RESUMO
O propósito deste artigo é apresentar algumas reflexões sobre conceitos e campos de atuação da gestão da educação e da implementação de políticas que permitam delimitar o campo da gestão educacional e escolar e oferecer possibilidades para que se possa estabelecer parâmetros e indicadores para monitorar e avaliar a educação infantil. A argumentação caminhará no sentido de delimitar alguns conceitos, distinguir campos de atuação na gestão educacional, problematizar concepções e decisões tomadas no âmbito das políticas para a educação infantil e apresentar o monitoramento e a avaliação como ferramentas importantes para subsidiar a gestão educacional e a gestão das instituições de educação infantil com dados que sejam relevantes para o aprimoramento da qualidade da oferta educativa em creches e pré-escolas, partindo do pressuposto de que não há política municipal de educação infantil que atenda às crianças de forma qualificada, sem que a gestão educacional e a gestão da instituição educativa sejam imbuídas de mecanismos de acompanhamento das ações de avaliação do processo e dos resultados obtidos. Nessa perspectiva, um dos grandes desafios a ser enfrentado é a tradução das políticas formuladas em práticas e ações e o desenvolvimento de processos de acompanhamento e avaliação que garantam o acesso e a oferta de uma educação infantil qualificada.
Palavras-chave: Educação Infantil; Políticas Educacionais; Gestão Educacional; Avaliação Educacional; Monitoramento da Educação
ABSTRACT
The purpose of this article is to present some reflections on concepts and fields of action of education management and the implementation of policies that allow delimiting the field of educational and school management and offer possibilities for establishing parameters and indicators to monitor and evaluate early childhood education. The argumentation will go towards delimiting some concepts, distinguishing fields of action in educational management, problematizing conceptions and decisions taken within the scope of policies for early childhood education and presenting monitoring and evaluation as important tools to subsidize the educational management and management of early childhood education institutions with data that are relevant to the improvement of the quality of educational provision in kindergartens and preschools, assuming that there is no municipal policy of early childhood education that meets children in a qualified way, without educational management and the management of the educational institution being imbued with mechanisms to monitor the actions of evaluation of the process and the results obtained. From this perspective, one of the major challenges to be faced is the translation of the policies formulated into practices and actions and the development of monitoring and evaluation processes that guarantee access to and the provision of qualified early childhood education.
Keywords: Early Childhood Education; Educational Policies; Educational Management; Educational Assessment; Education Monitoring
Introdução
As políticas municipais de educação infantil têm enfrentado desafios não somente na garantia do direito constitucional a crianças e trabalhadores, mas também na oferta de uma educação de qualidade. Embora exista um arcabouço importante de estudos que apontam as fragilidades das políticas públicas municipais de educação infantil de oferta de vagas e de garantia da qualidade (Rossetti-Ferreira; Ramon; Silva, 2002; Correa, 2003; Campos et al., 2012; Kramer; Toledo; Barros, 2014), um dos aspectos ainda pouco discutidos é a esfera das práticas e ações, mais especificamente a gestão da educação e os mecanismos de monitoramento e avaliação, que são ferramentas com grande potencial de oferta de informações relevantes para a implementação de políticas e para o gerenciamento dos processos e resultados obtidos.
Assim sendo, o propósito deste texto é apresentar algumas reflexões sobre conceitos e campos de atuação da gestão e da implementação de políticas, que permitem delimitar o campo da gestão educacional e escolar e oferecer possibilidades para que se possa estabelecer parâmetros e indicadores para monitorar e avaliar a educação infantil. O desenvolvimento da argumentação caminhará no sentido de delimitar alguns conceitos, distinguir campos de atuação na gestão educacional, problematizar concepções e decisões tomadas no âmbito das políticas para a educação infantil e apresentar o monitoramento e a avaliação como ferramentas importantes para subsidiar a gestão educacional e a gestão das instituições de educação infantil com dados que sejam relevantes para o aprimoramento da qualidade da oferta educativa em creches e pré-escolas.
Não se pretende adentrar nas distinções entre gestão e administração, pois isso ainda é um terreno movediço, e, sobre o assunto, já se desenvolveu um estudo bibliográfico (Fernandes; Campos, 2015). Para essa reflexão, é importante relembrar que, no Brasil, o termo gestão1 surgiu como uma proposta para se contrapor à administração centralizadora e autoritária e foi adotado como sinônimo de prática que favorece as relações participativas e democráticas no interior da escola e entre secretarias, órgãos intermediários e unidades escolares.
Nesse sentido, no Brasil, a gestão é entendida como práticas de organização alinhadas a uma perspectiva democrática e participativa. No âmbito acadêmico, tratou-se prioritariamente dos princípios democráticos, éticos e pedagógicos que deveriam sustentar as práticas de gestão nas unidades escolares, deixando em segundo plano questões de ordem mais procedimental ou operacional que permitem à gestão educacional e escolar organizar os processos burocráticos existentes nos sistemas de ensino e nas escolas.
No entanto, é preciso considerar que a gestão da educação não se limita à gestão pedagógica, pois envolve gestão financeira, recursos humanos, de materiais, patrimonial, de merenda escolar, entre outros aspectos pouco valorizados e discutidos nos estudos sobre a temática. Enfim, a gestão envolve uma dimensão política, mas também uma dimensão técnica pouco explorada no campo da gestão educacional, e não seria exagero admitir, tal como afirmou Sofia Lerche Vieira, que os “[...] teóricos do presente têm se contentado com a crítica (ideológica) às políticas vigentes ou ao estudo da gestão democrática em suas dimensões” (Vieira, 2007, p. 55).
Além disso, nos estudos do campo da gestão da educação, são analisadas as decisões e os resultados da implementação das políticas públicas educacionais por meio da coleta de informações com técnicos e gestores educacionais e escolares, mas pouca atenção se dá aos processos de gestão, ao gerenciamento dos recursos e às relações e pactos estabelecidos entre os agentes que atuam no âmbito da gestão de políticas e programas e a comunidade que tem acesso aos serviços oferecidos pelas redes públicas de educação. Destaca-se também que há estudos que analisam as ações de agentes externos na gestão e na política educacional, em uma abordagem que ilumina a complexa rede de relações entre esses atores privados e os agentes estatais.
Embora se reconheça a importância das discussões na esfera da gestão democrática, que esteve muito presente na produção acadêmica brasileira, nos decênios de 1980 e 1990 e início do de 2000, ainda há uma seara a ser explorada, a dimensão mais instrumental, que permite compreender os mecanismos de funcionamento dos processos de gestão e seus efeitos e reconhecer o conjunto de ações e interações sociais que acontecem nas secretarias, nas instâncias intermediárias, nas instituições educacionais e entre elas e com agentes sociais externos.
