Resumo
Em 2017, para nortear o currículo de ensino, são apresentadas as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva (DCNsCGSC). Com o objetivo de analisar o ensino nos cursos de graduação em saúde coletiva no brasil à luz dos projetos pedagógicos, realizamos um estudo qualitativo e exploratório com abordagem documental, utilizando o método da análise de conteúdo. Depois da análise de 22 projetos, observou-se que a maioria dos cursos segue ou se adequou (31,8%) às DCNsCGSC quanto a carga horária total, estágio, trabalho de conclusão e atividades complementares. A nomenclatura bacharelado em saúde coletiva é a principal denominação (77,3%). A maioria dos cursos está na região Norte (27,%) e em instituições federais (68,5%). Sobre o ensino, foram identificadas 274 citações de componentes obrigatórios com o termo de referência das subáreas da saúde coletiva. Desses, o eixo de políticas, planejamento e gestão em saúde, representa 66,42% (182) dos componentes e as ciências sociais e humanas em saúde 9,50% (26). O estudo elucidou como é realizado o ensino na graduação, agregando reflexões sobre a convergência das DCNsCGSC. Além disso, revela possíveis lacunas dos conteúdos de ensino necessários à formação para a atuação profissional, sobretudo para a consolidação do Sistema Único de Saúde.
Palavras-chave:
Ensino; Graduação; Saúde coletiva; Pesquisa qualitativa
Abstract
To standardize the teaching curriculum, the National Curriculum Guidelines for the Undergraduate Course in Public Health (DCNsCGSC) were set up in 2017. A qualitative and exploratory study with a documental approach was conducted, using the content analysis method, to analyze teaching in undergraduate courses in Public Health in Brazil in the light of Pedagogical Projects. After analysis of 22 projects, it was observed that the majority of the courses (31.8%) complied with the DCNsCGSC in terms of total workload, internship, final paper, and complementary activities. The term “bachelor’s degree in public health” is the main denomination (77.3%). Most courses are in the northern region (27%) and federal institutions (68.5%). In terms of teaching, 274 mentions of mandatory components were identified with the term of reference of the subareas of Public Health. Of these, the areas of health policies, planning, and management represent 66.42% (182) of the components and the social and human sciences in health 9.5% (26). The study elucidated how undergraduate teaching is carried out, adding reflections on the convergence of DCNsCGSC. In addition, it revealed possible gaps in the teaching content necessary for training for professional practice, especially for the consolidation of the Unified Health System.
Key words:
Teaching; Graduation; Public health; Qualitative research
Introdução
A formação de sanitarista percorreu um longo caminho até chegar aos cursos de graduação. A ideia de uma graduação em saúde coletiva nasce da problematização de um novo campo de saber e práticas que emergiu da crítica à saúde pública biomédica institucionalizada e dos modelos de saúde que a antecederam, a exemplo da medicina preventiva, da medicina comunitária e da medicina familiar11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.. Evolui como uma proposta de graduação com o movimento da Reforma Sanitária Brasileira (RSB) e com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) para a reconfiguração das práticas de saúde, tornando-se necessária a redefinição dos processos formativos para a qualificação profissional em saúde coletiva11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.
2 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.
3 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.-44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285..
Consideramos que a saúde coletiva foi construída como espaço multiprofissional (que reúne diversos profissionais) e interdisciplinar (integração de saberes de múltiplas disciplinas). Seu desenvolvimento como campo teórico, no que diz respeito ao âmbito de práticas, parte da formulação do pensamento coletivo, político, crítico e reflexivo construído por saberes provenientes da epidemiologia, da política, do planejamento e da gestão, e das ciências sociais e humanas em saúde que compreendessem o processo saúde-doença da realidade sanitária brasileira55 Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é Saúde Coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-14.. Desse modo, a formação profissional de sanitarista com a denominação saúde coletiva é iniciada em 1987, com os cursos de pós-graduação stricto sensu de mestrado, de doutorado em 1991 e, a partir de 2008, com a graduação de bacharéis em saúde coletiva66 Nunes ED, Ferreto LE, Barros NFD. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Cien Saude Colet 2010; 15(4):1923-1934.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652..
Os contextos do desenvolvimento da saúde coletiva como campo de conhecimento estão interligados aos movimentos de democratização da saúde como prática coletiva, social e pública. O projeto da RSB de 1970 debatia a concepção de saúde em seu conceito ampliado como um direito social, incorporado, em 1988, na Constituição Federal44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.. O SUS, como um dos componentes centrais desse projeto de reforma social, pauta-se em um conjunto de diretrizes fundamentais para a democratização da saúde, da sociedade, do poder público e da cultura55 Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é Saúde Coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-14.. Além disso, a partir da Constituição, assumiria a ordenação da formação dos recursos humanos dos cursos da área da saúde11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.,55 Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é Saúde Coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-14..
Durante esse processo, a saúde coletiva conquista espaço na formação dos profissionais de saúde pela inclusão dos conteúdos específicos desse campo de conhecimento nas graduações de saúde brasileiras, inseridos em suas diretrizes curriculares, e pelo ensino nos cursos de pós-graduação em saúde coletiva11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.,66 Nunes ED, Ferreto LE, Barros NFD. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Cien Saude Colet 2010; 15(4):1923-1934.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. Não obstante a relevância dos espaços conquistados para o ensino da saúde coletiva, algumas limitações foram apontadas para o reconhecimento de uma identidade para esse profissional. Evidenciou-se a insuficiência de uma formação profissional específica e especializada nas graduações de saúde existentes, e que o tempo para a formação e a quantidade de pós-graduados não responderia à demanda crescente de profissionais de saúde coletiva no Brasil11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.,44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518..
