RESUMO
O ensaio se propõe a pensar os conflitos de tempos no Brasil contemporâneo a partir do diagnóstico de uma perda da evidência do horizonte moderno de futuro. Busca-se interrogar de que modo essa perda de evidência do horizonte de futuro como sincronizador social se revela tanto na implosão do tempo da Nova República, como na emergência do tempo planetário na história nacional, expresso pelos efeitos da mudança climática. Em ambas as dimensões, que agora se entrecruzam de maneira decisiva, a singularidade temporal da nação é profundamente colocada em questão.
PALAVRAS-CHAVE: Nação; Temporalidade; Futuro
ABSTRACT
The essay reflects on the conflicts of time in contemporary Brazil as the country loses sight of a modern horizon of future. It questions how this loss of evidence of the future as a social synchronizer is revealed both in the implosion of time in the New Republic, and in the emergence of planetary time in national history, expressed by the effects of climate change. In both dimensions, which now decisively intersect, the nation’s temporal singularity is deeply called into question.
KEYWORDS: Nation; Temporality; Future
“Não sou ainda suficientemente brasileiro. Mas, às vezes, me pergunto se vale a pena sê-lo.”
(Carlos Drummond de Andrade a Mário de Andrade)
“A meu ver, só poderemos nos tornar brancos no dia em que eles mesmos se transformarem em Yanomami.”
(David Kopenawa; Albert, A queda do céu)
Se as comemorações do primeiro centenário da Independência ancoravam-se no pressuposto da existência da nação pelos próximos cem anos, hoje talvez o que mais nos afaste daquele tempo é o fato que essa certeza não está mais dada. Dito de outro modo: o futuro - ou, antes, a ameaça tangível da sua ausência - nos distancia daquele passado. Ainda que de modos diferentes, tanto nos processos de independência, em meio à própria formação do Estado-nação, como em 1922, com os ímpetos modernistas e modernizantes, o futuro figurava como um pressuposto, ofertando um quadro formal das experiências possíveis e orientando-lhes o sentido. Seja pela lógica da “regeneração” do passado glorioso português, seja pela lógica da aceleração do progresso nacional, os horizontes de expectativas tinham no pressuposto da existência do futuro a condição de possibilidade de suas temporalizações (Araújo, 2008; Motta, 1992). Hoje, essa evidência do futuro dissolveu-se, seja o futuro nacional, seja o futuro planetário - cada vez mais entrelaçados. No mesmo momento em que o Brasil bate recordes seguidos de queimadas e de desmatamento, em meio a uma pandemia, é lançado o sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) a respeito das mudanças climáticas, indicando que o planeta chegará ao aquecimento de 1,5 grau Célsius dez anos antes do previsto, já em 2040, podendo bater os inabitáveis 5,7 graus até o final do século, causando com isso a sexta extinção em massa (IPCC, 2021). Nesse cenário, não apenas as civilizações se redescobrem mortais, para parafrasear Paul Valéry (1960), como é a própria história que entra em uma nova condição, aquilo que Günther Anders (2007) denominou de “o tempo do fim”. Um tempo em que o futuro é irremediavelmente colocado em questão pela própria ação humana.
O que não quer dizer, bem entendido, que não haja imagens de futuro disponíveis e em circulação. Elas existem, e são muitas. Grande parte da imaginação coletiva parece transitar hoje, no entanto, entre a constatação empírica desse futuro ameaçado e a assombração - bastante real - de distopias autoritárias, pós-humanas e pós-planetárias vendidas como as (novas) últimas alternativas infernais possíveis (Kaplan, 2016; Taillandier, 2021). O que realmente diferencia a situação atual não é, portanto, a ausência de imagens de futuro, mas antes a perda da evidência de sua própria existência. Ele não é mais um pressuposto ao qual possamos nos agarrar em meio ao naufrágio.
A perda dessa evidência do futuro se manifesta de diferentes formas e em diferentes âmbitos, da sempre presente (ainda que esquecida) ameaça nuclear à emergência da crise climática; do investimento na exploração (ou fuga) espacial promovida por bilionários ao ressurgimento de experimentos neofascistas e negacionistas, com toda sua pulsão de morte; da escala planetária às fronteiras nacionais. A eclosão da pandemia da Covid-19, somada às reações desastrosas - e, como no caso brasileiro, de caráter genocida (Ventura; Perrone-Moisés; Martin-Chenut, 2021) - dos governos, veio catalisar ainda mais sensações como as de incerteza, insegurança, fragilidade, medo, mas também raiva e ressentimento, constringindo os horizontes de expectativas dos grupos sociais.
Uma pesquisa recente promovida pelo Museu do Amanhã indicou que 77% dos jovens manifestam incerteza em relação ao futuro (Tolmasquin; Bonela; Cotia, 2021). Em outra pesquisa, contatou-se que 69% dos brasileiros acreditam que o país está em declínio (Ipsos, 2021). A mesma pesquisa revelou que 80% consideram que a economia é gerida em benefício apenas dos mais ricos e poderosos, assim como 78% não veem os partidos políticos como entidades que representam os interesses da população em geral. Um contingente equivalente, de 74%, acredita que apenas um “líder forte” pode fazer frente a essa situação, de preferência (64%) “quebrando as regras” do sistema político. Essa percepção certamente não é desvinculada do diagnóstico apontado pelo Relatório da Riqueza Global, de 2021, publicado pelo Banco Crédit Suisse: quase a metade da riqueza do país (49,6%) concentrou-se nas mãos do 1% mais rico da população (Crédit Suisse, 2021). Por fim, para mais de 90% dos brasileiros o aquecimento climático é uma realidade, enquanto 80% consideram a situação “muito grave” (Pinto; Pires; Georges, 2021 ).
