Open-access Avaliação de Parâmetros de Soldagem nas Características de Juntas Dissimilares Inconel 718 - Inox 316L Soldadas pelo Processo TIG Autógeno

Metallurgical Characterization of Dissimilar Joints Inconel 718 - Inox 316L Welded by the Autogenous TIG Process

Resumo

A aplicação de juntas soldadas dissimilares, de Inconel 718 endurecível por precipitação e aço inoxidável austenítico AISI316L, ocorre principalmente em indústrias aeroespaciais e plantas de usinas nucleares. Isso ocorre devido à elevada resistência mecânica aliada a boa resistência à corrosão em ambos ambientes e condições de temperaturas. Este trabalho objetivou avaliar o efeito da intensidade da corrente de soldagem e da temperatura de interpasse em juntas dissimilares utilizando o processo de soldagem a arco com eletrodo de tungstênio e proteção gasosa (TIG) autógeno. Este processo de soldagem foi escolhido em função de seus excelentes resultados aliados à facilidade operacional e baixo custo. Foi utilizada a ferramenta de planejamento experimental para maximizar o potencial dos resultados experimentais. Para caracterização metalúrgica foram utilizados análise da macrografia da junta soldada, de perfis de microdureza, e de microscopia ótica (MO). A variação da corrente de soldagem e da temperatura de interpasse ocasionou alteração da geometria da zona fundida (ZF) de até 232% de aumento da área da ZF. A microdureza sofreu uma variação de até 25% de aumento na região da ZF. Quanto a fração volumétrica de ferrita, foi observado um acréscimo de até 139% na região da ZF. Este trabalho objetiva também estabelecer referências de parâmetros de soldagem que possam proporcionar garantias de estabilidade para a união metalúrgica entre metais de dissimilares.

Palavras-chave:  Aços inoxidáveis austeníticos; Super liga de níquel; Soldabilidade; Junta soldada; Processo TIG

Abstract

The application of dissimilar welded joints, from Inconel 718 precipitation curable and AISI316L austenitic stainless steel, occurs mainly in the aerospace and nuclear power plant industries. This is due to the high mechanical resistance coupled with good corrosion resistance in both environments and temperature conditions. The aim of this study was to evaluate the effect of welding current and interbody temperature on dissimilar joints using the tungsten electrode and gaseous protection (GTAW) autogenous arc welding process. This welding process was chosen due to its excellent results coupled with ease of operation and low cost. The experimental planning tool was used to maximize the potential of the experimental results. For metallurgical characterization, the weld joint macro-analysis, microhardness profile, and optical microscopy (OM) analysis were used. The variation of the welding current and the interpolation temperature caused a change in the geometry of the molten zone (MZ) of up to 232% increase in the ZF area. The microhardness varied up to a 25% increase in the MZ region. As for the volumetric fraction of ferrite, an increase of up to 139% in the MZ region was observed. This work also aims to establish references of welding parameters that can provide guarantees of stability for the metallurgical union between dissimilar metals.

Key-words:  Austenitic stainless steels; Super nickel alloy; Weldability; Welded joint; GTAW process

1. Introdução

O crescente consumo de energia elétrica e a constante busca por recursos renováveis, tornam a energia elétrica proveniente de usinas termo- nucleares uma potencial solução para grande parte dessa crescente demanda. No interior de um reator nuclear, protagonista neste processo de geração de energia elétrica, existem varetas que armazenam em seu interior pastilhas de Urânio-235. Estas varetas são encaixadas em suportes constituídos geralmente de materiais como o Inconel 718 e Inox 316L, para suportar as elevadas temperaturas e ambiente corrosivo. Além de suportar tais condições extremas esse suporte é fabricado utilizando soldagem dos componentes.