Desse modo, as profissões de saúde consolidadas, como medicina, enfermagem e farmácia, entre outras, não contemplavam o perfil profissional demandado para a gestão, construção e consolidação do SUS público e universal22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.. Os sanitaristas graduados em saúde coletiva aparecem para suprir uma demanda de mercado de profissionais da saúde capacitados no campo da gestão de serviços e sistemas, com domínio de conhecimento em epidemiologia, planejamento, políticas, vigilância e promoção da saúde, para atuar principalmente no SUS. Reconhecia-se que a saúde coletiva dispõe de um acúmulo de conhecimento histórico, científico, teórico, técnico e metodológico que permite sustentar uma nova profissão11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.,22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.,44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285..
Nesse cenário, a literatura aponta que, entre 2002 e 2007, ocorreu uma série de eventos, oficinas e congressos em âmbito nacional, a partir do esforço de professores, representantes de instituições de ensino e entidades como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e a Rede Unida, para tratar sobre a ideia da antecipação da formação de sanitaristas no nível de graduação22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.,44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.. A proposta formativa foi propiciada pelos marcos regulamentares da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação e pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI)11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.. Este último, com o objetivo de criar condições para ampliar o acesso e a permanência no ensino superior em universidades federais, é apontado pela literatura como catalisador das propostas que estavam em vias de implementação por essas instituições11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.
2 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.
3 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.-44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518..
Sobre os cursos, atualmente existem 24 cursos em funcionamento por todas as regiões do país, com grande diversidade, entre as instituições de ensino superior (IES), de nomenclatura e período de abertura, conforme disposto no Quadro 1 99 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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Desses cursos, a primeira turma de bacharéis em saúde coletiva foi formada pela UFAC em 201255 Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é Saúde Coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-14.. Destaca-se que, no primeiro semestre de 2014, havia 2.532 alunos com matrículas ativas em 18 cursos e 285 egressos88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. O mercado de trabalho é amplo, com atuação em cargos públicos, no âmbito do SUS e em secretarias de saúde, gestão, planejamento, assessoria, educação permanente, saúde suplementar, formação docente e como pesquisadores33 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.,44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. A inserção e permanência dos bacharéis em diferentes espaços ganhou expansão com a inclusão do graduado em saúde coletiva na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), em 2017, e com os processos em tramitação no Congresso Nacional para a regulamentação da profissão de sanitarista44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652..
Especificamente sobre a formação, desde 2012 existem egressos desses cursos formados sem amparo de diretrizes específicas à graduação em saúde coletiva. Nesse particular, em 2014 foi discutida, no Fórum de Graduação em Saúde Coletiva (FGSC), a construção de uma diretriz para nortear o planejamento curricular da graduação. Entre 2015 e 2016, foi construída, no FGSC, uma minuta apresentada ao Conselho Nacional de Educação (CNE), das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva (DCNsCGSC). A proposta foi aprovada pelo CNE em 20171010 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva [Internet]. 2017. [acessado 2020 set 11]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/fgsc-no-epi2017-expectativa-sobre-dcn-e-mobilizacao-para-o-abrascao-2018/276
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,1111 Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun.. Entretanto, aguarda publicação pelo Ministério da Educação (MEC) no Diário Oficial para entrar em vigor.
Após a aprovação das DCNsCGSC pelo CNE, houve preocupação por parte dos alunos e coordenadores de cursos de como se daria a incorporação das diretrizes. Em 20171212 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva tem nova coordenação [Internet]. 2021. [acessado 2021 jun 20]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/forum-de-graduacao-em-saude-coletiva-tem-nova-coordenacao/355
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, foram debatidas, nas reuniões do FGSC, medidas de implementação que respeitassem as particularidades e diversidades dos cursos, a depender da região onde estão inseridos. Essas discussões levaram muitos cursos a um processo de mudança nos projetos pedagógicos de cursos (PPCs) nos últimos anos. Houve um esforço de muitos cursos para promover alterações neste documento norteador dos cursos de graduação, em adequação às diretrizes que entrariam em vigor após três anos da publicação1212 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva tem nova coordenação [Internet]. 2021. [acessado 2021 jun 20]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/forum-de-graduacao-em-saude-coletiva-tem-nova-coordenacao/355
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Nessa perspectiva, identificou-se uma lacuna na forma como é organizado o ensino nos cursos de graduação em saúde coletiva existentes no Brasil e nos desdobramentos entre a convergência dos PPCs com os princípios contidos nas DCNsCGSC relacionados à estrutura de ensino na graduação. Desse modo, objetiva-se analisar o ensino nos cursos de graduação em saúde coletiva no Brasil à luz dos projetos pedagógicos.
