desenhar estratégias para a tramitação de projetos, a monitorar adversários, a articular alianças e a promover campanhas de apoio ou oposição a políticas públicas e projetos de lei junto aos demais membros da FPE.
Em sua entrevista, Maria afirmou que seu envolvimento com as pautas relacionadas a suas causas e crenças, em muitos casos, lhe impôs importantes custos emocionais. Em sua entrevista, relatou: “Às vezes, a gente volta para casa chorando, às vezes a gente volta para casa revoltada, querendo desistir de tudo com o que a gente ouve. Você deve imaginar que a gente ouve muita coisa”. Logo, porém, a pastora explicou os motivos pelos quais, mesmo considerando esses momentos desagradáveis, manteve seu trabalho como assessora parlamentar: “Eu entendo que isso é um chamado”, afirmou ela.
Renata e Maria, portanto, apesar de terem vínculos com parlamentares membros de uma mesma frente, têm perfis muito distintos. Renata buscou em sua atividade como assessora uma oportunidade de trabalho, aceitando até mesmo atuar junto a um parlamentar cujas crenças vão fortemente de encontro às suas, pouco mencionadas em seu ambiente profissional. Já Maria buscou em sua atividade como assessora parlamentar a defesa de causas pelas quais já militava, atuando junto a um senador reconhecido por seus vínculos com tais causas e demonstrando suas crenças publicamente como um traço significativo de sua identidade. Enquanto Renata se encaixa no perfil aqui denominado de “assessora profissional”, Maria se encaixa no perfil aqui denominado de “assessora ativista”.
Assessores ativistas atuam no Congresso Nacional em defesa das causas pelas quais militam de diversas maneiras segundo seus relatos de entrevista. Monitoram projetos de lei relacionados às suas causas, bem como buscam e recebem informações de suas bases e da burocracia aliada sobre as políticas públicas em desenvolvimento. Frente a projetos de lei de seu interesse, elaboram estratégias para sua tramitação, auxiliam parlamentares a usar o regimento em seu favor, articulam alianças em torno de propostas e requerimentos colhendo assinaturas de outros deputados ou senadores, redigem relatórios e pareceres dando argumentos técnicos aos projetos, acompanham as sessões das comissões e, em alguns casos, até mesmo sugerem aos parlamentares em quais comissões devem buscar espaços. Frente a políticas públicas de seu interesse, percorrem os gabinetes do Congresso Nacional buscando aliados para se opor a elas ou defendê-las, escrevem discursos para parlamentares proferirem em plenário e elaboram estratégias, como o uso de ações judiciais.
Assessores ativistas também são importantes na mediação entre movimentos sociais e parlamentares de acordo com seus relatos. Recebem as demandas de ativistas, articulam estratégias e mediam eventuais conflitos entre militantes e representantes. Ajudam a organizar seminários e audiências públicas no Congresso Nacional, eventos que reúnem deputados, senadores, burocratas e ativistas para a discussão de seus projetos e para a definição de suas prioridades. Ajudam também a mediar a relação entre parlamentares e a burocracia do Poder Executivo. Reúnem-se com burocratas para receber informações e para construir e defender projetos de lei que auxiliem a burocracia a desenvolver políticas públicas, podendo ser importantes articuladores, por exemplo, no processo de conquista de emendas ao orçamento para o financiamento dessas políticas.
O envolvimento dos assessores ativistas em ações relacionadas às suas causas, no entanto, depende em grande medida do envolvimento dos parlamentares e partidos aos quais estão vinculados nestas mesmas causas. Em primeiro lugar, embora lutem para inserir suas causas na agenda de seus parlamentares e partidos, assessores ativistas são, em grande medida, dependentes das prioridades estabelecidas por seus superiores. Débora, por exemplo, relata que se afastou do tema dos direitos LGBT quando a deputada para quem trabalhava anteriormente não se reelegeu. Mudou-se para o gabinete de um deputado do mesmo partido que, no entanto, não priorizava o tema.