Por mais que essas sondagens possam ter suas limitações e problemas, elas não deixam de apontar para o cenário atual de descrença em relação ao futuro, assim como para a consciência da precariedade de sua existência. Um lema político como o de Juscelino Kubitschek, 50 anos em 5, formulado no auge da crença na modernidade desenvolvimentista, hoje tenderia a causar muito mais pânico do que otimismo. Do mesmo modo, o mote Brasil, país do futuro passou a assumir no cenário internacional um sentido inverso ao figurado originalmente, representando uma espécie de vanguarda mundial do retrocesso, indicando inclusive uma distópica “brasilianização do mundo” (Hochuli, 2021).
Em meio ao tempo da catástrofe, no entanto, outros tempos reemergem com uma força renovada; não como futuros substitutos dentro da monocultura temporal de uma modernidade singular, mas antes como outros modos de temporalização. Outros tempos e corpos que sempre estiveram presentes, mas que nunca preencheram devidamente o espaço semântico e o tempo previstos por conceitos como “cidadania”, “representação” e “soberania”. Tal como hoje, com as ferramentas da Inteligência Artificial - como corretores gramaticais ou reconhecimentos faciais -, que preveem a presença do gênero masculino e do rosto branco em seus algoritmos, aqueles conceitos forjados nos processos de independência e na construção dos Estados-nação circunscreveram a universalidade de sua linguagem e de suas constituições às singularidades de suas formas de reprodução histórica (Parron, 2015; Silva, 2019). A promessa de conquista da cidadania, assim como a possibilidade de exercer a soberania sobre seus próprios corpos e territórios foram sistematicamente adiadas, vetadas, rompidas, em razão de uma outra cidadania plena - hoje, nas figuras do “cidadão de bem” e do “patriota” -, assim como em nome de uma soberania última, a do Estado e seu controle.
Se a modernidade, como afirmou Koselleck, é marcada pela tendência histórica de “democratização” dos conceitos, é necessário entender que os limites desse processo estão inscritos na sua própria forma de universalização, marcada por uma temporalização singular (Koselleck, 2006, p.267-304). A horizontalidade desse tempo singular inscrito no projeto nacional produziu, no mesmo movimento, uma hierarquia verticalizada de outros tempos. Enquanto eram apagados ou hierarquizados, os tempos das sociedades indígenas, dos negros, dos trabalhadores precarizados, das mulheres, da natureza, de todos aqueles que não cabiam nas projeções conceituais do “cidadão”, da “soberania” e da “liberdade”, serviam como condição de possibilidade para a narrativa daquela singularidade nacional. Como bem formulou Jacques Rancière (2021, p.19): “É a maneira de contar a progressão do tempo que recobre a distribuição das temporalidades que funda sua possibilidade”.
A força desse tempo singular está na promessa que ele guarda, em seu poder de ser sempre adiado, criando um vínculo de espera e de dívida. Da espera do futuro grandioso desenvolvimentista ao imperativo sacrificial da austeridade neoliberal, a promessa esconde a hierarquia que é (re)produzida no ato mesmo de sua enunciação. É nesse sentido que Jota Mombaça (2020), em diálogo com Denise Ferreira da Silva (2019), qualificou os corpos negros e indígenas como “máquinas do tempo”, uma vez em que eles não cabem na sequencialidade da temporalidade moderna nacional, ao mesmo tempo em que a possibilitam. O tempo da promessa, para esses outros hierarquizados, é a temporalidade de uma “dívida impagável”, que se reproduz como modo de expropriação e forma de produção de valor, ligando - tal qual em uma fita de Moebius - o passado da plantation ao presente das dívidas financeiras dos precarizados do neoliberalismo.
A perda da evidência do futuro, nessa chave, antes de ser entendida com uma ruptura singular e sem precedentes, deve ser relativizada ou, ao menos, perspectivada em razão desses outros tempos implicados. Qual futuro, cara branca? E, aqui, deparamos com o núcleo das tensões que marcam hoje, em seu bicentenário, o lugar da herança conceitual do projeto de Estado-nação brasileiro. No mesmo movimento em que aquele futuro da promessa se torna opaco e incerto, tendo sua própria existência colocada em questão, a estrutura temporal singular que o fundava é cada vez mais tensionada por esses outros tempos que lhe eram subordinados.
Não por acaso, reemergiram também com força movimentos reacionários que buscam “refundar a nação” contra a “degeneração do presente”. Na ausência da evidência de um futuro em nome do qual retomar o tempo da promessa, é no investimento em um passado nostálgico - do império escravista, da ditadura militar - que eles buscam capturar os afetos precarizados ou ressentidos do presente. Quando uma organização como o Instituto Brasil 200 conclama que foi D. Pedro I que “nos fez livres”, repete-se aquele mesmo gesto de universalização da singularidade, escamoteando-se a condição de possibilidade de sua monocultura temporal: uma liberdade fundada na escravidão. Do mesmo modo, quando o então candidato à presidência Jair Bolsonaro prometeu, em alto bom som, que “cada cidadão vai ter uma arma de fogo dentro de casa”, que “não vai ter um centímetro demarcado para terra indígena ou quilombola” - comparando esses últimos com cabeças de gado -, ou, ainda, que se dependesse dele retomaria execuções como as realizadas durante a ditadura, ele deixava claro o projeto de reatualização da singularidade temporal (“uma nação, um povo, um território”) e a consequente exclusão e mesmo o extermínio daqueles outros tempos que a ameaçavam. Não por acaso, a celebração do 7 de Setembro de 2021, chamada pelos apoiadores do governo de “a nova Independência”, foi vivenciada nacionalmente com a expectativa de um golpe de Estado, a partir do qual se aceleraria a promessa do resgate de um passado perdido.