Métodos
Estudo qualitativo e exploratório com abordagem documental, uma vez que, de acordo com Minayo1313 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, Rio de Janeiro: Hucitec; 2014., o método qualitativo conforma-se melhor com a investigação de grupos e segmentos delimitados, de histórias sociais sob a ótica dos atores, de relações e para a análise de discurso e de documentos. A escolha do PPCs como fonte de informação se deu por ser um instrumento norteador para a formação preconizado pelo MEC nas diretrizes curriculares1414 Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 569, de 8 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os princípios gerais para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação da Área da Saúde. Diário Oficial da União 2018; 8 dez.. O cenário de investigação foi constituído pelos 24 cursos de graduação com nomenclatura de bacharelado em saúde coletiva ou correspondentes cadastrados pelo Fórum de Graduação em Saúde Coletiva no endereço eletrônico da Abrasco99 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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A coleta de dados foi realizada entre outubro e dezembro de 2020. Inicialmente, os PPCs foram pesquisados mediante contato por endereço eletrônico com os coordenadores dos cursos e por acesso ao site institucional das 24 IES. Foram identificados 22 PPCs que seguiram para análise. Dois cursos não apresentavam os projetos disponíveis nem responderam às mensagens eletrônicas de solicitação, por esse motivo foram excluídos da pesquisa. Para assegurar o anonimato dos PPCs analisados, os nomes das IES foram codificados com números inteiros.
A análise dos dados foi efetuada com base no método de análise de conteúdo, na modalidade temática, segundo as três fases orientadas por Minayo1313 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, Rio de Janeiro: Hucitec; 2014.. Na primeira, que se refere à pré-análise, a leitura flutuante foi realizada mediante o contato com os PPCs de graduação em saúde coletiva. A constituição do corpus se deu por meio da análise da temática “estrutura de ensino na graduação em saúde coletiva” contida nos PPCs. Identificou-se que o material coletado contemplava todos os aspectos levantados no roteiro estruturante correspondente a currículo obrigatório, currículo optativo, estágio supervisionado, campo de estágio, trabalho de conclusão de curso e avaliação do ensino-aprendizagem. Foi feita a transcrição dos textos formando um arquivo para cada projeto no programa LibreOffice Writer versão: 6.3.2.2 (x64), que gerou um total de 22 arquivos que formam o universo de estudo em sua totalidade. A partir da execução da pré-análise, foi estabelecida a unidade de registro referente às áreas estruturantes para o ensino acadêmico.
A segunda fase, que corresponde à exploração do material, foi realizada a partir da unidade de registro preestabelecida, que consiste no descobrimento dos núcleos de sentido que compõem a comunicação do texto. Cada projeto foi analisado e organizado de modo a conter a unidade de registro e suas subcategorias, o que gerou 22 corpus. Cada corpus foi reorganizado em um segundo agrupamento contendo um arquivo correspondente para a unidade de registro dos 22 cursos, gerando um grande corpus.
A terceira fase consistiu no tratamento dos resultados obtidos e na interpretação dos dados. Foi realizada mediante o processamento do conteúdo textual do corpus, por meio da análise lexicográfica, com suporte do software Interface de R pour Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (Iramuteq) versão 0.7. O Iramuteq é um software gratuito que utiliza a interface R para efetuar análises estatísticas de corpus textuais para identificação dos segmentos de texto, ocorrência e frequência média de palavras e classificação gramatical que represente os discursos dos textos1515 Camargo BV, Justos AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psi 2013; 21(2):513-518.. Julgou-se necessária a utilização do processamento no software numa tentativa de diminuir a subjetividade da análise de cada texto, visto o grande quantitativo de textos dos 22 PPCs, que resultaram no total de 132 textos processados.
Após o processamento do corpus no software, foram verificados os parâmetros de conformidade do corpus com 132 textos e que teve aproveitamento superior a 82,29%, o que é considerado satisfatório.
Após este processamento inicial, seguiu-se com o processamento do corpus no software para obter a Classificação Hierárquica Descendente (CHD), que corresponde a classes de segmentos de texto (STs) por meio do método de Rainert. Este método visa extrair as classes de segmentos de texto, apresentando os vocábulos que se aproximam e os que se diferenciam dos segmentos de texto1515 Camargo BV, Justos AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psi 2013; 21(2):513-518.. Os resultados foram apresentados em seis seções correspondentes à unidade de registro. Além disso, foi organizado um banco de dados contendo os componentes curriculares obrigatórios e optativos de cada curso, identificados nos PPCs.
Foram consideradas as subáreas da saúde coletiva de epidemiologia, ciências sociais e ciências humanas em saúde e política, planejamento e gestão contidas nas DCNsCGSC10 para identificar os termos de referência na nomenclatura dos componentes obrigatórios nos currículos. Queríamos saber o quanto esse campo de conhecimento está representado nos cursos. A análise foi feita considerando o total de citações no currículo de componentes obrigatórios com os termos de referência e então, quando apropriado, efetuado o cálculo de porcentagem. Os componentes optativos foram considerados quando identificados com duas ou mais aparições no currículo. Para o desenvolvimento deste estudo não foi necessária a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), visto que utilizamos dados de domínio público, conforme a Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.
Resultados
O corpus que originou os resultados deste estudo foi formado a partir da análise de 22 projetos pedagógicos dos cursos de graduação em saúde coletiva organizados em uma unidade de registro. O Gráfico 1 mostra a quantidade e a distribuição dos projetos no período analisado, desses, 50% das datas dos documentos são de 2016 a 2019. Observa-se que 31,8% dos projetos entre 2018 e 2019 foram alterados com base no que preconizam as DCNsCGSC.
Os cursos estão distribuídos entre as regiões do país, sendo seis na região Norte, representando 27,3% do total dos cursos, cinco (22,7%) na região Sul, quatro (18,2%) na região Nordeste, percentual que se repete no Sudeste, e três cursos no Centro-Oeste, correspondendo a 13,6%. Foi identificada maior concentração de abertura dos cursos entre 2008 e 2014, com 86,3%; nos anos seguintes, entre 2015 e 2019, foram abertos dois cursos, representando 9%. Observa-se que a região Norte concentra o maior quantitativo de cursos, com o primeiro curso do país implantado em 2008 com a nomenclatura Bacharelado em Saúde Coletiva, e o último curso, em 2019, conforme apresentado no Quadro 2.
