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Resenha da obra "Pesquisa em Educação: Métodos e Epistemologias" de Silvio Sánchez Gamboa

Review of the book "Research in education: methods and epistemologies" by Silvio Sanchéz Gamboa

Reseña del libro "Investigación en educación: métodos y epistemologías" de Silvio Sanchéz Gamboa

GAMBOA, Silvio Sánchez. Pesquisa em Educação:. métodos e epistemologias. 3. ed.Chapecó: Argos, 2018

Apresenta-se a resenha da obra Pesquisa em educação: métodos e epistemologias, de autoria de Silvio Ancisar Sánchez Gamboa, o qual era docente da Universidade Estadual de Campinas, graduado em Filosofia, mestre e doutor em Educação. Sánchez Gamboa realizou diversas pesquisas sobre temas relacionados aos fundamentos, epistemologias e teorias da Educação e da Educação Física. Falecido recentemente, em novembro de 2022, há que se destacar tal obra como um de seus legados, visto que ela já teve três edições publicadas (2007, 2012 e 2018) pela editora Argos da Universidade Comunitária Regional de Chapecó.

A obra é organizada com um texto introdutório, dez capítulos e considerações finais, com artigos e comunicações de diversos países. Os três primeiros capítulos reúnem concepções básicas de investigação, métodos e epistemologias. Os outros sete apresentam resultados de investigações sobre cursos de pós-graduação na área de Educação. Os textos têm em comum a problemática da pesquisa em Educação, a partir das bases epistemológicas, articulando-se em torno da análise da prática investigativa e reflexão crítica. Salienta-se que cada capítulo nos incita a refletir sobre o anterior e sua circularidade com os próximos, fazendo com que haja uma fluidez durante a leitura.

Destaca-se, como importância da obra, a contribuição apresentada sobre a reflexão, além do aprofundamento atinente aos métodos e epistemologias implicadas na pesquisa educacional. Não como um tratado a explicitar somente os diversos tipos de metodologias, mas no contexto de um olhar sobre as problemáticas das pesquisas científicas dispostas na literatura, centralizando aspectos teórico-metodológicas sob o viés positivista, considerando inútil uma discussão centrada apenas em explicações de métodos/metodologias. Somos incitados na leitura acerca desta problemática quando da afirmação que a maioria dos textos publicados pode ser classificada em três grupos: numerosos manuais que explicam técnicas investigativas que indicam procedimentos e formas de elaboração de instrumentos; obras de elevado nível teórico-filosófico sobre a problemática do conhecimento; informes de resultados de investigações com articulações entre técnicas, métodos, teorias, pressupostos epistemológicos e filosóficos.

Logo no primeiro capítulo, o autor destaca justificativas para estudos epistemológicos sobre a multiplicidade de caminhos e oposições sobre a produção científica. Para isso, são apontados questionamentos sobre métodos utilizados e abordagens das problemáticas investigativas em Educação. Acerca deste debate, a autora Gatti (2001)GATTI, Bernardette A. Implicações e perspectivas da pesquisa educacional no Brasil contemporâneo. Cadernos de Pesquisa, n. 113, p. 65-81, 2001. https://doi.org/10.1590/S0100-15742001000200004
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200100...
, que também discorreu sobre as implicações da pesquisa educacional no Brasil, apresenta-nos problemáticas semelhantes às trazidas por Sánchez Gamboa, apontando a dificuldade de se constituírem categorias teóricas mais consistentes que abarquem a complexidade das questões educacionais.

A leitura põe-nos diante dessas complexidades, debatendo o conceito de investigação e reflexão sobre seu sentido e como a epistemologia tem o papel de interrogar tal atividade. Logo, o autor segue no próximo capítulo elaborando dimensões epistemológicas e circunstâncias que justificaram a gênese do enfoque epistemológico, sua lógica na pesquisa e riscos. Percebe-se a justificativa da análise epistemológica, o que nos direciona a um emaranhado lógico, sugerindo que tal enfoque funcione como exercício de vigilância e revisão do próprio conhecimento, delimitando situações práticas como a problemática da pesquisa e leitura de outros trabalhos que se relacionem com a produção científica e a classificação do problema de estudo.

O terceiro capítulo faz uma exibição do rápido aumento da produção científica com base nos cursos de pós-graduação na América Latina, em que surge a necessidade do estudo da qualidade das produções. Para isto, expõe um instrumental que foi denominado de "matriz paradigmática", permitindo explicar aspectos ontológicos, gnosiológicos e epistemológicos, bem como revelar os pressupostos da prática investigativa. A matriz busca recuperar a lógica essencial da pesquisa, que seria a relação básica entre uma pergunta, originada em um problema, e indagações que ganham a possibilidade de serem respondidas. Tais questionamentos orientam o processo de pesquisa, assim é produzida uma resposta. É necessário esclarecer que esse modelo não é definitivo, demonstrando a posição crítica do autor ao apresentar um modelo próprio que abre espaço a outras reflexões.