A perda de evidência do futuro faz revelar, assim, a coexistência tensa entre esses distintos tempos que se constituem hoje na sociedade brasileira, assim como suas diferentes formas de se relacionar com a herança conceitual do Estado-nação: os tempos dos povos indígenas, da população negra, das mulheres, dos LGBTQIA+, dos trabalhadores precarizados, da natureza, mas também os tempos do neoliberalismo, da elite tradicional, do ressentimento de parte da classe média, dos neofascismos. Nesse sentido, talvez pudéssemos identificar como a marca principal desse tensionamento uma profunda dessincronização dos tempos sociais. Isso implicaria dizer que a sincronização promovida pelas instituições do Estado-nação, com a justificativa de gerar um “todo homogêneo e compacto” - nas palavras de José Bonifácio -, já não é capaz de encontrar uma estabilidade dentro da hierarquização dos tempos que a compunham. Desde o processo de independência, a legitimidade da soberania do Estado dependeu do estabelecimento de formas de sincronização da cidadania com a representação política, assim como da economia com as demais esferas sociais. Esse processo de sincronização - e, portanto, também de exclusão e hierarquização - se deu mediante uma série de ações e de mecanismos, das legislações eleitorais às formas de acesso a serviços públicos; da regulação do trabalho à institucionalização de um sistema de ensino; da planificação econômica às políticas de memória. Com isso, sempre coube ao Estado ser o “soberano do tempo”. No cenário atual, marcado por um fluxo global acelerado do capital financeiro, pelas novas tecnologias de comunicação, por reivindicações sociais e de reconhecimento de diferentes grupos sociais, pela urgência da crise climática planetária, torna-se cada vez mais difícil para os Estados exercerem o seu papel histórico de sincronização dos atores sociais (Rosa; Scheuerman, 2009; Sassen, 2016).
É nesse sentido que alguns estudiosos qualificam essa dessincronização de tempos como um tempo da crise. Helge Jordheim e Einar Wigen (2018), por exemplo, apontaram como a noção de crise veio substituir a noção de progresso como forma de historicização das sociedades contemporâneas. O que significa dizer que diferentes processos históricos, como a economia ou a política, passaram a ser sincronizados não mais como continuidades processuais, mas antes como uma série acelerada de descontinuidades e rupturas. Esse tempo da crise também se manifesta na própria conjunção atual entre sociedade e tecnologia, mais especificamente na convergência entre neoliberalismo e as plataformas digitais. Na arquitetura das novas mídias, como destacou Wendy Chun (2016, p.69-92), os indivíduos - ou, melhor dizendo, os “usuários” - são capturados por uma temporalidade da crise. Ao mesmo tempo em que essas plataformas produzem um forte engajamento e empoderamento - via likes, compartilhamentos etc. -, elas também condicionam os usuários a atualizarem-se constantemente no ritmo da aceleração algorítmica do feed de notícias. A temporalização disruptiva das plataformas converge, assim - e não por acaso -, com aquela forma de historicização pela crise das sociedades contemporâneas, servindo como seu suporte mais efetivo. A experiência da “duração”, na qual autoras como Hannah Arendt viam a base da constituição de um espaço público, é dissolvida na efemeridade do tempo da crise, com seu presentismo hiperacelerado.
O sentido de crise que se apresenta nesse cenário não remete mais à dimensão hipocrática do ponto crítico, no qual a doença encontra seu momento de resolução, assim como também não significa o intervalo de passagem, ou de brecha, entre diferentes momentos ou épocas históricas. O que parece se colocar hoje é a crise como um modo próprio de governamentalidade da aceleração dessincronizada da sociedade contemporânea. A crise como projeto de gestão das temporalidades.
Se o uso estratégico da crise remonta ao modo neoliberal de governança das últimas três ou quatro décadas (Klein, 2008; Andrade, 2019), governos recentes como os de Trump e de Bolsonaro mostraram que essa sincronização pela crise pode ganhar novas formas e proporções com as extremas-direitas. Por meio das plataformas digitais, esses agentes capturam o presente vampirizando a atenção e a agenda pública em razão de uma série não processual de “eventos” por eles mesmos produzidos. As recorrentes falas “polêmicas” (na verdade, racistas, homofóbicas e negacionistas), as falsas polarizações, as mudanças abruptas de posição e as ambiguidades dos enunciados sempre passíveis de serem desmentidos, as notícias falsas, as teorias da conspiração, as mimeses inversas, todos esses recursos são usados na construção de uma temporalidade disruptiva, incapacitando articulações mais robustas entre passado, presente e futuro (Chun, 2016; Cesarino, 2021). As mídias tradicionais, as instituições, os diferentes agentes, ainda que de modos distintos, acabam sendo sincronizados por esse tempo da crise, mobilizados a reagirem à série acelerada de eventos e contribuindo para a sua própria ressonância e reprodução. A temporalidade da crise funciona, portanto, como uma paradoxal sincronização dos tempos dessincronizados da sociedade contemporânea. Mas uma sincronização negativa, por assim dizer, pautada menos por um projeto de futuro que se sedimenta como experiência histórica do que por uma série de reações efêmeras e sempre atrasadas.
Entender a crise como estratégia de sincronização implica, acima de tudo, considerar também aquilo que ela busca neutralizar: a sedimentação e a duração dos outros tempos que a ameaçam. Afinal, a perda de força do futuro como sincronizador dos tempos sociais veio associada à intensificação das demandas de reconhecimento de outros tempos, antes hierarquizados e excluídos. Nesse sentido, é importante ressaltar que nós não vivemos apenas uma dessincronização de tempos, mas, acima de tudo, um profundo conflito de tempos. Identificar as tensões temporais contemporâneas apenas como uma dessincronização implicaria, implícita ou explicitamente, prognosticar a sua superação por uma nova forma singular de sincronização, promovida seja por experts, reatualizando o imperativo neoliberal e neoevolucionista da adaptação (Stigler, 2019), seja por líderes que encarnariam em si a síntese de uma unidade qualquer. Pensar em conflitos de tempos, por sua vez, implica reconhecer as diferentes tessituras dos tempos implicados, seus ambientes, seus agentes, suas tensões, assim como buscar modos e formas institucionais possíveis desses tempos conviverem sem se anularem ou se reduzirem uns aos outros. Implica considerar, enfim, se é possível pensar a nação para além da singularidade temporal que a fundou.
