Resumos
A osteoporose, principalmente na pós-menopausa, apresenta alto impacto socioeconômico para o indivíduo e para a sociedade. Existem vários medicamentos para sua prevenção e tratamento; entretanto, observa-se ampla variação na eficácia e nos custos relacionados. Diversas avaliações econômicas têm sido conduzidas a fim de se avaliar as estratégias mais eficientes. O objetivo desse trabalho foi conduzir uma revisão sistemática das avaliações econômicas realizadas no Brasil e no mundo, enfocando o tratamento da osteoporose na pós-menopausa. Foi realizada uma busca de artigos sobre avaliação econômica de medicamentos para o tratamento da osteoporose na pós-menopausa, nas bases de dados PubMed e LILACS. No geral, os bisfosfonatos foram as estratégias mais avaliadas e que resultaram em melhores relações custo-efetividade incrementais. Terapia hormonal, suplementação de cálcio e vitamina D, ranelato de estrôncio, raloxifeno, teriparatida e denosumabe foram avaliados e apresentaram resultados variáveis dependendo da perspectiva adotada, do país e das premissas assumidas para cada estudo. Não foi possível extrapolar nenhum dos resultados para a população brasileira, limitando sua utilização pelos tomadores de decisão.
osteoporose; pós-menopausa; revisão; economia da saúde
Osteoporosis, especially in postmenopausal women, has a high socioeconomic impact on the individual and on the society. There are several drugs for its prevention and treatment; however, their effectiveness and costs vary considerably. Several economic assessments have been conducted in order to evaluate the most effective strategies. This study aimed at conducting a systematic review of complete economic assessments focusing on the treatment of postmenopausal osteoporosis performed in Brazil and worldwide. Articles about economic assessment of drugs for the treatment of postmenopausal osteoporosis were searched in the PubMed and LILACS databases. In general, bisphosphonates were the most frequently assessed strategies and had the best incremental cost-effectiveness ratios. Hormone therapy, vitamin D and calcium, strontium ranelate, raloxifene, teriparatide, and denosumab were assessed and showed variable results depending on the perspective of the country and the assumptions made for each study. None of the results could be extrapolated to the Brazilian population, which limits their use by decision makers.
osteoporosis; postmenopausal; review; health economics
ARTIGO DE REVISÃO
Análise farmacoeconômica das estratégias de tratamento da osteoporose em mulheres na pós-menopausa: uma revisão sistemática
Cristina Mariano Ruas BrandãoI; Gustavo Pinto da Matta MachadoII; Francisco de Assis AcurcioIII
IDoutora em Saúde Pública, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; Professora-Adjunta da Faculdade de Farmácia, UFMG; Analista de Gestão em Assistência à Saúde, Economia da Saúde, Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG
IIDoutor em Saúde Pública, UFMG; Professor do Departamento de Clínica Médica, UFMG
IIIPós-doutor em Economia da Saúde, Universitat Pompeu Fabra; Professor Titular da Faculdade de Farmácia, UFMG
Correspondência para Correspondência para: Cristina Mariano Ruas Brandão Gerência de Ensino e Pesquisa Alameda Álvaro Celso, 100 - Santa Efigênia CEP: 30150-260. Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: crisruasbrandao@yahoo.com.br
RESUMO
A osteoporose, principalmente na pós-menopausa, apresenta alto impacto socioeconômico para o indivíduo e para a sociedade. Existem vários medicamentos para sua prevenção e tratamento; entretanto, observa-se ampla variação na eficácia e nos custos relacionados. Diversas avaliações econômicas têm sido conduzidas a fim de se avaliar as estratégias mais eficientes. O objetivo desse trabalho foi conduzir uma revisão sistemática das avaliações econômicas realizadas no Brasil e no mundo, enfocando o tratamento da osteoporose na pós-menopausa. Foi realizada uma busca de artigos sobre avaliação econômica de medicamentos para o tratamento da osteoporose na pós-menopausa, nas bases de dados PubMed e LILACS. No geral, os bisfosfonatos foram as estratégias mais avaliadas e que resultaram em melhores relações custo-efetividade incrementais. Terapia hormonal, suplementação de cálcio e vitamina D, ranelato de estrôncio, raloxifeno, teriparatida e denosumabe foram avaliados e apresentaram resultados variáveis dependendo da perspectiva adotada, do país e das premissas assumidas para cada estudo. Não foi possível extrapolar nenhum dos resultados para a população brasileira, limitando sua utilização pelos tomadores de decisão.