Para as secretarias, órgãos intermediários de gestão e unidades educativas, a dimensão técnica instrumentaliza a gestão, oferecendo suporte para a organização e o funcionamento da educação. Aliás, a expressão “organização e funcionamento da educação” também caiu em desuso, junto com a administração escolar, sendo substituída por “política e gestão da educação”. Em absoluto, esses termos expressam o mesmo sentido, e a mudança, intencional e política, veio para demarcar um espaço em defesa da democracia, mas também a mudança de foco de processos técnicos da educação, de natureza mais procedimental, para questões de natureza política e social, relacionadas à ampliação dos espaços decisórios nos estabelecimentos escolares, mediante a defesa da autonomia e da participação da comunidade escolar na construção do projeto pedagógico da instituição. Nesse nível, muitos avanços foram obtidos na produção acadêmica brasileira e em documentos normativos e diretrizes de governo (Ferreira; Aguiar, 2001; Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2000; 2002; Bittar; Oliveira, 2004; Bastos, 1999; Lima, 2004; Ferreira, 2003), mas também muita discussão se limitou à dimensão ideológica dessas relações e à natureza neoliberal das políticas de Estado para a educação.
Nesse sentido, um dos desafios é debruçar-se sobre as dimensões técnicas e operacionais da gestão, especialmente da educação infantil, de modo a refletir sobre como os instrumentos que subsidiam a gestão, particularmente o monitoramento e a avaliação, podem oferecer dados relevantes e pertinentes para que a educação seja ofertada de forma qualificada. Isso não significa que técnica e política estejam desvinculadas, pois as decisões sobre os caminhos e procedimentos a serem adotados envolvem a confluência de interesses, a disputa de projetos, de concepções de educação, de qualidade e de intenções e a busca de consensos e articulações entre os diversos agentes envolvidos na execução de políticas e programas e o público-alvo dessas ações.
Uma das grandes necessidades das políticas municipais para a educação infantil é colocá-las em ação, pois a educação infantil não se constrói apenas com a consolidação de princípios normativos e de qualidade e com a definição de diretrizes para orientar as secretarias e as instituições de educação infantil, mas com a regulamentação desses princípios e diretrizes e a proposição de planos de ação para a sua materialização. Da mesma forma, é necessária a definição de mecanismos de acompanhamento dos processos e resultados, ou seja, a adoção de procedimentos de gestão que viabilizem a implementação das políticas, o monitoramento das ações e a avaliação do processo e dos resultados obtidos.
Gestão: aspectos conceituais
A gestão é a responsável pela condução de processos que darão materialidade ou concretude a políticas e programas. É na gestão que decisões são tomadas sobre as formas de sua implementação, tendo como horizonte atingir os efeitos desejados e definidos pelas intenções da política ou do programa. Essa é uma perspectiva clássica da política pública, que organiza os diferentes momentos ou etapas de uma política em um ciclo e que fornece um esquema conceitual ainda interessante para o desenvolvimento de investigações, monitoramento e avaliação de políticas2.
De acordo com Vieira (2007), a gestão pública possui três dimensões: valor público, condições de implementação e condições políticas. A intencionalidade das políticas é revelada pelo seu valor público. Nesse sentido:
Quando a Constituição afirma a educação como um “direito de todos e dever do Estado e da família” (Art. 205), está professando um valor público que, para ganhar materialidade, precisa se traduzir em políticas. Estas, uma vez concebidas, são operacionalizadas através de ações que concretizam a gestão (Vieira, 2007, p. 58).
Grande parte da produção sobre gestão da educação tratou do valor público, o que permite compreender o porquê tanto se produziu sobre as perspectivas conceituais em torno da gestão democrática e participativa. Uma das explicações para a resistência à dimensão técnica pode ser devido ao fato de, na década de 1990, configurar-se um novo padrão de gestão pública (Abrucio, 2006; Cabral Neto, 2009; Costa, 2010), orientado por princípios gerencialistas e preocupado com a racionalização e a produtividade do sistema. Dentre algumas propostas da configuração da gestão educacional, estavam a produtividade, a eficiência e o desempenho como princípios que guiariam a organização do trabalho educativo e o controle dos resultados de aprendizagem. E foi nessa perspectiva que a avaliação e o monitoramento foram introduzidos como ferramentas de controle e de responsabilização das escolas pelos seus resultados.
No entanto, da mesma forma que se resistiu à concepção gerencialista de gestão, pela defesa da democracia e da participação nos processos de gestão escolar, é importante que avaliação e monitoramento sejam ressignificados, dado seu potencial para garantir a qualidade da oferta educativa.
Ainda que não se descarte a importância das abordagens conceituais que valorizaram a dimensão política da gestão educacional e escolar, não se pode negligenciar o aspecto técnico. Essa negligência, durante as décadas de 1990 e 2000, culminou em um desprezo pelas técnicas e na quase rejeição da formação técnica do gestor (Oliveira, 2008; Fernandes; Campos, 2015).
Abordar a implementação e as condições políticas de concretização dos processos de gestão é adentrar em um território da prática, e são elas que:
[...] asseguram a sustentabilidade dos valores e a sua tradução em políticas. Nenhuma gestão será bem-sucedida se passar ao largo dessas duas dimensões. Por melhores e mais nobres que sejam as intenções de qualquer gestor ou gestora, suas ideias precisam ser viáveis (condições de implementação) e aceitáveis (condições políticas) (Vieira, 2007, p. 59).
A viabilidade, tal como definida por Vieira (2007), como condição de implementação é avaliada a partir da prática do planejamento e da construção de planos de ação que orientam o processo de implementação. Viabilidade, portanto, possui uma dimensão política e uma dimensão técnica que caminham juntas, de forma estratégica, pois não há condições de implementação sem que se avalie as condições políticas para que os objetivos propostos possam ser efetivados. Traduzir intenções é ser capaz de ler o contexto e de se cercar de um arcabouço de técnicas de estudo da viabilidade e dos possíveis caminhos para se atingir um determinado objetivo. Assim sendo, a gestão da educação possui uma dimensão técnico-administrativa referente ao controle e gerenciamento de recursos humanos, financeiros e materiais, mas também uma dimensão político-relacional (Bichir, 2020), que diz respeito às interações entre órgão, setores de governo, servidores públicos, comunidade escolar e agentes privados que interferem na condução das políticas educacionais.
É importante que nos debrucemos sobre essas questões relacionadas à viabilidade e as condições políticas, para que possamos compreender a dinâmica de relações nas instâncias de gestão, a interferência política no delineamento da educação infantil e as formas de atuação dos gestores nos processos de implementação das políticas e programas de educação.
