À BEIRA DO LEITO
MEDICINA FARMACÊUTICA
Qual o tamanho da amostra ideal para se realizar um ensaio clínico?
Raymundo Soares Azevedo
Para responder a esta pergunta, deve-se considerar alguns aspectos do desenho do estudo (ensaio clínico), com a ressalva de que não existe uma resposta apenas a esta questão.
Primeiro, é necessário identificar as variáveis de interesse e classificá-las de acordo com o seguinte critério: variáveis quantitativas (contínuas ou discretas) ou variáveis qualitativas (nominais ou ordinais). É a partir desta definição inicial que será estabelecida a estratégia de análise e a opção pelos testes estatísticos (paramétricos ou não-paramétricos)e a conseqüente formulação do cálculo amostral.
O segundo ponto a ser considerado é a expectativa de diferença a ser observada entre as medidas destas variáveis nos grupos constituídos, por exemplo o efeito terapêutico de um novo medicamento comparado ao tratamento habitual. Esta diferença pode ser entre as médias de cada grupo ou a diferença na proporção de melhora de um grupo em relação ao outro. Esta diferença também vai compor o cálculo amostral.
Finalmente, devem ser integrados a estimativa do tamanho da amostra duas probabilidades de erro ao se analisar os resultados do estudo, denominados erro tipo I (a) e erro tipo II (b), cujos valores derivam da distribuição de Gauss padronizada (tabela z da curva normal)1.
Também conhecido como nível de significância, a é a probabilidade de tomar como significativa uma diferença entre os grupos quando na verdade os tratamentos têm o mesmo efeito (falso-positivo).
De outro modo, b é a probabilidade de não detectar a partir dos resultados do estudo uma diferença significativa entre os grupos quando ela de fato existe, julgando erroneamente como iguais os tratamentos (falso-negativo). Costuma-se usar o complemento de b no cálculo de uma amostra, e denominar (1-b) como o poder do estudo, e portanto interpretar o poder do estudo como a probabilidade de detectar acertadamente uma diferença significativa entre os grupos.
É do uso corrente tomar valores de a menores do que 0,05 e de b menores do que 0,20 (ou 5% e 20%, respectivamente), a depender das conseqüências que cada um destes erros terá nas decisões resultantes do estudo2.
Uma vez anotados estes quatro parâmetros, há duas fórmulas gerais que podemos lançar mão para calcular a amostra necessária para constituir cada grupo do futuro ensaio clínico, a saber:
Estas duas formulações para o cálculo do tamanho da amostra em cada grupo a ser estudado, apesar de simples, nos permitem antever o peso de nossas decisões quanto à escolha de a, b e das expectativas de diferença entre os grupos.
Tomando-se a = 0,05 e b = 0,20 , temos respectivamente os valores 1,64 e 0,84 na tabela z da distribuição normal padronizada, o que resulta em um fator de multiplicação da amostra de aproximadamente seis vezes. Se aumentarmos o poder do estudo para 90%, diminuindo, portanto, o b para 0,10, teremos que recrutar quase duas vezes mais pacientes para compor cada grupo.
De modo inverso, quanto menor a diferença a ser testada no ensaio clínico, maior será a amostra necessária para tentar demonstrar esta diferença.
Não se pretende esgotar o assunto neste breve comentário, mesmo porque um bom desenho de estudo não depende apenas do cálculo do tamanho da amostra. Mas a partir dos parâmetros mencionados acima tem-se uma base para desenhar novos ensaios clínicos e, mais importante, interpretar e discutir resultados publicados na literatura especializada.
- 1. Massad E, de Menezes RX, Silveira PSP, Ortega NRS. Métodos quantitativos em medicina. São Paulo: Editora Manole Ltda; 2004.
- 2. Schulz KF, Grimes DA. Sample size calculations in randomised trials: mandatory and mystical. Lancet. 2005;365:1348-53.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
15 Ago 2008 -
Data do Fascículo
Ago 2008