Palavras-chave: osteoporose, pós-menopausa, revisão, economia da saúde.
INTRODUÇÃO
A osteoporose implica em aumento do risco de fraturas. A ocorrência de fraturas leva a consequências para o indivíduo e para a sociedade como um todo.1 As mulheres, especialmente após os 50 anos, são as mais vulneráveis a fraturas devido às alterações hormonais da pós-menopausa, responsáveis pela diminuição da massa óssea. O aumento da expectativa de vida, que ocorre em muitas partes do mundo, evidencia que as mulheres agora vivem mais de um terço de suas vidas após a menopausa, e que o número de mulheres na pós-menopausa está aumentando. No Brasil, por exemplo, em 1990, o número de mulheres com mais de 50 anos era de 10.345.440; 20 anos depois, esse número praticamente duplicou - e o número de mulheres é 18,0% maior que o número de homens.2 Essa é igualmente uma tendência em outros países da América e da Europa.1 Considerando-se o envelhecimento populacional, o aumento da expectativa de vida e a feminização das idades mais avançadas, torna-se grande o impacto socioeconômico da osteoporose.
Segundo o Latin American Vertebral Osteoporosis Study (LAVOS), estudo de base populacional, a prevalência de fraturas vertebrais radiográficas em mulheres nos países da América Latina é de 11,18% (IC: 9,23-13,4).3 Em estudo conduzido no Brasil, The Brazilian Osteoporosis Study (BRAZOS), encontrou-se prevalência de 15,1% de fraturas em mulheres e 6,0% de osteoporose.4 Lopes et al.5 encontraram que mulheres tiveram maior prevalência de fraturas osteoporóticas que homens. Os principais locais de acometimento foram: antebraço (6,0%), úmero (2,3%), fêmur (1,3%) e vértebras (1,1%). A prevalência é maior conforme o aumento da idade. Após os 40 anos, foi encontrada 33% de osteoporose e 11,5% de fraturas osteoporóticas.4
Os sítios anatômicos mais comumente associados à osteoporose são vértebras, quadris e punhos.1 Muitas fraturas vertebrais são assintomáticas e têm baixo impacto no uso de recursos em saúde; estima-se que somente 25% dessas fraturas sejam diagnosticadas clinicamente.6 Fraturas de quadris, geralmente no fêmur proximal, aumentam sua incidência conforme a idade e são associadas com significante redução na qualidade de vida e elevada mortalidade.7
Os custos da sociedade podem ser considerados diretos e indiretos e estão associados tanto à prevenção e ao tratamento da osteoporose quanto ao tratamento e à reabilitação das fraturas. Estudo conduzido no setor terciário avaliou os custos anuais da osteoporose em mulheres na pós-menopausa, sob a perspectiva da sociedade, e encontrou custo por paciente de 775 dólares ao ano (1998).8 O custo da terapia depende da estratégia de intervenção escolhida e da perspectiva analisada. Em Minas Gerais, por exemplo, os gastos médios mensais per capita com medicamentos para o tratamento da osteoporose, sob a perspectiva do Sistema Único de Saúde (SUS), foram de R$27,64 para pacientes que utilizaram alendronato, R$52,85 para os que utilizaram calcitriol, R$56,73 alfacalcidol, R$94,92 raloxifeno e R$132,75 para os que utilizaram calcitonina sintética de salmão.9
Estimativas de custos hospitalares para tratamento da fratura aguda do fêmur por osteoporose em dois hospitais paulistas conveniados ao SUS (Hospital Universitário e Santa Casa de Misericórdia) encontraram que a média do custo foi de R$8.266,25 e R$1.949,65, respectivamente. Entretanto, os autores consideram que os custos não correspondem à realidade, estando possivelmente subestimados devido às fontes e metodologias de avaliação dos custos.10 No sistema de saúde suplementar (privado), a estimativa de custo por tratamento de cada fratura foi de R$24.000,00.11