Gestão educacional e gestão escolar
Podemos afirmar que a gestão na educação tem dois principais níveis de atuação: um é o nível macro, no âmbito do sistema educacional, e outro, o nível micro, no âmbito do estabelecimento escolar. O primeiro, refere-se à gestão educacional, e o segundo, à gestão escolar. As atribuições destinadas a cada um dos níveis são definidas em lei (Brasil, 1996), sendo que a gestão educacional está mais próxima do centro das decisões sobre a política pública educacional, e a gestão escolar, de incumbências dos estabelecimentos para garantir a oferta educativa. O principal objeto a ser executado pela gestão escolar é a proposta pedagógica da escola, mas há outras atribuições também importantes, ainda que pouco se discuta sobre elas no âmbito acadêmico e na formação dos profissionais da educação, relacionadas à gestão de recursos humanos, materiais e financeiros. Isso não significa que a política não esteja na esfera escolar: gestores, professores e demais membros da comunidade escolar interferem na agenda política e nos resultados obtidos no processo educativo, convivendo em um espaço de negociação permanente entre eles e com as instâncias superiores da política e da gestão educacional.
Em que pese a importância da gestão escolar, o campo acadêmico debruçou-se sobre a gestão no nível macro, e, não raro, a área da gestão convergiu e se mesclou com a área da política educacional. Como desdobramento, há dificuldade de se definir o que realmente é objeto da gestão: “[...] dada a permeabilidade do campo e a sua origem poliepistêmica, muitos objetos acabam vindo compor os focos de investigação na gestão educacional” (Souza, 2008, p. 59).
Essa tendência tem efeitos, como, por exemplo, a falta de uma reflexão mais aprofundada sobre a gestão das instituições de educação, sobre a formação inicial e continuada dos gestores e a articulação entre a produção de conhecimento na área e as práticas das pessoas que atuam na gestão educacional (Fernandes; Campos, 2015, p. 150).
Entende-se que a ênfase nos princípios e nas questões políticas que permeiam a gestão das políticas e das instituições seja um dos aspectos que reforça a permeabilidade do campo e desestimula o desenvolvimento, necessário, de investigações sobre os processos e procedimentos de gestão educacional e escolar.
Gestão da educação infantil
Grande parte dos estudos desenvolvidos sobre gestão educacional e escolar tem como horizonte as escolas de ensino fundamental, e isso se deve também ao processo de descentralização e municipalização dessa etapa de ensino, na década de 1990 (Oliveira, 1997; 2001; 2008; Bordignon; Gracindo, 2000; Bruno, 2008; França; Bezerra, 2009; Krawczyk, 2008, Lück, 2000; 2010; Maia, 2008; Medeiros; Luce, 2006). A política indutora promovida pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) estimulou um processo de reorganização da educação brasileira para atender o princípio de divisão de responsabilidades entre os entes federativos, explicitado na Lei de Diretrizes e Bases. Esse é, provavelmente, um dos motivos pelo qual a educação infantil ainda carece de estudos específicos sobre a gestão da educação infantil e sobre a gestão das instituições de educação infantil, e, por conta disso, a área tem recorrido a estudos relacionados aos outros níveis de ensino.
No entanto, questiona-se se a produção acadêmica sobre gestão escolar dá suporte para se refletir sobre uma etapa da educação básica com características tão peculiares em relação às demais. Considerando as condições de funcionamento de creches e pré-escolas, a variedade de formatos institucionais existentes, a precariedade de algumas formas de atendimento e as relações clientelistas na designação de cargos de gestão, serão os princípios de gestão escolar suficientes para se pensar a gestão da educação infantil? As produções acadêmicas existentes dão suporte para o estabelecimento de relações democráticas no interior das unidades para a construção de um projeto pedagógico participativo e apropriado para as diferentes faixas etárias e para oferta de um atendimento educativo e de cuidados que se sustente em valores de igualdade e de equidade? O que se conhece da gestão da educação básica inspira um projeto pedagógico que estimule a autonomia e o protagonismo das crianças?
Os estudos teóricos sobre gestão e administração da educação não tratam da educação infantil.
Não é difícil encontrar motivos que podem ajudar a explicar essas características da bibliografia disponível no país: a Educação Infantil, especialmente a creche, é uma recém-chegada ao sistema educacional. Sendo um campo relativamente novo, conta com menor atenção por parte da gestão das redes escolares e até mesmo com certo estranhamento e resistência no âmbito das esferas técnicas responsáveis por sistemas educacionais mais complexos. Além disso, como recém-chegada, acaba por ser aquela etapa que precisa ajustar-se a modelos de gestão desenhados para outros níveis educacionais, modelos esses que já contam com uma história e com uma legitimidade que reforçam sua imposição às instituições de educação da criança pequena. Assim, é a creche e a pré-escola que precisam se adaptar às estruturas e aos mecanismos já consagrados de organização e gestão dos sistemas, e não o inverso. Peter Moss (2011) utiliza uma expressão interessante para se referir a esse tipo de processo: a “colonização” da Educação Infantil pelas etapas posteriores de educação (Fernandes; Campos, 2015, p. 152).
Outro aspecto importante é um desajuste que ocorre quando abordagens mais críticas sobre as reformas educacionais da década de 1990 são utilizadas para se analisar a educação infantil. Os contornos neoliberais impressos na gestão da educação básica, por exemplo, precisam ser contextualizados para se pensar a educação infantil, porque algumas formas de organização e gestão da educação infantil anunciadas como gerencialistas e neoliberais
[...] já são velhas conhecidas no campo da educação da criança pequena: terceirização de serviços e estabelecimento de convênios; captação de recursos deixada a cargo da própria comunidade atendida; interseções entre o público e o privado no desenho dos programas ofertados; utilização de “vouchers” para livre escolha das famílias (por exemplo, o vale creche); apelo à contribuição das empresas para prover atendimento a essa faixa etária; uso de trabalho voluntário; emprego de professores leigos; focalização de políticas, entre outras características (Fernandes; Campos, 2015, p. 151).
Chama-se a atenção para isso, porque o campo educacional na década de 1990 e nos primeiros 15 a 16 anos do século XXI trataram essas estratégias chamadas “neoliberais”, “gerencialistas” e “privatistas” como algo recente na história da educação. Se a educação infantil fosse observada com mais cuidado, compreender-se-ia que essas soluções não são exclusivas de uma orientação econômica neoliberal, mas se trata de uma prática capitalista excludente que mostra com clareza, na história da educação e da educação infantil, que ao pobre sempre se destinou soluções mais baratas, sob o argumento de que são as “[...] únicas alternativas para se atender a demandas urgentes da população caracterizada como carente ou em situação de risco, por parte de um Estado que dizia não dispor de recursos públicos suficientes para tanto” (Fernandes; Campos, 2015, p. 151). Essa falta de interlocução entre a produção sobre a política e a gestão da educação básica e a educação infantil é mais um argumento para entender que a gestão da educação infantil não pode ser pensada tendo como fundamento apenas a produção já existente sobre a gestão educacional.
