Open-access Gênero, trabalho e cidadania: função igual, tratamento salarial desigual

Gender Labor and Citizenship: Equal Occupation, Unequal Salary Treatment

Resumo:

Este estudo aborda a questão da (des)igualdade de gênero no trabalho, mais especificamente acerca da disparidade salarial entre homens e mulheres, à luz da igualdade e da premissa internacionalmente concertadas de trabalho igual, salário igual, objetivando problematizar como se apresenta contemporaneamente a demanda por paridade salarial como direito e como exercício de cidadania. Nesse compasso, ao analisar o ordenamento que veda discriminar (in)diretamente a mulher quando esta executa igual função ocupada por um homem e sublinhar a existência de uma aguda desigualdade sociolaboral, pretende-se refletir também sobre a persistência de uma ainda insuficiente compensação jurídica, proporcionada pela discriminação positiva. Constata-se que, apesar dos avanços verificados com uma maior inserção da mulher no mercado de trabalho, as determinações socioeconômicas, políticas e culturais que incidem sobre as relações de gênero dificultam a aplicabilidade dos instrumentos jurídicos disponíveis, entrelaçando essa questão com outras desigualdades próprias do modelo societário capitalista; porquanto permanece a igualdade salarial como uma demanda urgente e desafiadora da cidadania política, sobretudo em tempos de desmonte dos direitos sociais.

Palavras-chave: Gênero; trabalho; (des)igualdade; salário, cidadania

Abstract:

This study approaches the theme of gender inequality in labor, specifically about gender wage gap, equality and the legal principal of equal pay for equal work, in order to evaluate how is contemporary present the demand for wage parity as a right and as part of citizenship. Therefore, we analyze the legal prohibition for direct and indirect discrimination to women that executes the same function occupied by a man, systematization that reveals socio-occupational diversities and a still insufficient legal compensation by the positive discrimination. We observe that despites the progress achieved with the inclusion of women in the labor market, the socioeconomic, political and cultural determinations that affects gender relations interferes in the applicability of the legal instruments, connecting this legal issue with other diversities in the contemporary capitalism; consequently equal pay remains as an urgent and challenging demand of citizenship.

Keywords: Gender; Labor; Equality; Inequality; Salary; Citizenship

Introdução

A premissa universalizante da igualdade, conjugada ao mandamento garantista antidiscriminatório, demanda o dever de positivamente se diferenciar os não semelhantes, e rechaça a discriminação subjetiva e ilegítima (Mariana CANOTILHO, 2011), ambientados que são no paradigma constitucional da dignidade.

Antagonicamente a esses postulados, discriminação e diferenciações são aplicadas a determinados segmentos sociais (negros, mulheres, idosos, imigrantes, pessoas com deficiência), nos mais diversos contextos, em especial no mercado de trabalho, concorrendo em disparidades diversas que social e culturalmente ainda posicionam a mulher como um ser submetido à supremacia do homem e que afeta todas as esferas sociais, a se entrelaçar com a desigualdade de classes.

Uma síntese das múltiplas desigualdades que atingem a mulher pode ser constatada quando se verifica, segundo Arion Sayão Romita (2006), que mundialmente ela representa a maior parcela da população pobre (70%) e analfabeta (65%); e no plano laboral, pela ocupação predominantemente informal, precária e por tempo parcial, sendo-lhe atribuídas funções rotuladas como femininas, mas que possuem cariz doméstico, e pelo fato de desempenharem em menor proporção funções de comando no trabalho e na política, numa dimensão hierárquica naturalizada que segue culturalmente sendo também (re)produzida por parte das mulheres, o que só acentua a complexidade que reveste essa questão.

Este estudo, de caráter teórico e qualitativo, mediante pesquisa bibliográfica e documental, analisa instrumentos jurídicos internacionais, a legislação brasileira e a doutrina de referência, bases teórico-jurídicas necessárias para a compreensão analítica, crítica e contextual das desigualdades de gênero e dos parâmetros normativos de contenção e reparação.

Sob esse percurso metodológico, a temática das desigualdades é suscitada com base nas perspectivas histórica, socioeconômica e jurídica - sobretudo pela ótica dos direitos humanos da mulher, particularizando a questão da disparidade salarial entre homens e mulheres e articulando as demandas pelo trabalho protegido, sob os critérios universais e fundamentais da igualdade e da ausência de discriminação no ambiente de trabalho. Questiona-se inicialmente a razão de ser dessa prática, com poder de rebaixar o valor do trabalho quando este é exercido pela mulher, indagando quais elementos econômicos e culturais ainda fomentam esse quadro.

Diante desse panorama de discriminação e de violações, a confrontação pelo campo do direito é suscitada, ocasião em que serão discutidas as conquistas alcançadas pela ação política em busca da igualdade de gênero, o que vem resultando em normatividade protetiva e em progressiva garantia dos direitos (humanos, fundamentais e sociais) da mulher, enquanto processo histórico de construção jurídica, porém ainda distante de um quadro efetivamente equalizado.

Pondera-se em que medida essas normativas (cor)respondem às demandas por igualdade salarial e até que ponto conseguem romper com as barreiras culturais de opressão social, traçado metodológico que permitiu verificar como se apresenta hoje a cartilha de direitos, quais reivindicações e desafios permanecem atuais e qual o foco da luta feminista hoje, especificamente perante as desigualdades entre homens e mulheres no mundo do trabalho.

Igualdade e não discriminação: das desigualdades sociolaborais à discriminação positiva

A essência do sentido de igualdade tem origem no Cristianismo (Alice MONTEIRO DE BARROS, 1995), mas a construção de sua noção jurídica recebeu contributos de pensadores iluministas que influenciaram as revoluções liberais novecentistas (Guilherme Machado DRAY, 1999), sendo reproduzida e inserida sua perspectiva formalista nas constituições e nos documentos políticos liberais,1 a conformar a codificação ocidental da igualdade como premissa jurídico-política universalizante (ROMITA, 2006) nos níveis principiológico, constitucional e juspositivista.

A igualdade é a clássica premissa constitucional ocidental, garantia da dignidade humana,2 que perpassa enquanto mandamento o tratamento isonômico direcionado a todos, e que pressupõe a abolição de predileções, distinções e discriminações. Assim, “el mandato de igualdad en la formulación del derecho exige que todos sean igual por el legislador” (Robert ALEXY, 1993, p. 384), na sua perspectiva formalística.

Persiste nesse norte constitucional uma inegável ausência de materialidade. Por essa razão, necessita que seja especificado o seu conteúdo, sendo por isso uma categoria genérica - pelo que se reconhece nela um inegável “problema de determinação do conteúdo” (Maria Lúcia AMARAL, 2004, p. 45) - dividida, ainda, em formal (legalista) e material (no plano factual).

