Acessibilidade / Reportar erro

Atenção Primária à Saúde no Norte e Nordeste do Brasil: mapeando disparidades na distribuição de equipes

Resumo

Objetiva-se analisar o padrão espacial de implantação de equipes da Atenção Primária à Saúde (APS) no Norte e Nordeste do Brasil em 2017. Estudo ecológico das taxas de Agentes Comunitários de Saúde (ACS), equipes Saúde da Família (eSF), equipes Saúde Bucal (eSB) e Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF), a partir de dados do Ministério da saúde (MS). A análise dos dados de área permitiu a identificação de padrões de dependência espacial dos municípios para as taxas, utilizando os índices e mapas de Moran para visualizar clusters de áreas críticas (95% de confiança). Os municípios do Norte (n=450) e Nordeste (n=1.794) apresentaram 132,2 mil ACS, 18,4 mil eSF, 13 mil eSB e 2,2 mil NASF. A proporção de municípios com taxas dentro do preconizado pelo MS: ACS (>1,33/mil) 96% no Norte e 98,5% no Nordeste; eSF (>2,9/10 mil) 54% e 80% nas respectivas regiões; eSB (>2,9/10 mil) 28% e 59% nestas respectivas regiões. Equipes NASF foram implantadas em 70% do Norte e 89% do Nordeste. Exceto ACS, a região Norte constituiu-se em área crítica de equipes, principalmente no Pará, Rondônia, Amazonas e Amapá. No Nordeste, essas áreas foram menores e concentradas a oeste da Bahia e leste do Maranhão. O Nordeste exibiu melhor composição de equipes e menor extensão de áreas críticas.

Palavras-chave:
Atenção Primária à Saúde; Mão de obra em saúde; Análise espacial

Abstract

This study analyzes the spatial pattern of implementation of Primary Health Care (PHC) teams in Northern and Northeastern Brazil. This is an ecological study on the rates of Community Health Workers (ACS), Family Health Team (eSF), Oral Health Team (eSB), and Family Health Extended Center (NASF) based on data from the Ministry of Health (MoH). The analysis of the area data identified patterns of spatial dependence of the municipalities for the rates, using Moran indices and scatterplots to visualize critical areas’ clusters (95% confidence). Municipalities of the North (n=450) and Northeast (n=1,794) had 132,174 ACS, 18,405 eSF, 13,017 eSB, and 2,205 NASF. The proportion of municipalities with rates within the recommended by the MoH were: ACS (>1.33), 96% in the North and 98.5% in the Northeast; eSF (>2.9/1,000), 54% and 80% in the respective regions; eSB (>2.9/10,000) 28% and 59% in these respective regions. NASF teams were deployed in 70% of the North and 89% of the Northeast. Except for ACS, the North was a critical team area, mainly in Pará, Rondônia, Amazonas, and Amapá. In the Northeast, these areas were smaller and concentrated mainly in western Bahia and eastern Maranhão. The Northeast showed a better composition of teams and a smaller extent of critical areas.

Key words:
Primary Health Care; Health workforce; Space analysis

Introdução

O desenvolvimento de políticas públicas para a cobertura universal de saúde, expressado nos objetivos do milênio e na agenda 2030, são incentivadas pelas organizações internacionais desde 200511 World Health Organization (WHO). Department of Health Systems Governance and Financing. Health Systems Governance for Universal Health Coverage: action plan [Internet]. Washington, D.C.: WHO [cited 2019 jul 19]. Available from: https://www.who.int/universal_health_coverage/plan_action-hsgov_uhc.pdf.
https://www.who.int/universal_health_cov...
,22 Organização das Nações Unidas-Brasil (ONU-BR). Documentos temáticos: objetivos de desenvolvimento sustentável 1, 2,3 5, 9 e 14 [Internet]. Brasília: ONU-BR; 2017 [acessado 2019 jul 19]. Disponível em: http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/library/ods/documentos-tematicos--ods-1--2--3--5--9--14.html.. A concepção de universalidade em saúde no Brasil remete a pressupostos de um sistema público universal, o Sistema Único de Saúde (SUS). E é reafirmada pela política nacional de atenção básica, que busca a estruturação de serviços abrangentes e acesso universal ao cuidado integral com trabalho inter e multiprofissional33 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Ofical da União; 2017..

A atenção primária é fundamental por ser a entrada e centro de comunicação preferencial da Rede de Atenção à Saúde (RAS), com grande potencial resolutivo, quando inserido num sistema de saúde autorregulado e centrado no usuário. Estratégia principal de expansão e consolidação da APS, o Saúde da Família se coloca como principal base coordenadora do cuidado e ordenadora da RAS, com a finalidade de reestruturar o modelo assistencial do SUS, ainda que na prática se observem variados modelos e heterogeneidade nos territórios44 Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798..

Dados de base populacional apontaram aumento de cobertura da estratégia Saúde da Família (ESF) de 50,9%, em 2008, para 53,4%, em 2013, no Brasil55 Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis Ademar AC. A Cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cien Saude Colet 2016; 21(2):327-338.. Tendência semelhante à observada em dados administrativos do Ministério da Saúde, e que identificou maior acréscimo para a região Norte. Em 2013, as maiores coberturas foram no Nordeste (65%), estados de Tocantins, Paraíba e Piauí (>80%) e suas capitais (>69%). Metade das capitais dessas regiões posicionou-se abaixo da média nacional (40%)66 Neves RG, Flores TR, Duro SMS, Nunes BP, Tomasi E. Tendência temporal da cobertura da Estratégia Saúde da Família no Brasil, regiões e Unidades da Federação, 2006-2016. Epidemiol Serv Saude 2018; 27(3):e2017170.. Os progressos de cobertura da ESF nessas regiões significa em parte a recuperação de atrasos na APS44 Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798..

