Resumo
O objetivo foi analisar a associação entre o apoio social, autoeficácia e o tempo de prática de atividade física de diferentes intensidades (leve, moderada, vigorosa) e avaliar se essas associações são moderadas pelo estado nutricional dos adolescentes. Estudo transversal, com 650 adolescentes (10-14 anos de idade, 52,9% do sexo feminino) de João Pessoa-PB. O apoio social foi mensurado por uma escala com cinco itens para cada fonte de apoio (pai, mãe e amigos) e a autoeficácia com escala de quatro itens. O tempo de atividade física foi mensurado por meio de acelerômetro e o estado nutricional determinado a partir do índice de massa corporal. Na análise de regressão linear múltipla o apoio social dos amigos se associou de forma positiva e significativa com o tempo de prática de atividade física de intensidade moderada (β=2,67; IC95%: 0,28; 5,07). O estado nutricional não moderou a associação do apoio social e da autoeficácia com o tempo de atividade física (p>0,05). Adolescentes que percebiam receber mais apoio social dos amigos apresentaram maior prática de atividade física de intensidade moderada, independentemente do seu estado nutricional.
Palavras-chave: Atividade motora; Apoio social; Autoeficácia; Adolescentes
Abstract
The scope of this paper is to analyze the association between social support, self-efficacy and practice time of physical activity of different intensity (light, moderate, vigorous) and evaluate if these associations are moderated by the nutritional status of adolescents. It involved a cross-sectional study with 650 adolescents (10-14 years old, 52.9% female) from João Pessoa, State of Paraíba. Social support was measured by a scale with five items for each source of support (father, mother and friends) and self-efficacy, with a scale of four items. The physical activity time was measured by means of an accelerometer and the nutritional status was assessed by body mass index. The results of the multiple linear regression analysis showed that social support of friends was positively and significantly associated with moderate intensity physical activity time (β=2.67; CI95%: 0.28; 5.07). The nutritional status did not moderate the association of social support and self-efficacy with the duration of physical activity (p>0.05). The conclusion drawn is that adolescents who perceived that they are receiving more social support from friends tend to practice more moderate intensity physical activity, irrespective of their nutritional status.
Key words: Motor activity; Social support; Self-efficacy; Adolescents
Introdução
A quantidade de estudos para identificar os fatores correlatos e/ou determinantes da atividade física em adolescentes tem crescido de forma expressiva nas últimas duas décadas1,2. Entretanto, recomenda-se, além de identificar esses fatores/determinantes, analisar se as suas relações com a prática de atividade física variam com as características dos adolescentes (identificar moderadores)1.
O apoio social e a autoeficácia para a prática de atividade física estão entre os fatores associados a maiores níveis de atividade física1,2; essas associações têm sido moderadas pelo sexo e pela idade dos adolescentes3, mas uma possível moderação pelo estado nutricional foi pouco investigada, e os resultados dos estudos foram controversos4-8.
O apoio social para a prática de atividade física é uma forma de assistência que auxilia na manutenção e/ou adoção desse comportamento, podendo ser fornecido por diversas fontes (por exemplo, pais, amigos) e de diferentes formas (emocional, instrucional e instrumental)9. A autoeficácia refere-se à crença que a pessoa tem quanto a sua capacidade para adotar e/ou manter determinada prática de atividade física diante da presença de barreiras/dificuldades10.
A prevalência de excesso de peso corporal em adolescentes é elevada: cerca de 50% em países de renda alta e 21% em países de renda baixa-média11. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE, 2015) indicaram que 23,7% dos adolescentes brasileiros têm excesso de peso, sendo 26,9% na região Nordeste12. Em geral, adolescentes com excesso de peso subestimam as suas habilidades para a prática de atividade física e esportes13, têm mais interações sociais negativas14, são menos ativos fisicamente15, pertencem a famílias de condições socioeconômicas mais baixas12, percebem mais barreiras e menos apoio social para a prática de atividade física8. Sendo assim, é possível que as associações entre apoio social, autoeficácia e prática de atividade física variem de acordo com o estado nutricional.
