Resumos
Objetivou-se no presente trabalho estudar aspectos da predação entre larvas de Chrysoperla externa e Ceraeochrysa cubana, sob condições de laboratório, verificando a sobrevivência desses predadores nos diferentes ínstares, quando mantidos nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3. De modo geral, C. externa apresentou maior sobrevivência, independente do ínstar e da proporção de adensamento entre indivíduos. Ao contrário, C. cubana foi fortemente afetada pela interação com C. externa, tendo sua capacidade de sobrevivência reduzida com o aumento da proporção de adensamento e com o desenvolvimento larval. No final da fase larval, verificou-se uma taxa de sobrevivência próxima a 96, 90 e 95%, e 56, 23 e 9% para C. externa e C. cubana nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3 indivíduos, respectivamente.
Controle biológico; crisopídeos; predação intraguilda
This work aimed to study aspects of predation among Chrysoperla externa and Ceraeochrysa cubana larvae under laboratory conditions. The survival of those predators in different larval stages was studied, maintaining the larvae grouped in proportions of 1:1, 2:2 and 3:3 individuals. C. externa presented higher survival rates, independently of larval ínstar and density proportion among individuals. On the other hand, C. cubana was strongly affected by interaction with C. externa, and had its survival capacity reduced with the increase of grouping proportion and larval development. At the end of larval phase, a survival rate around 96, 90, and 95 and 56, 23 and 9% for C. externa and C. cubana in proportions of 1:1, 2:2 and 3:3 individuals, respectively, was verified.
Biological control; lacewings; intraguild predation
CIÊNCIAS AGRÁRIAS
Aspectos da predação entre larvas de Chrysoperla externa (Hagen, 1861) e Ceraeochrysa cubana (Hagen, 1861) (Neuroptera: Chrysopidae) em laboratório
Predation among Chrysoperla externa (Hagen, 1861) AND Ceraeochrysa cubana (Hagen, 1861) (Neuroptera: Chrysopidae) larvae under laboratory conditions
Brígida SouzaI; Renildo Ismael Félix CostaII; Ricardo Lima TanqueIII; Patrícia de Souza OliveiraIV; Fabíola Alves SantosIV
IDoutora, Professora – Departamento de Entomologia/DEN – Universidade Federal de Lavras/UFLA – Cx. P. 3037 37200-000 – Lavras, MG – brgsouza@ufla.br
IIDoutor, Professor – Fundação Educacional de Machado/FEM – Centro de Ensino Superior e Pesquisa/CESEP – Avenida Doutor Athayde Pereira de Souza, 730 – Cx. P. 37 – 37750-000, Machado, MG – renildoc@gmail.com.br
IIIBiólogo, Mestrando em Entomologia – Departamento de Entomologia/DEN – Universidade Federal de Lavras/UFLA – Cx. P. 3037 – 37200-000 – Lavras, MG – ricardotanque@ig.com.br
IVGraduandas em Engenharia Agronômica – Departamento de Entomologia/DEN – Universidade Federal de Lavras/UFLA – Cx. P. 3037 – 37200-000 – Lavras, MG – paty.souz@bol.com.br
RESUMO
Objetivou-se no presente trabalho estudar aspectos da predação entre larvas de Chrysoperla externa e Ceraeochrysa cubana, sob condições de laboratório, verificando a sobrevivência desses predadores nos diferentes ínstares, quando mantidos nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3. De modo geral, C. externa apresentou maior sobrevivência, independente do ínstar e da proporção de adensamento entre indivíduos. Ao contrário, C. cubana foi fortemente afetada pela interação com C. externa, tendo sua capacidade de sobrevivência reduzida com o aumento da proporção de adensamento e com o desenvolvimento larval. No final da fase larval, verificou-se uma taxa de sobrevivência próxima a 96, 90 e 95%, e 56, 23 e 9% para C. externa e C. cubana nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3 indivíduos, respectivamente.
Termos para indexação: Controle biológico, crisopídeos, predação intraguilda.
ABSTRACT
This work aimed to study aspects of predation among Chrysoperla externa and Ceraeochrysa cubana larvae under laboratory conditions. The survival of those predators in different larval stages was studied, maintaining the larvae grouped in proportions of 1:1, 2:2 and 3:3 individuals. C. externa presented higher survival rates, independently of larval ínstar and density proportion among individuals. On the other hand, C. cubana was strongly affected by interaction with C. externa, and had its survival capacity reduced with the increase of grouping proportion and larval development. At the end of larval phase, a survival rate around 96, 90, and 95 and 56, 23 and 9% for C. externa and C. cubana in proportions of 1:1, 2:2 and 3:3 individuals, respectively, was verified.
Index terms: Biological control, lacewings, intraguild predation.