O acesso à saúde é dado por realidades locorregionais heterogêneas no Brasil, com diferenças na estruturação da RAS. Marcadas por desigualdades socioeconômica e de desenvolvimento das diretrizes do SUS em áreas distintas do país. Sobretudo evidentes em territórios em situações mais desfavoráveis, isoladas de centros urbanos, como comunidades rurais e ribeirinhas da região amazônica77 Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, Herkrath FJ. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região Norte do Brasil. Saude Debate 2018; 42(Supl. 1):81-99.. Cenários para a ausência regular de serviços, que acentuam a insuficiente integração da APS na RAS44 Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798.

5 Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis Ademar AC. A Cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cien Saude Colet 2016; 21(2):327-338.
-66 Neves RG, Flores TR, Duro SMS, Nunes BP, Tomasi E. Tendência temporal da cobertura da Estratégia Saúde da Família no Brasil, regiões e Unidades da Federação, 2006-2016. Epidemiol Serv Saude 2018; 27(3):e2017170..

Escassez e alta rotatividade de recursos humanos na atenção primária é um desafio para certos territórios no Brasil. Em reposta ao componente mais crítico - médicos -, foram adotados programas de incentivo, como o Mais Médicos88 Pinto HA, Andreazza R, Ribeiro RJ, Loula MR, Reis AAC. O Programa Mais Médicos e a mudança do papel do Estado na regulação e ordenação da formação médica. Interface (Botucatu) 2019; 23(Supl. 1):e170960.. Este programa e o NASF juntam-se ao propósito de fortalecimento da APS, aumentando escopo e desenvolvimento da atenção básica99 Machado MH, Ximenes Neto FRG. Gestão da Educação e do Trabalho em Saúde no SUS: trinta anos de avanços e desafios. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1971-1979.,1010 Herval AM, Rodrigues ET. Ampliação do acesso e mudança de modelo: experiência a partir do Programa Mais Médicos. Interface (Botucatu) 2017; 21(Supl. 1):1325-1332..

Nesse contexto, é da maior relevância pensar em termos espaciais para melhor compreender o grau de adequação locais e regionais de equipes de APS implantados. A abordagem possibilita a visualização de padrões de distribuição de áreas semelhantes e críticas1111 Nucci LB, Souccar PT, Castilho SD. Spatial data analysis and the use of maps in scientific health articles. Rev Assoc Med Bras 2016; 62(4):336-341.. Análises de dados espaciais em saúde pública podem contribuir na localização de estruturação insuficiente e desigual da atenção básica. Assim subsidiar o delineamento de ações de extensão da APS em direção à integridade da saúde. Este trabalho pretende analisar o padrão espacial de implantação de equipes da atenção básica no Norte e Nordeste do Brasil em 2017.

Métodos

Estudo ecológico, com base em dados secundários, do padrão espacial da distribuição geográfica de equipes da APS implantadas nos municípios do Norte e Nordeste. Como etapa preliminar foi realizada descrição exploratória da magnitude das taxas nos municípios.

O número de equipes da atenção básica nos municípios foi a média mensal do ano de 2017, obtida dos dados eGestor informados pelo Departamento de Saúde da Família (DESF) da SAPS/MS1212 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Departamento de Atenção Básica (DAB) [internet]. [acessado 2018 jan. 29]. Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml.
https://egestorab.saude.gov.br/paginas/a...
. A fonte das estimativas de população foi o site do Datasus (http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?popsvs/cnv/popbr.def). Os dados de registros administrativos do DESF/MS foram considerados consistentes e oportunos em análises sobre a ESF55 Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis Ademar AC. A Cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cien Saude Colet 2016; 21(2):327-338.,1313 Aquino R, Barreto ML. Programa Saúde da Família: acerca da adequação do uso do seu indicador de cobertura. Cad Saude Publica 2008; 24(4):905-914..

Categorias de trabalhadores da atenção básica consideradas: ACS, eSF, eSB 1 e 2, e equipes de NASF 1, 2 e 3, conforme definição e composição da política nacional de atenção básica-PNAB que estabelece diretrizes para a sua organização no âmbito do SUS. As taxas de ACS foram calculadas por 1 mil hab., eSF e eSB por 10 mil hab. e NASF por 100 mil habitantes. O denominador foi a população residente nos municípios em 2017.

Magnitude das taxas de equipes implantadas nos municípios foi tipificada pelas suas medianas e intervalos interquartis (primeiro=Q1 e terceiro=Q3) por representar melhor o conjunto de indicadores para as variáveis em estudo, ou seja, não ser sensível a valores extremos. As variáveis explicativas das taxas de equipes implantadas foram: regiões Norte e Nordeste; capital e não capital; área metropolitana e não metropolitana; e porte populacional (até 20 mil, 20 a 50 mil, 50 a 100 mil, 100 a 200 mil, e 200 mil e +).

Adotou-se os parâmetros de adequação recomendados pela PNAB para os tipos de equipes investigados neste estudo. Número máximo de 750 pessoas acompanhadas por ACS, ou taxa adequada acima 1,33 por mil hab. População adscrita por eSF de 2.000 a 3.500 pessoas, que corresponde a taxa de 2,9 a 5,0 por 10 mil hab, consideradas adequadas taxas acima de 2,9/10 mil. O mesmo parâmetro foi aplicado para eSB. Como a política não define parâmetros para o NASF, estabelece como critério de inadequação a inexistência deste tipo de equipe implantada no município.

A análise espacial baseou-se na técnica da análise dos dados de área de forma a identificar padrões de dependência espacial dos municípios para as taxas de ACS, eSf, eSB e NASF implantadas no ano de 2017. Os indicadores foram normalizados e a posteriori foram aplicados os índices (I) de Moran global e Local (Local Indicator of Spatial Association - LISA).