Os resultados dos estudos sobre o papel moderador do estado nutricional na associação do apoio social e da autoeficácia com a prática de atividade física em adolescentes ainda são inconsistentes4-8. Os estudos identificados foram realizados com adolescentes de faixa etária restrita4, 7, do sexo feminino4,8, mensuraram a atividade física com questionário6,8, e os que utilizaram acelerômetros não analisaram as atividades de intensidade leve4,5,7. Desse modo, este estudo analisou as associações entre o apoio social, a autoeficácia e o tempo de prática de atividade física em diferentes intensidades (leve, moderada, vigorosa); e avaliou se elas eram moderadas pelo estado nutricional dos adolescentes.
Métodos
Estudo transversal que analisou dados da linha de base do Estudo Longitudinal sobre Comportamento Sedentário, Atividade Física, Alimentação e Saúde dos Adolescentes Estudo (LONCAAFS), que teve como população-alvo os adolescentes de ambos os sexos, matriculados no 6° ano do ensino fundamental de escolas públicas de João Pessoa, em 2014. Informações detalhadas sobre o LONCAAFS estão em outra publicação16. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal da Paraíba.
Para o cálculo de tamanho da amostra do LONCAAFS, foram adotados os seguintes parâmetros: população de referência igual a 9.520 escolares no 6° ano do ensino fundamental de escolas públicas da cidade de João Pessoa-PB; prevalência do desfecho igual a 50% - projeto com múltiplos desfechos, como no caso do LONCAAFS, esse procedimento permite alcançar uma amostra de maior tamanho para um mesmo de erro amostral máximo aceitável; intervalo de confiança de 95%; erro máximo aceitável de quatro pontos percentuais; efeito de desenho (deff) igual a dois17. Com base nesses parâmetros, o tamanho mínimo da amostra foi de 1.130 adolescentes. Foram acrescidos 40% para compensar possíveis perdas e recusas durante os quatro anos de coleta de dados, resultando em uma amostra de 1.582 adolescentes.
No presente estudo, foram utilizados dados de uma subamostra de adolescentes que utilizou acelerômetro, representando aproximadamente 70% dos casos da amostra. Para tanto, selecionaram-se aleatoriamente 17 das 28 escolas da amostra, distribuídas proporcionalmente por região geográfica (norte, sul, leste e oeste) e número de escolares no 6º do ensino fundamental, em cada escola. A utilização de acelerômetro em uma subamostra foi decorrente do número de equipamentos disponíveis, de membros na equipe de coleta de dados e do tempo disponível para tal. Entretanto, essa subamostra manteve a mesma distribuição proporcional dos escolares observadas na população e amostra, e não apresentou diferenças significativas nas variáveis estudadas em comparação aos dados da amostra16. Informações detalhadas sobre a amostragem estão apresentadas na Figura 1.
A coleta de dados foi realizada de fevereiro a junho e de agosto a dezembro de 2014, na escola, por equipe treinada; consistiu na aplicação de questionário, por entrevista “face a face”, realização de medidas antropométricas e uso de acelerômetros.
As variáveis sociodemográficas analisadas foram sexo (masculino e feminino); idade centesimal (diferença entre a data de nascimento e a data de coleta de dados, agrupada em 10-11 e 12-14 anos); classe econômica (critérios da ABEP18, que agrupa as pessoas nas classes “A” a “E”, posteriormente reagrupadas em “A/B” [classe alta] e “C/D/E” [média-baixa]); e escolaridade da mãe (fundamental incompleto, fundamental completo, médio completo ou superior).
O apoio social foi mensurado por meio de uma escala19 de cinco itens para cada fonte de apoio (pai, mãe e amigos). Os adolescentes informaram a frequência (nunca=1, raramente=2, frequentemente=3 ou sempre=4) com que o pai, a mãe e os amigos forneciam algum tipo de apoio social durante uma semana típica, por exemplo: “Durante uma semana normal com que frequência seu [pai/mãe/amigos] ... [incentiva, pratica junto, transporta/convida, assiste e comenta] você a praticar atividade física?”. Foram produzidos escores de apoio social para cada fonte de apoio, baseados no somatório das respostas dos itens das respectivas escalas, os quais variaram de 5 (menor nível) a 20 pontos (maior nível de apoio social).