Recentemente, investigações mais robustas sobre a gestão da educação infantil foram desenvolvidas e podem contribuir com a proposição de procedimentos e indicadores para implementar e monitorar políticas e programas para a referida etapa.
As investigações envolvendo a gestão da educação infantil abordam questões que afetam a qualidade da oferta educativa, buscando confrontar decisões e ações dos municípios com as responsabilidades constitucionais que eles possuem em relação à educação. São estudos que descortinam diferentes formas de organização da educação infantil e trazem contribuições para a pesquisa na área da gestão, uma vez que apresentam dados e indicadores relevantes para a compreensão da qualidade do atendimento, bem como para a avaliação e monitoramento da oferta (Kramer, 2001; Kramer; Nunes, 2007; Kramer; Toledo; Barros, 2014; Ferreira; Côco, 2012; Côco, 2009b; Campos, 2012; Corrêa, 2018). Há também os estudos que abriram a investigação sobre os princípios da gestão democrática na educação infantil, discutindo as questões conceituais que envolvem a participação no processo de gestão das instituições educativas (Côco, 2009a).
Gestão de políticas públicas e pesquisas em gestão da educação infantil
As pesquisas em gestão da educação infantil têm apontado dificuldades dos entes federativos em definir uma política pública de educação infantil que cumpra os preceitos legais de atendimento das crianças de 0 a 3 anos e de 4 e 5 anos dentro de parâmetros de qualidade que respeitem suas necessidades sociais, afetivas, cognitivas e biológicas. A grande contribuição desses trabalhos é trazer um conjunto de aspectos relacionados à qualidade que permitam construir um sistema de indicadores para avaliar e acompanhar a qualidade da oferta de educação infantil.
Kramer (2001) e Kramer e Nunes (2007) apontam aspectos da gestão educacional que afetam as creches e pré-escolas, indicando a necessidade de planejamento da oferta para a garantia do atendimento das demandas e direitos educacionais, de elaboração de documentos orientadores para a garantia da oferta qualificada da Educação Infantil, de investimento na formação continuada dos docentes e nos planos de carreira, da fixação de diretrizes que orientem a organização do trabalho administrativo e pedagógico nas instituições que permitam a integração das unidades com as Secretarias de Educação e a participação dos profissionais nas decisões sobre as políticas e mesmo na organização das unidades.
Sobre a gestão da unidade educativa, Valdete Côco (2009a) indica que a gestão das instituições de educação infantil, no Espírito Santo, reflete padrões de gestão do ensino fundamental, como, por exemplo, a constituição do cargo de diretor, as formas de investidura no cargo e a presença dos conselhos escolares. Ao mesmo tempo, a integração das instituições de educação infantil aos sistemas de ensino abriu um espaço para que elas manifestassem suas especificidades no rol de processos, procedimentos e ferramentas de gestão oriundos das demais etapas de ensino (Côco, 2009a). É possível que esse mesmo fenômeno tenha sido uma tendência nos demais estados, e as instituições de educação infantil se apropriaram dos conceitos e valores da gestão democrática, presentes no ensino fundamental, e desde então têm vivenciado os desafios para a efetivação desse estilo de gestão, como, por exemplo, estimular e garantir a participação da comunidade escolar nas decisões, implantar unidade executora, organizar e aprimorar a atuação dos órgãos colegiados e instalar a eleição de diretores.
Há também documentos importantes que são referência na conceituação de dimensões de qualidade e de indicadores que subsidiem a gestão da educação infantil.
Em 2009, foi elaborado, no âmbito do Ministério da Educação, o documento Indicadores da qualidade na educação infantil, que
[...] articula a questão da qualidade com uma proposição avaliativa, mais especificamente para que cada instituição possa empenhar-se em um processo de autoavaliação. Além deste princípio, o documento implica a adesão deliberada pela equipe e comunidade educativa ampliada (direção, técnicos, professores, auxiliares, famílias e outras pessoas da comunidade interessadas) de cada unidade. O processo a ser empreendido requer a participação democrática, disposição para mudanças da cultura institucional, para a reflexão e exercício de autocrítica em relação às práticas educativas efetivadas no cotidiano institucional (Coutinho; Moro, 2017, p. 351).
Em 2012, foi instituído, pela Portaria nº 1.147/2011, do Ministério da Educação (Brasil, 2012), um grupo de Trabalho para pensar uma política de avaliação da educação infantil integrada com a Política Nacional de Educação Básica. Como resultado, foi produzido o documento intitulado Subsídios para a avaliação da educação infantil, que traz referências importantes sobre quais aspectos poderiam ser avaliados na educação infantil e que dimensões orientariam a construção de instrumentos de avaliação e a produção de indicadores de qualidade da educação infantil. Esse documento é fruto de um esforço de síntese de produções na área da avaliação, com foco nas especificidades da educação infantil, e oferece um referencial importante para subsidiar a gestão pública educacional no acompanhamento da implementação de suas políticas educacionais, de modo a oferecer um atendimento condizente com os parâmetros nacionais e locais de qualidade.
O Plano Nacional de Educação (PNE) em vigência, aprovado pela Lei nº 13.005 de junho de 2014 (Brasil, 2014), estabelece que a educação infantil seja avaliada, a cada dois anos pelos municípios brasileiros, com base em parâmetros nacionais de qualidade, e são mencionadas as seguintes dimensões para a construção dos instrumentos: a infraestrutura física, o quadro de pessoal, as condições de gestão, os recursos pedagógicos, a situação de acessibilidade, entre outros indicadores relevantes.
Em 2015, é proposta uma minuta de portaria para a criação da Avaliação Nacional da Educação Infantil (ANEI), que tem como foco o monitoramento da oferta dessa etapa.
A ANEI em consonância com o estabelecido no atual PNE foi incluída no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SINAEB), a fim de avaliar e aprimorar as políticas públicas de educação. [...] Contudo, a crise política e institucional que se abateu sobre o país, também incorreu na dissolução do SINAEB, ainda durante o impedimento não definitivo da presidente eleita Dilma Roussef. Entre as possíveis consequências desta última decisão está a fragilização do PNE vigente e das metas ali colocadas para enfrentamento das condições atuais na área (Coutinho; Moro, 2017, p. 352).