O índice (I) global de Moran fornece um único valor de associação espacial para todo o conjunto de dados. Valores próximos a zero indicam ausência de autocorrelação espacial, ou aleatoriedade espacial. Valores próximos a +1, autocorrelação espacial positiva e próximos a -1, autocorrelação espacial negativa1414 Bailey T, Gattrel A. Spatial Data Analysis by Example. London: Longman; 1995..

O índice (I) de Moran Local (LISA) utilizando critérios de vizinhança de primeira ordem (vizinhos locais contíguos), permite verificar a dependência espacial e identificar os padrões espaciais de cada localidade1515 Anselin L. Local indicators of spatial association-LISA. Geograph Anal 1995; 27(2):93-115.. Para visualizar os resultados foi gerado o Moran Map.

De acordo com os resultados (nível de significância 95% de confiança), os municípios foram classificados em valores de 0 a 4, onde: 0 (não significante); 1 corresponde aos valores de Q1 (alto-alto - valores altos do indicador com vizinhança com média também alta); 2 (Q2) baixo-baixo, valores baixos do indicador com vizinhos que também apresentam valores baixos. Estas áreas são consideradas homogêneas com associação espacial positiva. Enquanto as áreas dos quadrantes 3 (Q3) alto-baixo e 4 (Q4) baixo-alto, ou seja, valores altos do indicador próximo a vizinhos com valores baixos e vice-versa, são consideradas áreas com associação espacial negativa, ou heterogêneas1414 Bailey T, Gattrel A. Spatial Data Analysis by Example. London: Longman; 1995.,1515 Anselin L. Local indicators of spatial association-LISA. Geograph Anal 1995; 27(2):93-115.. Considerou-se como área crítica, o que foi classificado no Moran Map como Q2 (baixo-baixo). i.e. locais onde a estruturação da atenção básica é insuficiente.

Para a análise espacial dos dados, foi utilizado o software livre TerraView 4.2.2, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

O estudo trabalhou com registros de dados secundários de base não nominal, em conformidade com o Decreto nº 7.724, 16 de maio de 20121616 Brasil. Decreto nº 7.721, de 16 de maio de 2012. Regulamenta a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, que dispõe sobre o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do caput do art. 5º , no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição. Diário Oficial da União 2012; 16 maio., e a Resolução nº 510, de 7 de abril de 20161717 Brasil. Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016. dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais cujos procedimentos metodológicos envolvam a utilização de dados diretamente obtidos com os participantes ou de informações identificáveis ou que possam acarretar riscos maiores do que os existentes na vida cotidiana. Diário Oficial da União 2016; 24 maio..

Resultados

Nos municípios das regiões Norte (n=450) e Nordeste (n=1.794) havia 132.174 ACS, 18.405 eSF, 13.017 eSB e 2.205 equipes de NASF. Municipalidades sem eSB e NASF foram 4,4% e 30% no Norte e 1,1% e 11% no Nordeste, principalmente em municípios menores de 100 mil hab.

A mediana das taxas de ACS na região Norte foi de 2,5/mil hab., permanecendo dentro do parâmetro recomendado (≥1,33/mil hab) municípios do interior e com até 200 mil hab. Esse padrão se reproduziu de modo semelhante no Nordeste, com valores ligeiramente inferiores (Tabela 1). As UFs alcançaram medianas acima de 1,33/mil (Tabela 2). Entretanto, somente quatro capitais atingiram esse valor (Tabela 3). Municípios com taxas inadequadas: 4% (n=18) no Norte e 1,5% (n=27) no Nordeste.

Tabela 1
Mediana das taxas de equipes na atenção básica (Quartis Q1-Q3), segundo características geográficas dos municípios do Norte (n=450) e Nordeste (n=1.794) do Brasil, 2017.
Tabela 2
Mediana das taxas de equipes na atenção básica (Quartis Q1-Q3) em municípios dos estados do Norte e Nordeste do Brasil, 2017.
Tabela 3
Taxas de equipes na atenção básica na capital e em municípios do interior (mediana) dos estados do Norte e Nordeste do Brasil, 2017.

A mediana das taxas de eSF no Nordeste foi de 3,8/10 mil hab., com municípios do interior e até 50 mil habitantes dentro do parâmetro (≥2,9/10 mil hab.). A região Norte seguiu perfil equivalente, mas com valores inferiores (Tabela 1). As medianas das UFs ficaram acima de 2,9/10 mil (Tabela 2), mas uma única capital com taxa adequada (Tabela 3). Taxas abaixo do recomendado nos municípios: 20% (n=359) no Nordeste e 46% (n=207) no Norte.

O padrão de distribuição de eSB implantadas no Nordeste é semelhante ao de eSF na região, mas com valores inferiores. A mediana de eSB ficou dentro do recomendado (≥2,9/10 mil hab.) para o total de municípios da região (3,2/10 mil hab.), cidades do interior e com até 20 mil habitantes. Na região Norte a mediana da taxa de eSB ficou abaixo do recomendado em todas as variáveis analisadas, principalmente municípios maiores (Tabela 1). Entre UFs, a mediana ficou acima de 2,9/10 mil em oito unidades do Nordeste e três do Norte (Tabela 2). Em 41% (n=736) dos municípios do Nordeste e 72% (n=324) do Norte o número de eSB ficou abaixo do parâmetro, incluindo todas capitais (Tabela 3).

A mediana da taxa de equipes NASF foi de 5,6/100 mil hab. (17.857 pessoas por equipe) no Nordeste e 2,9/100 mil hab. (34.883 pessoas por equipe) no Norte. Em ambas regiões, as taxas foram mais elevadas em municípios do interior, área metropolitana e cidades com menos de 20 mil hab. A mediana de equipes NASF variou de zero a 14,4/100 nos estados (Tabela 2), enquanto as taxas variaram entre 0,1 a 4,1/100 mil nas capitais (Tabela 3).