O estudo da soldagem em juntas dissimilares tem sido alvo de pesquisa utilizando técnicas tradicionais amplamente utilizadas na engenharia metalúrgica focadas em experimentos controlados, destacamos alguns. Hinojos em 2016 estudou técnicas de fabricação utilizando metal de adição na junção do Inconel 718 e aço inoxidável 316L usando soldagem por feixes de elétrons [ 1 ]. Wang [ 2 ] analisou as microestruturas e microdureza na fronteira de fusão de uma junta dissimilar do aço inox 316 aço e Inconel 182. Shakil et al. [ 3 ] avaliaram as microestruturas e microdurezas de uma junta dissimilar de Inconel 625 e aço inoxidável 304L soldados por feixe de elétrons. Ramkumar et al. [ 4 ] estudaram sobre a propriedade estrutural, relações mecânicas e comportamento corrosivo de juntas soldadas dissimilares de Inconel 718 e Inox 316L pelo processo de soldagem TIG sem usar fluxo ativado. Mortezaie e Shamanian [ 5 ] realizaram um estudo da microestrutura, propriedades mecânicas e resistência a corrosão de juntas dissimilares entre Inconel 718 e aço inox austenítico 310S utilizando o processo GTAW com três tipos de materiais de adição Inconel 625, Inconel 82 e Inox austenítico 310, respectivamente.

O presente trabalho objetiva analisar a geometria da macroestrutura da ZF a evolução microestrutural da ZF das juntas soldadas dissimilares e, além disso, foram realizadas análises da microdureza na ZF da junta soldada. Essas análises objetivam obter o efeito da temperatura de interpasse sobre a junta soldada, além de possibilitar a indicação da temperatura de interpasse ideal para processos de soldagem dissimilares envolvendo esses materiais.

Neste contexto, foi analisado, no presente trabalho, as características metalúrgicas de juntas soldadas dissimilares experimentalmente. Foi utilizado um método de planejamento experimental que utiliza a técnica do delineamento composto rotacional, um modelamento estatístico que possibilitou a previsão da tendência dos resultados obtidos com diferentes parâmetros, além daqueles realizados experimentalmente, possibilitando, portanto, a interpolação para previsão de condições de soldagem adequadas dentro do espectro dos parâmetros utilizados. Com os resultados das análises metalográficas, das propriedades mecânicas, o auxílio do delineamento composto rotacional tornou-se possível prever resultados que obtidos com parâmetros experimentais distintos, sem ser necessária a efetiva realização do ensaio de soldagem, muito menos das análises posteriores, apenas utilizando as tendências obtidas. Resultando em economia de recursos como materiais para confecção da junta soldada, tempo do equipamento, tempo do soldador, e possibilitando previsão com considerável confiança dos resultados que serão obtidos antes da realização da confecção da junta soldada.

2. Materiais e Métodos

2.1. Materiais

Foram utilizadas 10 chapas de aço inoxidável austenítico AISI 316L, e 10 chapas da superliga de níquel Inconel 718, todas com as mesmas dimensões. A largura das chapas utilizadas foi 20 mm, por 120 mm de comprimento, por 5mm de espessura. Na Tabela 1 é apresentada a composição química do AISI 316L e Inconel 718 ambas fornecidas pelos fabricantes.

Tabela 1
Composição química e propriedades físico-química do AISI316L e Inconel 718.

Das chapas citadas, foram cortadas duas amostras (uma de AISI 316l e uma de Inconel 718) para posterior análise no estado como recebido e posterior comparação. Após o processo de soldagem TIG autógeno os dois materiais formaram juntos o mesmo corpo de prova. Em seguida os corpos de prova soldados foram cortados, dando origem a dez amostras para serem submetidas a análise conforme mostra Figura 1 .

Figura 1
(a) Corpo de Prova após processo de soldagem multipasse; e (b) corpo de prova cortado para realização de análise de sua seção transversal.

