Open-access Normas de associação semântica para 20 categorias em adultos e idosos

Semantic association norms for 20 categories in adults and elderly

Normas de asociación semántica para 20 categorías en adultos y ancianos

Resumos

O desenvolvimento de normas para categorias semânticas é necessário para a compreensão do modo como os indivíduos organizam o conhecimento na memória e para a construção de instrumentos de avaliação cognitiva. O objetivo do presente estudo é fornecer normas associativas de 20 categorias semânticas para adultos e idosos brasileiros. Participaram do estudo 236 pessoas, entre 40 e 88 anos, das cinco regiões brasileiras. Os participantes responderam a um questionário de dados sociodemográficos e a um questionário de itens para categorias semânticas, e foram solicitados a produzir os cinco primeiros exemplares de cada categoria apresentada. Os resultados foram agrupados e são apresentadas as normas das categorias (exemplares, tamanho da categoria, respostas corretas, em branco e erros), bem como as respostas de cada categoria que foram comuns a todas as regiões brasileiras.

semântica; normas; associação; adulto; idoso


The development of semantic category norms is necessary to assist in the understanding of how individuals organize knowledge in memory, and to the creation of cognitive assessment instruments. The aim of this study is to provide associative norms of 20 semantic categories for Brazilian adults and elderly. The study included 236 participants from 40 to 88 years of age from the five Brazilian regions. They answered a socio-demographic questionnaire and a semantic category questionnaire, in which they were asked to produce the first five items of each category. Results are presented in category norms (items, category set size, correct responses, no responses and errors), as well as the responses that were common to all Brazilian regions belonging to each category.

semantics; standards; association; adult; aged


Es necesario el desarrollo de normas para categorías semánticas para poder comprender cómo las personas organizan el conocimiento en la memoria y para la construcción de instrumentos de evaluación cognitiva. El objetivo de este estudio es proporcionar normas asociativas de 20 categorías semánticas para muestras de brasileños adultos y ancianos. Participaron 236 personas entre 40 y 88 años, de cinco regiones de Brasil. Los participantes completaron un cuestionario de datos sociodemográfico y un cuestionario de ítems para categorías semánticas y se les solicitó la producción de los cinco primeros ejemplares de cada categoría presentada. Los resultados fueron agrupados y son presentadas las normas de las categorías (ejemplares, tamaño de categoría, respuestas correctas, en blanco y errores), así como las respuestas de cada categoría, comunes a todas las regiones de Brasil.

semántica; normas; asociación; adulto; anciano


Introdução

A disponibilidade de bancos de normas de palavras e imagens tem auxiliado pesquisadores no desenvolvimento de estudos em Psicologia e áreas correlatas. A utilização de estímulos normatizados reduz os efeitos indesejáveis de confusão dos experimentos, contribuindo para a compreensão teórica de fenômeno ou para desenhos experimentais. Como exemplo do uso de normas, pode-se citar que, quando a familiaridade de um determinado estímulo não é controlada em um teste de memória, isso pode repercutir na facilitação da tarefa para um grupo experimental que apresenta maior contato com os estímulos (familiaridade), enviesando as conclusões do estudo. Dessa forma, a criação de bancos de normas, busca minimizar esse tipo de efeito, além de ser fonte, por si só, de conhecimento.

Na literatura, destacam-se as normas internacionais de frequência de palavras de (Kucera e Francis 1967), de categorização semântica de (Battig e Montague 1969), de familiaridade e tipicidade de Hampton e Gardiner (1983), e de concretude de (Paivio, Yuille e Madigan 1968). Em se tratando de imagens, cita-se o estudo de (Snodgrass e Vanderwart 1980), que apresentam dados de concordância de nomeação, imageabilidade, familiaridade e complexidade visual.

No Brasil, o desenvolvimento de normas de palavras foi realizado principalmente na última década e compreende, na maioria das vezes, o estudo da frequência com que certas respostas são emitidas. Destaca-se a criação de um banco de dados de frequências de palavras na fala e na escrita de (Sardinha 2000), os estudos de associação semântica, concretude, frequência e emocionalidade de (Stein e Gomes 2009), as pesquisas sobre categorização semântica em adultos de (Janczura 1996) e em idosos de (Van Erven 2010), de concretude de palavras de (Janczura, Castilho, Rocha e Van Erven 2007), de associação de palavras completando sentenças de (Janczura 2005) e os estudos de Salles sobre associação semântica livre de palavras em universitários (Salles et al., 2008) e em adultos jovens e idosos (Zortea & Salles, 2012).

A criação de normas é útil ao entendimento de como os indivíduos organizam o conhecimento, além de servir de fonte no desenvolvimento de tarefas e instrumentos de mensuração (Buschke, 1984; Kaplan, Goodglass, & Weintraub, 2001). Ao que diz respeito, especificamente, à categorização semântica, pesquisadores buscam compreender o modo como os seres humanos organizam e relacionam mentalmente as informações. O banco de normas de categorização semântica mais difundido na literatura é o de (Battig e Montague 1969), o qual atualizou e expandiu os primeiros estudos com 43 categorias verbais de (Cohen, Bousfield e Whitmarsh 1957).