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Essa coexistência conflituosa de tempos pode ser visualizada em razão do modo como diferentes agentes - humanos e não humanos - se colocam (e são colocados) hoje diante da herança conceitual do Estado-nação brasileiro. Conceitos como “cidadania”, “representação” e “soberania”, que articularam em diferentes momentos e com distintas configurações as formas e os sentidos da relação entre sociedade e Estado, tornam-se objetos de uma intensa disputa e mesmo de rejeição, protagonizadas por diferentes agentes e inseridos em diferentes ambientes. A temporalização da espera e da dívida parece não encontrar mais espaços de sedimentação no cenário contemporâneo brasileiro. A perda de evidência do futuro se revela, nessa chave, tanto na implosão do tempo conciliatório da Nova República como na emergência do tempo planetário na história nacional, expresso pelos efeitos da mudança climática. Em ambas as dimensões, que agora se entrecruzam de maneira decisiva, a singularidade temporal da nação é profundamente colocada em questão.
Para pensar o rompimento do tempo da Nova República, vale retomar modo clássico de pensar a temporalidade da cidadania oferecido por T. A. Marshall (1967), em seu Cidadania e classe social. O sociólogo britânico apontou três tipos de cidadania (civil, política, social) e concebeu-a, a partir do caso inglês, como dotada de uma sequencialidade própria: dos direitos civis do final do século XVIII, passando pelos direitos políticos do século XIX, até a conquista dos direitos sociais no século XX. Usando esse modelo, José Murilo de Carvalho (2002, p.122) traçou uma importante história sistemática da cidadania no Brasil, sugerindo uma inversão daquela sequencialidade. Por aqui, segundo o historiador, “a pirâmide dos direitos foi colocada de cabeça pra baixo”, começando com a cidadania social, passando pela cidadania política e orientando-se à cidadania civil. Essa inversão da sequencialidade dos direitos, assim como seus efeitos - estatismo, patrimonialismo, falta de organização civil - seriam explicadas, em grande medida, pela tradição da “cultura ibérica” que marcou o processo de formação nacional.
Há no modo de funcionamento desse esquema explicativo um modelo normativo de cidadania que é temporalizado, ainda que essa temporalização seja preenchida por sequencialidades distintas de acordo com a história de cada país. Essa forma de leitura pode receber diferentes matizes narrativos e ideológicos, do liberalismo ao marxismo, mas quase todas tendem a operar com essa dupla dimensão da normatividade e da temporalização. No limite, essa forma de narrativa não deixa de traduzir também, em seus próprios termos, uma certa filosofia da história, cujo telos marca não apenas a distinção normalidade/anormalidade de cada realização temporal da cidadania, como também implica e justifica sua final expansão espacial - não muito diferente, nesse aspecto, da espacialização do modelo de democracia-liberal preconizada nos anos 1990 por alguém como Fukuyama, chamando essa condição de o “fim da história”. Entre ganhos e perdas, o sentido do processo pressupõe a completude de um sujeito de direito a ser constituído pela história - ou, para usar a fórmula clássica de Droysen: “acima das histórias está a História”.
Sabemos hoje que esse “fim da história” já se tornou passado. Aquela cidadania plena, democrata-liberal, não apenas não se realizou como prometida nos próprios países do norte global, como também não se espacializou com a globalização - e nem poderia. Pelo contrário, os modelos de cidadanias civil, social e política foram cada vez mais esvaziados a partir dos anos 1990 em nome de uma cidadania calcada no consumo, ao mesmo tempo em que os mecanismos de participação e de representação políticos davam lugar a governos tecnocráticos e gerencialistas, sincronizados pela velocidade de reação a um capital financeiro global (Brown, 2015; Davis, 2014).
Mas para além dessa “grande regressão” da cidadania, com seu caráter temporal, é necessário ressaltar também como a dimensão espacial é estruturante no modo como as formas e os tempos da cidadania se constituem. O recorte em razão de países deixa de lado o caráter sistêmico que os qualifica relacionalmente dentro de um “sistema-mundo”, condicionando as suas temporalizações possíveis. Em que medida é possível pensar a historicidade da cidadania no Brasil, por exemplo, desde o processo de independência, sem considerar essa dimensão espacial-global que marcou profundamente suas diferentes configurações: da cidadania censitária e da sociedade escravista do século XIX, passando pela cidadania trabalhista e desenvolvimentista dos anos 1930 aos 1970, até as desigualdades abissais que caracterizam, hoje, o acesso à cidadania de consumo sob o neoliberalismo? Do mesmo modo como a cidadania no Império dependia da escravidão e de sua inserção em um mercado atlântico, a cidadania do neoliberalismo depende da existência de todo um contingente global de precarizados, sincronizados por políticas econômicas supraestatais. Se o Estado se constituiu como o soberano do tempo nacional, operando dentro de seu território, fundamental lembrar que a sua soberania sempre foi atravessada e delimitada pelas posições sistêmicas que compõem a sincronização de um tempo global da modernidade capitalista (Marques; Parron, 2020). Nesse sentido, mais do que se suceder no tempo, as cidadanias normal/anormal, plena/incompleta convivem dessincronizadas no espaço, uma estando relacionada à reprodução da outra. Entre a cidadania incompleta (ou inexistente) e a cidadania plena a ser conquistada, mais do que um fosso temporal a ser superado - o tempo da espera -, deve-se considerar a dimensão espacial constantemente gerenciada em cada presente.