As produções que se seguiram traçaram possibilidades para se pensar a avaliação externa da educação infantil no Brasil. O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Infância e Educação Infantil (NEPIE), da Universidade Federal do Paraná, em parceria com outras universidades (Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade do Estado de Santa Catarina e Università degli Studi di Pavia) e Coordenação Geral de Educação Infantil (COEDI), do Ministério da Educação), teve um papel importante no aprofundamento da temática da avaliação da educação infantil. O projeto, intitulado Formação da rede em educação infantil: avaliação de contexto, desenvolvido no âmbito dessa parceria, tal como afirmado por Coutinho e Moro (2017, p. 353), teve por objetivo “[...] discutir e contribuir para a formulação de uma política nacional de avaliação em Educação Infantil (Brasil, 2015) em consonância com os princípios democráticos e participativos focalizando uma abordagem metodológica formativa e em contexto (Bondioli; Savio, 2013)”.
A abordagem de avaliação do estudo tomou como objeto de estudo o contexto educativo, e, portanto, as condições materiais, humanas e simbólicas (Bondioli; Savio, 2015) presentes nas instituições de educação infantil, mas que também são oferecidas pelo poder público aos seus sistemas de educação. A implicação dessa abordagem é o desenvolvimento de instrumentos de avaliação que contem com a ampla participação das instituições de educação infantil e que desempenhem o papel de reflexão sobre os processos educacionais de modo a se atingir um determinado parâmetro de qualidade que atenda aos direitos e necessidades das crianças, por meio do aprimoramento das políticas públicas para a educação infantil e do atendimento das demandas das instituições educativas (Brasil, 2015).
Essa abordagem reforça a perspectiva defendida pela área da educação infantil no Brasil de que a avaliação externa seja organizada por meio da avaliação das condições de oferta da etapa, e não pela avaliação das crianças. E, sobre essa questão, cabe algumas observações, pois entende-se que a avaliação das crianças como referência de qualidade da educação infantil pode ser um equívoco metodológico e político.
Do ponto de vista metodológico, considerando que a educação infantil é a soma de diferentes práticas que envolvem o cuidado e a educação, e que o desenvolvimento infantil é pleno quando as condições do ambiente são favoráveis, os resultados que uma avaliação dessas proporciona são restritos, e pouco oferecem para o aprimoramento da política de educação infantil. Crianças aprendem na interação com seus pares e em ambientes que estimulem e, ao mesmo tempo, ofereçam segurança e bem-estar, e o desenvolvimento infantil agrega diferentes aspectos, afetivos, cognitivos, físicos, sociais, sendo a brincadeira e as interações sociais os caminhos por excelência para que ele seja atingido. Portanto, uma avaliação da criança não consegue captar as práticas em que ela está imersa e as possibilidades existentes na instituição para a máxima expressão do desenvolvimento infantil.
Desse modo, ao adotar um único instrumento de mensuração de habilidades nessa etapa, além do equívoco já apontado até mesmo por economistas que trabalham com avaliações de larga escala, demonstrando que testes não recobrem todos os aspectos envolvidos no processo educativo, o governo desrespeita a história dos direitos até aqui alcançados (Corrêa; Andrade, 2011, p. 282).
Do ponto de vista político, e se entende que essa dimensão é a mais crítica, avaliações desse tipo podem resultar em instrumentos padrão que desconsiderem a avaliação de contexto e as especificidades da educação infantil e do desenvolvimento da criança. Em 2011, a educação infantil enfrentou uma ameaça, pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, do Governo Federal, de se introduzir um teste padrão de desenvolvimento infantil, o Ages and Stages Questionnaires (ASQ-3), para avaliar todas as crianças que frequentavam a educação infantil, tendo como fundamento o argumento econômico de que o investimento em educação infantil garantiria taxas de retorno sociais elevadas. Desde então, experiências desse tipo surgem em municípios e são contestadas pela área da educação infantil.
Entende-se que a avaliação centralizada na criança é reducionista, na medida em que o atendimento em educação infantil é oferecido a partir de diversos tipos de instituição, com os mais variados formatos institucionais. Ademais, esse tipo de abordagem não se sustenta diante das profundas desigualdades sociais e da vulnerabilidade a que muitas crianças estão submetidas, e seus resultados podem oferecer imagens e valores distorcidos sobre as instituições e os profissionais de educação.
A focalização no desempenho da criança pode gerar decisões equivocadas em relação ao aprimoramento da etapa de educação, com a criação de mecanismos de competitividade entre instituições, processos de controle do trabalho docente e interferências na organização do trabalho educativo que desconsideram questões mais amplas do contexto em que as crianças estão imersas.
Outro ponto nevrálgico é a tentativa de padronizar e direcionar o trabalho educativo para a precoce escolarização das crianças, mediante a valorização de práticas de alfabetização inadequadas para as crianças de pré-escola.
Avaliação e monitoramento da educação infantil
A primeira questão sobre a qual se debruçar é a definição do que se entende por qualidade da educação infantil. A produção sobre esse conceito é vasta (Corrêa, 2003; Füllgraf, 2002; Coutinho; Moro, 2017; Campos et al., 2012), e as dimensões que a definem têm um componente histórico, social e político, refletindo os princípios e objetivos da educação infantil, o contexto social e econômico e as constatações das ciências da educação que problematizam e qualificam as práticas pedagógicas constantemente.
Em 2015, um dos produtos da investigação desenvolvida pela Universidade Federal do Paraná com demais parceiros foi a publicação Contribuições para a política nacional: a avaliação em educação infantil a partir da avaliação de contexto (Brasil, 2015), que apresenta uma discussão importante sobre qualidade, explicitando toda a trajetória de constituição do debate sobre ela no Brasil.
Entende-se que a qualidade está relacionada ao cumprimento do direito educacional à matrícula em creches e pré-escolas e às condições de atendimento ofertadas pelas instituições de educação infantil. À gestão educacional cabe definir estratégias e oferecer os recursos necessários para a garantir um atendimento de qualidade e, à gestão das instituições, a administração dos recursos, a organização do trabalho educativo e oferta de condições adequadas para que o processo educativo e de cuidados seja realizado de acordo com princípios democráticos, participativos e que respeitem o direito e as especificidades da infância.
Assim sendo, é necessário que a gestão seja imbuída de informações relevantes para avaliar e monitorar a eficiência da utilização de recursos, a eficácia do cumprimento dos objetivos e a efetividade do atendimento das demandas e necessidades das crianças de 0 a 5 anos. Do ponto de vista da gestão educacional, por exemplo, as informações têm o papel de prever demanda e oferta de vagas; de subsidiar tomadas de decisões sobre manutenção e ampliação de infraestrutura, distribuição de recursos financeiros, materiais e de alimentação; a definição de documentos curriculares, a proposição de cursos de formação dos profissionais da educação; o provimento de recursos humanos e o cumprimento dos planos de carreira.