Dessa necessidade de corporificação e instrumentalização apresenta-se o mandamento antidiscriminatório como corolário da igualdade, sendo esta segunda uma diretriz mais ampla e complexa que a primeira, vindo o preceito da não discriminação a conferir substancialidade e instrumentalidade à igualdade (Dulce LOPES, 1999), rompendo com a rigidez positivista de sua versão formal. A doutrina considera como a grande questão atual da igualdade jurídica o abismo entre sua proposta formal e sua aplicação material (Oscar Ermida URIARTE, 2006). Nesse sentido, a discriminação seria constituída por “distinções, restrições, exclusões ou preferências” (Vera Lúcia RAPOSO, 2006, p. 167) direcionadas a grupos vulnerabilizados, minoritários ou específicos, podendo, até mesmo, resultar em medidas fortuitas ou de cunho odioso (CANOTILHO, 2011).

Essa (re)construção contemporânea da dimensão jurídica da igualdade, cumulada com a da não discriminação, fixou-as em um patamar de categorias éticas, valores e paradigmas constitucionais estruturantes da ordem político-jurídica ocidental e em consonância com os valores republicano e democrático (Paulo Daflon BARROZO, 2004) que implicam a obrigação de positivamente se diferenciar e nas proibições ao arbítrio e à discriminação subjetiva e injustificada (CANOTILHO, 2011), fincados que são no preceito axiológico da dignidade humana (José Carlos Vieira de Andrade, 2012).

Nesse contexto, destaca-se que o ato de se diferenciar não importa em uma liminar discriminação negativa, mas na conduta em não se tratar por semelhantes os opostos, o que também não significa a necessária promoção de desigualdades materiais (Flávia PIOVESAN, 2005), se baseado o tratamento diferenciador em pretextos legítimos, objetivos e proporcionais (RAPOSO, 2006). Desse modo, nem todas as diferenciações serão arbitrárias ou desarrazoadas, tão só aquelas movidas por razões subjetivas e injustas (Sergio Gamonal CONTRERAS, 2006).

Assim, ao passo que “a igualdade pressupõe formas de inclusão social, a discriminação implica violenta exclusão e intolerância à diferença e à diversidade” (PIOVESAN, 2005, p. 49). Comporta a discriminação, subdivisão direta, indireta e em ação positiva ou discriminação positiva - distinções essas de origem norte-americana e europeia, respectivamente.

Na discriminação direta, ou aberta (María del Carmen ORTIZ LALLANA, 1987, p. 77), que ainda pode ser explícita ou encoberta (CONTRERAS, 2006, p. 150), há a categórica intenção de se diferenciar os iguais ou de se tratar igualmente os opostos que mereçam tratamento especial.

Já para a discriminação indireta, oculta ou dissimulada (ORTIZ LALLANA, 1987, p. 77), “não é necessária a intenção discriminatória, bastando que o seja o seu resultado” (Jorge LEITE, 2006, p. 13). Desse modo, mesmo que a norma ou conduta adote critérios aparentemente neutros e objetivos, na prática afetam desproporcionalmente (CONTRERAS, 2006) grupos específicos e vulnerabilizados (as categorias suspeitas), provocando a desigualdade de resultado, ainda que o tratamento inicial tenha sido formalmente isonômico e a diferenciação não haja sido intencional; alegação difícil de ser confirmada na prática (LOPES, 1999).

Essa dupla referência de igualdade e de proibição para ilegitimamente discriminar produz o binômio inclusão-exclusão (PIOVESAN, 2005, p. 49), aparecendo a isonomia material como uma presunção de inclusão social, econômica e cultural; já a diferenciação negativa implica segregação e ausência de consideração para com a diferença e a diversidade multicultural (PIOVESAN, 2008).

Percebe Romita (2006, p. 83) o preceito antidiscriminatório como uma verdadeira igualdade em direitos. Nessa medida, uma categoria depende da outra para efetivar-se no plano fático, não logrando apenas a igualdade ou somente o mandamento antidiscriminatório à inclusão de grupos minoritários alijados socialmente (Joaquim Barbosa GOMES, 2001).

Mesmo com a combinação legal da isonomia e com a não discriminação, ainda assim a igualdade material parece não ser alcançada, ou as ilegítimas e antidemocráticas diferenciações, eliminadas (Carmen Lúcia Antunes ROCHA, 1996). Uma premissa normativa não se torna efetiva por carregar em seu seio um mandamento jurídico, muito menos autossuficiente substancialmente “para reverter um quadro social que finca âncoras na tradição cultural de cada país” (GOMES, 2001, p. 134).

Nesse sentido, apesar de a igualdade formal ser confirmada constitucionalmente, sua versão material nem sempre se faz efetiva ou equitativa. Contudo, afere-se que é através da diferenciação positiva compensatória, uma discriminação às avessas (URIARTE, 2006), que se consegue alçar ao patamar de igualdade material situações concretas de desigualdade, sejam elas sociais, culturais, econômicas ou jurídicas (LOPES, 2011).

A gênese das ações afirmativas remete às contribuições proferidas pela Suprema Corte norte-americana, na metade da década de 1960, sendo-lhes atribuído o sentido de ser “uma forma jurídica para se superar o isolamento ou a diminuição social a que se acham sujeitas as minorias” (ROCHA, 1996, p. 286), elevando-as ao patamar de igualdade a nível jurídico, social, político e econômico.

Por isso mesmo essas ações são entendidas como discriminações normativo-positivas (AMARAL, 2004); são especiais e transitórias, fincadas em critérios objetivos, abstratos e proporcionais, e direcionadas a grupos específicos, de modo a se restabelecer a igualdade substancial - “o que não deixa de ser paradoxal, já que se pretende obter a igualdade pela desigualdade ou pela discriminação” (Jorge COSTA, 2004, p. 62).

Justificam a sua razão de ser na necessidade de se proporcionar uma atenção especial a singularidades marginalizadas, de modo a se (re)equilibrar as diferenças e (r)estabelecer a igualdade factual, sendo, assim, “a expressão democrática mais atualizada da igualdade jurídica promovida na e pela sociedade” (ROCHA, 1996, p. 295).

Enquanto perspectiva garantista da premissa de que “temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza” (Boaventura de Sousa SANTOS, 2003a, p. 458), essa noção reconhece tanto o direito à igualdade quanto à diferença e à diversidade (PIOVESAN, 2005, p. 47), sem permitir que desigualdades ilegítimas sejam nutridas no espaço sociocultural, econômico e jurídico (PIOVESAN, 2008).