O objetivo do tratamento farmacológico é a redução da incidência de novas fraturas vertebrais e não vertebrais (principalmente de quadril), responsáveis pela morbidade associada à doença. A avaliação da eficácia não tem sido suficiente para a utilização desses fármacos no contexto do sistema público de saúde, levando-se em conta as limitações orçamentárias. Análises econômicas permitem a avaliação conjunta da efetividade e de distintos componentes relacionados ao custo. Diferentes abordagens metodológicas podem ser adotadas, levando-se em consideração principalmente a medida de resultados. Os tipos de estudos comumente utilizados em farmacoeconomia são os estudos de minimização de custos, custo-efetividade, custo-utilidade e custo-benefício. De acordo com o tipo de análise realizada, o benefício em saúde pode ser expresso em anos de vida salvos ou expectativa de vida, para estimar razões de custo-efetividade. Se a unidade de desfecho clínico ou efetividade utilizada for a preferência do paciente ou a qualidade de vida, então o estudo avalia razões de custo-utilidade. Se o estudo converte o desfecho clínico em dólares ou unidade monetária, a relação calculada é expressa como custo-benefício.12
Conforme seja definido o público do estudo, diferentes perspectivas de avaliação econômica podem ser adotadas, o que influenciará nos tipos de custos que serão mensurados. As perspectivas mais comumente utilizadas nesses estudos são aquelas que consideram o ponto de vista do paciente e da família, o dos hospitais, o do setor público, o das companhias de seguro ou o da sociedade como um todo.13
Os resultados nas avaliações econômicas comumente são expressos em razão média e razão adicional (incremental) de custo-efetividade. A razão custo-efetividade (RCE) é calculada dividindo-se o custo da estratégia farmacológica pelo benefício na saúde obtido com essa estratégia. A razão custo-efetividade incremental (RCEI) compara os custos adicionais de uma estratégia em relação à outra, comparando com a proporção adicional de efeitos, benefícios ou utilidades que oferecem. Enquanto a RCE enfoca uma estratégia específica, a RCEI avalia a diferença entre as duas estratégias farmacológicas, sendo, portanto, de maior aplicabilidade para tomada de decisão e, por isso, seu uso é recomendado nas análises de custo-efetividade e custo-utilidade.14 Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são consideradas custo-efetivas as estratégias terapêuticas cuja RCEI não ultrapasse o limiar de disponibilidade a pagar de três vezes o produto interno bruto per capita daquele país.15
As medidas de resultados utilizadas nas avaliações econômicas de custo-efetividade e custo-utilidade de medicamentos para o tratamento da osteoporose são geralmente apresentadas em termos de fraturas evitadas, anos de vida ganhos (AVG) ou anos de vida ajustados pela qualidade (AVAQ ou QALY -Quality adjusted life years). Os AVAQ incorporam não só os anos de vida ganhos (quantidade), como também a qualidade de vida correspondente. Essa medida de efetividade é relevante nas situações em que existe um aumento da sobrevida em condições de saúde que não são ideais ou quando terapias não alteram a sobrevida, mas somente a qualidade de vida.14 Seu uso tem se mostrado muito útil para estimar doenças crônicas, como a osteoporose.16
Análises econômicas têm sido conduzidas para subsidiar os tomadores de decisão quanto ao valor das alternativas terapêuticas disponíveis, com o intuito de prover uma alocação eficiente dos recursos para alcançar o máximo benefício nos cuidados de saúde. Essas avaliações incorporam tanto as diferenças na eficácia dos medicamentos quanto a variação nos custos com o tratamento da osteoporose.
Dados de eficácia de medicamentos podem ser transferíveis de uma localidade para outra. Entretanto, em avaliações econômicas em saúde, existem inúmeras razões que dificultam a generalização de resultados. Aspectos relacionados à validade externa, como as diferenças das estimativas de efetividade e custos entre populações, devem ser considerados antes de utilizar os resultados de avaliações econômicas obtidas em diferentes países. Até mesmo estudos conduzidos dentro de uma mesma localidade podem gerar resultados que não devem ser confrontados quando existem diferenças na perspectiva da avaliação.13 Apesar disso, a apreciação desses estudos pode ser útil no direcionamento das análises, fornecendo uma visão abrangente de aspectos relevantes para condução de estudos de custo-efetividade e custo-utilidade. Nessa perspectiva, o objetivo desse trabalho foi conduzir uma revisão sistemática das avaliações econômicas completas, realizadas no Brasil e no mundo, enfocando o tratamento da osteoporose na pós-menopausa.