Quanto à distribuição dos cursos por instituição, há uma predominância nas universidades federais, com 68,5%, seguidas das universidades públicas, com 18%, e das universidades estaduais, com 13,5%. A nomenclatura predominante é a de Bacharelado em Saúde Coletiva em 77,3% dos cursos, e alguns destes cursos apontam ter modificado a nomenclatura para a mais utilizada no Brasil. Cinco cursos (22,7%) apresentam variação da nomenclatura, conforme o Quadro 2.
Os resultados obtidos pela CHD são apresentados no dendrograma (Figura 1) e tratam sobre as áreas estruturantes para o “ensino na formação acadêmica do graduado em saúde coletiva”. A CHD é formada por 132 textos, destacados por 1.434 segmentos de texto, que obtiveram aproveitamento total de 1.180, representando 82,29%. Foram registradas 50.481 ocorrências de palavras ou vocábulos; 4.668 formas diferentes de palavras; e 1.119 com uma aparição (hápax). A unidade é composta de um corpus único que se repartiu em dois subcorpus, gerando duas categorias. Uma categoria gerou as classes I (20.85%) e III (12.46%), e a segunda, as classes VI (15.34%), IV (15.08%), II (21.69%) e V (14.58%); sendo as classes V, II e IV aquelas que apresentam discurso com maior semelhança e agrupamento entre as classes IV e II.
Dendrograma da classificação hierárquica descendente do ensino na formação acadêmica do graduado em saúde coletiva.
Classe I - componente curricular
A classe I, representada por 20,85% dos vocabulários, trata sobre os componentes curriculares obrigatórios e optativos ofertados para a formação na graduação em saúde coletiva. Obtiveram maior relevância para essa classe as palavras epidemiologia, saúde, ciência, vigilância e gestão. Estas representam os três eixos fundamentais da saúde coletiva que devem integrar a formação.
Em relação aos componentes que formam a matriz curricular, analisados a partir do termo de referência, foram identificados 274 componentes obrigatórios. A epidemiologia representa 24,08% (66) dos componentes analisados; as políticas, o planejamento e a gestão em saúde, 66,42% (182); e as ciências sociais e humanas em saúde, 9,50% (26). Analisando os componentes em separado, os relacionados à gestão representam 33,57% (92), seguidos da epidemiologia, com 24,08% (66), políticas, com 17,15% (47), planejamento, com 15,69% (43), ciências sociais, com 7,66% (21), e ciências humanas, com 1,85% (5). Esses componentes são ofertados de forma escalonada com variações de três a quatro componentes, têm variação de carga horária com média de 45 a 60 horas/aula. Além dos componentes, são preconizados estágios obrigatórios nas áreas estruturantes de gestão, epidemiologia e vigilância.
A distribuição dos principais componentes da área de concentração da saúde coletiva representa uma variação a depender da região, conforme o Quadro 3.
Identifica-se, na região Norte, a oferta de todos os principais componentes comuns ao ensino da saúde coletiva apresentados na matriz curricular dos PPCs, com destaque para os relacionados a: ciências humanas, 80% (4); ciências sociais, 38,09% (8); vigilância, 32,07% (17); políticas, 31,91% (15); atenção à saúde, 33,33% (6); tópicos especiais, 60,00% (3); educação e comunicação em saúde, que representam 32,35% (13). A região Sudeste apresenta maior instabilidade na oferta de componentes, quando comparada às demais regiões.
Os componentes com o termo de referência “SUS” aparecem em menor quantidade, são considerados obrigatórios e apresentados nas seguintes variações: história da saúde e organização do SUS; legislação do SUS; economia da saúde e financiamento do SUS; o SUS como modelo de atenção à saúde; e funções de gestores do SUS. Esses componentes foram mencionados em apenas 18% (4) dos PPCs dos cursos analisados.
O componente optativo de Língua Brasileira de Sinais (Libras) aparece em 59% (13 cursos) das matrizes curriculares dos projetos analisados. As demais temáticas relacionadas aos componentes optativos apresentam ampla variação entre os cursos. Os componentes que obtiveram maior destaque, com duas ou mais aparições, foram: gênero, gênero e saúde, raça e etnia; direitos humanos, povos indígenas, ética, bioética, diversidade cultural, relações étnico-raciais, saúde do trabalhador, administração pública e saúde mental. A carga horária desses componentes apresenta variação entre 30 e 60 horas; alguns têm 90 horas. Dois cursos não apresentam informações sobre a matriz de componentes optativos.
Classe III - articulação entre o currículo e o saber
A formação da classe III tem 12,46% dos vocábulos que envolvem os contextos desenvolvidos nos componentes obrigatórios, optativos e de campo de estágio durante o processo formativo. São representados pelas palavras ação, população, determinante, controle e saúde.
A palavra “ação” emerge da interação dos alunos com os diversos campos interligados no curso por meio do desenvolvimento de atividades práticas. No projeto da IES 10, é destacado que a integração prática “oportuniza aos futuros sanitaristas o acesso à prática nos serviços e ambientes da sociedade civil e em instituições de outras áreas”. A interligação da ação em saúde representa o discurso das ações realizadas para o diagnóstico dos agravos de saúde da população. Desse modo, o contato prático dos alunos é feito durante os estágios obrigatórios, a partir do estudo dos determinantes sociais e do controle social exercidos pelos serviços de saúde.