Dessas orientações protetivas emergem as ações afirmativas (ou a discriminação positiva) como direito e “como poderosos instrumentos de inclusão social” (PIOVESAN, 2005, p. 49); constituem propostas temporárias destinadas a aceleradamente sanar dissimetrias sociais (MONTEIRO DE BARROS, 2006), o que exige a concreta atuação no sentido de se romper com as desigualdades (Martha Márquez GARMENDIA, 2006), lógica essa protetiva e compensatória, alicerçada no ideal dos direitos fundamentais e humanos.

É oportuno ressaltar que a discriminação positiva e as ações afirmativas comportam muita discussão teórica, havendo doutrina que entende ambas as nomenclaturas como sinônimas (URIARTE, 2006; GARMENDIA, 2006); adotadas neste estudo como semelhantes e correlacionáveis, com respaldo na doutrina de Raposo (2006).

A título elucidativo, a discriminação positiva, de origem europeia, é a conduta legal, objetiva, temporária e transitória (URIARTE, 2006) que tenta reparar desigualdades concretas impostas a grupos vulnerabilizados. Já as ações afirmativas, de gênese americana, são medidas estatais especiais e temporárias destinadas a grupos minoritários específicos, a fim de restabelecer mais celeremente a igualdade material, sendo, pois, a ação política que instrumentaliza a discriminação positiva normativa (PIOVESAN, 2005).

Outra discussão levantada é acerca do reconhecimento das ações afirmativas. Parcela da doutrina as compreende como dispositivos jurídicos violadores de direitos, sendo majoritariamente percebidas como instrumentos viabilizadores da igualdade material e da inclusão social (PIOVESAN, 2008).

Tenta-se compensar com a igualdade de oportunidades e com a igualdade de resultados (RAPOSO, 2006), materializadas em políticas públicas3 através da justiça distributiva e social (URIARTE, 2006) - justiça essa com caráter bidimensional (SANTOS; João Arriscado NUNES, 2003b) - que demanda redistribuição e o reconhecimento de múltiplas identidades (Nancy FRASER, 2002). Trata-se de uma longa história de desigualdade social e de discriminação cultural a determinados segmentos (BARROZO, 2004), como negros, trabalhadores, mulheres, comunidades indígenas, imigrantes, por orientação sexual, visando a promover a efetiva inclusão social desses grupos e afirmar direitos fundamentais antes declinados (PIOVESAN, 2005; 2008).

Reconhecer a vulnerabilização sociocultural desses grupos e (re)distribuir vantagens sociais e econômicas enquanto concepção bidimensional da justiça (FRASER, 2002, p. 4) como canais para se efetivar a igualdade material permite suprimir diferenças e assegurar o multiculturalismo, de modo a enfrentar a diferenciação negativa (SANTOS; NUNES, 2003b) e a promover a crescente inclusão e integração da mulher no campo do trabalho (FRASER, 2002) em patamar de igualdade formal. Nesse sentido, a questão da (des)igualdade salarial entre gêneros será discutida adiante.

A disparidade salarial entre homens e mulheres no exercício da mesma função

No campo do trabalho, a igualdade e a não discriminação são chamadas para se tentar sanar e reverter cenários de segregação, de distinção injustificada ou de ausência de distinção necessária e que contraria a norma; devem ambos os mandamentos ser observados em todas as fases contratuais do trabalho, evitando-se, assim, predileções, injustiças e ilegalidades. Na verdade, essa é a essência do direito laboral, que carrega em seu seio a noção de discriminação positiva (DRAY, 1999), uma vez que contrabalança disparidades, promove a isonomia no plano fático.

Desse modo, o parâmetro de averiguação da aptidão laboral do trabalhador não poderá ser subjetivamente fincado em questões como gênero, nacionalidade, idade, ideologia, orientação sexual ou valor religioso. Em se tratando de um grupo heterogêneo de trabalhadores, eventual tratamento não poderá ocorrer, nem será considerado legítimo e constitucionalmente pertinente com base nessas questões, salvo se excepcionalmente justificado em razão de particularidades da profissão ou de prévia e objetiva previsão legal (ROMITA, 2006).

No entanto, a segregação da mulher do campo civil-político, do jurídico e do trabalho foi perpetuada enquanto filosofia clássica. Paulatinamente, a mulher (sobretudo a ocidental) desconstrói essa noção e luta pela igualdade de gênero, pelos direitos humanos das mulheres (PIOVESAN, 2006) e por sua inserção protegida no mercado de trabalho, objeto deste estudo.

Em especial, o contemporâneo debate da desigualdade no trabalho, em que pese a diferenciação salarial,4 e apesar das investidas político-jurídicas de enfrentamento, mantém-se elevado. Esse cenário de disparidade apresenta-se como reflexo de uma cultura sexista, machista e segregante da mulher - e que (re)produz diversas outras desigualdades, “vista(s) como uma condição natural necessária, não como um produto da cultura e da sociedade, que pode ser modificado” (Thereza Cristina GOSDAL, 2006, p. 306).

Hoje, para além da desigualdade econômica, e em face das imposições culturais da dominação masculina, a mulher ainda enfrenta forte desigualdade social (discriminação no trabalho por gravidez), cultural (histórico de violência5 contra a mulher), política (pouca representatividade e ocupação dos cargos6) e jurídica (já que apenas recentemente assumiu a mulher a capacidade jurídica plena para gerir seus direitos e interesses, entre outros episódios7), consignando um corolário de desigualdades que resulta na constatação de precarização, vulnerabilização e violência de gênero (Helena HIRATA, 2004).

É nesse sentido que se constata um histórico deslocamento social e cultural da mulher para o segundo plano, em comparação com o posicionamento do homem em caráter de essencialidade (GOSDAL, 2006), sem desatentar para outros processos igualmente excludentes. Tal constatação é proporcionada nesse espaço social porque “el mundo del trabajo constituye uno de los ámbitos privilegiados para el análisis de las relaciones de género” (GARMENDIA, 2006, p. 139), cenário que permite que se observe as influências sociais e a construção cultural definidora de rótulos, sendo também constatada uma progressiva feminização do trabalho em razão do pós-guerra e da necessidade de mão de obra para atender às demandas industriais (Sara Falcão CASACA, 2010).

E não apenas com relação à remuneração no contexto da desigualdade socioeconômica, mas a mulher sofre também outras inúmeras injustiças e espoliações no trabalho, tendo em vista que o próprio contexto social do trabalho é potencializador de discriminação em seu espaço - sendo, por isso, a discriminação de gênero ainda mais nítida nessa conjuntura social (ORTIZ LALLANA, 1987), por ser a relação laboral essencialmente uma relação de poder e de subordinação (URIARTE, 2006).