2.2. Métodos

Para a realização da parte experimental foi realizada a caracterização microestrutural dos materiais como recebido, posteriormente a soldagem das 20 chapas por meio do processo TIG autógeno utilizando corrente contínua. Das 10 amostras soldadas, foi cortado um CP de cada para preparação metalográfica, ataque com Água Régia ( Tabela 2 ) e análise da macroestrutura e microestrutura das juntas soldadas por MO, e posterior medição da Microdureza Vickers. A Tabela 2 apresenta a composição da Água Régia utilizada para ataque da amostras como recebidas (CR) e soldadas.

Tabela 2
Composição do reagente água régia.

Após ataque, foi realizado o dimensionamento da ZF através do software Geogebra. Foi realizada uma análise da distribuição das bandas de ferrita δ através da medida dos espaçamentos na estrutura dendrítica da ZF com o software ImageJ. A quantificação dessas bandas de ferrita δ também foi realizada através do software ImageJ, para mensurar quantitativamente a influência da corrente de soldagem e da temperatura de interpasse, sobre a formação das bandas de ferrita δ. Essa análise foi realizada a partir de cinco micrografias de regiões distintas da ZF de cada amostra, no final das quantificações foram obtidas cinco medidas para cada amostra, a partir dessas medidas foi calculada uma fração volumétrica de ferrita δ média na ZF de cada amostra. Para medição da microdureza na região da ZF foram realizadas dez medidas em regiões distintas da ZF para o cálculo da medida média.

Para concluir o estudo foi realizado o Delineamento Composto Central Rotacional (DCCR). Há diversos caminhos para se atingir um objetivo partindo-se da condição distante da otimizada. O número de planejamentos experimentais fatoriais necessários depende principalmente do número de variáveis independentes a serem estudadas inicialmente. No caso deste trabalho são duas as variáveis independentes a serem consideradas a corrente, que influencia de forma direta no aporte térmico, e a temperatura de interpasse. Adotou-se o delineamento composto central rotacional (DCCR) devido às variáveis adotadas no estudo. Assim foi realizado um fatorial completo, incluindo os 3 pontos axiais e 3 repetições no ponto central, totalizando 10 ensaios [ 6 ]. As faixas adotadas para a variável corrente de soldagem foi 110 a 210A, e para temperatura foi 350 a 850 °C, respectivamente. Através dos resultados obtidos será possível avaliar todos os parâmetros do modelo, o que tornará possível a elaboração de um modelo com as variáveis codificadas. Após a aplicação do modelo será possível avaliar as resposta de cada ensaio, tais como: fração volumétrica das fases componentes da microestrutura, dimensões da ZF, espaçamento das bandas de ferrita na região da ZF, e microdureza Vickers na região da ZF das juntas soldadas de cada ensaio [ 6 ]. Na Tabela 3 são apresentados detalhes dos parâmetros de cada ensaio.

Tabela 3
Tabela com os valores de corrente e temperatura de interpasse para cada ensaio de soldagem.

Após as análises dos resultados experimentais foram montadas tabelas (exemplo Tabela 2 ), adicionando uma coluna com o dado da análise, por exemplo, fração volumétrica de ferrita δ na zona fundida. Então utilizando o software STATISTICA, foram construídos gráficos a partir dos dados iniciais de soldagem (corrente e temperatura de interpasse), e de análises realizadas de resultados experimentais.

3. Resultados e Discussão

3.1. Amostras como recebidas

As amostras como recebidas passaram por preparação metalográfica, e foram analisadas por microscopia óptica, as micrografias dos aços AISI 316L e Inconel 718, a Figura 2 a apresenta matriz de grãos poligonais de austenita com presença de maclas, a Figura 2 b mostra a microestrutura da liga de níquel Inconel 718 constituída por uma matriz austenítica com grãos heterogêneos com diferentes formatos e tamanhos.

Figura 2
Micrografia no estado como recebido (a) do aço AISI 316L; (b) da liga Inconel 718, aumento de 200X, ataque com Água Régia.