A autoeficácia foi mensurada por escala19 de quatro itens, e os adolescentes referiam o quanto se percebiam capazes de praticar atividade física na maioria dos dias da semana na presença de barreiras (sim=2 e não=1), por exemplo: “Você conseguiria praticar atividade física ou esportes na maioria dos dias da semana, mesmo que não tivesse ninguém para ir com você?”. Foram produzidos escores de autoeficácia com base no somatório da resposta de cada item, os quais variaram de 4 (menor nível) a 8 (maior nível de autoeficácia).
As escalas de apoio social e de autoeficácia apresentaram níveis satisfatórios de fidedignidade (apoio social - Alpha de Cronbach: pai=0,75; mãe=0,80; amigo=0,77; coeficiente de correlação intraclasse: pai=0,80; mãe=0,78; amigo=0,75; autoeficácia - Índice de fidedignidade combinada=0,38; Kappa Pabak=0,68) e de validade de construto (análise fatorial confirmatória: apoio social - cargas fatoriais >0,59; autoeficácia - cargas fatoriais de 0,33 a 0,38)19.
A medida da massa corporal foi realizada em balança digital, e a da estatura, em estadiômetro. Foram realizadas três medidas, e o valor médio foi adotado como resultado para fins de análise. A partir do índice de massa corporal (IMC - massa corporal [kg] / estatura [m]²), determinado com base nas medidas de massa e estatura, os adolescentes foram classificados como “sem excesso de peso” (baixo peso + peso normal) e “com excesso de peso” (sobrepeso + obesidade), conforme critérios da Organização Mundial da Saúde20.
A atividade física e o comportamento sedentário foram mensurados por meio de acelerômetros da Actigraph GT3X+. O adolescente foi orientado a utilizá-lo por sete dias consecutivos, fixado no lado direito da cintura por cinto elástico, retirando-o para dormir, tomar banho, realizar atividades aquáticas e lutas com quedas (devido ao risco de lesão). Na redução dos dados, foi utilizado o programa ActiLife 6.12, conforme os critérios que seguem: usar por pelo menos oito horas por dia, três ou mais dias da semana, sendo pelo menos um dia de final de semana16, epoch de 15 segundos e período de não uso de 60 minutos ou mais com zeros consecutivos. Os pontos de corte de Evenson et al.21 foram utilizados para definir o tempo em comportamento sedentário: ≤100 counts/minuto; atividade física leve: 101-2.295 counts/minuto; moderada: 2.296-4.011 counts/minuto; vigorosa: ≥4.012 counts/minuto; moderada a vigorosa: ≥2.296 counts/minuto.
Na determinação do tempo de comportamento sedentário e de atividade física de diferentes intensidades (leve, modera e vigorosa), em horas por dia, calculou-se a média ponderada: tempo médio (hora/dia) em dias de semana (segunda a sexta-feira) multiplicado por 5, e por 2 para os dias de final de semana (sábado e/ou domingo), dividindo-se o somatório por 7 (obter o tempo em minutos/dia).
Os critérios de exclusão adotados foram: estar fora da faixa etária de interesse do estudo (<10 e >14 anos de idade); ter alguma deficiência que impedisse ou limitasse a prática de atividade física ou resposta ao questionário; não atender aos critérios de redução dos dados do acelerômetro; não ter realizado as medidas de estatura e/ou massa corporal e; não ter respondido as questões sobre apoio social e autoeficácia.
Na análise descritiva dos dados, foi utilizada a distribuição por frequência para as variáveis qualitativas, e a média e o desvio padrão para as quantitativas. A regressão linear bruta e ajustada foi utilizada para associar o apoio social do pai, da mãe e dos amigos e a percepção de autoeficácia (variáveis independentes) ao tempo de atividade física leve, moderada, vigorosa e moderada a vigorosa (variáveis dependentes). O método utilizado na seleção das variáveis para o modelo ajustada foi o Forward, e os potenciais fatores de confusão utilizados foram sexo, idade, classe econômica, índice de massa corporal (quando não estava sendo tratado como moderador) e comportamento sedentário.