MATERIAIS E MÉTODOS
Critérios de busca
Foi realizada uma busca de artigos sobre avaliação econômica de medicamentos para o tratamento da osteoporose na pósmenopausa, na base de dados PubMed por meio do programa Jabref versão 2.6. As seguintes palavras-chave foram utilizadas: {osteoporosis} and ({postmenopausal} or {post-menopausal}) and ({cost effectiveness} or {cost benefit} or {cost utility} or {economic evaluation}). Os critérios de busca foram aplicados aos títulos e resumos.
Adicionalmente, realizou-se uma busca de estudos conduzidos no Brasil na base de dados da LILACS, com as palavraschave {osteoporosis or osteoporose} and ({postmenopausal} or {post-menopausal} or {pós-menopausa} or {pós menopausa}).
Também foi realizada uma busca manual em revistas nacionais não indexadas. Não houve restrição de data da publicação de artigos; a busca foi feita até abril de 2012.
Critérios de inclusão e exclusão
Os critérios de seleção dos artigos foram os seguintes: a) ser uma avaliação econômica completa (custo-efetividade, custo-utilidade ou custo-benefício); b) o estudo ter sido conduzido em população com osteoporose pós-menopausa; c) ter avaliado medicamentos para o tratamento da osteoporose.
Os critérios de exclusão foram: a) tratamento de osteoporose após câncer de mama; b) população de mulheres com osteopenia; c) avaliação econômica parcial; d) comparação de estratégias de triagem clínica.
Seleção dos estudos
A análise dos títulos e resumos quanto aos critérios de elegibilidade foi realizada por dois revisores independentes. Nos casos discordantes, estes foram analisados por um terceiro revisor.
Apresentação dos resultados
Depois de aplicados os critérios de elegibilidade, realizou-se uma leitura minuciosa dos artigos e os dados foram agrupados em duas tabelas descritivas. Para facilitar a comparação entre os dados, determinou-se, a partir dos estudos, autores e ano do estudo, local onde o estudo foi realizado, perspectiva do estudo, moeda em que foi apresentado o resultado, taxa de desconto utilizada, população-alvo, intervenção analisada, horizonte temporal, instituição dos autores, desfecho, RCEI, e informações a respeito dos conflitos de interesse com a indústria farmacêutica. Para apresentação dos resultados, considerou-se a ordem de publicação dos estudos.
RESULTADOS
A partir dos critérios de busca, foram encontrados 170 títulos e resumos de estudos na base de dados PubMed. Na LILACS foram encontrados 69 artigos, e um na busca manual. De acordo com os critérios de elegibilidade, 210 títulos e resumos foram excluídos, principalmente por não se tratarem de avaliações econômicas (n = 143), avaliação de estratégias de rastreamento (n = 23) e outros motivos (n = 44). Permaneceram 30 estudos para a revisão farmacoeconômica.
Dentre os 30 artigos apresentados, cinco foram publicados em 2006 e 2008 (cada) e quatro em 2010; três em 2003, 2004 e 2011; dois em 2002 e 2007; e um em 1998, 1999 e 2005. Foram encontrados estudos de custo-efetividade e custo-utilidade. Todos os resultados foram apresentados em RCEI, com exceção de Borgström et al.,17 que apresentaram os resultados somente em custos/QALY. Para padronização dos resultados, em um dos estudos incluídos, foi necessário calcular o valor de RCEI a partir dos dados de custo e efetividade informados em tabelas.18 Todos os dados relevantes referentes aos estudos selecionados estão apresentados na Tabela 1 e na Tabela 2.
Alguns termos comumente utilizados em farmacoeconomia foram utilizados neste estudo e carecem de definições para melhor entendimento do texto. "Estratégia dominante" refere-se a uma estratégia terapêutica comparada que é mais efetiva e mais barata que a estratégia padrão de comparação. Consequentemente, a estratégia dominada deve ser descartada. "Estratégias cost-saving" estão relacionadas àquelas que produzem economia de recursos; no caso da osteoporose, os custos com o tratamento medicamentoso são menores que os custos decorrentes das fraturas evitadas; portanto, seu uso é altamente recomendado.
Os bisfosfonatos foram as estratégias terapêuticas mais avaliadas. A maioria dos estudos encontrou eficácia no tratamento com esses medicamentos e RCEI dentro dos limiares de disponibilidade a pagar de cada país.19-31 A exceção deu-se em três estudos: Escolar et al.,32 que concluíram que o alendronato não foi custo-efetivo frente ao placebo para prevenção de fraturas de quadris; Silva et al.,33 que questionaram a utilização dos bisfosfonatos tendo em vista os recursos escassos em saúde pública; e Kanis et al.,34 cujo estudo encontrou que os custos excederam o limiar de custo-efetividade do país.