Os mapas de distribuição de equipes ilustram como a maior parte das localidades tem número adequado de ACS em ambas regiões. O Nordeste também tem maior área de taxas adequadas de eSF, eSB e equipe NASF. Os estados do Piauí, Rio Grande do Norte e Paraíba destacaram-se por maior área com número recomendado de eSF e eSB. Em contrapartida, boa parte dos outros estados apresentaram falhas, principalmente na implantação de eSB (Figura 1).

Figura 1
Taxas de equipes na atenção básica nos municípios do Norte e Nordeste do Brasil, 2017.

Ao analisar o padrão espacial da distribuição de implantação das equipes da atenção básica, observou-se a existência de autocorrelação espacial para todas as equipes, utilizando o (I) Indice de Moran Global com p=0,01 (IACS=0,286; IeSF=0,348; IeSB=0,436; INASF=0,32). Ao aplicar o LISA e obter o Moran Map (Figura 2) foi possível visualizar aglomerados (clusters) de áreas homogêneas, estatisticamente significantes, cujos locais têm dependência espacial mais pronunciada, permitindo estabelecer áreas prioritárias. A região Norte constituiu-se como área crítica em quase toda extensão, principalmente no Pará, Rondônia, Amazonas e Amapá para todos os tipos de equipes, com exceção de ACS. Enquanto no Nordeste, as áreas críticas atingiram menor proporção, concentrando-se por equipes em: ACS (litoral do Ceará, sul de Sergipe, e territórios dispersos da Bahia e Pernambuco); eSF (região central de Ceará e metropolitana de Fortaleza, norte e oeste da Bahia, e regiões central, oeste de Pernambuco e metropolitana de Recife); eSB (oeste do Maranhão, litoral oeste do Ceará, metropolitana de Recife e norte da Bahia, principalmente); NASF (norte e oeste do Maranhão, Ceará, Pernambuco, Sul do Sergipe, e norte e oeste da Bahia). Tocantins retratou comportamento mais semelhante aos estados da região Nordeste.

Figura 2
Mapa de espalhamento de Moran (Moran Map) das taxas de equipes na atenção básica nos municípios do Norte e Nordeste do Brasil, 2017.

Discussão

Entre as modalidades de equipes na APS, apenas a cobertura de ACS alcançou o parâmetro de adequação definido na PNAB para as regiões analisadas. O Nordeste do Brasil denotou ainda melhor composição e distribuição de eSF, eSB e NASF. Conforme diminui o porte do município maior a adequação de equipes na APS, bem como em cidades do interior. Não foi desprezível a frequência de municípios sem NASF. Enquanto a região Norte teve maior porção de locais onde a estruturação da atenção básica é insuficiente (áreas críticas). No Nordeste o estado da Bahia se destacou pela presença persistente dessas áreas críticas. Inversamente, Piauí, Rio Grande do Norte e Paraíba distinguiram-se por coberturas adequadas.

Análises anteriores5-7 constataram cenários compatíveis aos resultados encontrados neste estudo. Melhor estruturação da ESF no Nordeste e em área rural, com aumento de cobertura inversamente proporcional ao porte do município. Assim como, coberturas mais elevadas em Tocantins, Paraíba, Piauí e suas capitais. Observa-se algum nível de correspondência entre este perfil de cobertura da APS e a qualidade da atenção básica para as regiões em análise. Municípios com parâmentro adequado de equipes significou melhor coordenação do cuidado33 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Ofical da União; 2017. e aumento de acesso da população1818 Corrêa GT, Celeste RK. Associação entre a cobertura de equipes de saúde bucal na saúde da família e o aumento na produção ambulatorial dos municípios brasileiros, 1999 e 2011. Cad Saude Publica 2015; 31(12):2588-2598..

A desfavorável estruturação da APS na região Norte pode ser mais crítica, devido a implatanção de equipes fora das suas áreas de abrangência. Este expediente, equipes para atender comunidades rurais alocadas em espaços urbanos e o acúmulo da oferta de serviços nas sedes dos municípios representam barreiras de entrada à unidade de saúde77 Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, Herkrath FJ. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região Norte do Brasil. Saude Debate 2018; 42(Supl. 1):81-99.,1919 Poças KC, Freitas LRS, Duarte EC. Censo de estrutura da Atenção Primária à Saúde no Brasil (2012): estimativas de coberturas potenciais. Epidemiol Serv Saude 2017; 26(2):275-284.. O atendimento distante das famílias ainda dificulta o vínculo profissional-usuário neste tipo de território, comumente extenso e de alta dispensão populacional. Essa realidade espacial fica excepcionalmente acentuada na região amazônica. Portanto, resultados isolados de coberturas médias devem ser relativizados, pois necessariamente podem não se traduzir em maior acessibilidade geográfica ou organizacional para todos.

O aumento de cobertura da ESF muitas vezes se traduz em impacto na saúde da população2020 Abreu DMX, Pinheiro PC, Queiroz BL, Lopes EAS, Machado ATGM, Lima AMLD, Santos AF, Rocha HA. Análise espacial da qualidade da Atenção Básica em Saúde no Brasil. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):67-80., mas sem representar mudanças no modelo assistencial2121 Lentsck MH, Mathias TAF. Internações por doenças cardiovasculares e a cobertura da estratégia saúde da família. Rev Latino-Am Enferm 2015; 23(4):611-619.. O nível elevado de adequação da atenção primária se faz acompanhar de grandes diferenças entre os estados, incipiente oferta de atendimento nos finais de semana e fragilidade no acolhimento das demandas do usuário1919 Poças KC, Freitas LRS, Duarte EC. Censo de estrutura da Atenção Primária à Saúde no Brasil (2012): estimativas de coberturas potenciais. Epidemiol Serv Saude 2017; 26(2):275-284..