Entre as estatísticas da OIT (2016), constata-se que a mulher trabalha até duas horas a mais que o homem e que o gênero feminino representa um maior contingente de trabalho informal, não qualificado e por tempo parcial. Com relação à desigualdade salarial entre homens e mulheres,8 apesar de, em estudo recente, a instituição ter constatado que houve redução nas diferenças salariais de 30% para 23%, ainda se precisará de mais de 70 anos para suprimir essa disparidade, que implica, também, a redução da cobertura previdenciária da mulher, em consonância com o percentual anual de redução (OIT, 2016) - o que concorre para a “crescente feminização da pobreza” (Jürgen HABERMAS, 2002, p. 296).

Outra constatação de desigualdade da mulher no trabalho é a discriminação horizontal e a vertical, canalizadas que são horizontalmente na designação de cargos tidos por femininos - com traços de responsabilidade matriarcal e doméstica (GOSDAL, 2006); ou em uma maior assunção do trabalho informal, precário ou com remuneração reduzida. E verticalmente desigual por representar o universo feminino o contingente que menos assume postos de comando no trabalho (CONTRERAS, 2006).

Por essas e outras razões é possível afirmar que “as mulheres ainda não puderam valer-se plenamente da igualdade formal, porque suas vidas materiais encontram-se marcadas por especificidades de gênero” (GOSDAL, 2006, p. 310). O Índice Global de Desigualdade de 2015 revela números assustadores e que ressaltam a urgência do tratamento jurídico.

Diante desse quadro, a discriminação de gênero passa a receber especial proteção em normativas internacionais que apontam diretrizes e perspectivas para tal questão. É sabido que “o processo de universalização dos direitos humanos permitiu a formação de um sistema internacional de proteção desses direitos” (PIOVESAN, 2005, p. 45), conformando um arcabouço jurídico internacional a nível global e regional que se complementam - a exemplo das produções europeia, latino-americana e africana - de modo a ampliar a tutela efetiva dos direitos humanos e fundamentais da mulher (PIOVESAN, 2005).

A desigualdade salarial da mulher e suas implicações futuras

A diferenciação salarial provocada pela discriminação da mulher no trabalho ramifica-se em diversos outros desdobramentos e traz consequências futuras para sua reprodução pessoal e familiar. Repercute, inclusive, na proteção social, em especial na aposentadoria (OIT, 2016). Uma vez que há o rebaixamento do salário da mulher em relação ao do homem, ocorre, também, o rebaixamento do valor de sua aposentadoria, dada a lógica contributiva dos regimes previdenciários que se baseiam, entre outros fatores, no valor das contribuições dos segurados.

No caso da disparidade salarial da mulher, que compõe um grupo culturalmente discriminado no trabalho, a vulnerabilização de sua condição implica uma reduzida proteção social, em compasso com o seu rendimento mensal inferior ao percebido pelo homem.

Esse cálculo, para ser positivo, demanda conjugar o trabalho protegido, integrado e de qualidade com o sistema de proteção social (LOUREIRO, 2014), estando eles umbilicalmente interligados. Não se pode esperar uma proteção social efetiva e em patamar de igualdade para todos os segurados se o valor do trabalho exercido no período ativo foi desproporcional. Assim, a (des)igualdade salarial entre homens e mulheres implica (des)igualdade da segurança social, na medida em que, se o trabalhador homem receber um ordenado maior e por isso contribuir mais, estaria em disparidade com a realidade da mulher, que, por receber em média 23% a menos que o homem, contribuirá proporcionalmente menos, dados esses que confirmam a constatação da feminização da pobreza (HABERMAS, 2002).

Em face desse quadro, a OIT (2016, p. 12) recomenda que a ação promocional da igualdade de gênero no trabalho deve se dar no sentido de que “os pisos de segurança social projetados nacionalmente podem e devem servir como uma ferramenta transformadora das questões de gênero”; isso consistiria na (re)afirmação da cidadania através da promoção da proteção social e da erradicação da pobreza (LOUREIRO, 2014).

A questão da desigualdade da mulher na ordem jurídica internacional

No plano internacional, um primeiro contributo genérico da OIT9 em matéria de igualdade e não discriminação em razão do sexo é a Declaração da Filadélfia (1944), proclamada em substituição à Constituição da OIT (1919), que consagrou o princípio da remuneração igual para trabalho de igual valor, preconizando a igualdade de oportunidades e de tratamento no trabalho (URIARTE, 2006).

Outras contribuições da OIT em matéria de igualdade salarial entre homens e mulheres enquanto direito humano (Martin OELZ et al., 2013), e de não discriminação no trabalho, foram a Convenção nº 100 (1951) e a Recomendação nº 90 (1951), ambas sobre Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres, e a Convenção nº 111 (1958) e a Recomendação nº 111 (1958), ambas sobre Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação, que incentivaram, além de outras diretrizes, a produção de pesquisa científica sobre essa temática.

No entanto, a normativa referência para a questão da igualdade de gênero é a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher (CEDAW), das Nações Unidas (1979), que alça os determinantes isonômico e não discriminatório ao patamar de supranacionalidade, objetivando promovê-los nos cenários jurídicos e erradicar formas antagônicas de dignidade (Biltis Diniz PAIANO, 2015). Isso se dará através da adoção de uma conduta positivo-promocional da igualdade (e de ações afirmativas) e repressivo-punitiva da discriminação (PIOVESAN, 2006) - sendo necessária a combinação de ambas as orientações (PIOVESAN, 2005), pelas óticas retrospectiva (de modo a compensar um passado discriminatório e de marginalização) e prospectiva (a fim de garantir novos contornos sociais de liberdade e de igualdade) (PIOVESAN, 2008).

A Convenção (artigo 4º, parágrafo 1º) confirma, ainda, a possibilidade de adoção pelos Estados-partes de ações afirmativas especiais, temporárias e compensatórias, que permitam viabilizar, com uma maior celeridade, a igualdade factual entre homens e mulheres (PIOVESAN, 2006). Ademais, cria o Comitê para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres.

Outro dispositivo importante é a Declaração de Direitos Humanos de Viena (1993), que alça os direitos da mulher à categoria de direitos humanos, que são, por orientação dessa normativa, universais, indivisíveis e interdependentes (PIOVESAN, 2006). Ainda, consagra a igualdade em todas as esferas, sobretudo na social, e a erradicação da discriminação com base no gênero (artigo 18).

Já a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da (1998) vincula compulsoriamente os países-membros aos princípios informados neste documento, mesmo que não tenham eles ratificado todos os documentos produzidos pela organização - sendo um desses princípios a proposta de eliminação da discriminação em matéria de emprego.