Na comparação de diferentes bisfosfonatos, Grima et al.35 encontraram que o risedronato apresentou melhor RCEI que o alendronato; Araújo et al.36 encontraram dominância do ácido zoledrônico em relação ao risedronato na prevenção de fraturas de fêmur; Tosteson et al.29 encontraram que risedronato e alendronato foram custo-efetivos no tratamento da osteoporose, mas o ibandronato foi dominado (a mais cara e menos efetiva das alternativas). Berto et al.31 observaram que o risedronato foi custo-efetivo nas faixas etárias de 65-74 anos e foi dominado em relação ao alendronato após os 75 anos - ou seja, apresentou maior custo e menor efetividade que o alendronato.
Observou-se discrepância no estudo de Kanis et al.,34 em que os autores concluíram que, no cenário-base (mulheres com osteoporose pós-menopausa estabelecida aos 70 anos), o tratamento foi custo-efetivo, considerando-se um limiar de custo-efetividade de 30.000 por AVAQ ganho. Todavia, os resultados mostraram que a estratégia de tratamento farmacológico foi dominada em relação a não tratar com medicamentos - ou seja, observou-se maior custo (10.674 vs. 10.471) e menor efetividade (8.598 vs. 8.699 AVAQ) com o tratamento.
No estudo realizado pelo Health Technology Assessment, órgão inglês de avaliação de tecnologias, não se recomenda tratamento farmacológico aos 50 anos de idade. Aos 60 anos, recomenda-se raloxifeno ou não tratamento, nessa ordem de RCEI. Aos 70, não tratar, alendronato e risedronato, etidronato, raloxifeno e estrogênio. Aos 80 anos, alendronato, risedronato, etidronato, raloxifeno, estrogênio ou não tratamento. Em mulheres com osteoporose sem fraturas prévias, as intervenções custo-efetivas, aos 70 anos, foram raloxifeno ou o não tratamento. Aos 80 anos, alendronato, risedronato, raloxifeno, etidronato e não tratamento.19
Earnashaw et al.28 realizaram um estudo comparando as frequências de administração mensal e semanal de bisfosfonatos para estimar o efeito da adesão ao tratamento na RCE. A administração mensal de medicamentos foi a intervenção mais custo-efetiva, por apresentar maior adesão.
Cinco estudos avaliaram o uso da teriparatida. Esse medicamento não foi considerado custo-efetivo em nenhuma das faixas etárias analisadas19,29 em população com e sem fraturas.29 Liu et al.26 relataram que o uso de teriparatida por dois anos não foi uma escolha racional. Com a utilização de teriparatida por dois anos, seguido de alendronato por cinco anos, os custos foram menores e houve maior incremento de AVAQ.26 O uso de alendronato isoladamente ainda apresentou melhor RCEI.26 Somente Lundkvist et al.,18 que compararam a teriparatida a não fazer nada, encontraram que o medicamento é custo-efetivo em populações com fraturas prévias, de 69 anos e densidade mineral óssea (DMO) com T-score -3. Outro estudo comparou a teriparatida com o paratormônio 1-84 (PTH 1-84) e encontrou que a primeira foi mais custo-efetiva que a segunda; a teriparatida também foi mais custo-efetiva que o não tratamento.17
Três estudos avaliaram o uso de terapia hormonal (TH). Todos encontraram boa RCE, mas chamam atenção para o risco aumentado de câncer de mama.20,33,37 Lekander et al.,37 que consideraram resultados do Women's Health Initiative (WHI), concluíram que a TH é custo-efetiva para pacientes histerectomizadas, independente de presença ou não de fraturas prévias. Para mulheres com útero preservado e sem fraturas prévias, não tratamento farmacológico foi a opção preferida. Todavia, os bisfosfonatos têm mostrado redução similar no risco de fraturas quando comparados com a TH, sem aumentar o risco de eventos adversos, mesmo para as histerectomizadas.37
Quatro avaliações econômicas continham o raloxifeno, e duas o consideraram custo-efetivo: Borgström et al.,38 em pacientes sem fraturas a partir de 60 anos, e Stevenson et al.,19 em pacientes com fraturas prévias a partir dos 60 anos e em pacientes sem fraturas prévias a partir dos 70 anos. Brecht et al.39 e Goeree et al.25 compararam bisfosfonatos com raloxifeno, tendo concluído que os bisfosfonatos foram mais custo-efetivos.