Após a caracterização, com o auxílio do perfilômetro pelo método dos interceptos foi medido o tamanho de grão das amostras como recebidas (CR) seguindo a norma ASTM E112. Foram realizadas 10 medidas para cada material e calculada a média simples. O tamanho de grão do AISI316L foi 0,031 ± 0,002 mm, já a superliga de níquel foi 0,05 ± 0,0001 mm. As amostras CR também passaram por quantificação de fases através do software ImageJ, foram realizadas 5 medidas de cada material de regiões distintas e calculada a média simples. A fração volumétrica de ferrita do aço AISI 316L foi 12,3 ± 0,21%, já a superliga de níquel foi 6,98 ± 0,87%. Posteriormente foi realizada a medida de microdureza das amostras como recebidas (CR). Foram realizadas dez medidas de regiões distintas e calculada a média simples para cada material. A microdureza Vickers do AISI316L foi 169 ± 0,325 HV, já para a superliga de níquel Inconel 718 foi 225 ± 0,684 HV.

3.2. Análise da macrografia das amostras soldadas

A Figura 3 mostra a macrografia da seção transversal da junta soldada dissimilar para as dez amostras após procedimentos metalográficos.

Figura 3
Macrografia da seção transversal das amostras soldadas.

A Tabela 4 mostra os resultados obtidos para a área da ZF das juntas soldadas dissimilares nos diferentes ensaio.

Tabela 4
Valores da área da ZF obtidos através de medidas realizadas com Geogebra.

A Figura 4 mostra os dados da Tabela 4 plotados em um gráfico área da ZF x Amostra, com a finalidade de facilitar a visualização da dispersão dos resultados.

Figura 4
Medida de área da ZF para cada amostra, medida pelo Geogebra.

Através da análise do gráfico da Figura 4 observa-se que exceto para a amostra 4 o aumento da corrente de soldagem ocasionou aumento da largura e penetração, logo também da área da ZF da junta soldada, estes resultados foram semelhantes aos observados por Oliveira [ 7 ], assim como Dias [ 8 ] e Royse [ 9 ] também concluíram em seus estudos. Esse resultado já era esperado pois o aumento do aporte térmico resulta em mais calor adicionado aumentando também a diluição [ 10 ]. Observando a Tabela 3 e 4 nota-se que o comportamento da amostra 4 foi discrepante das outras amostras, pois mesmo com o aumento da corrente de soldagem a área do ZF não correspondeu a esta variação da corrente de soldagem como as outras amostras. Com a variação dos parâmetros definidos pelo planejamento experimental pode-se observar na Tabela 4 que a área da ZF foi desde 9,18 mm2 (amostra 9) até 32,21 mm 2 (amostra 6).

3.3. Análise microscópica da ZF das amostras soldadas

As Figuras 5 5j mostram a região da ZF para as dez amostras, essas micrografias foram retiradas de regiões equivalentes, a região escolhida foi aproximadamente o meio da ZF visando uma aproximação da igualdade entre as composições químicas dos dois materiais.

Figura 5
Microestrutura da região da ZF com ataque de Água Régia e aumento 200x. (a) amostra 1; (b) amostra 2; (c) amostra 3; (d) amostra 4; (e) amostra 5; (f) amostra 6; (g) amostra 7; (h) amostra 8; (i) amostra 9; (j) amostra 10.