Para testar a presença de interação entre o estado nutricional (IMC), apoio social e autoeficácia, foi criado um termo de interação multiplicando o escore de cada fonte de apoio e de autoeficácia pelo estado nutricional do adolescente, por exemplo: apoio social do pai * estado nutricional (com excesso de peso corporal=1 e sem excesso de peso corporal=0). Valores de p<0,05 para o coeficiente de regressão do termo de interação indicaram a presença de interação. No caso de interação presente, as análises seriam estratificadas pelo estado nutricional, permitindo avaliar a magnitude e o sentido da associação do apoio social e da autoeficácia com a atividade física entre esses dois grupos. As análises foram realizadas no Stata 13. O nível de significância foi de p<0,05; o intervalo de confiança, de 95%.
Resultados
Para o presente estudo, foram selecionados 1.046 adolescentes, sendo que 152 foram considerados como perdas e 244 foram excluídos, resultando em uma amostra final de 650 adolescentes. A proporção de adolescentes excluídos das análises por não atenderem aos critérios de redução dos dados do acelerômetro foi maior nos que tinham de 12 a 14 anos de idade (38,7%) comparativamente aos de 10 a 11 anos (19,3%, p=0,02). Porém, não foram identificadas diferenças significativas (p≥0,05) para o apoio social, a autoeficácia e o tempo de prática de atividade física (dados não apresentados em tabelas).
A amostra do presente estudo foi composta por adolescentes de 10 a 14 anos de idade, de ambos os sexos. A maioria era do sexo feminino (52,9%) e pertencia à classe econômica média-baixa (63,6%), cerca de um terço era filho de mães que concluíram pelo menos o ensino médio. Verificou-se que 35,5% tinham excesso de peso corporal, tempo médio de atividade física moderada-vigorosa de 202,5 minutos por semana (desvio padrão=137,9) e 7 horas por dia (desvio padrão=2,1) de tempo em comportamentos sedentários (Tabela 1). O tempo médio de uso do acelerômetro por dia foi de 12 horas (desvio padrão=3,0) (dados não apresentados em tabelas).
Na análise bruta, o apoio social dos amigos (atividade física moderada: β=3,79; IC95%: 1,77; 5,80 e atividade física moderada-vigorosa: β=4,32; IC95%: 1,72; 6,92) e a autoeficácia (atividade física moderada: β=10,80; IC95%: 3,33; 18,29 e atividade física moderada-vigorosa: β=11,92; IC95%: 2,28; 21,56) associaram-se de forma positiva e significativa com o tempo de prática de atividade física (Tabela 2).
Na análise ajustada, apenas o apoio social dos amigos se manteve associado ao tempo de prática de atividade física moderada (β=2,67; IC95%: 0,28; 5,07). O estado nutricional não apresentou interação significativa (p≥0,05) com o apoio social e a autoeficácia na associação com o tempo de prática de atividade física de diferentes intensidades (Tabela 2). Cálculos realizados a posteriori indicaram que a amostra deste estudo (n=650 adolescentes) apresentou poder estatístico igual a 1,0 (1-Beta), para todos os modelos de regressão (considerando valores dos coeficientes de regressão - R2, variando de 0,14 a 0,25, com 14 variáveis preditoras em cada um, e nível de significância de 5%).
Discussão
Adolescentes que recebiam mais apoio social dos amigos apresentaram maior tempo de prática de atividade física de intensidade moderada. O apoio social dos pais e a percepção de autoeficácia não se associaram ao tempo de prática de atividade física para todas as intensidades. A hipótese de que o estado nutricional dos adolescentes seria um moderador da associação entre apoio social, autoeficácia e prática de atividade física não foi confirmada no presente estudo.
O apoio social fornecido pelos pais e os amigos e a percepção de autoeficácia têm sido consistentemente associados a maiores níveis de prática de atividade física em adolescentes1,2. Aumentos nos níveis de apoio social e de autoeficácia, em resposta às ações desenvolvidas em intervenções, têm sido acompanhados de aumentos na prática de atividade física dos adolescentes1. Esses achados reforçam a importância desses dois construtos para a prática de atividade física em adolescentes.