No âmbito europeu, o Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE) confirma a igualdade remuneratória entre homens e mulheres (artigo 157º), assim como promove a igualdade de gênero o Tratado da União Europeia (TUE, artigos 2º e 3º, nº 3º), a Carta dos Direitos Fundamentais (artigo 23º), o Pacto Europeu para a Igualdade entre Homens e Mulheres (2006) e a Diretiva 2006/54/CE. A igualdade salarial e a não discriminação em razão do sexo do trabalhador são ainda confirmadas pela jurisprudência comunitária (LOPES, 2011; ORTIZ LALLANA, 1987).

Na América Latina, a Declaração Sociolaboral do Mercosul (1998) prescreve importantes princípios e direitos trabalhistas e, entre eles, promove a igualdade de direitos, de tratamento e de oportunidades (artigo 3º), e a não discriminação (artigo 1º), sobretudo em razão de sexo, vinculando os Estados-partes a adotar medidas afirmativas de eliminação de desigualdades e discriminação no trabalho, ingressando essa orientação na ordem constitucional brasileira, por força do artigo 5º, § 2º, da Constituição Federal de 1988 (URIARTE, 2006).

Em 2015, uma nova Declaração Sociolaboral do Mercosul foi proferida. Neste documento, a noção de igualdade de direitos, de tratamento e de oportunidades (artigo 4º) é reproduzida em consonância com a orientação anterior. Amplia, no entanto, a questão salarial como direito individual, em sintonia com a premissa da OIT de igualdade salarial. Também reafirma este diploma a possibilidade de adoção, pelos Estados, de ações afirmativas que viabilizem acelerar a promoção da igualdade e da não discriminação em seu âmbito interno.

Brasil e a (des)igualdade salarial entre homens e mulheres

Conforme exposto, a igualdade salarial entre homens e mulheres, enquanto direito, é demanda há muito reverberada no plano internacional, apesar de a realidade ainda atestar ser a diferenciação prática comum nas mais diversas atividades, do setor público e do privado. No Brasil, a construção de um regramento nesse sentido e sua efetiva aplicabilidade também constituem reivindicação histórica das mulheres, ao lado de outras referentes à condição democrática da vida civil, política e social. Em seu conjunto, a agenda feminista demandou enormes pressões por parte das mulheres, de modo a enfrentar os conflitos inerentes à exploração do trabalho pelo capital, bem como aqueles decorrentes do código moral patriarcal que atribui à figura feminina um papel socialmente restrito.

No que se refere à discussão ora empreendida, a primeira manifestação constitucional referente à igualdade salarial entre homens e mulheres veio com a Carta de 1934, para, em seguida, ser omitida tal referência na Constituição Outorgada de 1937. Em consequência, o Decreto-Lei n. 2.548, de 1940, autorizou redução salarial da ordem de 10% para as mulheres ante o salário dos homens. Posteriormente, os diplomas constitucionais de 1946 e de 1967 reintroduziram o preceito da isonomia salarial entre os gêneros.

A construção de um ordenamento normativo consolidado em torno da igualdade de gênero só se apresentou favorável na década de 1980, em face da redemocratização do país e das amplas articulações coletivas em prol da conquista de direitos sociais, com a participação fundamental do movimento feminista, cujo manifesto Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes, de 1986,10 representou o ponto nodal desse processo de lutas, concorrendo decisivamente para a formulação de amplas garantias constitucionais para as mulheres.

A Constituição Federal de 1988 consagra a igualdade formal entre homens e mulheres (artigo 5º, inciso I), sendo-lhes garantido o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, sem distinção de qualquer natureza. Também é confirmada a proibição ao preconceito e à discriminação em razão do sexo, entre outras categorias, como origem ou idade (artigo 3º, inciso IV), recebendo a mulher proteção especial no mercado de trabalho mediante incentivos11 (artigo 7º, inciso XX); sendo, por isso, proibida a diferenciação salarial por motivo de gênero (artigo 7º, inciso XXX). No entanto, apesar da carga principiológica e da força normativa e vinculante desses artigos, remanesce como não efetivada a igualdade salarial no plano factual para a mulher.

Em nível infraconstitucional, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) admite as ações afirmativas no sentido de se inserir a mulher no mercado de trabalho e de modo protegido, através das políticas de igualdade (373-A, parágrafo único, da CLT); assim como assenta a igualdade salarial para funções idênticas, proibindo distinções remuneratórias em face do gênero, da nacionalidade ou da idade do trabalhador (artigo 461 da CLT).

Promulgada durante o regime ditatorial civil-militar brasileiro, a Lei nº 5.473/1968 dispõe sobre a nulidade de normas ou provimentos que venham a discriminar, em razão do sexo, o provimento da seleção de cargos. Outra norma extravagante brasileira que aborda a questão de gênero no trabalho é a Lei nº 9.029/1995, que veda a adoção de categorias discriminatórias como critério seletivo (artigo 1º), incluindo no rol descritivo a seleção com base no gênero.

Em nível jurisprudencial, a isonomia salarial e a proibição de discriminação também estão pacificadas:

Direito Constitucional. Previdenciário e Processual Civil. Licença-gestante. Salário. Limitação. Ação Direta de Inconstitucionalidade do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998. Alegação de violação ao disposto nos artigos 3º, IV, 5º, I, 7º, XVIII, E 60, § 4º, IV, da Constituição Federal (…). Estará, então, propiciada a discriminação que a Constituição buscou combater, quando proibiu diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão, por motivo de sexo (art. 7º, inc. XXX, da C.F./88), proibição, que, em substância, é um desdobramento do princípio da igualdade de direitos, entre homens e mulheres, previsto no inciso I do art. 5º da Constituição Federal (…). Plenário. Decisão unânime (ADI 1946/DF (Tribunal Pleno) - Rel. Min. Sydney Sanches - DJ 16-05-2003 PP-00090).

No entanto, ainda se verifica no Brasil forte desigualdade salarial entre homens e mulheres.12 Inclusive, é questão pouco discutida judicialmente, sendo pequeno o número de ações trabalhistas que registram o gap salarial como matéria questionada. Entre as possíveis causas apontadas pela literatura, aparecem o predomínio de estereótipos enraizados culturalmente e de difícil confrontação legal, apesar da série de avanços jurídicos, políticos e sociais que se concretizaram.

Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apontam que permanece no país redução ou desvalorização da mulher no trabalho (GOSDAL, 2006), sobretudo da mulher negra, estigmatizada em desproporcional ocupação de cargos executivos por dupla discriminação: étnica e de gênero; com carga horária superior à do homem (em contraste com a contraprestação, que é inferior); no preenchimento majoritário dos empregos tidos como femininos, o que concorre para uma setorização do trabalho com base no sexo (HIRATA, 2004); e corresponde a uma maior taxa de desemprego, de emprego informal, não qualificado e mal remunerado - realidade essa constatada em outros espaços sociais, mas que é indicativa de que o peso cultural patriarcal prevalece mais em países periféricos.