Em segundo lugar, assessores ativistas também dependem dos parlamentares para os quais trabalham, pois deputados e senadores detêm recursos e prerrogativas essenciais no Congresso Nacional. Conseguem mais facilmente agendar reuniões com outros parlamentares, com a chefia de ministérios e com a presidência para apresentar demandas. Suas prerrogativas regimentais incluem a fala e o voto em plenário e em comissões legislativas, bem como a autoridade para assinar requerimentos, projetos e ações judiciais. Assim, a assessoria parlamentar pode ser responsável por sugerir estratégias e linhas de ação aos parlamentares, mas, em última instância, são os deputados e senadores que detêm o poder de executá-las.
Quando encontram junto aos parlamentares e partidos aos quais estão vinculados condições favoráveis, assessores ativistas agem em defesa de suas causas, em muitos casos, a partir de sua articulação em redes estabelecidas entre assessores com identidades e crenças compartilhadas. Essas redes podem estar estruturadas em torno das frentes parlamentares. De acordo com seus relatos, portanto, assessores ativistas são essenciais para o desenvolvimento das atividades de muitas das frentes parlamentares. Leandro, por exemplo, alega que a FLGBT “foi uma frente de assessores”. Do outro lado do confronto, Maria faz afirmação semelhante: “Às vezes, o parlamentar nem tem ideia de que a gente está aqui tentando. Às vezes, o mandato dele é alavancado por nossa causa”, afirmou a assessora ativista. Nesse sentido, assessores parlamentares contribuem para as frentes ao realizar parte significativa de suas atividades operacionais, mas também ao propor pautas e diretrizes aos parlamentares que compõem essas frentes, apresentando e defendendo junto a eles demandas recebidas das bases e de organizações de movimentos sociais.
Cabe ressaltar, porém, que o próprio envolvimento de assessores em frentes parlamentares também é dependente do envolvimento de seus superiores nesses grupos. Isso ocorre porque assessores ativistas que trabalham junto a frentes parlamentares relacionadas às suas causas não são a elas vinculados oficialmente - já que as frentes não são grupos formalizados no Congresso Nacional -, sendo formalmente vinculados a parlamentares ou a bancadas partidárias. Assim, parlamentares e partidos precisam liberar seus assessores para o trabalho em articulação com as frentes, o que, em geral, ocorre quando seus vínculos com as causas defendidas pelas frentes também são fortes. Esse, por exemplo, é o caso vivido por Miguel, que se apresenta como assessor da FPE e não como assessor do deputado ao qual está vinculado, fortemente engajado nessa frente. Portanto, embora assessores em alguns casos exerçam influência sobre as frentes parlamentares, suas possibilidades de fazê-lo estão atreladas ao perfil do parlamentar ao qual estão vinculados, ao envolvimento desse parlamentar com a frente e às negociações estabelecidas entre parlamentar e assessor a respeito das atribuições do último.
Em suma, os dados aqui apresentados indicam a centralidade dos “assessores ativistas” para o ativismo institucional no Poder Legislativo em nível federal nos casos estudados. Tais assessores defendem as causas pelas quais militam no Congresso Nacional apresentando-se claramente como defensores destes ideais. Buscam trabalhar com parlamentares com os quais compartilham crenças, na medida em que dependem deles de inúmeras formas para poder agir em defesa de suas causas nas instituições legislativas. Quando encontram condições favoráveis para agir desta forma, em geral, o fazem a partir de uma articulação realizada em torno de frentes parlamentares. A importância das frentes parlamentares para o ativismo institucional no Poder Legislativo é o tema da próxima seção deste trabalho.
Frentes parlamentares
Conforme argumentado anteriormente, nos casos em que os interesses e as convicções de assessores e parlamentares ou partidos convergiram, as ações de assessores ativistas articulados em frentes parlamentares foram centrais no confronto político aqui analisado. Frentes parlamentares são grupos suprapartidários de parlamentares que se organizam em torno de temas específicos no interior das instituições legislativas (CORADINI, 2010).