A taxa menor de equipes da ESF nas capitais, achado corroborado por estudo anterior55 Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis Ademar AC. A Cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cien Saude Colet 2016; 21(2):327-338., pode significar um processo de extensão de cobertura da APS nos centros urbanos. Não sendo incomum, a introdução de unidades da saúde da família à estrutura preexistente de unidades tradicionais. A composição de modelos variados de acesso em APS, quando integrados numa estrutura organizacional e sistêmica, tem sido percebida como uma experiência própria de sistemas abrangentes e robustos. Dada a heterogeneidade de realidades de saúde nos distintos cantos do país, importa uma variedade adaptativa, unida por princípios gerais, de estratégias de atenção para o SUS44 Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798..

A despeito dos obstáculos, confirmam-se boas práticas em APS, em particular atividades de prevenção e promoção da saúde direncionadas a grupos específicos, tal como crianças de área rural nas regiões Norte e Nordeste2222 Santos AMA, Jacinto PA. O Impacto do Programa Saúde da Família Sobre a Saúde das Crianças da Área Rural do Brasil. Rev Econ Soc Rural 2017; 55(2):227-246.. Quando prioriza os mais vulneráveis, a continuidade do cuidado na ESF se notabilizou uma potente política equitativa2323 Martins MMF, Aquino R, Pamponet ML, Pinto Junior EP, Amorim LDAF. Acesso aos serviços de atenção primária à saúde por adolescentes e jovens em um município do Estado da Bahia, Brasil. Cad Saude Publica 2019; 35(1):e00044718.

24 Andrade MV, Noronha K, Barbosa ACQ, Rocha TAH, Silva NC, Calazans JA, Souza MN, Carvalho LR, Souza A. A equidade na cobertura da Estratégia Saúde da Família em Minas Gerais, Brasil. Cad Saude Publica 2015; 31(6):1175-1187.
-2525 Kessler M, Lima SBS, Weiller TH, Lopes LFD, Ferraz L, Thumé E. A longitudinalidade na Atenção Primária à Saúde: comparação entre modelos assistenciais. Rev Bras Enferm 2018; 71(3):1063-1071.. Por outro lado, a baixa presença desta estratégia se relacionou a falhas na prevenção de agravos de importância para a saúde pública2626 Nunes PS, Zara ALSA, Rocha DFNC, Marinho TA, Mandacarú PMP, Turchi MD. Sífilis gestacional e congênita e sua relação com a cobertura da Estratégia Saúde da Família, Goiás, 2007-2014: um estudo ecológico. Epidemiol Serv Saude 2018; 27(4):e2018127..

A força de trabalho da APS no Brasil tem sido exemplo por inovar em equipes que envolvem profissionais de nível médio e ACS com usuários e suas famílias na prestação de serviços de saúde, condição de qualidade em escala focada nas pessoas2727 Schwarz D, Duong D, Adam C, Awoonor-Williams JK, Back D, Bang A, Bang R, Beebe M, Bhatt S, Campbell J, Conteh M, Dimitrova D, Dimovska D, Dossou J-P, Evans T, Gadir M, Islam K, Kasyaba R, Kumar P, Levy C, Oanh TM, Monsef N, Oh J, Otoo N, Palazuelos D, Poh A, Sinha S, Smith C, Stewart B, Thomas C, Tritter B, Varnum P, Weilnau T, Ellner A. Primary Care 2030: Creating an Enabling Ecosystem for Disruptive Primary Care Models to Achieve Universal Health Coverage in Low- and Middle-Income Countries. Annals Glob Health 2020; 86(1):9.. No entanto, a baixa regulação dos recursos humanos em saúde é um forte condicionante da expansão e desenvolvimento da APS no Brasil. Embora sem resolver esta trajetória de déficit regulatório, o Programa Mais Médicos ampliou cobertura e equidade na APS com a alocação de médicos em lugares de situação mais crítica para a presença deste profissional1010 Herval AM, Rodrigues ET. Ampliação do acesso e mudança de modelo: experiência a partir do Programa Mais Médicos. Interface (Botucatu) 2017; 21(Supl. 1):1325-1332.,2828 Campos GWS, Pereira Júnior N. A Atenção Primária e o Programa Mais Médicos do Sistema Único de Saúde: conquistas e limites. Cien Saude Colet 2016; 21(9):2655-2663.,2929 Pinto HA, Oliveira FP, Santana JSS, Santos FOS, Araujo SQ, Figueiredo AM, Araújo GD. Programa Mais Médicos: avaliando a implantação do Eixo Provimento de 2013 a 2015. Interface (Botucatu) 2017; 21(Supl. 1):1087-1101..