Com a perda da evidência do horizonte de um futuro mais amplo a partir do qual a temporalização da cidadania pudesse se reproduzir, é essa dimensão espacial e assimétrica que hoje se revela em toda a sua tensão. O véu do futuro já não permite cobrir, como antes, os diferentes estratos temporais do presente. E essa condição se mostra particularmente intensa e explícita no cenário contemporâneo brasileiro, com a implosão do último movimento de temporalização da cidadania, iniciado na década de 1980. Convém, assim, apontar antes algumas das características dessa implosão do tempo da Nova República, a fim de indicar, ao final, em que medida a experiência vinculada ao Estado-nação não está sofrendo hoje uma espécie de “virada espacial”, cujos efeitos ainda precisam ser avaliados.
Desde as manifestações de 2013 e 2015, passando pelo golpe parlamentar de 2016 e com a posterior eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, o Brasil parece ter fechado mais um ciclo de sua história, iniciado com a campanha das Diretas Já e a Constituição de 1988 (Müller; Iegelski, 2018; Bianchi et al., 2021). Não sendo exatamente o fruto de uma ruptura com o que veio antes, a ditadura militar, mas antes o resultado de uma “transição negociada”, a Nova República acabou trazendo em suas estruturas todo um “entulho autoritário” herdado do período anterior (Mendes, 2020; Reis, 2010). Em meio a esses entulhos, no entanto, também foi negociada e avançada a construção de um projeto que buscou alargar o espaço da cidadania, tornando a Constituição de 1988 um marco inquestionável daquela democratização dos conceitos fundamentais da experiência sociopolítica. O caráter progressista da Constituição, condenando explicitamente o racismo, prevendo a dimensão social da cidadania, protegendo os territórios dos povos indígenas, serviu como um farol de esperança no processo de refiguração do futuro nacional (Viscardi; Perlato, 2018). O Brasil tornava-se, novamente - e, talvez, pela enésima vez -, o país do futuro. Contudo, entre todo horizonte de expectativa e todo espaço de experiência há sempre uma diferença irredutível, um hiato no qual nos resta viver e, em muitos casos, sobreviver. O projeto conciliatório da Nova República foi, acima de tudo, um tempo habitado por profundas tensões, ambiguidades e antinomias, que não deixariam de implodi-lo, liberando os conflitos temporais latentes que hoje se tornam explícitos.
No mesmo movimento em que a redemocratização apontou para um processo real de ampliação do espaço da cidadania, foi-se implementando também todo um aparato legal, conceitual e institucional que restringia e mesmo subvertia aquela ampliação. A intensificação de políticas econômicas e a implementação de toda uma nova “razão do mundo” neoliberal, continuadas mesmo na coexistência com aspectos desenvolvimentistas e de redistribuição social, acabou por gerar efeitos estruturantes no modo como se experimenta cotidianamente as dimensões da cidadania, da representação e da identidade coletiva (Ramalho, 2018; Antunes, 2018). O consumo como modo de acesso a serviços e direitos, a financeirização da vida cotidiana, as mudanças no mercado de trabalho - privilegiando a responsabilização individual, a concorrência e a flexibilização -, a adoção das lógicas de um Novo Gerenciamento Público, todos esses fatores foram determinantes em vampirizar os conceitos modernos da experiência sociopolítica, formatando um novo “tempo precário” (Turin, 2019). Os efeitos dessa reestruturação social neoliberal e sua individualização empreendedora não deixariam de se voltar contra os efeitos daquele movimento de expansão da cidadania. Junto com a incorporação de um ethos empreendedor e de uma visão concorrencial de sociedade, formou-se o ressentimento por parte de determinados grupos sociais, acusando as políticas sociais e de reconhecimento de violar as regras do jogo do puro mercado, impedindo com isso o sucesso do empreendimento do “bom cidadão”. Grande parte dos movimentos recentes de extrema-direita, em sua pluralidade e com suas diferentes matrizes narrativas, alimenta-se desse duplo vínculo entre a ética do empreendedorismo e o ressentimento social, caracterizando hoje a relação estreita entre neoliberalismo e neoconservadorismo (Pinheiro-Machado; Scalco, 2020; Nunes, 2021). O tempo da promessa de um Estado social e democrático, previsto na Constituição, acabou sendo atravessado pelo tempo concorrencial, autoritário e individualizante do neoliberalismo empreendedor.
Além dessa reestruturação do tecido social e das tensões dali resultantes, o horizonte de expansão da cidadania também foi acompanhado pela continuidade e pela intensificação de um aparelho policial repressor oriundo da Ditadura. O investimento no discurso da criminalidade urbana, intensificado a partir das décadas de 1980 e 1990, não apenas serviu para garantir a permanência da estrutura de uma polícia militarizada, como também passou a determinar a pauta política e midiática, orientando as disputas eleitorais (Adorno, 2006). O resultado, como as estatísticas são eloquentes em mostrar, foi a criminalização das periferias, o assassinato sistemático e desresponsabilizado de jovens negros e a explosão da população carcerária. Segundo dados do 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2021, 78% dos mortos pela polícia no Brasil são negros, assim como o são 66,3% da população carcerária, quando há informação racial disponível (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2021).
Um dos resultados desse gerenciamento espacial e racial da cidadania tem sido a incorporação legal e mesmo constitucional de elementos do estado de exceção, reforçando o perfil de um Estado securitário. Da Lei de Segurança Nacional, herdada da ditadura, passando pela Lei Antiterrorismo, de 2016, até os projetos do governo Bolsonaro para desresponsabilizar a violência policial, o Estado cada vez mais legitima mecanismos de vigilância e repressão. Essa internalização constitucional da exceção, com a justificativa de prever abusos e de combater atos “terroristas”, acaba por conferir uma estrutura jurídica à violência do Estado contra grandes parcelas da população, sedimentando de vez a sua normalização social e banalização semântica (Frankenberg, 2018). Portanto, ao lado do tempo da promessa de expansão da representação social no Estado, promovida pela Constituição e pela pressão dos movimentos sociais, instaurou-se também um reforço do seu “braço forte”, de contenção, visando gerenciar os riscos sociais da desintegração de sua coesão e hierarquias temporais. A perda de evidência do futuro, aqui, se transforma no horizonte de uma ameaça que constringe o presente e que deve ser constantemente antecipada e contida.