Cabe considerar também que a gestão educacional possui uma relação estreita com as circunstâncias políticas, as quais, por sua vez, interferem na disponibilidade financeira e na provisão de recursos humanos. No âmbito da gestão educacional, a negociação e o conflito vão muito além das questões relacionadas aos princípios e objetivos da educação e suas condições de funcionamento, envolvendo, muitas vezes, interesses políticos e partidários que descontinuam, substituem ou precarizam políticas e programas em curso. A gestão educacional é o espaço de ação de governos e as informações são cruciais para que os gestores educacionais, principalmente os servidores públicos que ocupam cargos técnicos nas secretarias de educação e órgãos descentralizados de ensino, impeçam que modificações na agenda firam os interesses e as demandas de toda a comunidade escolar.
Para as unidades educativas, dados são necessários para a gestão e o planejamento das rotinas, como a organização das salas e das turmas; a organização dos espaços de uso coletivos; a organização do trabalho docente e dos demais profissionais que atuam na instituição; o planejamento de reuniões e a execução do projeto pedagógico.
Estudos apontam a importância das avaliações na educação para subsidiar a gestão educacional e escolar (Bauer, 2014), o que abre um campo frutífero de estudos sobre a educação infantil, dada a recente incorporação dessa etapa à Política Nacional de Educação Básica. A abordagem de avaliação que tem sido defendida na área de educação infantil é a avaliação de contexto, cujo desenvolvimento se dá mediante a prática reflexiva e a negociação, em um ambiente participativo e democrático.
O monitoramento também é um mecanismo importante para se acompanhar a evolução de uma política pública, trazendo informações para aprimorar programas e projetos em curso. Como ferramenta para subsidiar a realização de avaliações, o monitoramento, na educação infantil, pode oferecer indicadores que permitam mensurar oferta de vagas e avaliar as condições de atendimento (Fernandes, 2014).
Os indicadores de monitoramento sintetizam informações sobre o ritmo e a forma de implementação de um programa ou de uma política pública, e os indicadores de avaliação a alimentam com dados sobre resultados e efeitos das ações desenvolvidas no âmbito desse programa ou política (Jannuzzi, 2004).
Na educação infantil, o primeiro aspecto para se pensar na construção de indicadores é o acesso à educação infantil, o que exige acompanhar, por exemplo, taxas de atendimento e demandas por vagas existentes, taxa de natalidade e condições socioeconômicas dos territórios que possuem creches e pré-escolas. Esses dados também permitem avaliar as possibilidades e capacidades dos sistemas municipais de educação para atender crianças de 0 a 5 anos e localizar os territórios com mais necessidades de vagas. Em relação às condições de atendimento, os indicadores devem subsidiar os gestores educacionais e escolares sobre os aspectos relacionados à organização do trabalho educativo; à infraestrutura e recursos materiais e humanos disponíveis e ao desenvolvimento do projeto pedagógico. Essas informações, articuladas com um parâmetro de qualidade definido e estabelecido de forma democrática e participativa, são insumos básicos para subsidiar avaliações da e na educação infantil.
Aspecto importante que não poderia ser negligenciado é a redução das desigualdades. Em um país marcado por grandes desigualdades sociais, a perspectiva de qualidade de atendimento precisa ser ampliada no sentido de contribuir para a atenuação desse fenômeno, que produz trajetórias diferenciadas de crianças e adolescentes em seu percurso educacional e escolar. Entende-se que concepções de justiça e redução de desigualdades devem fundamentar os critérios para a definição de indicadores de qualidade, de modo que eles possam apontar os problemas e os desafios que deverão ser enfrentados pelo poder público na formulação e implementação da política de educação e de demais políticas que possam oferecer melhores condições de vida para a população mais pobre e vulnerável. Gestores educacionais e escolares enfrentam cotidianamente os embates com a pobreza, e isso representa um desafio para a implementação das políticas públicas educacionais, na medida em que é necessário ampliar o acesso, mas ao mesmo tempo cuidar para que critérios de matrículas não sejam barreiras de exclusão; é necessário cuidar e oferecer todos os recursos possíveis para que a criança desenvolva-se de forma saudável e plena; é preciso enfrentar a falta de recursos e de oportunidades das famílias entre outros aspectos que interferem diretamente no organização e no desenvolvimento do trabalho educativo.
Considerações finais
As reflexões desenvolvidas partem do pressuposto de que não há política municipal de educação infantil que atenda às crianças de forma qualificada, sem que a gestão educacional e a gestão da instituição educativa sejam imbuídas de mecanismos de acompanhamento das ações e de avaliação do processo e dos resultados obtidos.
Um dos grandes desafios é a tradução das políticas formuladas em práticas e ações. Traduzindo-a, segue um segundo desafio, que é garantir que os objetivos para a educação infantil sejam cumpridos, e uma das dimensões que auxiliam a gestão no seu cumprimento são as ferramentas de monitoramento e avaliação. Para isso, é preciso qualificar mecanismos de acompanhamento e de avaliação que dêem suporte à gestão da educação.
Além disso, é necessário desenvolver um olhar para a gestão e para a implementação das políticas de modo a compreender as articulações entre as esferas políticas e técnicas na consecução dos objetivos. Como afirmado no início da exposição, gestão é um processo técnico e político, e sua concretização se dá no quadro de relações sociais, em contextos e espaços com diferenças socioeconômicas marcantes, com manifestações de interesses os mais variados, com disputas de projetos e diversos níveis e formas de entendimento sobre como desenvolver um programa de educação infantil.
Finalmente, é sabido que os dados educacionais brasileiros são robustos, e não se faz necessário partir da etapa zero para a produção de informações sobre a educação infantil. O desafio é acessar esses dados e traduzi-los em informações que sejam relevantes para a gestão da educação infantil e que espelhem a qualidade que se deseja e as perspectivas de avaliação que se apresentam nos diferentes entes federativos.
Referências
- ABRUCIO, Fernando Luís. Os avanços e os dilemas do modelo pós-burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência internacional recente. In: BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos; SPINK, Peter. (Org.). Reforma do Estado e administração pública gerencial. Rio de Janeiro: FGV, 2006. p. 173-200.
- BASTOS, João Baptista. Gestão democrática. Rio de Janeiro: DP&A: SEPE, 1999.