Outras formas de enfrentamento da discriminação da mulher no trabalho

Questões de desigualdade e de discriminação da mulher no trabalho vêm sendo combatidas pelo direito ocidental contemporâneo. Essa análise comparativa entre as produções jurídicas internacionais, regionais e a brasileira dá conta de apontar quais normativas se apresentam como mais avançadas e efetivas em matéria de igualdade salarial, e quais dispositivos não conseguiram ou permanecem com dificuldade para efetivar as proteções e os objetivos propostos.

A persistência do gap salarial e de outras desigualdades de gênero no trabalho é indicativa, também, da complexidade dessa questão. Diante do descompasso entre as orientações jurídicas e a realidade social, confirma-se que “a legislação revela uma tendência em adiantar-se ao fenômeno social” (MONTEIRO DE BARROS, 1995, p. 143), o que pode implicar a não efetividade e a insuficiência da norma jurídica, apesar de seus expressivos contributos - constatação essa que não intenta depreciar, por evidente, a (re)construção do direito, mas alertar para a sua insuficiência caso não articulada com outras investidas.

Nesse aspecto, apenas o direito não poderá reverter todo um contexto de desigualdade social e econômica. Por ser um produto histórico e cultural, encontra-se em consonância com a sociabilidade de seu tempo; daí comportar a acumulação de formas múltiplas de diferenciação, configurando uma verdadeira multidiscriminação com base na perspectiva de que grupos vulnerabilizados e alvo de distinção negativa podem comportar ramificações de singularidades que atraem ainda mais estigma, como, por exemplo, dentro do grupo das mulheres, as imigrantes (Madalena DUARTE; Ana OLIVEIRA, 2012), as jovens (OIT, 2016) e as negras,13 criando subgrupos de exclusão social potencializada em um universo já excludente.

Essa verificação se dá apesar das importantes investidas positivo-promocionais da igualdade e repressivo-punitivas da discriminação (PIOVESAN, 2006), sobretudo no tocante aos direitos humanos. Faz-se necessário conjugar essas orientações jurídicas internacionais, regionais e internas com outras medidas, priorizando a esfera das políticas públicas de acolhimento e educativas (Maria Manuela Maia da SILVA, 2000) como dimensão preventiva de outras desigualdades.

Em simultâneo com as investidas normativas de desconstrução do modelo social e cultural que historicamente segregou a mulher, a promoção de políticas públicas de emprego integrado e protegido que fomentem a inclusão social e erradiquem a pobreza dos setores marginalizados e das minorias constitui outra medida imperiosa ao enfrentamento da desigualdade de gênero no trabalho (Laís ABRAMO, 2006).

Mais do que normativas rígidas e de uma atuação política incisiva, o esforço conjunto para superar a desigualdade sociolaboral da mulher “demanda um processo de transformações mais amplo, que envolve a valorização dos interesses desses grupos e a implementação de possibilidades efetivas de sua participação no poder” (GOSDAL, 2006, p. 312).

Entre as propostas de enfrentamento delineadas por Uriarte (2006), aliadas à produção normativa, recebem destaque a atuação sindical e, sobretudo, a intervenção na educação (URIARTE, 2006, p. 123) tanto em nível formal (na educação de base), quanto em nível profissional e no meio social.

É a partir da atribuição de papéis sociais e econômicos à mulher (pelo simples fato de ser mulher) que se enraíza e naturaliza14 a discriminação. Tal perspectiva leva a concluir que uma primeira medida factível para se enfrentar a desigualdade de gênero no trabalho seria a desconstrução cultural desses papéis atribuídos enquanto manifestação de dominação. Deve-se ter em vista que “enquanto a divisão do trabalho for assimétrica, a igualdade será uma utopia” (HIRATA, 2004, p. 20). A igualdade e o exercício da cidadania apenas serão alcançados quando uma reestruturação da dinâmica cultural e social for levada a cabo.

Seguindo essa linha, Noemia Aparecida Garcia Porto (2009, p. 8) assinala que uma via para se efetivar a igualdade no plano material seria a partir do questionamento acerca da construção social e cultural que obstrui e dificulta essa investida positivo-promocional da igualdade (PIOVESAN, 2006), de modo a desconstruir a histórica prática depreciativa da mulher em todos os cenários, inclusive, e sobretudo, no laboral, o que demanda a articulação de frentes diversas (URIARTE, 2006), panorama que permitiria avançar com o exercício da cidadania.

Esse espaço de discussão, de produção do conhecimento e de participação política concorre para novas formas de produção jurídica. O desmonte de modelos opressores repercute, também, na reconstrução do próprio sentido de direito e de justiça por uma ótica mais ética, democrática e humana.

Ademais, pressões sociais, políticas e jurídicas por um mercado de trabalho mais protegido implicam, também, a promoção da igualdade entre homens e mulheres, enquanto lutas vinculadas e complementares entre si. Apenas assim se logrará formar um terreno fértil ao exercício da cidadania pela mulher, na perspectiva do trabalho protegido, integrado e igual, enquanto direito fundamental social (ALEXY, 1993).

Gênero e trabalho: entre direito(s) e perspectiva(s)

A incorporação da mulher ao trabalho protegido, em patamar de igualdade e livre de diferenciações (sobretudo salariais), enquanto manifestação de cidadania (URIARTE, 2006) - que carrega em seu seio essa noção de participação, mas também de pertença -, apenas poderá ser plenamente exercida quando ela puder ser igual e equitativamente inserida nas esferas civil, social e política (MONTEIRO DE BARROS, 2008).

A persistência de tão amplas desigualdades no trabalho revela que a necessidade de “incorporar a perspectiva de gênero na doutrina jurídica impõe, sobretudo, o desafio de mudança de paradigmas” (PIOVESAN, 2006, p. 212). Isto porque paradigmas legitimadores da exclusão da mulher fincados historicamente mantiveram-na refém de papéis estigmatizantes, sendo-lhe vetada ou dificultada a participação política ativa na esfera pública (Ana AGUADO, 2005), como se afirma ao longo deste estudo.

Um primeiro passo para o seu enfrentamento, além de reconhecer tais questões, é procurar entender como permanecem operando os mecanismos sociais e culturais e os padrões comportamentais impositivos que conjugam noções sexistas de segregação legitimadas à época por um pensamento hegemônico misógino (AGUADO, 2005, p. 22) que impunha à mulher o dever de desempenhar o papel doméstico, produzindo práticas discriminatórias (enraizadas) em larga proporção.