Quatro estudos abordavam o ranelato de estrôncio. Em uma análise conduzida em diferentes países, os autores concluíram que o medicamento foi custo-efetivo em mulheres com 70 anos com fraturas prévias, mas não nas sem fraturas, já que ultrapassou o limiar de disponibilidade a pagar em alguns países (superior a 40.000 por AVAQ ganho).40 Hiligsmann et al.41,42 encontraram que o medicamento foi custo-efetivo, comparando-se ao placebo e ao risedronato aos 70, 75 e 80 anos.
Em relação à suplementação de cálcio e vitamina D, Rosner et al.16 incluíram em sua avaliação um grupo no qual os pacientes utilizavam cálcio por um período, comparando a outras estratégias terapêuticas. O cálcio não se mostrou custo-efetivo devido à alta incidência de fraturas vertebrais nesse grupo. Willis et al.,43 que compararam a estratégia de cálcio associado à vitamina D em pacientes de 70 anos, encontraram que o medicamento é cost saving em relação a não oferecer tratamento farmacológico. Silva33 encontrou essa alternativa com a melhor RCEI dentre as analisadas.
Hiligsmann e Reginster44 realizaram uma avaliação de custo-efetividade comparando o denosumabe ao não tratamento farmacológico. Como o medicamento não estava disponível para comercialização à época do estudo, os preços foram baseados no valor comercializado para o risedronato e dois cenários, de -15% e +15%. O denosumabe foi custo-efetivo em todos os cenários, considerando-se uma disponibilidade a pagar de 35.000 por AVAQ ganho. Jönsson et al.45 constataram que, apesar de o denosumabe ter apresentado maior custo de tratamento que as alternativas analisadas, resultou em melhor RCEI devido ao maior número de fraturas evitadas. Os autores consideram este medicamento administrado por via parenteral como uma alternativa ao tratamento farmacológico por via oral, já que a adesão ao tratamento é um dos grandes problemas da efetividade em pacientes com alto risco de fraturas. O denosumabe mostrou-se custo-efetivo em comparação aos bisfosfonatos (alendronato - genérico e de marca - e risedronato) aos 70 anos.46
Dos estudos analisados, 80% declararam existência de conflitos de interesses com a indústria farmacêutica e somente seis não apresentam representantes da indústria entre os autores.
Desconto é um método usado para ajustar custos futuros e benefícios a seus valores de mercado atuais. A taxa de desconto é a taxa na qual custos e benefícios futuros são ajustados para refletir seu valor presente. Diferentes taxas de desconto são utilizadas no mundo. As taxas de desconto utilizadas para os custos variaram de 1,5%-6,0% e, nos resultados, de 0,0%-6,0%. As taxas mais utilizadas foram de 3,0% tanto para os custos quanto para os efeitos.
DISCUSSÃO
Observou-se grande variabilidade metodológica dos estudos de avaliação econômica que abordam a osteoporose na pós-menopausa. E isso ocorreu tanto por questões próprias de cada país, como os fatores demográficos e epidemiológicos, fatores associados a sistemas e serviços de saúde (perspectiva do estudo), referentes aos preços, à valoração dos estados de saúde pela população (utilidade); quanto por fatores inerentes à modelagem econômica, em que foram assumidas diferentes premissas na tentativa de aproximação da realidade. Todos os estudos utilizaram os critérios diagnósticos propostos pela OMS. A maioria dos estudos considerou coortes de mulheres osteoporóticas com e sem fraturas prévias. Lundkvist et al.,18 que compararam a teriparatida com a opção de não oferecer tratamento medicamentoso, consideraram apenas indivíduos com T-score -3. Os resultados foram considerados válidos somente para essa população.