O projeto da IES 19 apresenta as atividades que os alunos vão desempenhar durante as atividades práticas, são elas: “avaliação, formulação, construção de práticas de cuidado em saúde, incluindo processos decisórios em diferentes dispositivos de gestão da clínica ampliada de forma compartilhada com as equipes de saúde e comunidade a partir do contexto e necessidades identificadas no serviço”. Observa-se a importância da relação entre a construção do saber formativo das universidades e a integração com os cenários de práticas para a formação e desenvolvimento da atuação profissional.
Classe VI - avaliação do ensino-aprendizagem
A classe VI corresponde a 15,34% dos discursos relacionados à avaliação do ensino durante a graduação em saúde coletiva. É representada pelas palavras: frequência, número, nota, prova e avaliação.
A palavra “frequência” se refere à assiduidade dos alunos durante as atividades de ensino exercidas ao longo da formação. Para avaliação da presença nas atividades desenvolvidas a cada semestre, o aluno precisa obter frequência igual ou superior a 75% da carga horária total para ser considerado aprovado. A expressão “número” representa variações de sentido, expressadas por número de leis que trazem respaldo à avaliação do ensino-aprendizagem da formação em saúde coletiva. O projeto da IES 5 destaca “o parecer número 242/2017, orienta os conteúdos no currículo do curso de graduação em saúde coletiva, bem como sua organização curricular, flexibilidade de estudos, demandas e expectativas de desenvolvimento do campo de saberes e práticas da saúde coletiva”.
As palavras “nota”, “prova” e “avaliação” estão interligadas entre si e denotam o processo de aferição dos índices de aprendizado dos alunos. Identifica-se a padronização de ao menos uma atividade avaliativa ser uma prova teórica ou prática. De forma complementar, são considerados: “trabalhos escritos, seminários, leitura, resenha crítica de textos, relatórios de visitas técnicas, estudos orientados, grupos de discussão, portfólios, análise do desempenho em campos de prática e autoavaliação” (IES 15). A avaliação do aluno se baseia no rendimento escolar a partir dos resultados dos diversos trabalhos e dos exames finais. Observa-se, entre os cursos, a utilização de metodologias inovadoras de avaliação para valorização do conhecimento.
Classe IV - trabalho de conclusão de curso
A classe IV detém 15,08% dos discursos relacionados sobre o trabalho de conclusão de curso (TCC). É considerada uma atividade obrigatória para a formação que pode ser realizada durante o período de estágio ou no desenvolvimento da produção científica. As palavras que configuram essa atividade são representadas como: relatório, científico, monografia, artigo e professor.
Os vocábulos destacados por esta classe representam os modelos de atividades desenvolvidas pelo aluno como produto final para sua formação. São consideradas as atividades de intervenção realizadas no estágio que terão como produto um relatório ou a produção de uma pesquisa que resultará em uma monografia ou artigo. O intuito desse processo é gerar no aluno “o aprofundamento do conhecimento numa área de interesse no campo da saúde que será apresentado na forma oral e escrita no formato de monografia ou artigo científico na disciplina de TCC” (IES 5). Destaca-se que esse trabalho pode ser a primeira produção científica do aluno durante a formação. É marcado como um momento para além da contribuição científica, pelo início da experiência como pesquisador. Além disso, o professor orientador participa de todo o processo de construção do trabalho, bem como da avaliação da produção intelectual.
Classe II - articulação prática na formação
A classe II é formada por 21,69% dos contextos que envolvem o contato prático durante a formação. Os vocábulos são evidenciados por meio das palavras profissional, formação, conhecimento, pedagógico e prático.
A palavra “profissional” se refere ao contato dos alunos com experiências reais do cotidiano profissional de saúde vivenciadas durante as atividades práticas. O projeto da IES 3 destaca que “o objetivo é proporcionar experiência nos diferentes cenários de prática no SUS, estabelecer articulação entre teoria e prática profissional, propiciando reflexões sobre o processo de trabalho cotidiano nos serviços de saúde”.
As palavras “formação”, “conhecimento”, “pedagógico” e “prático” estão interligadas e juntas expressam o contexto em que são formadas as competências e habilidades nessa passagem para o amadurecimento profissional. “É pretendido que o aluno vivencie e consolide as competências exigidas para o exercício profissional em diferentes campos” (IES 9). Identifica-se nos projetos o esforço dos cursos para transformar as aulas práticas em ferramenta para uma formação voltada principalmente para a atuação nos serviços de saúde, de maneira que integre ensino, serviço e comunidade.
Classe V - organização curricular
A classe V é representada por 14,58% dos discursos sobre organização do currículo estruturado durante a formação na graduação em saúde coletiva. Foram destacados por esta classe os vocábulos hora, crédito, obrigatório, integralização e optativo.
A palavra “hora” representa uma variação entre os termos “horário” do curso e “carga horária” de componentes curriculares obrigatórios, optativos, de atividades complementares e estágios.
No Quadro 2 é apresentada a distribuição da carga horária dos cursos analisados. Destaca-se que na maioria, 40,9% dos cursos, o horário de funcionamento é noturno, 68,2% dos cursos têm carga horária igual ou superior a 3.200 horas e 4,5% realizaram a adequação da carga horária após as DCNsCGSC de 2017. Todos os cursos mencionam a carga horária destinada a atividades obrigatórias e como são distribuídas entre os componentes obrigatórios, estágios e TCC.