O tempo da expansão da cidadania, portanto, conviveu - e, em grande medida, dependeu - da instauração desse outro tempo da repressão e da violência nas periferias. Um dos efeitos dessa condição, em certa medida não previsto, foi que o próprio Estado foi sendo vampirizado pela lógica produzida em suas margens, absorvendo aquilo que Gabriel Feltran (2020) denominou de “formas elementares da vida política”. Uma razão miliciana, que reduz a vida política cada vez mais ao estado da violência bruta, não apenas tomou conta das forças policiais, mas ingressou nas próprias instituições políticas e administravas do Estado. “O que antes era a rotina do poder nas favelas e periferias, então, tende a se ‘democratizar’. Não foi fazendo o controle desses pobres, afinal, que homens de bem e seus leais policiais aprenderam como opera o poder?” (Feltran, 2020).
Diante desse cenário, talvez caiba perguntar em que medida o golpe parlamentar de 2016 e a irrupção do bolsonarismo e sua normalização e banalização semântica e institucional representam não apenas o fim do tempo da Nova República, mas acima de tudo um ponto de fissura ou, ao menos, de esgarçamento das condições de uma nova sincronização nacional por meio da crença no modelo moderno de temporalização da cidadania. As noções de cidadania e de liberdade que informam o bolsonarismo e boa parte da extrema-direita contemporânea, com uma considerável inserção na sociedade brasileira, explicitam sem o menor pudor o seu caráter restritivo, excludente e violento (Avritzer; Kerche; Marona, 2021; Bustamante; Mendes, 2021). O tempo da nação que é acionado por esses agentes, como já dito anteriormente, é o tempo de um passado nostálgico, no qual a relação entre cidadania e Estado era bem circunscrita. Não espanta, nesse sentido, o sucesso atual entre esses grupos sociais de empresas como a Brasil Paralelo, que resgata e atualiza uma visão histórica oitocentista extremamente conservadora do passado nacional, marcada pelo patriarcalismo, pelo autoritarismo, pela escravidão e pelo cristianismo (Nicolazzi, 2021; Avila, 2021). A diferença crucial entre esses passados evocados e o presente bolsonarista, contudo, é a perda de evidência do futuro. Hoje já não há a garantia do horizonte formal do futuro pelo qual uma ideia de cidadania ou de nação possa ser temporalizada enquanto promessa, justificando o presente e suas hierarquias. A circunscrição da cidadania no bolsonarismo e nas novas extremas-direitas se apresenta claramente como a reprodução contínua de um Estado de exclusão, sem visão de futuro e mobilizada pela via da ameaça a ser constantemente combatida e gerenciada.
De todo modo, enquanto no passado a temporalização moderna do futuro podia servir como um mecanismo de mediação para legitimar projetos de sincronização e de “conciliação” nacional, mobilizando pactos políticos e modelos socioeconômicos, hoje parece que cada vez menos essa forma de temporalização tem a força suficiente para produzir uma nova convergência de tempos. O bolsonarismo é, nesse sentido, apenas a manifestação mais brutal, niilista e suicidária dessa condição contemporânea, fortalecido pela capacidade tecnológica de sincronizar negativamente as diferentes temporalidades sociais. Mesmo sem a existência do bolsonarismo, no entanto, os conflitos temporais que atravessam a sociedade brasileira parecem distantes de encontrar algum ponto de fuga comum, onde pudessem se sincronizar de modo mais ou menos durável. Afinal, como já foi dito, os modelos modernos de temporalização da cidadania também não deixam de ser profundamente tensionados pelos movimentos negros, pelos povos indígenas, pelas mulheres, pelos trabalhadores precarizados, pelos LGBTQIA+ e, como veremos, pela própria natureza. O tempo da espera e da dívida, longe de servir novamente como meio de apaziguamento, cada vez mais é contestado em razão de outras formas de temporalização, enraizadas em espaços distintos. A reivindicação de autonomia dos povos indígenas, as demandas de reconhecimento e de reparação imediatas e efetivas por parte do movimento negro, as contestações feministas e LGBTQIA+ do sistema patriarcalista e de sua violência cotidiana, a iminência de um colapso ambiental, todas essas forças recusam ingressar novamente no tempo singularizante da espera e da dívida.
Esse conflito de tempos leva, no limite, à implosão do próprio conceito moderno de história que fundou o Estado-nação. Afinal, como oferecer sínteses dos diferentes tempos que compõem o território nacional quando a própria condição da temporalização moderna, o futuro, não está mais dada como pressuposto? Quais os efeitos disso para a temporalização do Estado-nação e dos povos que habitam esse território? No lugar da busca de novas sínteses que preencham o futuro da temporalização moderna, o que talvez experimentamos hoje seja um duplo desafio, estreitamente inter-relacionado: garantir a própria existência do futuro e, como condição disso, produzir novas formas de habitar os tempos, distintas daquelas que herdamos do passado.
* * *
Uma questão central que se coloca às vésperas do bicentenário, portanto, é como pensar a nação quando a própria forma de historicidade que a fundou parece estar em ruínas (Hartog, 2013). Haverá Estado-nação para além do conceito moderno de história? Essa é uma pergunta para a qual qualquer resposta segura mostra-se precipitada. De todo modo, se escrever sobre o passado nacional sempre foi um meio de projetar o seu futuro, isso se devia porque a forma-futuro estava dada de antemão, esperando para ser preenchida por diferentes conteúdos narrativos. Hoje, pelo contrário, pensar o tempo nacional passa necessariamente pelo enfrentamento da perda de evidência daquela forma de futuro processual e singular, assim como pela necessidade de especular sobre suas possíveis novas figurações (Tamm; Simon, 2020).