A maioria dos estudos que comparou estratégias terapêuticas com não oferecer tratamento medicamentoso encontrou uma RCEI razoável, de acordo com a disponibilidade a pagar de cada país. As intervenções terapêuticas tornaram-se mais custo-efetivas com o aumento da idade, redução da DMO e presença de fraturas prévias. Nesse sentido, observa-se que a combinação de fatores clínicos de risco com a medida da densidade óssea do fêmur, conforme preconizado pelo FRAXTM, é uma estratégia importante para definição dos candidatos ao tratamento.47 Recentemente, foi criado e validado no Brasil um instrumento que pretende prever o risco de fraturas a partir de fatores de risco: The São Paulo Osteoporosis Risk Index (SAPORI). Sua utilização poderá otimizar o início do tratamento farmacológico, além de reduzir custos com o diagnóstico, uma vez que o médico estabelecerá critérios de solicitação do exame de densitometria ao ponderar quantitativamente os fatores clínicos de risco.48
Estudo conduzido por entidade espanhola questiona a eficiência na utilização de medicamentos para a prevenção da ocorrência de fraturas. Como as fraturas tendem a acontecer em idades mais avançadas, consideram controverso iniciar uma terapia aos 50 anos para prevenção de eventos que ocorrerão somente na sétima ou oitava década da vida.49
Os bisfosfonatos são os medicamentos mais utilizados para o tratamento da osteoporose e foram as estratégias terapêuticas mais avaliadas. Entretanto, apesar de sua ampla utilização e de as avaliações econômicas demonstrarem que a utilização dessa classe de medicamentos representa estratégia custoefetiva, têm surgido informações sobre os efeitos adversos graves associados ao seu uso, o que levou a Food and Drug Administration (FDA), órgão público dos Estados Unidos, a rever a segurança desses medicamentos. Embora rara, a osteonecrose de mandíbula continua sendo uma das complicações regularmente citadas.50,51 Também têm sido identificadas na literatura complicações oftálmicas e dermatológicas. O FDA emitiu um alerta sobre dor óssea grave, fibrilação atrial e fratura induzida pelos bisfosfonatos (fratura subtrocantérica ou atípica).52 Alguns estudos contemplaram os custos decorrentes das reações adversas mais frequentes no modelo econômico, que são as reações gastrintestinais com os bisfosfonatos. Considerando-se a importância dos novos efeitos adversos citados, novos estudos devem ser conduzidos para avaliar a segurança desses medicamentos. Caso haja importância clínica e aumento significativo nos custos com o manejo das reações, novos estudos de custo-efetividade devem ser conduzidos para avaliar se haverá alteração da direção dos resultados.
Os dois estudos que compararam o uso de teriparatida com os bisfosfonatos encontraram que os bisfosfonatos foram mais custo-efetivos.19,29A teriparatida mostrou-se mais custo-efetiva quando o PTH (1-84)17 e a não oferta de tratamento farmacológico foram utilizados como comparadores.18
Quanto à TH, seu benefício para prevenção e tratamento da perda óssea na pós-menopausa e para alívio dos sintomas vasomotores associadas ao climatério é bem estabelecido.53 Assim, a TH é uma opção atrativa para o tratamento dos sintomas relacionados à pós-menopausa e apresenta boa RCE.20,33,37 Entretanto, devido à capacidade de modular a fisiologia e ao risco de doenças em outros tecidos, sua segurança deve sempre ser cuidadosamente considerada antes da prescrição.54
Apesar da ausência de efeito do raloxifeno na redução das fraturas de quadris e em outras fraturas não vertebrais, este agente tem se mostrado custo-efetivo quando comparado aos pacientes sem tratamento, sem fraturas prévias e a partir de 60 anos.38 Também foi custo-efetivo em pacientes com fraturas prévias a partir dos 60 anos e em pacientes sem fraturas prévias a partir dos 70 anos.19 O medicamento não foi considerado custo-efetivo quando comparado aos bisfosfonatos.23,25 Os resultados favoráveis ao raloxifeno devem-se, em parte, ao perfil de redução do risco de câncer de mama apresentado pelo medicamento e aos comparadores utilizados (pacientes sem tratamento).
Quanto ao ranelato de estrôncio, esse agente se mostrou custo-efetivo apenas em algumas faixas: mulheres com 70 anos ou mais e com fraturas prévias.40-42 Avaliações adicionais a respeito desse medicamento são necessárias para analisar os efeitos vasculares e neurológicos, além de diarreia, associados ao seu uso.55
O uso de vitamina D isoladamente não foi custo-efetivo.20 Todavia, Silva33 concluiu ser esta a opção mais custo-efetiva em situações de recursos escassos. Willis et al.43 observaram que seu uso é mais custo-efetivo que não oferecer tratamento farmacológico.