Quanto aos componentes optativos, 81,8% dos cursos mencionam os componentes ofertados e a carga horária a eles destinada, mas 18,8% não apresentam o valor da carga horária nos PPCs para essa atividade. A maioria dos cursos menciona a carga horária destinada a atividades complementares e apenas 9% apresentam uma carga horária específica destinada a atividades de extensão, o que representa 10% da carga horária total do curso.
Para os cenários das práticas durante o estágio supervisionado, os projetos destacam os serviços de saúde que contemplam diferentes níveis de complexidade: públicos e privados; Estratégia Saúde da Família; unidades básicas; serviços especializados; serviços de apoio a diagnóstico e hospitais. Essa diversidade de serviços permite que o estagiário vivencie as mais diferentes possibilidades de atuação profissional.
Nos setores que representam a gestão em saúde, os espaços corporativos são representados pelos serviços de: regulação, controle e avaliação; auditoria; planejamento; programas de saúde e de políticas de saúde; comunicação; vigilância; gestão do trabalho e da educação na saúde e em empresas de planos de saúde. Os espaços sociais são representados por: conselhos de saúde; conferências de saúde; polos de educação permanente em saúde; associações comunitárias; comissão intergestores e ouvidorias. Ainda compõem essa lista os serviços de pesquisa, como: laboratórios; institutos de pesquisas; universidades; organizações não governamentais; e hospitais de ensino.
Discussão
Os resultados apontam que, em maior predomínio, os cursos seguem ou procuraram se adequar ao que é preconizado nas DCNsCGSC de 2017, mesmo que esta ainda não estejam em vigor, por não ter sido publicada no Diário Oficial pelo MEC. Destaca-se que, em 2018 e 2019, 31,8% dos cursos atualizaram seus PPCs com base na diretriz de 2017. Esse alinhamento é identificado devido ao empenho dos coordenadores dos cursos, realizado no âmbito dos fóruns da Abrasco. Nesses espaços são promovidas discussões coletivas em benefício do fortalecimento da graduação, ao atualizarem suas propostas pedagógicas para haver equiparação do ensino durante a formação, independentemente da região onde o curso está inserido88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,1010 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva [Internet]. 2017. [acessado 2020 set 11]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/fgsc-no-epi2017-expectativa-sobre-dcn-e-mobilizacao-para-o-abrascao-2018/276
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,1111 Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun..
Quando comparado a estudos anteriores, atualmente é identificada a consolidação da nomenclatura Bacharelado em Saúde Coletiva em 77,3% dos cursos88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,99 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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. Ao analisar os cursos de graduação em saúde coletiva entre 2008 e 2014, um estudo identificou a região Nordeste com maior concentração de cursos, um total de cinco no período analisado88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. No cenário atual, a região Norte se destaca pelo maior quantitativo (6) de cursos no país, com 27,3%. A justificativa para essa expansão paulatina é representada pela inauguração de novas universidades e a abertura de novos cursos. Destaca-se que, em 2018 e 2019, foram abertos dois cursos de saúde coletiva na região88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,99 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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Quanto às instituições de ensino, 68,5% dos cursos estão em universidades federais. Essa forte concentração da formação em instituições federais também é identificada na literatura pelas instituições que aderiram ao programa REUNI22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. Esses primeiros cursos tiveram o apoio do REUNI para a abertura de novos cursos e a expansão do ensino superior, e continuaram se expandindo pelas regiões do país ao longo dos anos33 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. O impulso rápido, de 90,9%, observado entre 2008 e 2014 foi definhando entre 2015 e 2019, com a abertura de apenas dois cursos88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,99 Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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. A justificativa apontada na literatura para essa desaceleração da educação superior está relacionada à intensificação das políticas de austeridade e às recentes perdas sofridas nos recursos orçamentários destinados à educação pública22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,1616 Mangueira JO, Silva LR, Medeiros KR, Santos CR, Pinto ICM. Graduação em saúde pública no Brasil: formação, identidade profissional e inserção no mercado de trabalho. Pesq Soc Desenv 2021; 10(5): e21810514746..
Os resultados deste estudo se diferem de uma pesquisa realizada em 2017, ao analisar as matrizes curriculares com relação a políticas, planejamento e gestão em saúde de 15 cursos denominados Bacharelado em Saúde Coletiva, em que identificou inconsistências no ensino1717 Sobral LF, Barros EL, Carnut L. A área de política, planejamento e gestão em saúde nas graduações em saúde coletiva no Brasil. Trab Educ Saude 2017; 15(3):879-894.. Hoje é reconhecido o esforço dos cursos para ancorar o ensino nas bases da saúde coletiva, com destaque para o eixo de componentes relacionados a políticas, planejamento e gestão em saúde, que representam 66,42% dos componentes ofertados durante a formação. Destaca-se o baixo quantitativo, de 9,50%, de componentes do eixo da diretriz relacionados às ciências sociais e humanas em saúde, o que pode inviabilizar discussões importantes para a formação do sanitarista1111 Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun..