É importante observar que a morfologia das dendritas (grãos colunares) e das bandas de ferrita δ (regiões mais escuras no contorno ou entre as dendritas indicadas na Figura 5 ) variou entre os ensaios devido a diferentes correntes de soldagem utilizadas assim como temperaturas de interpasse. Além disso a reação ao ataque químico realizado (que foi o mesmo para todos os ensaios) na região da ZF foi visivelmente diferente entre os ensaios, essa diferença se dá devido a composição química resultante na região da ZF diferente de uma amostra para outra. Essa diferença ocorreu devido a união de materiais dissimilares em condições distintas, durante o processo a dinâmica da poça de fusão (mistura dos materiais) varia com as condições pré-estabelecidas para cada ensaio resultando em composições químicas e portanto microestruturas distintas. De acordo com um estudo realizado em 2013, a dinâmica da poça de fusão é regida pela força de Lorentz, essa é função do campo magnético que por sua vez é induzido pela corrente elétrica que se desloca da peça para o eletrodo (pois a polaridade é inversa), portanto como a corrente foi variada no presente trabalho entre os ensaios, com base nos estudos desenvolvidos por Bachmann et al. [ 11 ] em Berlim na Alemanha, a instabilidade de resultados na região da ZF, principalmente na região do Inconel tem relação com a heterogeneidade da composição química no local da ZF. A Tabela 5 mostra os valores médios de ferrita δ para cada amostra com o erro de cada medida.

Tabela 5
Fração volumétrica média de ferrita δ para a região da ZF de cada amostra.

A Figura 6 mostra os dados da Tabela 5 plotados em um gráfico da fração volumétrica de ferrita δ na região da ZF por Amostra, com a finalidade de facilitar a visualização da distribuição dos resultados.

Figura 6
Medidas da fração volumétrica de ferrita δ na ZF por amostra.

Pode-se observar na Tabela 5 que exceto para os ensaios 7 e 8 que o aumento da corrente levou ao aumento da fração volumétrica de ferrita δ na ZF, além disso valores de correntes semelhantes apresentaram frações volumétricas maiores quando a temperatura de interpasse foi superior. Esse comportamento foi observado pois mais energia fornecida para a junta soldada aliada a temperatura de interpasse maior resulta em maior Temperatura final da ZF, ocasionando assim o aumento na fração volumétrica de ferrita δ observado em alguns ensaios. Com a variação dos parâmetros definidos pelo planejamento experimental pode-se observar na Tabela 5 que a fração volumétrica de ferrita δ na ZF variou entre 10,64% (amostra 7) até 25,496% (amostra 4).

3.4. Distribuição das bandas de ferrita

As variações realizadas de um ensaio para outro, de corrente de soldagem e temperatura de interpasse, ocasionaram diferentes taxas de resfriamento da região da ZF, isso influencia de forma direta na morfologia dendrítica, como primeira análise foi realizada com o auxílio do ImageJ medidas do espaçamento entre as bandas de ferrita δ. Foram realizadas 10 medidas em três micrografias de regiões distintas de cada ZF, totalizando 30 medidas para cada amostra.

A Figura 7 mostra os dados da Tabela 6 plotados em um gráfico do espaçamento médio de bandas de ferrita na ZF por Amostra, com a finalidade de facilitar a visualização da distribuição dos resultados.

Figura 7
Medidas do espaçamento médio entre as bandas de ferrita δ por amostra.
Tabela 6
Microdureza Vickers na região da ZF.

Percebe-se que o aumento da corrente levou ao aumento do espaçamento entre as bandas de ferrita δ, além disso valores de corrente semelhantes apresentaram espaçamentos maiores quando a temperatura de interpasse foi superior. Isso ocorreu pois correntes maiores levam a aportes térmicos maiores, isto é, mais energia fornecida para a junta soldada, e quando a temperatura de interpasse é maior a energia na forma de calor (Temperatura) final da ZF é maior, ocasionando assim o aumento no distanciamento das bandas de ferrita δ observado em alguns ensaios plotados no gráfico da Figura 7 , devido a processos de difusão de elementos químicos constituintes das bandas de ferrita. Com a variação dos parâmetros definidos pelo planejamento experimental pode-se observar na Tabela 7 que o espaçamento entre as bandas de ferrita δ na ZF variou entre 8,243 μm (amostra 9) até 20,24 μm (amostra 6).

Tabela 7
Valores dos espaçamentos médios entre as bandas de ferrita δ na ZF obtidos através de medidas realizadas com ImageJ.