O quarto capítulo, intitulado "Do esquema paradigmático à matriz epistemológica: sistematizando novos níveis de análise", é a singularidade da terceira edição, tendo sido escrito com a colaboração de Régis Henrique Reis da Silva, também docente da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Somos conduzidos à análise epistemológica da produção científica e reconstituição (baseada na "matriz paradigmática" e nas dimensões internas que recuperam as dimensões externas) de um novo esquema: a matriz epistemológica. Com as alterações desenvolvidas nesse instrumental de análise teórico-filosófica, os autores articularam a dimensão histórica entre os níveis, pressupostos e elementos histórico-sociais da produção em análise.

No próximo capítulo são discutidas questões sobre a formação e congruência das abordagens empírico-analíticas, fenomenológico-hermenêuticas e crítico-dialéticas. O debate debruça-se em considerar que a formação não deve ter apenas competência técnica, mas relacionar métodos, pressupostos teóricos e epistemológicos que fundamentam o processo investigativo, mostrando-nos que a falta da formação filosófica reduz a problemática da pesquisa a uma simples questão técnica. É necessário citar nesse debate a inter-relação com Goldenberg (2011)GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais. 12. ed. Rio de Janeiro: Record, 2011., que menciona que os estudos epistemológicos revelam que fazer ciência é superar regras preestabelecidas, incluindo a curiosidade de um olhar ávido. O autor fortalece tal modo de validação à inerência da pesquisa com a reflexão do fazer científico.

O sexto capítulo versa sobre a qualificação das pesquisas e a importância de um diagnóstico para tal, colocando-nos em posição de refletir sobre estratégias de inovação. Com isso, ressalta-se a ausência de um estatuto epistemológico próprio em que os fenômenos educativos resultem na aplicação de categorias fundadas em disciplinas específicas, fazendo com que o campo da Educação seja inundado por princípios e métodos de outras áreas, constituindo o que o autor nomeou de "colonialismo epistemológico".

Destarte, o sétimo capítulo trata da relação entre pressupostos gnosiológicos, abordagens epistemológicas e teorias da Educação utilizadas nas pesquisas. É defendida a prática de uma teoria do conhecimento no processo investigativo, na qual todo paradigma epistemológico se embasa, tendo um enfoque epistemológico fundante para toda forma de investigar.

É necessário considerar as articulações realizadas entre as abordagens teórico-metodológicas e os pressupostos utilizados na investigação. Tal feito é realizado no oitavo capítulo, no qual, com base nos pressupostos elencados, é possível ver os nexos entre os métodos utilizados e os desdobramentos filosóficos.

Já o nono capítulo apresenta os conceitos de tempo e história presentes nas investigações, partindo da historiografia da Educação como crítica epistemológica e ideológica, para considerar o caráter sócio-histórico dos fenômenos educacionais. Constatamos que dependendo do método utilizado há ausência de tais fenômenos ou desprezo por eles.

O penúltimo capítulo delineia os argumentos sobre as limitações de alguns modelos teóricos e a exposição de reflexões no âmbito da ética e da Filosofia da Educação, retornando ao debate sobre a crítica positivista, indagando se existe uma perspectiva ética traçada pelo pesquisador com abordagem teórico-metodológica. O que nos leva a considerar que o pesquisador não é racionalmente neutro, pois tem consciência dos interesses que direcionam sua investigação. Assim, a partir da tomada de consciência é possível recuperar a dimensão ética dos processos científicos realizados.

Por fim, as Considerações Finais evidenciam a amplitude e complexidade dos caminhos do conhecimento científico, que não implicam apenas a leitura de manuais metodológicos, mas a articulação da prática da pesquisa e a realização de uma autocrítica sobre os fundamentos epistemológicos e filosóficos.

Ao longo de toda a obra, percebe-se a preocupação com a maneira de fazer ciência, na qual o autor dá ênfase aos Programas de Pós-Graduação na área de Educação. É problematizado, até mesmo, que a prática investigativa é vista como requisito acadêmico para a aquisição de titulação ou ascensão universitária. O diferencial em relação às outras obras do autor é a discussão dos elementos epistemológicos nas pesquisas, em que são sublinhados os problemas epistemológicos, o método e suas tipologias.

A leitura convida-nos a reflexionar sobre a investigação científica na área de Educação, perspectivando uma sobrelevação da visão positivista. Sua relevância assenta-se na apresentação da superação de problemas decorrentes de um menor comprometimento teórico em algumas pesquisas, como graves incoerências epistemológicas que comprometem a qualidade e a validade dos conhecimentos apresentados.

A leitura pode ser realizada tanto por iniciantes quanto pelos mais experientes na pesquisa, pois a obra não dá um direcionamento único nem se desenha como um manual a seguir, mas incita a refletir sobre quais caminhos podem ser traçados, debruçando-se sobre diversos enfoques no contexto educacional.

  • Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

REFERÊNCIAS

  • GAMBOA, Silvio Sánchez. Pesquisa em Educação: métodos e epistemologias. 3. ed. Chapecó: Argos, 2018.
  • GATTI, Bernardette A. Implicações e perspectivas da pesquisa educacional no Brasil contemporâneo. Cadernos de Pesquisa, n. 113, p. 65-81, 2001. https://doi.org/10.1590/S0100-15742001000200004
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742001000200004
  • GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais. 12. ed. Rio de Janeiro: Record, 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2023
  • Revisado
    05 Jun 2023
  • Aceito
    15 Jun 2023
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