Quando analisados os componentes por temática, a gestão em saúde representa 33,57% do total de componentes ofertados. Esse resultado aponta uma consolidação dessa área de ensino na graduação em saúde coletiva, que em outros tempos apresentava fragilidades1717 Sobral LF, Barros EL, Carnut L. A área de política, planejamento e gestão em saúde nas graduações em saúde coletiva no Brasil. Trab Educ Saude 2017; 15(3):879-894.. As ciências sociais e humanas estarem em menor percentual aponta que essas temáticas precisam ter a matriz curricular ampliada, tendo em vista a dificuldade de aprofundamento dos enfoques teóricos e metodológicos. Chama a atenção, sobretudo, a pertinência desses componentes, por tratarem de assuntos relevantes para a teoria e a prática da saúde coletiva no desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo dos alunos, preconizado nas diretrizes1111 Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun.,1818 Trad LAB, Mota CS, López YAA. O ensino das ciências sociais e humanas na graduação em saúde coletiva: entre desafios e oportunidades de transgressões. Saude Soc 2019; 28(2):11-24.. Ressalta-se, ainda, a escassez de componentes com o termo de referência “SUS” numa graduação em saúde coletiva, apontado em apenas 18% dos cursos. O estudo de Sobral1717 Sobral LF, Barros EL, Carnut L. A área de política, planejamento e gestão em saúde nas graduações em saúde coletiva no Brasil. Trab Educ Saude 2017; 15(3):879-894. associou o baixo índice de componentes relacionados ao SUS, com a perda, nos últimos anos, da força ideológica que originou o sistema de saúde nos movimentos da RSB.
Os componentes optativos que mais apareceram nos PPCs foram Libras, seguida dos componentes relacionados a gênero, gênero e saúde, raça e etnia, direitos humanos, povos indígenas, ética, bioética, diversidade cultural e relações étnico-raciais. É destacado por Pedrosa1919 Pedrosa JIS. A equidade em saúde na formação médica: reflexões sobre o curso de medicina em Parnaíba, Piauí, Brasil. Edu Popul Equi Saude 2020; 1:82-107. que a maior aparição das temáticas étnico-raciais e de direitos humanos como componentes optativos pode levar os alunos a não optarem cursar esses componentes durante a formação. Desse modo, pode ocorrer a invisibilidade de temáticas que abordam o preconceito, as diferenças culturais e raciais e a importância da inclusão social1919 Pedrosa JIS. A equidade em saúde na formação médica: reflexões sobre o curso de medicina em Parnaíba, Piauí, Brasil. Edu Popul Equi Saude 2020; 1:82-107..
A análise da distribuição dos principais componentes por região nos faz inferir que a região Norte apresenta o maior quantitativo de componentes do escopo da saúde coletiva. Essa relação é identificada nos PPCs pelo perfil de formação da matriz curricular dos cursos da região Norte, que enfatizaram questões sociais e culturais de saúde da população, abordadas nos componentes das ciências humanas e sociais2020 Loiola AA, Cyrino EG, Alexandre FLF. Competências e habilidades nos currículos da graduação em saúde coletiva no Brasil. Rev Baiana de Saude Publica 2017; 41(1):81-97.. Já os cursos da região Sudeste, quando comparados aos das demais regiões, não apresentam destaque de componentes da área de concentração da saúde coletiva pela variação na matriz curricular, bem como nos perfis dos cursos da região. O estudo de Meneses88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518. ressalta que, quanto maior a variação da nomenclatura do curso, pode ocorrer maior divergência no perfil de formação.
As unidades de registro que abordaram o currículo e a formação prática enfatizam que os alunos têm uma formação ativa ao interligarem a teoria à prática profissional com as situações reais de necessidade de saúde da população, de modo que integrem ensino, serviço e comunidade. Estudos anteriores apontaram ser imprescindível o contato prático dos graduandos com os serviços de saúde para o aperfeiçoamento e conhecimento dos núcleos de saberes e a prática profissional do sanitarista bacharel, fortalecendo assim a inserção no mercado de trabalho após a formação11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.
2 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.
3 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.-44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518..
A avaliação do ensino-aprendizagem dos graduandos está em consonância com o preconizado nas DCNsCGSC de 2017, pela incorporação de metodologias inovadoras de avaliação. São descritas nos PPCs atividades avaliativas com metodologias ativas de discussão, de forma individual ou em grupo, que prezam a construção do conhecimento participativo, de maneira que amplie o modelo tradicional avaliativo de provas práticas e teóricas1111 Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun..
O horário de funcionamento, em 40,9% dos cursos de saúde coletiva, é noturno. Esse resultado também foi identificado em estudos anteriores22 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.. No entanto, é sinalizada nos PPCs uma migração paulatina para o turno diurno, em decorrência do horário de funcionamento dos serviços de saúde. Os resultados afirmam que a estrutura organizacional dos cursos, de maneira predominante, cumpre ou se adequou ao que preconizam as DCNsCGSC 2017 quanto à carga horária total do curso ser igual ou superior a 3.200 horas, divididas entre componentes obrigatórios, optativos, estágios supervisionados e atividades complementares. Nota-se que apenas 9% dos cursos destinam carga horária específica a atividades de extensão, conforme orientado pela Diretriz de Extensão Superior para ações estratégicas de gestão da saúde1414 Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 569, de 8 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os princípios gerais para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação da Área da Saúde. Diário Oficial da União 2018; 8 dez..
Os cenários de práticas e as atividades desenvolvidas pelos estagiários estão em consonância com os achados em estudos anteriores, quando tratam da diversidade de espaços práticos tanto para estágios quanto para atuação profissional11 Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.
2 Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.
3 Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.-44 Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.,77 Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.,88 Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.,1616 Mangueira JO, Silva LR, Medeiros KR, Santos CR, Pinto ICM. Graduação em saúde pública no Brasil: formação, identidade profissional e inserção no mercado de trabalho. Pesq Soc Desenv 2021; 10(5): e21810514746.. Por fim, o presente estudo identifica que a formação na graduação em saúde coletiva apresenta convergência com o preconizado nas DCNsCGSC de 2017, caracterizando uma ascendência para consolidação dos cursos ao escopo de ensino na área.