Estudos sobre frentes parlamentares têm indicado que associações da sociedade civil e frentes parlamentares têm fortes relações entre si. Em suas pesquisas sobre o tema, Coradini (2010, 2011) demonstra que a filiação de um parlamentar a uma frente está relacionada aos vínculos associativos prévios deste deputado ou senador. Estudos sobre frentes parlamentares específicas e sobre a atuação de movimentos sociais no Poder Legislativo em nível federal indicam, ainda, que as frentes estabelecem relações próximas com organizações de movimentos sociais e associações profissionais, realizando reuniões e eventos em conjunto com elas (CARONE, 2018; FONSECA, 2008; PARREIRA, 2012).
Ademais, em sua pesquisa, Coradini (2010) demonstra ainda que o pertencimento de um parlamentar a uma frente também tende a se relacionar com seu vínculo partidário e com sua posição no espaço social (em termos de renda, formação, profissão, etc.). Assim, as frentes parlamentares no Congresso Nacional tendem a se dividir em grandes redes de frentes que se opõem ideologicamente umas em relação às outras. Parlamentares que se associam a uma frente tendem também a se associar a frentes que sejam próximas a ela do ponto de vista ideológico e a rejeitar a associação a frentes ideologicamente distantes (CORADINI, 2010).
A literatura sobre frentes parlamentares indica, portanto, a existência de relações entre determinadas frentes e movimentos, bem como a tendência de polarização de frentes parlamentares em confrontos políticos no Congresso Nacional. A partir destes estudos e das evidências empíricas que serão aqui apresentadas, argumenta-se neste artigo que as frentes parlamentares são espaços privilegiados para a articulação do ativismo institucional no Poder Legislativo em determinadas circunstâncias. Em casos particulares, é a partir da ação em frentes parlamentares que ativistas institucionais atuam na defesa de seus interesses e crenças em confrontos políticos no Congresso Nacional. Nesses casos, frentes parlamentares se tornam, portanto, os principais interlocutores de determinados movimentos sociais no Poder Legislativo, já que se articulam em torno de temas e confrontos mais específicos que partidos políticos.
Ressalta-se, no entanto, que a existência de uma relação forte entre dado movimento e dada frente parlamentar pode ser observada em apenas alguns casos. Assim como partidos políticos, frentes parlamentares não são necessariamente ideologicamente coesas, apesar de se referirem a temas específicos. Em seu estudo sobre a Frente Parlamentar da Saúde, por exemplo, Fonseca (2008) concluiu que essa frente é composta por grupos que têm visões distintas sobre quais são os problemas e as soluções para a área da saúde no Brasil. Dessa forma, frentes podem não apresentar uma relação direta com um único movimento social.
Ressalta-se, ainda, que mesmo quando essa relação existe, nem todos os membros de uma frente parlamentar podem ser considerados ativistas institucionais. Estudos empíricos sobre frentes específicas têm sugerido que parlamentares podem buscar se filiar a uma frente mesmo que não tenham um vínculo profundo com o tema abordado por ela em busca de ganhos de reputação junto a seus eleitores (FONSECA, 2008; MARQUES; D’ÁVILA, 2010). Assim, deputados e senadores podem se envolver em graus variáveis nas atividades cotidianas das frentes das quais são membros, como indicam análises da FPE (DANTAS, 2011; DUARTE, 2011; MAIA, 2012).
Apesar destas ressalvas, no caso analisado foi possível observar forte vínculo entre os movimentos em estudo e frentes parlamentares no Congresso Nacional, bem como a atuação intensa de ativistas institucionais de forma articulada em seu interior. As principais frentes envolvidas no confronto aqui analisado foram a FPLGBT e a FPE.