A experiência tem demonstrado que modelos de saúde universal que se organizaram a partir dos princípios da APS alcançaram melhores resultados3030 Facchini LA, Tomasi E, Dilélio AS. Qualidade da Atenção Primária à Saúde no Brasil: avanços, desafios e perspectivas. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):208-223.,3131 Uchôa SAC, Arcêncio RA, Fronteira I, Coêlho AA, Martiniano CS, Brandão ICA, Yamamura M, Maroto RM, Silva AKF. Acesso potencial à Atenção Primária à Saúde: o que mostram os dados do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade do Brasil? Rev Latino-Am Enferm 2016; 24:e2672.. Para um alcance mais amplo, o compromisso renovado com a APS, na Declaração de Astana3232 World Health Organization (WHO). Global Conference on Primary Health Care. Declaration of Astana [Internet] Astana; 2018 [cited 2020 out 16]. Available from: https://www.who.int/docs/default-source/primary-health/declaration/gcphc-declaration.pdf.
https://www.who.int/docs/default-source/...
, demanda liderança dos países por inovação tecnológica centrada no usuário e modelos coordenados por equipes multidisciplinares, potentes para superar redes de cuidados episódicos e mal equipados2727 Schwarz D, Duong D, Adam C, Awoonor-Williams JK, Back D, Bang A, Bang R, Beebe M, Bhatt S, Campbell J, Conteh M, Dimitrova D, Dimovska D, Dossou J-P, Evans T, Gadir M, Islam K, Kasyaba R, Kumar P, Levy C, Oanh TM, Monsef N, Oh J, Otoo N, Palazuelos D, Poh A, Sinha S, Smith C, Stewart B, Thomas C, Tritter B, Varnum P, Weilnau T, Ellner A. Primary Care 2030: Creating an Enabling Ecosystem for Disruptive Primary Care Models to Achieve Universal Health Coverage in Low- and Middle-Income Countries. Annals Glob Health 2020; 86(1):9.,3333 Friebel R, Molloy A, Leatherman S, Dixon J, Bauhoff S, Chalkidou K. Achieving high-quality universal health coverage: a perspective from the National health service in England. BMJ Glob Health 2018;3:e000944.,3434 Tao W, Zeng Z, Dang H, Lu B, Chuong L, Yue D, Wen J, Zhao R, Li W, Kominski GF. Towards universal health coverage: lessons from 10 years of healthcare reform in China. BMJ Global Health 2020; 5(3):e002086.. Embora uma realidade ainda distante, a adoção dessas tecnologias é vista como possibilidade de ajudar a escalar a prestação de cuidados primários de qualidade, mesmo em áreas com escassez de profissionais e outras barreiras de acesso2727 Schwarz D, Duong D, Adam C, Awoonor-Williams JK, Back D, Bang A, Bang R, Beebe M, Bhatt S, Campbell J, Conteh M, Dimitrova D, Dimovska D, Dossou J-P, Evans T, Gadir M, Islam K, Kasyaba R, Kumar P, Levy C, Oanh TM, Monsef N, Oh J, Otoo N, Palazuelos D, Poh A, Sinha S, Smith C, Stewart B, Thomas C, Tritter B, Varnum P, Weilnau T, Ellner A. Primary Care 2030: Creating an Enabling Ecosystem for Disruptive Primary Care Models to Achieve Universal Health Coverage in Low- and Middle-Income Countries. Annals Glob Health 2020; 86(1):9.. Inovações capazes de permitir ao mundo abordar os determinantes e a crescente carga de agravos e doenças3535 Kluge H, Barkley S, Theodorakis PN, Yamamoto N, Tsoy A, Aiypkhanova A, Ganesh V, Hipgrave DB, Peterson SS, Valderas JM, Mossialos E. How primary health care can make universal health coverage a reality, ensure healthy lives, and promote wellbeing for all. Lancet 2018; 392(10156):1372-1374..

A universalização da APS não será possível de ser obtida sem a integração e unidade dos mais variados modelos de atenção encontrados na prática e a correção de inadequações na aplicação dos princípios e diretrizes da PNAB44 Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798.,3030 Facchini LA, Tomasi E, Dilélio AS. Qualidade da Atenção Primária à Saúde no Brasil: avanços, desafios e perspectivas. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):208-223.,3131 Uchôa SAC, Arcêncio RA, Fronteira I, Coêlho AA, Martiniano CS, Brandão ICA, Yamamura M, Maroto RM, Silva AKF. Acesso potencial à Atenção Primária à Saúde: o que mostram os dados do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade do Brasil? Rev Latino-Am Enferm 2016; 24:e2672.. Entretanto, as modificações introduzidas nesta politica apontam em outra direção, ao promover a relativização da cobertura universal, a segmentação do acesso e a recomposição das equipes. Num país com realidades tão distintas e um processo de descentralização carente de aprimoramentos, é um risco o Estado renunciar à sua atribuição indutora das bases nacionais e unidade para a APS3636 Morosini MVGC, Fonseca AF, Lima Luciana Dias de. Política Nacional de Atenção Básica 2017: retrocessos e riscos para o Sistema Único de Saúde. Saude Debate 2018; 42(116):11-24..

Nos últimos anos, o SUS tem estado sujeito a tensões resultantes de políticas de austeridade fiscal. A piora de indicadores de saúde sinalizou os efeitos dessa redução de investimentos na saúde3737 Paes-Sousa R, Rasella D, Carepa-Sousa J. Política econômica e saúde pública: equilíbrio fiscal e bem-estar da população. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 3):172-182.,3838 Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Noronha QVMS, Rocha R, Macinko J, Hone T, Tasca R, Giovanella L, Malik AM, Werneck H, Fachini LA, Atun R. Brazil's unified health system: the first 30 years and prospects for the future. Lancet 2019; 394(10195):345-356.. A epidemia recente da COVID-19 elevou a pressão sobre a saúde e revelou a capacidade obstrutiva de agentes políticos do Estado, ao formar narrativas de conflito com as boas práticas em saúde pública. A experiência do Brasil com outras emergências de saúde, materizalizada na resposta das redes de atenção e de vigilância do SUS, demonstrou ser capaz de evitar danos piores em consequência de incertezas no caminho3939 Campos GWS. O pesadelo macabro da Covid-19 no Brasil: entre negacionismos e desvarios. Trab Educ Saude 2020; 18(3):e00279111.,4040 Croda J, Oliveira WK, Frutuoso RL, Mandetta LH, Baia-da-Silva DC, Brito-Sousa JD, Monteiro WM, Lacerda MVG. COVID-19 in Brazil: advantages of a socialized unified health system and preparation to contain cases. Rev Soc Bras Med Trop 2020; 53:e20200167..

A principal limitação desse estudo está relacionada a natureza do dado administrativo sobre equipes implantadas no município. Esta informação sofre variações ao longo do ano, devido a atualização mensal do número de equipes cadastradas. Como forma de lidar com essa limitação utilizou-se o cálculo da média mensal para o ano estudado, como declarado nos métodos. Além disso, algum grau de incompletitude e subnotificação de informações podem afetar a qualidade de dados secundários. Por fim, a unidade de análise espacial pode ocultar diferenciais decorrentes de dados agregados (viés ecológico).