-
BAUER, Adriana. Avaliação de redes de ensino e gestão educacional: o que apontam os estudos acadêmicos. In: CONGRESSO IBERO-AMERICANO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO, IV.; CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO, VII., Porto. Publicação. Porto: ANPAE, FPAE, FEAE, 2014. https://anpae.org.br/IBERO_AMERICANO_IV/GT2/GT2_Comunicacao/AdrianaBauer_GT2_integral.pdf
» https://anpae.org.br/IBERO_AMERICANO_IV/GT2/GT2_Comunicacao/AdrianaBauer_GT2_integral.pdf - BICHIR, Renata. Para além da “fracassomania”: os estudos brasileiros sobre implementação de políticas públicas. In: MELLO, Janine; RIBEIRO, Vanda Mendes; LOTTA, Gabriela; BONAMINO, Alicia; CARVALHO, Cynthia Paes. Implementação de políticas e atuação de gestores públicos: experiências recentes das políticas das desigualdades. Brasília: IPEA, 2020. p. 21-41.
- BITTAR, Mariluce; OLIVEIRA, João Ferreira de. Gestão e políticas da educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
- BONDIOLI, Anna. Construir compartilhando a qualidade: a contribuição das partes interessadas. In: BONDIOLI, Anna; SAVIO, Donatella (Org.). Participação e qualidade em educação da infância: percursos de compartilhamento reflexivo em contextos educativos. Curitiba: Editora UFPR, 2013. p. 25-49.
- BONDIOLI, Anna; SAVIO, Donatella (Org.). Participação e qualidade em educação da infância: percursos e compartilhamento reflexivo em contextos educativos. Curitiba: Editora UFPR, 2013.
- BONDIOLI, Anna; SAVIO, Donatella. Elaborar indicadores de qualidade educativa das instituições de educação infantil: uma pesquisa compartilhada entre Itália e Brasil. In: SOUZA, Gizele de; MORO, Catarina; COUTINHO, Angela (Org.). Formação da rede em educação infantil: avaliação de contexto. Curitiba: Appris, 2015. p. 21-49.
- BORDIGNON, Genuíno; GRACINDO, Regina Vinhaes. Gestão da educação: o município e a escola. In: FERREIRA, Naura Syria Carapeto; AGUIAR, Márcia Angela da Silva (Org.). Gestão da educação: impasses, perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2000. p. 147-176.
- BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 27833, 23 dez. 1996.
- BRASIL. Ministério da Educação. Educação infantil: subsídios para construção de uma sistemática de avaliação. Brasília, DF: MEC, 2012. (Documento produzido pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 1.147/2011, do Ministério da Educação).
-
BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm
» http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm - BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Currículos e Educação Integral. Coordenação Geral de Educação Infantil. Contribuições para a política nacional: a avaliação em educação infantil a partir da avaliação de contexto. Curitiba: UFPR, 2015.
- BRUNO, Lúcia. Gestão da educação: onde procurar o democrático? In: OLIVEIRA, Dalila Andrade; ROSAR, Maria de Fátima Felix. (Org.). Política e gestão da educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 19-40.
- CABRAL NETO, Antônio. Gerencialismo e gestão educacional: cenários, princípios e estratégias. In: FRANÇA, Magna; BEZERRA, Maura Costa. (Org.). Política educacional: gestão e qualidade do ensino. Brasília: Líber Livro, 2009. p. 175-197.
-
CAMPOS, Maria Malta; ESPOSITO, Yara; BHERING, Eliana; GIMENES, Nelson; ABUCHAIM, Beatriz; FERNANDES, Fabiana Silva; RIBEIRO, Bruna. A gestão da educação infantil no Brasil. Estudos & Pesquisas Educacionais, n. 3, 2012. p. 29-102. https://fvc.org.br/wp-content/uploads/2018/04/estudos_e_pesquisas_educacionais_vol_3.pdf
» https://fvc.org.br/wp-content/uploads/2018/04/estudos_e_pesquisas_educacionais_vol_3.pdf -
CÔCO, Valdete. Gestão na educação infantil: os processos de escolha dos dirigentes das instituições. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO, XXIV.; CONGRESSO INTERAMERICANO DE POLÍTICA E ADMINISTRAÇÃO DA EDUCAÇÃO, III., 2009, Vitória. Trabalhos completos. Niterói: ANPAE, 2009a. https://www.anpae.org.br/simposio2009/345.pdf
» https://www.anpae.org.br/simposio2009/345.pdf -
CÔCO, Valdete. Professores na educação infantil: inserção na carreira, espaço de atuação e formação. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 32., 2009, Caxambu. Anais... Rio de Janeiro: ANPEd, 2009b. http://32reuniao.anped.org.br/arquivos/trabalhos/GT08-5363--Int.pdf
» http://32reuniao.anped.org.br/arquivos/trabalhos/GT08-5363--Int.pdf -
CORRÊA, Bianca Cristina. Considerações sobre qualidade na educação infantil. Cadernos de Pesquisa, n. 119, p. 85-112, jul. 2003. https://doi.org/10.1590/S0100-15742003000200005
» https://doi.org/10.1590/S0100-15742003000200005 -
CORRÊA, Bianca Cristina. A gestão da educação infantil em 12 municípios paulistas. Fineduca, v. 8, n. 2, p. 1-15, 2018. https://doi.org/10.17648/fineduca-2236-5907-v8-78020
» https://doi.org/10.17648/fineduca-2236-5907-v8-78020 -
CORRÊA, Bianca Cristina; ANDRADE, Érika Natacha F. de. Infância e vivências formativas na educação infantil: qual o sentido das avaliações padronizadas nessa etapa educacional? Revista Retratos da Escola, v. 5, n. 9, p. 275-289, 2011. https://doi.org/10.22420/rde.v5i9.12
» https://doi.org/10.22420/rde.v5i9.12 - COSTA, Fernando Lustosa da. Reforma do Estado e contexto brasileiro: crítica do paradigma gerencialista. Rio de Janeiro: FGV, 2010.
-
COUTINHO, Ângela Scalabrin; MORO, Catarina. Educação infantil no cenário brasileiro pós-golpe parlamentar: políticas públicas e avaliação. Revista zero a seis, v. 19, n. 36, p. 349-360, 2017. https://doi.org/10.5007/1980-4512.2017v19n36p349
» https://doi.org/10.5007/1980-4512.2017v19n36p349 -
FERNANDES, Fabiana Silva. Políticas públicas e monitoramento na educação infantil. Estudos em Avaliação Educacional, v. 25, n. 58, p. 44-72, 2014. http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-68312014000200004&lng=pt&nrm=iso
» http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-68312014000200004&lng=pt&nrm=iso - FERNANDES, Fabiana Silva; CAMPOS, Maria Malta. Gestão da educação infantil: um balanço de literatura. Educação em Revista, v. 31, n. 1, p. 139-167, 2015.