A FPLGBT foi fundada em 2003 com a denominação de Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual, sendo renomeada, em 2007, como Frente Parlamentar de Defesa da Cidadania LGBT. Essa frente estabeleceu uma relação de cooperação com o movimento LGBT, em especial, por meio da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABGLT). Por meio de sua iniciativa denominada “Projeto Aliadas”, essa organização se aproximou da FPLGBT em busca da aprovação de matérias que defendiam os direitos LGBT, bem como de emendas parlamentares para o financiamento de políticas públicas de diversidade sexual (PRADO; MACHADO; CARMONA, 2009; MARQUES; D’ÁVILA, 2010). Embora esta frente tenha progressivamente contado com uma maior adesão de signatários de partidos de centro e de direita ao longo de sua trajetória (MARQUES; D’ÁVILA, 2010; SANTOS, 2016), deputados, senadores e assessores vinculados a partidos de esquerda se destacaram em atividades desta frente de acordo com os relatos dos entrevistados.
Já a FPE foi criada extraoficialmente no ano de 2003, tendo como principal objetivo articular parlamentares evangélicos de partidos políticos e denominações diversas - que, até então, atuavam de forma individualizada - para que coordenassem suas ações em temas de interesse das igrejas. Sua primeira pauta prioritária foi a regulamentação da personalidade jurídica das igrejas no novo Código Civil, que fora aprovado em 2002 (GONÇALVES, 2016; MAIA, 2012; MARIANO, 2006; SOUZA; RUATA; CAMPANA, 2013). Foi principalmente a partir da criação da FPE que temas morais como o aborto e as pautas LGBT passaram a ser tomados como prioritários por parlamentares evangélicos11. Relatos de pesquisa indicam que a FPE atuou em conjunto com organizações do movimento familista como o FENASP. Tais organizações recebiam informações sobre as atividades legislativas da frente, circulavam nos gabinetes em busca de aliados e mobilizavam ativistas para marchas, orações, jejuns e atos em defesa dos parlamentares da FPE em comissões da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. No caso da FPE, destacou-se ao longo da pesquisa empírica o ativismo de assessores vinculados a partidos de direita e centro-direita, muitos deles com vínculos prévios com igrejas evangélicas.
Ambas as frentes analisadas, portanto, atuaram de forma próxima a movimentos sociais ao longo do período analisado e tiveram como membros ativistas institucionais que se articularam para defender as causas do movimento LGBT ou do movimento familista. Para isso, mobilizaram as frentes de diversas maneiras em um confronto político no interior das instituições legislativas federais (Quadro 02).
Em primeiro lugar, estas frentes se engajaram em confrontos diretos entre si no âmbito das dinâmicas legislativas do Congresso Nacional. Para isso, agiram disputando espaços estratégicos para esse confronto, tais como a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) e a Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados. O caso das disputas entre integrantes destas frentes no episódio da ocupação da presidência da CDHM pelo deputado Marco Feliciano (PSC) ilustra este tipo de ação (GONÇALVES, 2016). A crescente ocupação de comissões legislativas estratégicas pela FPE em sua disputa com a FPLGBT ao longo do primeiro Governo Dilma permitiu a esta frente uma ampliação de seu poder de influência sobre as leis e políticas LGBT (PEREIRA, 2018b). Uma vez ocupados estes espaços, assessores e parlamentares debateram em conjunto o desenvolvimento de manobras e estratégias regimentais para a defesa ou oposição a matérias no interior destas comissões, de acordo com relatos de entrevista.
Também no que se refere às relações de confronto entre a FPE e a FPLBT no Congresso Nacional, essas frentes parlamentares se organizaram de forma a monitorar os projetos de lei em tramitação principalmente por meio da ação coordenada de assessores ativistas. Em especial, destaca-se, nesse caso, a formação do Grupo de Assessoria Parlamentar Evangélica (GAPE) pela FPE, um grupo de assessores destacados pela frente para monitorar os projetos em tramitação no Congresso Nacional que afetam os interesses e crenças de seus membros.