INTRODUÇÃO
As populações naturais são dinâmicas, sendo constantemente modificadas com relação ao seu tamanho e composição dos organismos. A demografia de cada população é determinada pelas características adaptativas de cada espécie que lhes permite a colonização, sobrevivência e reprodução num determinado habitat mediante as interações com outras populações do ecossistema e com o ambiente. As principais interações entre espécies são predação ou parasitismo, competição e mutualismo (PHOOFOLO & OBRYCKI, 1998). Quando as adaptações de duas espécies forem similares e os recursos forem insuficientes para manter suas populações, poderá ocorrer competição (GLIESSMAN, 2001). A quarta interação que pode influenciar a estrutura de uma comunidade é a combinação entre predação e competição conhecida como predação intraguilda (BRODEUR et al., 2002; COLFER & ROSENHEIM, 2001; PHOOFOLO & OBRYCKI, 1998; ROSENHEIM et al., 1993; VENZON et al., 2001).
Na América Neotropical, Chrysoperla externa (Hagen, 1861) e Ceraeochrysa cubana (Hagen, 1861) apresentam grande potencial para utilização em programas de controle biológico pela eficiência na regulação natural de artrópodes-praga, em diversos agroecossistemas (ALBUQUERQUE et al., 2001; FREITAS & SCALOPPI, 1996; SANTA-CECÍLIA et al., 1997; SOUZA & CARVALHO, 2002). As larvas dessas espécies são vorazes, podendo alimentar-se de diferentes tipos de presas. Para garantir sua perpetuação em situações de escassez de alimento é natural, entre os predadores da família Chrysopidae, o consumo de ovos, larvas ou pupas de co-específicos (CANARD & DUELLI, 1984; COSTA et al., 2003).
Os crisopídeos apresentam estratégias de defesa que os preservam da predação intra e inter-específica, mesmo em ambientes mais abertos como é o caso dos ecossistemas agrícolas. No entanto, existe uma variação entre as espécies com relação aos mecanismos empregados. Os insetos do gênero Chrysoperla Steinmann, 1964 apresentam o corpo descoberto (larvas não-lixeiras ou "not trash-carriers"). Para defenderem-se podem utilizar a estratégia da fuga, por causa da sua agilidade, ou esconderem-se em pequenas fendas. Além disso, podem lançar uma secreção repelente, exsudada pelo ânus, quando submetidas à situações de risco iminente (LAMUNYON & ADAMS, 1987). Esses mecanismos não são comumente observados nas espécies do gênero Ceraeochrysa Adams, 1982, cuja principal estratégia de defesa consiste no hábito de cobrirem-se com uma infinidade de pequenos fragmentos como pedaços de folhas, gravetos, carcaças das presas consumidas, musgos, etc. Esse comportamento deu origem ao nome vulgar "bicho lixeiro" (do inglês "trash-carrier" ou "debris-carrying") que é empregado não apenas para as espécies de Ceraeochrysa, mas também para as larvas de outros gêneros que apresentam característica semelhante como, por exemplo, Chrysopodes Navás, 1913 e Leucochrysa McLachlan, 1868. Além de conferir proteção física (CANARD & DUELLI, 1984), essa estratégia também configura um tipo de camuflagem nas larvas, dando a elas a aparência com alguns elementos da vegetação, sobretudo quando se trata de florestas naturais ou cultivos de plantas arbustivas.
Tendo em vista a possível perda de eficiência dos insetos entomófagos decorrente da predação intraguilda e o reflexo dessa perda na regulação natural de pragas ou em programas de controle biológico. Objetivou-se neste trabalho estudar aspectos da predação entre C. externa e C. cubana nos diferentes estádios larvais, submetidas a três proporções de adensamento, sob condições de laboratório.
MATERIAL E MÉTODOS
Os ensaios foram realizados a 25 ± 2oC, 60 ± 10% de UR e fotofase de 12 horas. Larvas de C. externa e C. cubana, com até 24 horas de idade, foram agrupadas nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3 em placas de Petri de 5 cm de diâmetro, forradas com papel de filtro. Em cada placa foram colocados ovos da traça-dos-cereais, Anagasta kuehniella (Zeller, 1879) (Lepidoptera: Pyralidae), fornecidos ad libitum para a alimentação das larvas. Utilizou-se o delineamento inteiramente casualizado com três tratamentos, representados pelos níveis de adensamento das larvas, em parcela subdividida no tempo, representada pelo estádio larval em que se encontrava o predador. Avaliou-se, em 30 repetições, a predação intraguilda, verificando-se a capacidade de sobrevivência de cada espécie de predador nas diferentes proporções de adensamento, no decorrer dos ínstares. Os dados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Scott-Knott a 5% de probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Avaliando-se as opções de agrupamento, constatou-se que o aumento no adensamento dos indivíduos afetou negativamente C. cubana, aumentando a exposição das larvas à predação por C. externa. A mortalidade das larvas de C. cubana acentuou-se na medida em que avançavam os ínstares, tornando o número de sobreviventes dessa espécie inferior àquele estabelecido originalmente para cada tratamento, exceto na proporção 1:1, durante o primeiro e segundo ínstares, nos quais a sobrevivência de C. cubana não foi alterada (Figura 1).