O presente estudo indicou um padrão na composição e extensão da APS no Norte e Nordeste do país. O nível de adequação e distribuição dos distintos tipos de equipes incide desigualmente entre os diferentes territórios. Os dados sugerem variadas estruturas e realidades de cuidados primários em saúde, com evidenciada condição de inferioridade para a região Norte. A identificação de áreas críticas de cobertura oferece evidências que possibilita o estabelecimento de áreas prioritárias e o planejamento de políticas específicas de adequação da saúde primária. Sob a ótica da universalidade da saúde, pode orientar a expansão de estruturas e estratégias articuladas de APS mais ajustadas a múltiplas realidades encontradas pelo Brasil. E inserida numa rede de atenção à saúde estruturada, ser capaz de gerar impacto na saúde das pessoas.

Referências

  • 1
    World Health Organization (WHO). Department of Health Systems Governance and Financing. Health Systems Governance for Universal Health Coverage: action plan [Internet]. Washington, D.C.: WHO [cited 2019 jul 19]. Available from: https://www.who.int/universal_health_coverage/plan_action-hsgov_uhc.pdf
    » https://www.who.int/universal_health_coverage/plan_action-hsgov_uhc.pdf
  • 2
    Organização das Nações Unidas-Brasil (ONU-BR). Documentos temáticos: objetivos de desenvolvimento sustentável 1, 2,3 5, 9 e 14 [Internet]. Brasília: ONU-BR; 2017 [acessado 2019 jul 19]. Disponível em: http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/library/ods/documentos-tematicos--ods-1--2--3--5--9--14.html.
  • 3
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Ofical da União; 2017.
  • 4
    Viana ALA, Bousquat A, Melo GA, Negri Filho A, Medina MG. Regionalização e Redes de Saúde. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1791-1798.
  • 5
    Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis Ademar AC. A Cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cien Saude Colet 2016; 21(2):327-338.
  • 6
    Neves RG, Flores TR, Duro SMS, Nunes BP, Tomasi E. Tendência temporal da cobertura da Estratégia Saúde da Família no Brasil, regiões e Unidades da Federação, 2006-2016. Epidemiol Serv Saude 2018; 27(3):e2017170.
  • 7
    Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, Herkrath FJ. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região Norte do Brasil. Saude Debate 2018; 42(Supl. 1):81-99.
  • 8
    Pinto HA, Andreazza R, Ribeiro RJ, Loula MR, Reis AAC. O Programa Mais Médicos e a mudança do papel do Estado na regulação e ordenação da formação médica. Interface (Botucatu) 2019; 23(Supl. 1):e170960.
  • 9
    Machado MH, Ximenes Neto FRG. Gestão da Educação e do Trabalho em Saúde no SUS: trinta anos de avanços e desafios. Cien Saude Colet 2018; 23(6):1971-1979.
  • 10
    Herval AM, Rodrigues ET. Ampliação do acesso e mudança de modelo: experiência a partir do Programa Mais Médicos. Interface (Botucatu) 2017; 21(Supl. 1):1325-1332.
  • 11
    Nucci LB, Souccar PT, Castilho SD. Spatial data analysis and the use of maps in scientific health articles. Rev Assoc Med Bras 2016; 62(4):336-341.
  • 12
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Departamento de Atenção Básica (DAB) [internet]. [acessado 2018 jan. 29]. Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml
    » https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml
  • 13
    Aquino R, Barreto ML. Programa Saúde da Família: acerca da adequação do uso do seu indicador de cobertura. Cad Saude Publica 2008; 24(4):905-914.
  • 14
    Bailey T, Gattrel A. Spatial Data Analysis by Example. London: Longman; 1995.
  • 15
    Anselin L. Local indicators of spatial association-LISA. Geograph Anal 1995; 27(2):93-115.
  • 16
    Brasil. Decreto nº 7.721, de 16 de maio de 2012. Regulamenta a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, que dispõe sobre o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do caput do art. 5º , no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição. Diário Oficial da União 2012; 16 maio.
  • 17
    Brasil. Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016. dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais cujos procedimentos metodológicos envolvam a utilização de dados diretamente obtidos com os participantes ou de informações identificáveis ou que possam acarretar riscos maiores do que os existentes na vida cotidiana. Diário Oficial da União 2016; 24 maio.
  • 18
    Corrêa GT, Celeste RK. Associação entre a cobertura de equipes de saúde bucal na saúde da família e o aumento na produção ambulatorial dos municípios brasileiros, 1999 e 2011. Cad Saude Publica 2015; 31(12):2588-2598.
  • 19
    Poças KC, Freitas LRS, Duarte EC. Censo de estrutura da Atenção Primária à Saúde no Brasil (2012): estimativas de coberturas potenciais. Epidemiol Serv Saude 2017; 26(2):275-284.
  • 20
    Abreu DMX, Pinheiro PC, Queiroz BL, Lopes EAS, Machado ATGM, Lima AMLD, Santos AF, Rocha HA. Análise espacial da qualidade da Atenção Básica em Saúde no Brasil. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):67-80.
  • 21
    Lentsck MH, Mathias TAF. Internações por doenças cardiovasculares e a cobertura da estratégia saúde da família. Rev Latino-Am Enferm 2015; 23(4):611-619.