3.5. Análise da microdureza da ZF das amostras soldadas

Para medição da microdureza na ZF foi utilizada uma carga de 200gf durante um período de 20 segundos. A microdureza nas amostras foram calculadas através da realização de sete medidas em regiões distintas da ZF, posteriormente foi feita a média aritmética simples dessas medidas para calcular a microdureza média.

Para melhor visualização das medidas os resultados foram plotados em um gráfico apresentado na figura 8 .

Figura 8
Microdureza Vickers da ZF das amostras soldadas.

O gráfico da Figura 8 mostra que não houve variação muito expressiva na microdureza média da ZF, no entanto com a variação dos parâmetros definidos pelo planejamento experimental pode-se observar na Tabela 6 que a microdureza média na ZF variou entre 166 HV (amostra 6) até 209 HV (amostra 9).

3.6. Modelamento estatístico

Como mencionado no item 1, no início deste estudo foi aplicado o método de planejamento experimental fatorial, descrito por Calegare [ 6 ], para possibilitar o delineamento dos resultados experimentais, com extrapolação para combinações de variáveis (corrente, temperatura de interpasse) não realizadas experimentalmente. A utilização do software STATISTICA 8 tornou este modelamento possível e confiável devido a validação prévia dos resultados. Esta ferramenta possibilitou a previsão de características metalúrgicas na ZF da junta soldada em condições distintas das experimentais. Com isso tem-se economia e previsão na realização de um projeto com estes materiais. Para constatar a validade do modelo estatístico basta coletar valores experimentais utilizados e medidos depois localizá-los no gráfico respectivo, como por exemplo corrente de soldagem e temperatura de interpasse da amostra 3 com a área da ZF encontrada para a mesma, o valor encontrado para a variável em análise será o encontrado experimentalmente (nesse caso aproximadamente 21 mm2 ), se o mesmo for realizado para outras amostras será constatado que o modelo retrata com precisão os resultados experimentais, indo além com resultados de combinações não realizadas experimentalmente. As tendências obtidas com o modelamento estatístico são apresentadas na Figura 9 , que mostra o delineamento da área da ZF, em função da corrente de soldagem e temperatura de interpasse.

Figura 9
Delineamento da área da ZF versus Temperatura de interpasse versus corrente de soldagem.

A partir da Figura 9 pode-se observar que o aumento da corrente de soldagem ocasionaram aumento da largura e penetração, logo também da área da ZF da junta soldada, estes resultados foram semelhantes aos observados por Oliveira [ 7 ], assim como Dias [ 8 ] e Royse [ 9 ] também concluíram em seus estudos. Esse resultado já era esperado pois o aumento do aporte térmico resulta em mais calor adicionado aumentando também a diluição [ 10 ]. Também observa-se que valores de correntes baixas (110 A por exemplo) podem fornecer áreas da ZF desde valores mínimos até valores máximos, isso dependerá da temperatura de interpasse selecionada. Em outro extremo para valores elevados de corrente (190 a 210 A) tem-se os valores de áreas da ZF máximos para as temperaturas de interpasse relativamente baixas (350 a 600 °C).

A Figura 10 mostra o delineamento da fração volumétrica de ferrita δ na região da ZF, em função da corrente de soldagem e temperatura de interpasse.

Figura 10
Delineamento da fração volumétrica de ferrita δ na ZF versus Temperatura de interpasse versus corrente de soldagem.

A partir da Figura 10 pode-se observar que para valores de correntes em torno de 170 A com temperatura de interpasse de 700 a 850 °C forneceram valores de fração volumétrica de ferrita δ na ZF intermediários. Por outro lado essa mesma faixa de corrente com temperaturas de interpasse de 500 a 750 °C forneceram valores de fração volumétrica de ferrita δ na ZF máximos. Os valores mínimos foram obtidos com corrente de soldagem baixa (110 A por exemplo), ou muito altas (200 a 210 A), utilizando respectivamente temperaturas de interpasse aliadas a temperaturas de interpasse de 350 a 500 °C e 700 a 850 °C respectivamente. A Figura 11 mostra o delineamento do espaçamento das bandas de ferrita δ na região da ZF, em função da corrente de soldagem e temperatura de interpasse.