E não há como especular sobre a condição do futuro, hoje, sem o enfrentamento do que podemos chamar de o “acontecimento Terra” (Costa; Veiga, 2021). Junto com aqueles fatores de dessincronização e de conflitos dos tempos sociais que marcam a crise da sociedade contemporânea, a mudança climática e seus efeitos são um dos vetores que tencionam de maneira decisiva a constelação conceitual e temporal do Estado-nação brasileiro. Convém, assim, apontar brevemente alguns desses efeitos, indagando em que medida a irrupção do tempo planetário na história nacional não cobra também a elaboração de uma nova forma de ambientação e de sedimentação das diferentes temporalidades, para além da forma de sincronização do tempo moderno. Ou seja, de que modo essa nova espacialização da experiência histórica não implica em novas políticas do tempo (Turin, 2021).
Desde a independência, passando pelos diferentes modernismos e pela cultura de massa da segunda metade do século XX, a natureza serviu como um elemento fundamental de figuração da identidade nacional. Diante da diversidade de povos que habitavam o território, a construção da nação brasileira se valeu sistematicamente da natureza como dispositivo de unificação simbólica (Schiavinatto, 2003; Süssekind, 1990). Mais do que isso, ela sempre foi vista como uma das condições de possibilidade da temporalização do Estado-nação, servindo como a garantia de um futuro de abundância. Os futuros do passado nacional foram estruturalmente ancorados na possibilidade da exploração da natureza: das matas densas de árvores “valiosas” - das quais rendeu o próprio nome do país -, passando pela extensão de terras propícias para as plantations e pela riqueza de minerais em seu solo, até a descoberta de grandes reservas de petróleo. Nesse sentido, se o pensamento político-econômico moderno se formou na estreita associação entre “abundância e liberdade”, como bem analisou Pierre Charbonnier (2020), no Brasil essa associação sempre dependeu da certeza de uma grande quantidade de “recursos naturais” disponíveis a serem explorados. A temporalidade da cidadania sempre se ancorou na estrutura da monocultura extensiva e na mineração predatória. O tempo histórico da promessa e da dívida também sempre teve na natureza o seu fiador involuntário.
O que se torna evidente, hoje, é que não é mais possível viver nesse tempo comprado com o crédito dos “recursos” do planeta. O diagnóstico inequívoco das mudanças climáticas, formalizado em 2021 pelo sexto relatório do IPCC, nos coloca na situação de ter que lidar com um futuro planetário muito distinto das condições nas quais as sociedades viveram pelos últimos 11 mil anos. A provável nomeação oficial de uma nova época geológica, o Antropoceno, vem reforçar a profundidade dessa ruptura temporal (Zalasiewicz, 2019). A consciência inescapável de que a ação humana passa a se inscrever enquanto agente geológico nos obriga, igualmente, a conceber a natureza não mais como o palco inerte da história humana, mas como um composto complexo dotado de agências próprias (Chakrabarty, 2021; Danowski; Viveiros de Castro, 2014; Latour, 2020). As implicações históricas, éticas, políticas, epistemológicas e, ao fim, ontológicas dessa mudança ainda estão longe de ser plenamente formuladas, apesar da já extensa bibliografia sobre o tema.
De todo modo, cabe perguntar: seria o Antropoceno uma nova forma de sincronização das temporalidades globais e nacionais? Com o naufrágio das metanarrativas modernas, poderia esse novo “regime climático” se tornar o elemento organizador de uma nova ordem do tempo (Hartog, 2020, p.271-80)? As respostas que forem dadas a essas questões provavelmente definirão as novas configurações e mesmo a sobrevivência de conceitos como “cidadania”, “soberania” e “representação”. Em que medida uma noção de cidadania cuja realização ancora-se no imperativo da abundância pode continuar orientando as promessas políticas e seus arranjos sociais? Afinal, a globalização da cidadania baseada no consumo se mostra impossível de ser realizada não apenas pelas assimetrias estruturais que relacionam as sociedades no sistema capitalista mundial, mas também porque ela implicaria o colapso completo das condições de vida no planeta. Há, assim, um profundo conflito entre as condições de habitabilidade do planeta e as promessas que estruturam a temporalização moderna da cidadania, cobrando novas articulações globais e locais entre justiça social e justiça climática (Latour; Chaktabarty, 2020).
Do mesmo modo, o pressuposto da soberania das nações sobre seus próprios territórios, alimentado pelo mito westphaliano, é diretamente colocado em xeque em razão dos efeitos das mudanças climáticas, que não respeitam fronteiras e muros. De nada adianta que certos países implementem políticas sustentáveis em seus territórios se em outras regiões ecossistemas inteiros são devastados. Mesmo que em proporções e ritmos distintos, a conta chegará (e já está chegando) para todos. A recorrência cada vez mais acelerada de eventos climáticos extremos vem explicitando essa fragilidade das fronteiras e a impotência de uma política focada apenas nos Estados-nação. A criação de legislações e agências internacionais voltadas a crimes ambientais e ao controle de emissões poluentes sinaliza para a restrição do poder dos Estados em relação a seus territórios - considerando, obviamente, as já existentes assimetrias e os próprios limites desse ideal de soberania (Toussant, 2020). Os debates e as querelas internacionais recentes que se criaram em torno da Amazônia sob o governo Bolsonaro, como a recente acusação de crime ambiental no Tribunal Internacional de Haia, são um exemplo eloquente desse processo em andamento de redimensionamento do poder soberano das nações diante das mudanças climáticas. Ao mesmo tempo, contudo, a previsão em um futuro próximo da migração de mais de 1,2 bilhão de pessoas em razão da degradação ambiental faz que se retome, especialmente em países do norte global, a lógica das “soberanias muradas”. Já se coloca em discussão, inclusive, como alternativa para lidar com essa realidade a implementação oficial de cidadanias diferenciadas, de primeira e segunda ordens, distinguindo direitos entre indivíduos que vivem sob o mesmo Estado (Milanovic, 2019 p.129-75). Há, portanto, movimentos tanto centrípetos como centrífugos que vêm afetar estruturalmente a dimensão da soberania westphaliana e suas temporalizações, abrindo diferentes horizontes possíveis: desde a criação de uma inédita “soberania planetária”, de caráter tecnocrático, até o investimento na pluralização de soberanias locais ou transversais (Wainwrigth; Mann, 2000; Dardot; Laval, 2020).