O denosumabe é um medicamento novo, e os estudos que o avaliaram encontraram boa RCE.44-46 Todavia, apesar de estudos demonstrarem eficácia desse medicamento no tratamento da osteoporose, atentam para a ocorrência de reações adversas, inclusive na pele, que devem ser mais bem estudadas para se avaliar a segurança do medicamento.56-58
Considerando-se as especificidades do envelhecimento populacional no Brasil, que apresenta expectativa de vida em torno de 76,7 anos,59 menor que em países desenvolvidos, onde geralmente ela é maior que 80 anos, os resultados de avaliações econômicas conduzidas em países desenvolvidos devem ser apreciados com cautela no contexto brasileiro. Além disso, outros fatores, como a presença de conflitos de interesses, pode influenciar os resultados, levando à condução de estudos com desenhos ou interpretação de resultados de forma tendenciosa.
No Brasil, somente dois estudos foram realizados. Silva33 apresentou um estudo preliminar de custo-efetividade com o objetivo de suscitar as discussões acerca da disponibilização de estratégias terapêuticas para o tratamento da osteoporose no país. Entretanto, para doenças em que a sequência de eventos após a intervenção é constante ao longo do tempo, é necessário utilizar o modelo de Markov para simulação dos resultados, e não a árvore de decisão, conforme utilizado pelo autor. Araújo et al.36 realizaram um estudo sob a perspectiva do sistema suplementar de saúde, considerando o ácido zoledrônico para a prevenção de fratura proximal do fêmur em faixa etária específica (65 anos). Nesse cenário, o medicamento apresentou-se mais custo-efetivo; entretanto, os resultados não podem ser extrapolados para outros sistemas de saúde (público ou sob a perspectiva social) e essa mesma relação pode não ser válida para as fraturas de quadris, vertebrais ou não vertebrais.
No Brasil, a farmacoeconomia é uma área muito recente e essencial para auxiliar nas tomadas de decisão, principalmente no nível das políticas públicas de saúde. Estudos de custoefetividade que abordem a perspectiva do SUS podem ser úteis para a definição da idade em que é mais custo-efetivo iniciar o tratamento e quais estratégias terapêuticas apresentam maior RCEI. Procurando homogeneizar a condução dos estudos de avaliação econômica no Brasil e permitir a comparabilidade entre eles, o Ministério da Saúde elaborou as diretrizes metodológicas para avaliações econômicas, que devem ser seguidas. Ademais, devem-se estabelecer os custos das estratégias terapêuticas adotando essa perspectiva, utilizar um sistema de custo de internações hospitalares decorrentes das fraturas osteoporóticas que permita incluir não só os custos com medicamentos e materiais médico-hospitalares como também os honorários da equipe de saúde e administrativa, depreciação de equipamentos, limpeza, energia elétrica e outros. Reconhecemse as dificuldades da elaboração dos custos, mas também a importância desses estudos para as tomadas de decisão no contexto brasileiro. Os estudos conduzidos em outros países não podem ser extrapolados para a realidade brasileira, tendo em vista as peculiaridades de cada sistema de saúde, a extensão das taxas de desconto utilizadas e aos fatores epidemiológicos e demográficos de cada país.
CONCLUSÃO
O uso de estudos de avaliação econômica, principalmente estudos de custo-efetividade, tem sido cada vez mais frequente para apoiar a tomada de decisão quanto às políticas de saúde, incorporação de novas tecnologias, implementação de programas preventivos e desenvolvimento de diretrizes assistenciais na área da saúde, inclusive na abordagem da osteoporose.
No geral, os bisfosfonatos foram as estratégias mais avaliadas e que resultaram em melhores RCEI. TH, suplementação com vitamina D, ranelato de estrôncio, raloxifeno, teriparatida e denosumabe foram analisados e apresentaram resultados variáveis dependendo da perspectiva, do país e das premissas assumidas para cada estudo. Não foi possível extrapolar nenhum dos resultados para a população brasileira no contexto do SUS, limitando sua utilização pelos tomadores de decisão.
Recebido em 13/10/2011.
Aprovado, após revisão, em 05/09/2012.
Os autores declaram a inexistência de conflito de interesse.
Suporte Financeiro: CMRB foi bolsista de doutorado pela Fapemig; FAA é bolsista de produtividade em Pesquisa nível II do CNPq e do Programa de Pesquisador Mineiro da Fapemig.
Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG.
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Correspondência para:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Dez 2012 -
Data do Fascículo
Dez 2012
Histórico
-
Recebido
13 Out 2011 -
Aceito
05 Set 2012