No presente estudo, apenas o apoio social dos amigos se associou a um maior tempo de prática de atividade física de intensidade moderada dos adolescentes. Esse resultado pode estar relacionado ao fato de que, com o passar da idade, os adolescentes passam a ter maior convívio e praticar suas atividades físicas em companhia dos amigos9. O apoio social dos amigos pode aumentar em até três vezes as chances de os adolescentes serem fisicamente mais ativos22. Desse modo, o apoio social desse grupo social parece exercer maior influência na atividade física dos adolescentes comparativamente ao dos pais, sobretudo com o passar da idade na adolescência9,22.
Os amigos podem influenciar a prática de atividade física dos seus pares adolescentes por diferentes formas/meios: norma social - os adolescentes praticam determinadas atividades físicas para poder fazer parte ou pertencer ao grupo social dos seus amigos; apoio social - são estabelecidas ou fortalecidas as relações de amizade entre os que compartilham as práticas de atividade física23; modelagem do comportamento - sentem-se atraídos para iniciar uma prática de atividade física porque os amigos estão envolvidos. A prática de atividade física dos amigos passa a atuar como modelo de comportamento entre os adolescentes24.
A ausência de associação entre o apoio social dos pais (pai e mãe) e o tempo de prática de atividade física pode ter ocorrido devido ao grupo estudado pertencer, predominantemente, a famílias de baixo nível socioeconômico. Pais com menor nível de escolaridade, fenômeno frequentemente identificado nesses estratos socioeconômicos, podem ter menor preocupação e atenção com a prática de atividade física de seus filhos devido à elevada carga de trabalho semanal e/ou ao menor nível de conhecimento sobre a importância de tal prática para a saúde25; e menor condição econômica para disponibilizar equipamentos, materiais e oportunidades de prática para os seus filhos26. Destaca-se, ainda, o fato de que pais mais pobres são fisicamente menos ativos, e o nível de atividade física deles está associado ao dos seus filhos1,26.
O nível socioeconômico está associado às condições de infraestrutura do bairro em que os adolescentes residem. Famílias de condições socioeconômicas mais baixas residem em bairros com menor infraestrutura para a prática de atividade física, como, por exemplo, locais e equipamentos para a prática, segurança27. Desse modo, os pais tenderiam a fornecer menos apoio para a prática de atividade física em função dessas condições ambientais mais adversas.
Outro fator a ser considerado é que as atividades físicas em que os adolescentes de baixo nível socioeconômico estão mais envolvidos não dependem de locais, equipamentos e incentivos específicos para a sua prática26. No presente estudo, a medida de atividade física considerou as atividades praticadas no lazer, na escola, nas aulas de educação de física e como forma de deslocamento. É possível que a maior parte do tempo de prática desses adolescentes seja em atividades físicas que não necessitem de apoio social dos pais: atividades nas aulas de educação física, deslocamento a pé ou de bicicleta para ir à escola e retornar para casa, brincadeiras e jogos ao ar livre.
No presente estudo, a autoeficácia não se associou à atividade física, contrariando os resultados de estudos prévios com adolescentes2,3. É possível que isso tenha ocorrido devido à escala utilizada para mensurar a autoeficácia, que, apesar de ter níveis satisfatórios de reprodutibilidade, alcançou baixos níveis de consistência interna e validade. As barreiras para a prática de atividade física que foram utilizadas para compor os itens da escala podem não ser representativas dos adolescentes que fizeram parte deste estudo. Desse modo, os níveis de autoeficácia não refletiriam as percepções dos adolescentes quanto a sua capacidade de superar barreiras para serem fisicamente ativos. Outra explicação é que as atividades físicas mais praticadas por eles podem não exigir a superação de barreiras que são identificadas para outras atividades físicas como, por exemplo, atividades físicas no lazer, esportes estruturados e exercícios físicos em academias28.
O estado nutricional dos adolescentes não moderou a associação do apoio social e da autoeficácia com o tempo de atividade física, sugerindo que as possíveis influências desses construtos sobre a atividade física têm o mesmo sentido e magnitude em adolescentes com e sem excesso de peso corporal, e independentemente do sexo dos adolescentes.