No confronto político analisado, frentes parlamentares não apenas interagiram entre si, mas também mantiveram relações de conflito e de cooperação com a burocracia do Poder Executivo. A partir de sua rede de contatos com burocratas ativistas aliados, de acordo com relatos de entrevista, assessores ativistas engajados nas frentes parlamentares em estudo obtiveram informações sobre as políticas públicas em formulação e implementação, bem como traçaram estratégias em conjunto para a conquista de emendas parlamentares para o financiamento de políticas por eles defendidas.
Já em seus esforços de oposição a burocratas ativistas adversários, frentes parlamentares mobilizaram instrumentos formais de controle da burocracia. Nesse sentido, destaca-se o uso de requerimentos de informação ao Poder Executivo por parte de deputados e senadores, o uso de representações no Ministério Público, bem como a proposição de projetos de decreto legislativo, que visam sustar iniciativas de outros poderes que extrapolem seu poder regulamentar.
Por fim, frentes parlamentares também foram atores centrais em iniciativas que buscaram pressionar a chefia do Executivo em relação a políticas públicas e projetos de lei de interesse dos movimentos sociais aos quais estão relacionadas. Uma primeira tática utilizada para isso foi o estabelecimento de alianças e compromissos eleitorais com candidatos à presidência. Neste sentido, destaca-se a pressão exercida por parlamentares e lideranças evangélicas sobre a então candidata Dilma Rousseff (PT) na campanha presidencial de 2010. Tais lideranças exploraram uma declaração dada por Dilma à imprensa, na qual afirmava que o aborto deveria ser tratado como uma questão de saúde pública, tornando as “pautas morais” centrais no debate eleitoral. Após uma queda nas intenções de voto em Dilma em pesquisas de opinião, a campanha da futura presidenta divulgou documentos nos quais foi estabelecido o compromisso de não alteração das legislações sobre aborto e sobre a união civil entre casais do mesmo sexo (MACHADO, 2012; TREVISAN, 2013).
Uma segunda tática utilizada neste sentido foi o uso de barganhas em torno da fidelidade de membros de uma frente parlamentar que estabeleceram compromissos no interior de coalizões presidenciais para pressionar a chefia do Executivo em direção a políticas públicas de preferência desta frente e do movimento a ela relacionado (PEREIRA, 2018b). Esta tática pode ser exemplificada pelo caso do veto ao material didático produzido no âmbito do projeto Escola sem Partido, no qual deputados membros da coalizão governamental ameaçaram suspender seu apoio à chefia do Executivo em procedimentos de votação em plenário, bem como em comissões legislativas.
Comparando-se as ações dessas duas frentes parlamentares, é possível observar o uso de táticas semelhantes, tais como a ocupação de espaços estratégicos, o uso de estratégias regimentais e o monitoramento de projetos de lei, embora o uso dessa última tática tenha sido mais sistemático no caso da FPE a partir da criação do GAPE. Já táticas como o uso de instrumentos de controle da burocracia e o uso de barganhas em torno da fidelidade foram observadas principalmente no caso da FPE12
É possível observar, assim, que o ativismo institucional nas instituições legislativas pode ser articulado a partir das frentes parlamentares em determinadas circunstâncias. No caso da FPLGBT e da FPE, pode ser uma observada uma forte relação entre frentes e movimentos sociais, bem como intenso ativismo institucional de alguns dos assessores a elas conectados, que buscam coordenar suas ações por meio das frentes. Tais frentes se engajaram em confrontos político no Congresso Nacional de maneiras diversas. Disputaram diretamente espaços e matérias com a frente opositora no âmbito das dinâmicas legislativas, estabeleceram relações de conflito e de cooperação com burocratas ativistas aliados e rivais no Poder Executivo e pressionaram a presidência em direção aos interesses e preferências do movimento ao qual estiveram vinculadas.