Figura 11
Delineamento do espaçamento das bandas de ferrita δ na ZF versus Temperatura de interpasse versus corrente de soldagem.

A partir da Figura 11 pode-se observar que correntes de soldagem baixas (110 a 140 A por exemplo), aliadas a temperaturas de interpasse elevadas (600 a 850 °C) forneceram os valores mínimos de espaçamentos das bandas de ferrita δ na ZF, quando aliadas a temperaturas inferiores essa faixa de corrente de soldagem forneceu valores até 3 vezes maiores. Por outro lado correntes altas (180 a 210 A), aliadas a temperaturas de interpasse elevadas (600 a 850 °C) forneceram os maiores valores de espaçamento entre bandas de ferrita δ na ZF, chegando a 5 vezes maior que quando essa mesma faixa de corrente de soldagem for utilizada com temperaturas de interpasse menores (350 a 450 °C). A Figura 12 mostra o delineamento da microdureza na ZF, em função da corrente de soldagem e temperatura de interpasse.

Figura 12
Delineamento da microdureza na ZF versus Temperatura de interpasse versus corrente de soldagem.

Analisando a Figura 12 com o delineamento da microdureza pode-se observar que o aumento da corrente de soldagem resultou em quedas da microdureza, assim como Oliveira observou utilizando a Liga Inconel 718 como revestimento de um substrato através do processo TIG [ 7 ], essa redução de dureza foi ocasionada pela formação de estruturas mais grosseiras, e maior diluição do Inconel no Inox na região da ZF. A mesma relação entre corrente se soldagem e microdureza foi observada na soldagem das ligas de níquel Hasteloy X e cobalto Ultimet, em estudos realizados por Dias [ 8 ] e Royse [ 9 ].

O modelamento estatístico apresentou boa precisão na previsão dos resultados e mostrou-se muito útil, como relatado com detalhes no primeiro parágrafo do item 3.6, através do mesmo pode-se estimar com confiança características metalúrgicas como área da ZF, fração volumétrica de ferrita, distribuição das bandas de ferrita, e microdureza Vickers para combinações de corrente de soldagem e temperatura de interpasse que não foram realizadas experimentalmente. A Figura 13 mostra o gráfico de valores medidos (em azul) vs valores calculados (em vermelho).

Figura 13
Valores medidos experimentalmente e previstos por interpolação pelo modelo estatístico para a fração de ferrita.

Os experimentos realizados nas juntas soldadas são insuficientes para determinar as melhores condições de soldagem, pois precisaria serem confirmados com ensaios mecânicos como tração e Charpy, entretanto com base apenas nas características metalúrgicas exploradas no presente trabalho, podemos afirmar que a amostra 8 apresenta as características mais favoráveis, portanto podemos indicar que estas condições seriam as mais adequadas para a soldagem dissimilar apresentada neste estudo.

4. Conclusões

Este estudo aborda a análise bem sucedida entre dois materiais dissimilares através do processo de soldagem TIG autógeno com multipasse utilizando correntes e temperaturas distintas pré estabelecidas pelo planejamento experimental. A seguir as principais conclusões do presente estudo:

  • Como analisado no último parágrafo do item 3.2 a área da ZF sofreu um aumento de até 250%;

  • A fração volumétrica de ferrita δ na região da ZF entre os ensaio sofreu um aumento de até 151%, como analisado no último parágrafo do item 3.3;

  • Como analisado no último parágrafo do item 3.4, a distribuição das bandas de ferrita apresentou um aumento no espaçamento entre os ensaios de até 146%;

  • A microdureza Vickers na região da ZF entre os ensaios com as variações dos parâmetros sofreu um aumento de até 24%, como analisado no último parágrafo do item 3.5.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2018
  • Aceito
    19 Out 2018
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