A noção de “representação”, por fim, cuja crise tem esvaziado o que existe dos sistemas democráticos nas últimas décadas, parece também encaminhar-se para uma profunda ressignificação. Ao sentimento de falta de representatividade ante o sistema político, causado pelo gerencialismo neoliberal, somam-se outros desafios surgidos com a crise climática. Se o tempo das deliberações políticas parlamentares já vinha se mostrando lento demais diante da hiperaceleração do capital financeiro global, o que dizer agora, quando é o tempo da própria natureza que se revela mais acelerado do que a capacidade de reação do mercado e dos Estados? A história dos acordos internacionais para o combate do aquecimento climático, desde a Rio-92, mostra a dificuldade em fazer convergir os tempos dos Estados-nação em direção à emergência do tempo planetário, ainda mais quando esses Estados se tornaram cada vez mais vulneráveis à pressão de grandes corporações emissoras de poluentes (Aykut; Dahan, 2015). Quem representa e quem é representado nesses novos fóruns globais de negociações a respeito do futuro climático do planeta? Quais os mecanismos efetivos de deliberação democrática em uma escala planetária? A emergência de uma nova geopolítica - somando-se à biopolítica moderna -, pautada pela geoengenharia e pela administração técnica dos “recursos” do planeta, já se desenha como um horizonte efetivo, ameaçando de vez o viés representativo dos sistemas democráticos modernos (Yusoff, 2017).
Se, por um lado, a noção de representação moderna vem sofrendo um processo de esvaziamento, reforçando forças centralizadas, tecnocráticas e autoritárias de decisão, por outro, ela também não deixa de apontar para possíveis e profundas refigurações, abarcando realidades mais-que-humanas. O processo de inclusão de animais e biomas como sujeitos de direitos plenos, por exemplo, transcende a visão objetificada da natureza como um mero recurso barato e explorável, assim como altera a temporalização moderna da história centrada apenas na agência humana. Esse reconhecimento de uma pluralização de formas de agências, humanas e não humanas, implica não apenas a elaboração de outras formas de historicidade, mas também o reconhecimento de seus limites, marcados por fronteiras ontológicas e suas conexões parciais (Seth, 2013; Haraway, 2016; De La Cadena, 2019; Krenak, 2020, Kopenawa; Albert, 2015). É a própria noção de política, aqui, que é refigurada para além de sua circunscrição aristotélica (“o homem é um animal político”), assim como para aquém do horizonte da singularização expansiva da modernidade. Uma política - ou, para falar com Isabelle Stengers (2018), uma “cosmopolítica” - que realmente reconheça os outros implicados e seus tempos, humanos e não-humanos, sem submetê-los ou anulá-los em nome da enunciação de um futuro singular qualquer.
Ao final, em meio a essas tendências de transformação da constelação conceitual e temporal do Estado-nação, a irrupção do tempo planetário nos recoloca as opções: dobrar a aposta moderna na disponibilidade da história (e do planeta) à ação e à volição humanas, ou, então, elaborar o reconhecimento da incontornável indisponibilidade do mundo, criando outras formas de habitabilidade. O que está implicado nessas opções não são apenas conteúdos de futuro distintos, mas, acima de tudo, formas diferentes de temporalização. Enquanto a dobra da aposta moderna encaminha para a intensificação de um processo de singularização e abstração do tempo, materializado hoje por narrativas transhumanistas do Vale do Silício, pela promessa de exploração interplanetária e pelo ressurgimento de políticas fascistas, o reconhecimento da indisponibilidade do mundo orienta para um caminho diverso, de materialização do tempo, ou, mais precisamente, de sua espacialização, pluralizando as temporalizações em razão de seus diferentes ambientes e dos sujeitos implicados. Entre esses distintos caminhos, é a própria forma de futuro, ou de futuros, que está sendo redesenhada e disputada.
Na medida em que o tempo da promessa e da dívida sempre dependeu da necessária abstração das diferentes ambientações implicadas, ele transformava os espaços em meios transitórios de sua realização. O que os conflitos temporais e a catástrofe climática trazem como desafio, hoje, é um processo inverso, de espacialização dos tempos. Quanto mais abstrata a temporalidade, mais ela tende à singularização; quanto mais espacializada, mais ela se mostra em toda a sua pluralidade constitutiva. O que parece certo, contudo, é que os conflitos de tempo que marcam a sociedade brasileira dificilmente poderão ser apaziguados e sincronizados em nome de um outro futuro singular qualquer. No lugar da temporalização da política, iniciada há duzentos anos com o processo de independência, o que experimentamos hoje é um cenário de profunda e acirrada politização dos tempos. A perda da evidência do futuro pode representar, ao final, a possibilidade de realizar o corte naquela fita de Moebius de exploração e expropriação da qual sempre dependeu o tempo progressivo e singular da modernidade nacional (Mombaça, 2020, p.10). Afinal, se o mundo é uma totalidade impossível, como não cansou de nos mostrar Carlos Drummond de Andrade, o Brasil é uma totalidade ainda mais impossível, na qual diferentes mundos (re)existem e, no limite, “nenhum Brasil existe”.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
13 Maio 2022 -
Data do Fascículo
May-Aug 2022
Histórico
-
Recebido
27 Out 2021 -
Aceito
15 Nov 2021