Conclusão
A graduação em saúde coletiva no Brasil foi idealizada pelas políticas de reorientação da formação dos profissionais de saúde com vistas à formação de profissionais mais implicados no fortalecimento e na consolidação do SUS. A capacidade de articulação dos docentes, coordenadores, discentes e egressos se destaca na história dessa formação. Os fóruns da Abrasco, espaço que congrega a maioria dos cursos, consiste em um lugar privilegiado de articulação e pactuação nacional para esses atores. Os reflexos de suas ações conjuntas são constatados nos PPCs, que preservam um eixo comum que se ancora nas bases da saúde coletiva. A incorporação ou adequação dos PPCs às DCNsCGSC de 2017, em alguns cursos, reforçou a oferta de uma formação de ensino em saúde mais equânime entre os cursos.
Nesse sentido, independentemente da região onde o curso está inserido, identifica-se uma matriz curricular com base no campo de ensino da saúde coletiva com destaque para os componentes relacionados à gestão em saúde, ainda que se observem as particularidade das regiões de cada curso.
No estudo aqui apresentado, identificou-se e discutiu-se a baixa proporção de componentes curriculares do eixo de ensino das ciências humanas e sociais na graduação em saúde coletiva. Portanto, a institucionalização e consolidação desses eixos de ensino do campo de conhecimento da saúde coletiva torna-se um desafio a ser superado pela graduação. Cabe refletir se a estrutura de ensino apresentada nos PPCs espelha a complexidade de saberes do campo das estruturas políticas e sociais que implicam na capacidade de pensar e agir do aluno, de modo a prepará-lo para a atuação profissional.
Aposta-se em uma formação que capacita o aluno a olhar as deficiências da sociedade e buscar desenvolver políticas públicas que cooperem com campo da saúde coletiva para a efetiva consolidação do SUS. Os profissionais formados pela graduação em saúde coletiva avançaram na ampliação do horizonte de suas trajetórias de ensino e de atuação nas práticas de saúde.
Referências
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1Paim JS, Pinto ICM. Graduação em Saúde Coletiva: conquistas e passos para além do sanitarismo. Tem Act de Saúde Colet 2013; 7(3):13-35.
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2Pinto I, Paim J. A Abrasco e a experiência da graduação em saúde coletiva. In: Lima NT, Santana JP, Paiva CHA, organizadores. Saúde Coletiva: a Abrasco em 35 anos de história. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2015. p. 137-150.
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3Silva VO, Pinto ICM, Teixeira CFS. Identidade profissional e movimentos de emprego de egressos dos cursos de graduação em Sau´de Coletiva. Saude Debate 2018; 42:799-808.
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4Viana JL, Souza ECF. Os novos sanitaristas no mundo do trabalho: um estudo com graduados em saúde coletiva. Trab Educ Saude 2018; 16(3):1261-1285.
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5Vieira-da-Silva LM, Paim JS, Schraiber LB. O que é Saúde Coletiva? In: Paim JS, Almeida-Filho N, organizadores. Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook; 2014. p. 3-14.
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6Nunes ED, Ferreto LE, Barros NFD. A pós-graduação em Saúde Coletiva no Brasil: trajetória. Cien Saude Colet 2010; 15(4):1923-1934.
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7Souza PB, Lopes DCL, Valença CN, Medeiros SM. Mercado de trabalho do sanitarista em saúde coletiva: novas perspectivas. Rev Baiana Saude Publica 2018; 42(4):640-652.
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8Meneses JJS, Silva MMO, Castellanos MEP, Ribeiro GS. Panorama dos cursos de graduação em Saúde Coletiva no Brasil entre 2008 e 2014. Trab Educ Saude 2017; 15(2):501-518.
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9Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação em Saúde Coletiva [Internet]. 2021. [acessado 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/cursos
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10Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva [Internet]. 2017. [acessado 2020 set 11]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/fgsc-no-epi2017-expectativa-sobre-dcn-e-mobilizacao-para-o-abrascao-2018/276
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11Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 242/2017. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Saúde Coletiva. 2017; 6 jun.
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12Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Fórum de Graduação de Saúde Coletiva tem nova coordenação [Internet]. 2021. [acessado 2021 jun 20]. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/graduacaoemsaude/forum-de-graduacao-em-saude-coletiva-tem-nova-coordenacao/355
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13Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, Rio de Janeiro: Hucitec; 2014.
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14Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 569, de 8 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os princípios gerais para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação da Área da Saúde. Diário Oficial da União 2018; 8 dez.
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15Camargo BV, Justos AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psi 2013; 21(2):513-518.
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16Mangueira JO, Silva LR, Medeiros KR, Santos CR, Pinto ICM. Graduação em saúde pública no Brasil: formação, identidade profissional e inserção no mercado de trabalho. Pesq Soc Desenv 2021; 10(5): e21810514746.
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19Pedrosa JIS. A equidade em saúde na formação médica: reflexões sobre o curso de medicina em Parnaíba, Piauí, Brasil. Edu Popul Equi Saude 2020; 1:82-107.
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Financiamento
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001.
Editores-chefes:
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
29 Maio 2023 -
Data do Fascículo
Jun 2023
Histórico
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Recebido
02 Maio 2022 -
Aceito
08 Set 2022 -
Publicado
10 Set 2022