Ao contrário do que foi observado no presente estudo, a autoeficácia tem se mostrado associada a maior tempo de prática de atividade física de intensidade moderada-vigorosa em adolescentes com e sem excesso de peso, independentemente da medida de atividade física5,6,8. As mesmas explicações que foram apresentadas para a ausência de associação entre o apoio social, a autoeficácia e atividade física podem ser aplicadas para esses resultados: perfil socioeconômico, as atividades físicas mais praticadas pelos adolescentes do presente estudo e a escala de autoeficácia utilizada. Desse modo, a autoeficácia não se mostrou um preditor da atividade física, e sem diferenças em termos de possíveis influências na prática de atividade física dos adolescentes com e sem excesso de peso corporal.
Os resultados disponíveis até o momento indicam que adolescentes que recebem mais apoio social dos amigos apresentam maior prática de atividade física, independentemente do seu estado nutricional1,2, corroborando os resultados do presente estudo. Este é um achado importante para a promoção da prática de atividade física, tendo em vista que o apoio social dos amigos é um dos principais preditores dessa prática1, e a atividade física tem importante papel na prevenção, no controle e tratamento do excesso de peso e da obesidade2. Desse modo, favorecer o apoio social dos amigos é uma das formas de aumentar o nível de atividade física dos adolescentes de diferentes estados nutricionais. Além de promover vários benefícios para a saúde, isso pode ajudar na redução e no controle do excesso de peso e/ou obesidade, bem como dos problemas de saúde associados a essa condição.
Mais estudos precisam ser conduzidos para avaliar o possível papel moderador do estado nutricional na influência do apoio social e da autoeficácia na prática de atividade física dos adolescentes. Esses estudos precisam considerar diferentes tipos de prática de atividade física, de fontes e tipos de apoio social, e as escalas de autoeficácia devem conter barreiras para prática de atividade física representativas da faixa etária e das atividades físicas mensuradas, envolvendo adolescentes de diferentes condições socioeconômicas.
Dentre as limitações do presente estudo, destacam-se estas: presença de um possível viés de seleção, devido à maior proporção de adolescentes de 12 a 14 anos de idade que não cumpriram os critérios de redução dos dados do acelerômetro, comparativamente aos de 10 a 11 anos. No entanto, não foram observadas diferenças significativas nas variáveis apoio social, autoeficácia e nível de atividade física entre os incluídos e excluídos nas análises. O fato de não se ter incluído escolares da rede privada pode ter contribuído para maior homogeneidade nos resultados da condição socioeconômica, prática de atividade física, apoio social e autoeficácia dos adolescentes. A escala de autoeficácia apresentou baixos níveis de consistência interna e de validade, o que pode ter colaborado para a ausência de associações significativas. Esses fatores podem ter contribuído para a ausência de associação entre o apoio social dos pais e a autoeficácia com a prática de atividade física dos adolescentes; bem como para a ausência de interação entre autoeficácia e apoio social com o estado nutricional dos adolescentes.
Dentre os pontos fortes deste estudo, destacam-se os seguintes: uso de amostra representativa e com poder estatístico adequado (1-beta igual ou superior a 80%) para testar as hipóteses; utilização de instrumentos previamente validados, aplicados por equipe treinada e que não conhecia as hipóteses do estudo; a atividade física foi mensurada por meio de acelerômetro, evitando viés de memória e de mensuração, tendo em vista que adolescentes com excesso de peso tendem a superestimar o tempo de atividade física comparativamente aos de peso normal29.
Adolescentes que recebiam mais apoio social dos amigos apresentaram maior tempo de prática de atividade física, independentemente do seu estado nutricional (com ou sem excesso de peso corporal). No entanto, o apoio social dos pais e a autoeficácia não se associaram ao tempo de prática de atividade física. Os achados do presente estudo sugerem que intervenções para aumentar a atividade física com foco no apoio social dos amigos devem incluir ações similares para adolescentes com diferentes estados nutricionais.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Set 2021 -
Data do Fascículo
Set 2021
Histórico
-
Recebido
23 Nov 2019 -
Aceito
29 Jul 2020 -
Publicado
31 Jul 2020