Esse panorama sexista é ilustrado no jurídico pela necessidade da universalidade dos direitos que, na verdade, compreendia somente o universo masculino, vindo as mulheres apenas recentemente a ser foco da proteção e da promoção de direitos sociais, civis e políticos, de modo a se (re)construir o senso atual de cidadania (trans)nacional (ROCHA, 1997) e “horizontal” (LOUREIRO, 2014, p. 89), inclusiva e democrática.

Uma primeira tentativa de codificação formal dos direitos de cidadania da mulher foi o projeto da Declaração de Direitos da Mulher e da Cidadã (1791), de Olympe de Gouges, elaborado em conformidade com os ideais da Revolução Francesa e proposto logo após a proclamação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789; tratativa, no entanto, que não foi bem recebida, apesar do espírito de igualdade e de liberdade reverberado à época (MONTEIRO DE BARROS, 2008).

Essa proposta feminista demandava a igualdade de gênero e a inclusão da mulher no contexto político e social como direitos naturais, inalienáveis e sagrados.15 A autora desse documento foi guilhotinada em 1793, e a mulher não foi incluída nos textos da época como tendo direitos iguais aos do homem (AGUADO, 2005).

Ainda com relação a essa contradição protetiva-excludente, Aguado (2005) ressalta a afirmação da cartilha de direitos liberais que imprimia as primeiras noções de igualdade e de liberdade, mas que concomitantemente negava às mulheres o status de cidadania e a titulação de direitos políticos.

Nesse processo, novas formas de enfrentar a desigualdade salarial de gênero são delineadas, culminando com a consolidação dos direitos humanos da mulher e a proclamação da Declaração de Direitos Humanos de Viena (1993) (PIOVESAN, 2006). No entanto, tal formalidade, como as demais, carece das condições sociais que favoreçam sua implementação, e que são dadas objetivamente pela forma como a sociedade organiza sua (re)produção social, remanescendo o questionamento de porquais direitos a mulher ainda tem de lutar no mercado de trabalho.

Uma inquietação apresentada por Uriarte (2006) diz respeito à incerteza do fundamento ético de inclusão e incorporação da mulher ao trabalho (protegido): se ocorreria como forma de exercício da cidadania ou como mecanismo de fomento ao consumo, inserida a trabalhadora como parcela produtiva, para que possa a vir representar, também, um contingente de consumo.

Nesse sentido, argui-se, num primeiro questionamento, como alcançar a igualdade de gênero numa sociedade que é desigual, o que resulta numa desigualdade transversal. Diante desse panorama, quais perspectivas se apresentam, em forma de pressão ao Estado, enquanto âmbito de mediação entre as classes e as demandas gerais, para que este aja no sentido de garantir medidas que equalizem igualdade e cidadania na perspectiva de gênero?

Sobre tal ação política, Habermas (2002, p. 297) enfatiza a necessidade de atuação e luta por direitos pelo próprio grupo demandante, no caso, as mulheres que litigam pela igualdade de gênero (e também salarial) no trabalho, por entender o autor que esses direitos “não podem ser formulados de modo adequado sem que os próprios envolvidos articulem e fundamentem os aspectos considerados relevantes para o tratamento igual ou desigual em casos típicos”. Confirma assim a premissa de que os sujeitos interditados têm muito mais legitimidade para postular por seus direitos, o que não significa que esta luta não deva ser ampliada e incorpore outros atores ou segmentos políticos.

Portanto, apresenta-se como imperiosa a participação democrática e integrada da mulher na (re)construção do próprio sentido de direito, de modo a conferir-lhe o senso de identificação, de pertença ao contexto sociocultural, conformando novas orientações para uma outra noção de cidadania, mais inclusiva, pluralista e que abarque a diversidade (Isabel TURÉGANO, 2012).

Com relação às demandas ainda não alcançadas, “o direito não conseguiu superar as desigualdades de gênero, exatamente porque ele reflete a realidade social impregnada de estereótipos sexistas” (MONTEIRO DE BARROS, 2008, p. 83). Embora o direito, como produto histórico, seja um dos mecanismos mais importantes e efetivos para se abordar as questões e demandas sociais, há de se levar em conta o contexto cultural. Não será pelo simples fato de prescrever juridicamente uma conduta que esta será efetivada no plano fático.

É preciso que concepções e novas configurações sociais sejam incorporadas culturalmente; incidam sobre condutas e padrões comportamentais arraigados, para que produzam resultados socialmente relevantes no sentido de se avançar com demandas legítimas que confrontam um sistema de desigualdades.16

Desse modo, “la construcción de un nuevo concepto de ciudadanía sólo encuentra los necesarios instrumentos explicativos en una perspectiva histórica que incluya el género como variable” (AGUADO, 2005, p. 11). Entre as demandas desse processo, garantir a igualdade salarial entre homens e mulheres no trabalho significa avançar com a luta pela cidadania.

Considerações finais

Tomando como referência os avanços conquistados pelo movimento feminista que defende a equivalência dos gêneros e o enfrentamento de padrões opressores, como a discriminação de gênero e as desigualdades no trabalho, apreende-se que determinações estruturais dificultam a concretização objetiva da produção de novas percepções e práticas no âmbito da cultura, da economia e do jurídico.

No tempo presente, à mulher continuamente ainda é imposta uma série de diferenciações nos mais diversos âmbitos sociais, todas moldadas sob a ótica de uma cultura sexista e a demarcar um quadro estigmatizante que requer uma ativa ação política do universo feminino, a fim de enfrentar as mais variadas formas de assédio nas diversas esferas (familiar, social e laboral). Isso inclui a diferenciação salarial entre homens e mulheres e a destinação, para elas, das maiores fatias de trabalho informal, mal remunerado e não qualificado.

Ao abordar essa questão no âmbito das amplas diferenciações entre homens e mulheres, além da compreensão de que esta seja forjada por um padrão patriarcal e sexista dominante e renitente, também se considera ser ela transversal ao contexto de uma sociedade de classes, o que em si já implica um universo constituído de relações de poder e de subordinação.

A questão de gênero é parte importante dessas relações sociais e explicita a necessária confrontação a estruturas de poder que dificultam o exercício de cidadania das mulheres. Percebe-se que, apesar dos avanços das normativas, como a brasileira, ainda se evidencia um quadro problemático e estigmatizante, que exige o desenvolvimento de sensibilidades condizentes com o enfrentamento e a superação de hierarquias naturalizadoras - sobretudo ações mais efetivas por parte do Estado em todas as suas dimensões (política, social, jurídica), porquanto tal desigualdade se insurge em meio a outras tantas que o capitalismo produz.