-
FERREIRA, Elisa Bartolozzi; CÔCO, Valdete. Gestão na educação infantil e trabalho docente. Revista Retratos da Escola, v. 5, n. 9, p. 357-370, 2012. https://doi.org/10.22420/rde.v5i9.17
» https://doi.org/10.22420/rde.v5i9.17 - FERREIRA, Naura Syria Carapeto (Org.). Formação continuada e gestão da educação. São Paulo: Cortez, 2003.
- FERREIRA, Naura Syria Carapeto; AGUIAR, Márcia Angela da S. Gestão da educação: impasses, perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2001.
- FRANÇA, Magna; BEZERRA, Maura Costa. Política Educacional: gestão e qualidade do ensino. Brasília: Líber Livro, 2009.
-
FÜLLGRAF, Jodete. B. G. Direito das crianças à educação infantil: um direito de papel. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPEd, 25., 2002, Caxambu. Textos dos trabalhos e pôsteres. Caxambu: ANPEd, 2009. http://25reuniao.anped.org.br/jodetegomesfullgraft07.rtf
» http://25reuniao.anped.org.br/jodetegomesfullgraft07.rtf - INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA (INEP). Em Aberto, v. 17, n. 72, 2000.
- INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA (INEP). Em Aberto, v. 19, n. 75, 2002.
- JANNUZZI, Paulo de Martino. Conceitos básicos. In: JANUZZI, Paulo de Martino. Indicadores sociais no Brasil: conceitos, fontes de dados e aplicações. Campinas: Alínea, 2004. p. 13-36.
- KRAMER, Sônia. (Org.). Formação de profissionais da educação infantil no estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ravil, 2001.
-
KRAMER, Sônia; NUNES, Maria Fernanda. Gestão pública, formação e identidade de profissionais de educação infantil. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 131, p. 423-454, 2007. https://doi.org/10.1590/S0100-15742007000200010
» https://doi.org/10.1590/S0100-15742007000200010 -
KRAMER, Sônia; TOLEDO, Leonor Pio Borges de; BARROS, Camila. Gestão da educação infantil nas políticas municipais. Revista Brasileira de Educação, v. 19, n. 56, p. 11-36, 2014. https://doi.org/10.1590/S1413-24782014000100002
» https://doi.org/10.1590/S1413-24782014000100002 - KRAWCZYK, Nora Rut. Em busca de uma nova governabilidade na educação. In: OLIVEIRA, Dalila Andrade; ROSAR, Maria de Fátima Felix. (Org.). Política e gestão da educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 61-74.
- LIMA, Antonio Bosco de (Org.). Estado, políticas educacionais e gestão compartilhada. São Paulo: Xamã, 2004.
-
LÜCK, Heloísa. Perspectivas da gestão escolar e implicações quanto à formação de seus gestores. Em Aberto, v. 17, n. 72, p. 11-33, 2000. https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.17i72.2116
» https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.17i72.2116 - LÜCK, Heloísa. Gestão participativa na escola. São Paulo: Vozes, 2010.
-
MAIA, Graziela Zambão Abdian. As publicações da ANPAE e a trajetória do conhecimento em administração da educação no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração, v. 24, n.1, p. 31-50, 2008. https://seer.ufrgs.br/index.php/rbpae/article/view/19237
» https://seer.ufrgs.br/index.php/rbpae/article/view/19237 - MEDEIROS, Isabel Letícia Pedroso de; LUCE, Maria Beatriz. Gestão democrática na e da educação: concepções e vivências. In: LUCE, Maria Beatriz; MEDEIROS, Isabel Letícia Pedroso de. Gestão escolar democrática: concepções e vivências. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2006. p. 15-25.
- OLIVEIRA, Dalila Andrade. Educação e planejamento: a escola como núcleo de gestão. In: OLIVEIRA, Dalila Andrade. (Org.). Gestão democrática da educação: desafios contemporâneos. Petrópolis: Vozes, 1997. p. 64-104.
- OLIVEIRA, Dalila Andrade. A gestão democrática da educação no contexto da reforma do Estado. In: FERREIRA, Naura Syria Carapeto; AGUIAR, Márcia Angela da S. (Org.). Gestão da educação: impasses, perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2001. p. 91-112.
- OLIVEIRA, Dalila Andrade. Mudanças na organização e na gestão do trabalho na escola. In: OLIVEIRA, Dalila Andrade; ROSAR, Maria de Fátima Felix. (Org.). Política e gestão da educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 127-145.
- PALUMBO, Dennis J. Public policy in América: government in action. San Diego: Harcourt Brace & Company, 1994.
- ROSSETTI-FERREIRA, Maria Clotilde; RAMON, Fabíola; SILVA, Ana Paula Soares. Políticas de atendimento à criança pequena nos países em desenvolvimento. Cadernos de Pesquisa, n. 115, p. 65-100, 2002.
-
SOUZA, Ângelo Ricardo de. A produção do conhecimento e o ensino da gestão educacional no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração, v. 24, n. 1, p. 51-60, 2008. https://seer.ufrgs.br/index.php/rbpae/article/view/19238
» https://seer.ufrgs.br/index.php/rbpae/article/view/19238 -
VIEIRA, Sofia Lerche. Política(s) e gestão da educação básica: revisitando conceitos simples. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 23, n. 1, p. 53-69, 2007. https://seer.ufrgs.br/rbpae/article/view/19013
» https://seer.ufrgs.br/rbpae/article/view/19013
-
1
No entanto, o termo, originário da língua inglesa, é “management”, e sua tradução literal é “gerencialismo”, conceito que tratamos como o oposto do termo “gestão”.
-
2
Palumbo considera que “[...] essa visão do processo de elaboração de uma política, envolvendo vários estágios, é útil para distinguir componentes importantes de um conjunto complicado de comportamentos [...]” (Palumbo, 1994, p. 51), contudo alerta para a necessidade de visualizar elementos que podem vir a compor esse sistema, como, por exemplo, a questão dos resultados, que podem ser “[...] gerados durante o processo de implementação [...]” (Palumbo, 1994,p. 51). O autor alerta, ainda, que essa visão do processo “[...] é organizada demais, lógica demais e sequencial demais [...]” (Palumbo, 1994, p. 51), o que significa dizer que, “[...] no mundo real, os vários estágios se sobrepõem e se mesclam. Eles ocorrem, às vezes, ao mesmo tempo, ou fora de sequência” (Palumbo, 1994,p. 51).
Disponibilidade de dados
Não se aplica.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
19 Jul 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
22 Mar 2023 -
Aceito
26 Abr 2023