Considerações finais
Em dezembro de 2018, o então presidente eleito Jair Bolsonaro (do Partido Social Liberal - PSL) anunciou que o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos seria chefiado pela pastora Damares Alves. Pouco conhecida pelo grande público, Damares era um nome familiar para aqueles envolvidos no confronto entre o movimento LGBT e o movimento familista no Congresso Nacional. Além de pastora, a futura ministra foi assessora do senador Magno Malta (PR) e integrante de organizações deste movimento conservador. No âmbito de sua atuação nos bastidores do Poder Legislativo federal, se tornou reconhecida tanto por membros da FPE, quanto por membros da FPLGBT, como uma das principais articuladoras dos parlamentares e assessores evangélicos. Antes de ser ministra, portanto, Damares foi assessora ativista e uma importante liderança da FPE nos bastidores das instituições legislativas federais.
A literatura brasileira sobre movimentos sociais tem recentemente destacado este ativismo silencioso que ocorre no interior das instituições políticas, criticando premissas dicotômicas sobre as relações entre sociedade civil e Estado. Suas contribuições têm tornado possível perceber que os processos que ocorrem no interior de ministérios e secretarias de governo - comumente analisados pela literatura dedicada ao estudo de políticas públicas - têm, em muitos casos, forte relação com a atuação de movimentos sociais. Nesse sentido, a literatura nacional tem recentemente buscado aproximar os campos de estudo dos movimentos sociais e das políticas públicas em seus esforços de compreensão das relações entre organizações da sociedade civil e Estado no Brasil.
Como dito anteriormente, tais estudos têm, no entanto, em geral, limitado seu foco analítico ao ativismo institucional no interior do Poder Executivo e, em especial, ao ativismo progressista. Este artigo contribui para essa literatura ao analisar o ativismo institucional no Poder Legislativo, bem como ao incorporar em sua análise o ativismo conservador e suas interações contenciosas com movimentos progressistas por meio do conceito de “confronto político” e do par “movimentos” e “contramovimentos”. Seus resultados indicam a centralidade de assessores e frentes parlamentares para o ativismo institucional e para os confrontos políticos que se desenrolam nas instituições legislativas em nível federal.
A partir desses resultados, sugere-se neste artigo que os confrontos políticos estabelecidos entre partidos e frentes no interior das instituições legislativas - em geral, analisados pela literatura dedicada ao estudo de processos legislativos - têm, em determinados casos, forte relação com confrontos políticos entre movimentos sociais. Neste sentido, mostra-se pertinente uma maior aproximação entre, por um lado, o campo de estudos dedicado às instituições legislativas e às relações Executivo-Legislativo e, por outro lado, o campo de estudos dos movimentos sociais.
Os resultados deste trabalho indicam, ainda, a fertilidade de uma abordagem que identifique as ações de ativistas institucionais opositores no interior de órgãos do Poder Executivo, rompendo-se com a tendência de isolar a atuação de burocratas ativistas progressistas em relação a seus antagonistas no interior de ministérios e secretarias. Nesse sentido, uma aproximação entre teorias dos movimentos sociais que enfatizem as diversas formas de confronto nas quais estes atores se engajam - tal como a abordagem do confronto político (MCADAM; TARROW; TILLY, 2001; TILLY; TARROW, 2015) - e perspectivas teóricas no estudo de políticas públicas que enfatizem as dinâmicas de conflito no interior da burocracia estatal - tais como a abordagem das “coalizões de defesa” (SABATIER; WEIBLE, 2007) - mostram-se pertinentes para uma análise da conflitualidade social que evite os riscos impostos por premissas dicotômicas sobre a relação entre Estado e movimentos sociais.
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Uma versão preliminar desse artigo foi apresentada no seminário temático (ST) “Movimentos Sociais, Protestos Políticos e Ativismos” do IV Encontro Internacional Participação, Democracia e Políticas Públicas. Agradeço às organizadoras desse ST, Euzeneia Carlos e Virginia Vecchioli, bem como às pareceristas anônimas da Revista Brasileira de Ciência Política por suas contribuições para o desenvolvimento desse artigo.