A preocupação que orientou este estudo consistiu em colocar sob o exame da crítica a persistência do gender gap salarial, sobremodo as investidas de cunho político-jurídico - internacionais, regionais e nacional -, ressaltando a dificuldade de se efetivar a igualdade e a não discriminação no ambiente de trabalho - espaço social (re)produtor de agudas (des)igualdades. Tal questão foi correlacionada à cidadania, revelando seus impactos presentes e suas implicações futuras nas relações laborais e humanas, em si desafiadoras para as mulheres, que se apresentam ainda mais complexas ante a natureza destruidora da crise econômica e dos retrocessos político-sociais que repercutem mais dramaticamente na vida das mulheres e na sua capacidade de reprodução social.

Nesse sentido, a necessidade de se criar possibilidades para angariar consensos e congregar forças de modo a promover igualdade, integridade e trabalho protegido permanece como demanda fundamental para a construção de uma sociedade democrática.

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  • 1
    Em dispositivos como a Carta Magna (1215), a Declaração de Direitos da Virgínia (1776), o Bill of Rights americano (1789), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e a Constituição Francesa (1793).
  • 2
    A dignidade enquanto premissa fundamental e edificante das cartilhas constitucionais ocidentais é incorporada “como critério valorativo limitativo dos direitos” (João Carlos LOUREIRO, 2003, p. 472) no nível de substancialidade do juridicamente garantido e protegido e acerca da sua (in)disponibilidade por parte de seu detentor: o ser humano.
  • 3
    As políticas públicas são ações afirmativas que instrumentalizam a discriminação legal positiva, pois visam a contornar reais desigualdades de grupos vulnerabilizados (GOMES, 2001).
  • 4
    Uma das justificativas iniciais para a razão de a mulher receber contraprestação inferior à do homem baseia-se na noção de se tratar o seu ordenado de um complemento ao rendimento mensal familiar, tendo em vista ter sido o homem histórica e culturalmente designado para assumir o papel de provedor (HIRATA; Danièle KERGOAT, 2007).
  • 5
    A mulher é a vítima em potencial e predominante do assédio moral e do sexual no trabalho (GOSDAL, 2006).
  • 6
    No contexto brasileiro faz-se necessária a ação afirmativa estatal de estabelecer em legislação (Lei nº 9.504/1997) o sistema de cotas na política, impondo a necessidade de se garantir a participação com base no gênero.
  • 7
    Outra constatação de desigualdade jurídica, no contexto brasileiro, é a percepção de que até pouco tempo atrás havia gritante diferença entre a punição para o crime de estupro e para o de roubo. Essa alteração veio em 2009 (Lei nº 12.015); até então o crime de estupro era punido com pena-base de reclusão de 3 a 8 anos, agora majorada para 6 a 10 anos; ao passo que o crime de roubo é punido com pena-base de 4 a 10 anos mais multa desde 1940.
  • 8
    Ainda enquanto desigualdade de gênero no trabalho, informa Diemut Elisabet BUBECK (1995, p. 24) ser também desproporcional o número de homens a exercer atividade não remunerada em comparação com o percentual de mulheres a exercer a dupla jornada (doméstica e familiar).
  • 9
    Em 2016, o tema comemorativo do Dia Internacional da Mulher proposto pela OIT foi Chegando à Igualdade em 2030: o futuro é agora, em harmonia com o projeto de desenvolvimento sustentável da ONU projetado para 2030, que prevê a erradicação da pobreza e a promoção da igualdade de gênero e do emprego pleno e digno, a conferir.
  • 10
    Para a construção desse documento histórico teve papel destacado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher que patrocinou, em 1985, o movimento Mulher e Constituinte, fomentando o debate e a produção de uma pauta política que resultou na referida Carta, entregue no ano seguinte ao Congresso Nacional (MONTEIRO DE BARROS, 1995).
  • 11
    Com relação às ações afirmativas autorizadas pela Constituição Federal de 1988, a Lei nº 9.799/1999 regulamenta a norma constitucional e dá nova redação ao artigo 373-A da CLT, dispondo que será proibida a seleção, anúncio de emprego ou inscrição e aprovação em concurso em razão do sexo, assim como proíbe recusar emprego, exigir atestado de gravidez, proceder à revista íntima ou à aferição da remuneração com base no gênero.
  • 12
    O Brasil está na 85ª posição de igualdade de gênero (retroagiu 14 colocações em comparação com a relação de 2014) e no 133º lugar no ranking mundial de igualdade salarial (WORLD ECONOMIC FORUM, 2015).
  • 13
    Com relação às brasileiras negras, essas importam em aproximadamente 23% das atividades domésticas no país, indicador que ressalta o alto índice de precariedade do trabalho da mulher, sobretudo de subgrupos sociais ainda mais vulneráveis, como o mencionado (ABRAMO, 2006).
  • 14
    Legitima-se a divisão do trabalho com base no gênero pela concepção naturalista (HIRATA; KERGOAT, 2007, p. 599), como se essa imposição não fosse produto da construção social e cultural.
  • 15
    Mais de um século após esse fato histórico ainda se travava uma dura batalha, como visto no filme As sufragistas (2015), que retrata a luta feminista pelo direito ao voto - no Brasil apenas consagrado com a Constituição de 1932 -, “etapa determinada en el desarrollo tanto de los derechos de ciudadanía como de la evolución de los feminismos como movimientos sociales” (AGUADO, 2005, p. 24); na sequência, outra importante conquista feminista foi o direito à educação.
  • 16
    Nesse sentido, vale destacar a incorporação de relevantes orientações legais ao ordenamento jurídico nacional, a exemplo da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), da Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) e das disposições por igualdade salarial no trabalho (artigo 373-A, parágrafo único e artigo 461 da CLT).
  • Camila Rodrigues Neves de Almeida Lima (advcamilarodrigues@hotmail.com) é advogada, doutoranda em Direito Público e mestre em Direito Laboral pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC). Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Escola da Magistratura Trabalhista da Paraíba (ESMAT 13) e em Processo Civil pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ). Membro convidado de corpo editorial da Revista Videre da Faculdade de Direito e Relações Internacionais da UFGD. Membro do corpo de avaliadores da Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. Autora do livro Escravos da Moda: análise da intervenção jurídica em face da exploração do trabalho em oficinas-moradia de costura paulistanas.
  • Errata:
    Neste artigo, na primeira página, no nome da autora:
    Onde se lia:
    Camila Rodrigues Neves de Almeida
    Leia-se:
    Camila Rodrigues Neves de Almeida Lima

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Out 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2016
  • Revisado
    21 Mar 2018
  • Aceito
    12 Abr 2018
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