  • 22
    Santos AMA, Jacinto PA. O Impacto do Programa Saúde da Família Sobre a Saúde das Crianças da Área Rural do Brasil. Rev Econ Soc Rural 2017; 55(2):227-246.
  • 23
    Martins MMF, Aquino R, Pamponet ML, Pinto Junior EP, Amorim LDAF. Acesso aos serviços de atenção primária à saúde por adolescentes e jovens em um município do Estado da Bahia, Brasil. Cad Saude Publica 2019; 35(1):e00044718.
  • 24
    Andrade MV, Noronha K, Barbosa ACQ, Rocha TAH, Silva NC, Calazans JA, Souza MN, Carvalho LR, Souza A. A equidade na cobertura da Estratégia Saúde da Família em Minas Gerais, Brasil. Cad Saude Publica 2015; 31(6):1175-1187.
  • 25
    Kessler M, Lima SBS, Weiller TH, Lopes LFD, Ferraz L, Thumé E. A longitudinalidade na Atenção Primária à Saúde: comparação entre modelos assistenciais. Rev Bras Enferm 2018; 71(3):1063-1071.
  • 26
    Nunes PS, Zara ALSA, Rocha DFNC, Marinho TA, Mandacarú PMP, Turchi MD. Sífilis gestacional e congênita e sua relação com a cobertura da Estratégia Saúde da Família, Goiás, 2007-2014: um estudo ecológico. Epidemiol Serv Saude 2018; 27(4):e2018127.
  • 27
    Schwarz D, Duong D, Adam C, Awoonor-Williams JK, Back D, Bang A, Bang R, Beebe M, Bhatt S, Campbell J, Conteh M, Dimitrova D, Dimovska D, Dossou J-P, Evans T, Gadir M, Islam K, Kasyaba R, Kumar P, Levy C, Oanh TM, Monsef N, Oh J, Otoo N, Palazuelos D, Poh A, Sinha S, Smith C, Stewart B, Thomas C, Tritter B, Varnum P, Weilnau T, Ellner A. Primary Care 2030: Creating an Enabling Ecosystem for Disruptive Primary Care Models to Achieve Universal Health Coverage in Low- and Middle-Income Countries. Annals Glob Health 2020; 86(1):9.
  • 28
    Campos GWS, Pereira Júnior N. A Atenção Primária e o Programa Mais Médicos do Sistema Único de Saúde: conquistas e limites. Cien Saude Colet 2016; 21(9):2655-2663.
  • 29
    Pinto HA, Oliveira FP, Santana JSS, Santos FOS, Araujo SQ, Figueiredo AM, Araújo GD. Programa Mais Médicos: avaliando a implantação do Eixo Provimento de 2013 a 2015. Interface (Botucatu) 2017; 21(Supl. 1):1087-1101.
  • 30
    Facchini LA, Tomasi E, Dilélio AS. Qualidade da Atenção Primária à Saúde no Brasil: avanços, desafios e perspectivas. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 1):208-223.
  • 31
    Uchôa SAC, Arcêncio RA, Fronteira I, Coêlho AA, Martiniano CS, Brandão ICA, Yamamura M, Maroto RM, Silva AKF. Acesso potencial à Atenção Primária à Saúde: o que mostram os dados do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade do Brasil? Rev Latino-Am Enferm 2016; 24:e2672.
  • 32
    World Health Organization (WHO). Global Conference on Primary Health Care. Declaration of Astana [Internet] Astana; 2018 [cited 2020 out 16]. Available from: https://www.who.int/docs/default-source/primary-health/declaration/gcphc-declaration.pdf
    » https://www.who.int/docs/default-source/primary-health/declaration/gcphc-declaration.pdf
  • 33
    Friebel R, Molloy A, Leatherman S, Dixon J, Bauhoff S, Chalkidou K. Achieving high-quality universal health coverage: a perspective from the National health service in England. BMJ Glob Health 2018;3:e000944.
  • 34
    Tao W, Zeng Z, Dang H, Lu B, Chuong L, Yue D, Wen J, Zhao R, Li W, Kominski GF. Towards universal health coverage: lessons from 10 years of healthcare reform in China. BMJ Global Health 2020; 5(3):e002086.
  • 35
    Kluge H, Barkley S, Theodorakis PN, Yamamoto N, Tsoy A, Aiypkhanova A, Ganesh V, Hipgrave DB, Peterson SS, Valderas JM, Mossialos E. How primary health care can make universal health coverage a reality, ensure healthy lives, and promote wellbeing for all. Lancet 2018; 392(10156):1372-1374.
  • 36
    Morosini MVGC, Fonseca AF, Lima Luciana Dias de. Política Nacional de Atenção Básica 2017: retrocessos e riscos para o Sistema Único de Saúde. Saude Debate 2018; 42(116):11-24.
  • 37
    Paes-Sousa R, Rasella D, Carepa-Sousa J. Política econômica e saúde pública: equilíbrio fiscal e bem-estar da população. Saude Debate 2018; 42(n. esp. 3):172-182.
  • 38
    Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Noronha QVMS, Rocha R, Macinko J, Hone T, Tasca R, Giovanella L, Malik AM, Werneck H, Fachini LA, Atun R. Brazil's unified health system: the first 30 years and prospects for the future. Lancet 2019; 394(10195):345-356.
  • 39
    Campos GWS. O pesadelo macabro da Covid-19 no Brasil: entre negacionismos e desvarios. Trab Educ Saude 2020; 18(3):e00279111.
  • 40
    Croda J, Oliveira WK, Frutuoso RL, Mandetta LH, Baia-da-Silva DC, Brito-Sousa JD, Monteiro WM, Lacerda MVG. COVID-19 in Brazil: advantages of a socialized unified health system and preparation to contain cases. Rev Soc Bras Med Trop 2020; 53:e20200167.

Editado por

Editores-chefes:

Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Jan 2022

Histórico

  • Recebido
    27 Dez 2019
  • Aceito
    20 Nov 2020
  • Publicado
    22 Nov 2020
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Av. Brasil, 4036 - sala 700 Manguinhos, 21040-361 Rio de Janeiro RJ - Brazil, Tel.: +55 21 3882-9153 / 3882-9151 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cienciasaudecoletiva@fiocruz.br