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Maria foi uma das assessoras parlamentares entrevistadas no âmbito da pesquisa empírica na qual este artigo está baseado. Os nomes dos informantes foram substituídos por pseudônimos para garantir seu anonimato, acordado entre pesquisador e informantes de pesquisa.
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Críticas em relação à abordagem do confronto político argumentam que esta perspectiva tem reduzido as interações entre Estado e sociedade à lógica do conflito (CARLOS; DOWBOR; ALBUQUERQUE, 2017; CAYRES, 2017). A leitura aqui realizada se distancia desta crítica, salientando que a definição do conceito de “política contenciosa” não inclui os governos necessariamente como alvos das demandas dos movimentos (MCADAM; TARROW; TILLY, 2001; TILLY; TARROW, 2015). Confrontos políticos podem atravessar instituições políticas, na medida em que potencialmente polarizam atores nelas inseridos, por exemplo, em relação a demandas de movimentos e contramovimentos. Nesse sentido, confrontos políticos ocorrem dentro e fora das instituições políticas, conectando tais espaços em um conjunto de interações de cooperação e conflito ao redor de determinadas demandas e tornando, assim, suas fronteiras pouco rígidas (PEREIRA, 2018a).
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Para mais informações sobre os conselhos políticos de igrejas evangélicas, ver Machado (2015) e Mariano (2009).
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Para um debate sobre o ativismo institucional em contextos internacionais, ver Banaszak (2005; 2009), Pettinichio (2012), Santoro e McGuire (1997) e Stearns e Almeida (2004).
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O autodenominado “movimento evangélico progressista” atua de forma mais próxima a partidos políticos de esquerda e recusa uma posição de oposição aberta aos direitos das pessoas LGBT, declarando-se ao mesmo tempo favorável a políticas de combate à homofobia e a políticas que garantam aos pastores liberdade para pregarem suas convicções sobre a homossexualidade (EVANGÉLICOS PELA JUSTIÇA, 2011). No Congresso Nacional, o informante representante desse movimento atuou como mediador entre partidos de esquerda, movimento LGBT e movimento familista.
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Tal definição é, em grande medida, inspirada na definição de “burocratas ativistas” de Ferreira e Lotta (2016, p. 15). Nela sigo também a definição de ativismo proposta por Abers (2015, p. 147), que amplia este conceito para além da atuação marcada por vínculos formais com organizações de movimentos sociais, definindo-o como “um tipo de ação que visa promover projetos políticos ou sociais percebidos pelo ator como de natureza pública ou coletiva”.
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A caracterização aqui proposta dos “assessores ativistas” e dos “assessores profissionais” devem ser encaradas como tipos ideais, não correspondendo completamente à descrição concreta de cada assessora em sua individualidade. Ressalto, nesse sentido, que não busco afirmar com essa tipologia que assessores ativistas não tenham qualidades ou ética profissionais. Tampouco busco afirmar que assessores profissionais não tenham crenças e valores que buscam defender em suas atividades profissionais.
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Maia (2012, p. 99) mostra, por exemplo, que a primeira edição da revista da FPE, publicada em 2004, define como um dos objetivos dessa frente “influenciar as políticas públicas do governo, defendendo a sociedade e a família no que diz respeito à moral e aos bons costumes”.
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No caso em análise, essas diferenças parecem estar relacionadas à proximidade ideológica da FPLGBT com setores do governo em exercício, que desenvolveram políticas que iam ao encontro de suas crenças, tornando atrativas táticas de oposição a essas políticas para a FPE, como o monitoramento e controle da burocracia subordinada ao Poder Executivo e a pressão sobre sua chefia. Porém, pesquisas empíricas que investiguem como as táticas desenvolvidas por frentes parlamentares variam de acordo com fatores como sua orientação ideológica se mostram promissoras, podendo auxiliar na compreensão das diferenças aqui identificadas.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
11 Maio 2020 -
Data do Fascículo
Jan-Apr 2020
Histórico
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Recebido
10 Jul 2019 -
Aceito
21 Jan 2020