Por outro lado, não foi observada influência dos tratamentos no comportamento de C. externa, de modo que as larvas desse predador apresentaram um índice de sobrevivência bem próximo das proporções originais, independente do nível de agrupamento ou estádio de desenvolvimento larval (Figura 2).
Comparando a capacidade de competição entre as duas espécies, verificou-se que C. externa apresentou um melhor desempenho em relação a C. cubana, apresentando maior sobrevivência em todas as proporções testadas, com exceção às condições 1:1 e 2:2, durante o primeiro estádio larval, e da proporção 1:1, no segundo estádio, onde não houve diferença significativa entre as espécies (Figura 3). No final da fase, verificou-se um índice de sobrevivência próximo a 96, 90 e 95%, e 56, 23 e 9% para C. externa e C. cubana nas proporções de 1:1, 2:2 e 3:3 indivíduos, respectivamente.
Considerando que nas parcelas experimentais havia disponibilidade de ovos de A. kuehniella, descaracterizando uma situação de escassez de recursos alimentares que resulta na competição entre espécies, pode-se inferir que a principal causa de mortalidade de C. cubana foi a predação intraguilda.
De modo semelhante, Rosenheim et al. (1993) observaram a ocorrência de interações negativas entre inimigos naturais do pulgão Aphis gossypii Glover, 1877 (Hemiptera: Aphididae), considerando que hemípteros predadores generalistas constituíram-se numa importante causa de mortalidade de larvas de Chrysoperla carnea (Stephens, 1836). Além disso, não foi observada nenhuma ação independente entre os predadores de modo a se obter um efeito aditivo (sinergismo) na supressão da praga. Ao contrário, a interação entre eles ocasionou o aumento da densidade de afídeos, através do efeito conhecido como cascata trófica (COLFER & ROSENHEIM, 2001).
Com relação às estratégias de defesa, observou-se que as larvas de C. cubana utilizaram o córion dos ovos d e A. kuehniella como proteção, por ser a matéria mais abundante nas unidades experimentais. No entanto, evidenciou-se que esse mecanismo não foi suficiente para impedir a predação por C. externa. Cabe ressaltar que o fato de não haver uma maior diversidade de fragmentos para servir de proteção às larvas de C. cubana pode ter restringido sua capacidade de defesa.
De acordo com Magalhães et al. (2004), os predadores afetam a população da presa não apenas pela mortalidade causada nessa população, mas também por sua capacidade de desenvolver estratégias anti-predação, defendendo-se ou escapando da predação intraguilda. Dessa forma, C. externa seria mais eficiente que C. cubana na regulação natural de pragas, com igualdade de condições.
Em ambientes naturais, foi possível perceber uma co-ocorrência espacial (no mesmo agroecossistema) e temporal (na mesma estação do ano) de C. externa e C. cubana em cultivos de cafeeiro, no Sul de Minas Gerais (Costa, 2006). No entanto, deve-se ressaltar que, em laboratório, amplifica-se a possibilidade de encontros entre as larvas dos predadores por causa do confinamento dos indivíduos. Além disso, mesmo em se tratando de espécies que são encontradas no mesmo nicho, o comportamento inerente a cada uma delas, associado aos fatores ambientais, pode aumentar o grau de isolamento temporal e/ou espacial, fazendo com que cada espécie intensifique a exploração de um determinado habitat, em diferentes estações do ano. Corroborando essa hipótese, Souza & Carvalho (2002) revelaram que, apesar de C. externa estar presente em vários cultivos agrícolas, sua densidade populacional intensifica-se no período entre maio e outubro, sendo sua presença dificilmente detectada nos demais meses do ano. No entanto, os estudos que tratam do comportamento de populações de crisopídeos, sob condições naturais, ainda são escassos.
CONCLUSÃO
A predação intraguilda constituiu uma importante causa de mortalidade para C. cubana, no entanto, não afetou significativamente a população de C. externa, independente do ínstar e da proporção de adensamento entre indivíduos. Esses resultados representam mais um passo para o entendimento das possíveis interações entre as espécies desses predadores.
(Recebido em 20 de outubro de 2005 e aprovado em 17 de novembro de 2006)
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- COSTA, R. I. F.; CARVALHO, C. F.; SOUZA, B.; LORETI, J. Influência da densidade de indivíduos na criação de Chrysoperla externa (Hagen, 1861) (Neuroptera Chrysopidae). Ciência e Agrotecnologia, Lavras, p. 1539-1545, 2003. Edição especial.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
07 Jul 2008 -
Data do Fascículo
Jun 2008
Histórico
-
Aceito
17 Nov 2006 -
Recebido
20 Out 2005