Ao realizar a coleta de dados, (Battig e Montague 1969) apresentavam um caderno com 56 categorias (uma por página), para as quais os participantes escreviam o maior número de exemplares possíveis no período de 30 segundos. O estudo foi realizado com universitários de duas instituições (Universidades de Illinois e de Maryland). A motivação para a construção de normas foi a ascensão de estudos sobre aprendizagem e organização do conhecimento, principalmente, utilizando recordação livre.

No Brasil, citam-se os estudos de Jancuza e de Van Erven na construção de normas de categorias semânticas. Em 1996, Janczura apresentou os dados de associação semântica para 69 categorias. Solicitava aos participantes a produção do primeiro exemplar de cada categoria. Foram disponibilizadas informações, como tamanho das categorias, número de acertos e respostas em branco, exemplares e sua frequência de aparição. Para garantir maior fidedignidade ao estudo, realizou randomização com cinco formas de aplicação. O estudo foi realizado com 220 universitários de Brasília, sendo que, na amostra, havia participantes provenientes de outros estados brasileiros (Janczura, 1996). Em uma pesquisa em desenvolvimento, normas associativas de categorias em idosos vem sendo criadas por (Van Erven e Janczura 2007). Para tanto, em estudo prévio, foram selecionadas 47 categorias do estudo inicial de (Janczura 1996), também, com o intuito de comparar o modo como crianças, jovens e idosos produzem exemplares e categorizam.

Dentre os estudos revisados, nota-se a existência de formas variadas de coleta de dados, que incluem o método de primeira resposta e de respostas múltiplas. (Janczura 1996) e (Van Erven 2010) se utilizaram de uma única palavra associada à categoria; (Stein, Feix e Rohenkohl 2006) solicitaram aos participantes que produzissem três exemplares; (Battig e Montague 1969) disponibilizaram 30 segundos para que os participantes produzissem o número de exemplares possíveis; (Yoon et al. 2004) solicitaram cinco exemplares para cada categoria. A discussão sobre a melhor forma de coleta está relacionada aos processos cognitivos subjacentes a cada uma delas.

Em 1982, McEvoy e Nelson realizaram um estudo para avaliar se as formas de coleta para um exemplar ou mais de um diferiam nos resultados de associação semântica obtidos. Eles coletaram normas para 106 categorias semânticas e as compararam com as normas já existentes. Como resposta, obtiveram grandes similaridades entre os resultados, porém o fato de não serem idênticas foi compreendido como sendo processos subjacentes distintos. Os críticos, quanto ao método de respostas múltiplas, sugerem que é possível que haja um encadeamento de respostas, ou seja, ao emitir um exemplar, o próximo poderia estar associado a esse e não mais à categoria. Além disso, é possível que ao serem solicitados a produzir um número de exemplares, possam evocar, simultaneamente, um conjunto de respostas relacionadas entre si (Nelson, McEvoy, & Bajo, 1988).

No Brasil, existe uma demanda crescente por instrumentos de avaliação neuropsicológica e, embora haja disponibilidade de acesso a testes internacionais, sempre se considera temerária a transposição pura e simples dos dados normativos, sobretudo quando os instrumentos envolvem o uso da linguagem. A construção de normas de palavras e imagens, no âmbito da avaliação psicológica e neuropsicológica, apresenta relevância na construção de instrumentos, visando à possibilidade de escolha de itens adequados que condigam com o objetivo da mensuração e no controle de variáveis intervenientes. No que diz respeito à avaliação da memória por meio de pistas semânticas, a existência de normas de frequência propicia aos pesquisadores maior poder de decisão e manipulação das variáveis, tendo em vista que há facilitação da recuperação de itens que apresentam maior força de associação (Koriat, 2000).

A frequência de produção de exemplares de categorias tem sido associada fortemente a construtos como tipicidade e acessibilidade conceitual. Esses dados demonstram que os exemplares mais frequentes apresentados nas categorias são os itens mais típicos ou mais protuberantes dentro das categorias, com maior facilidade e rapidez de identificação de pertencimento à categoria (Janczura & Nelson, 2006).

Esse artigo tem como objetivo apresentar a criação de normas para 20 categorias semânticas. Futuramente, pretende subsidiar o processo de construção de um instrumento de avaliação de memória e aprendizagem visoverbal por meio de estímulos desenhados. O desenvolvimento de normas para categorias semânticas se fez necessário, tendo em vista limitações dos bancos de dados disponíveis, no que diz respeito a fornecer estímulos necessários à construção do instrumento. Dentre as 69 categorias normatizadas de (Janczura 1996), apenas 11 delas poderiam ser utilizadas, visto que, em algumas, observou-se conotação emocional (ex.: artigo religioso), sobreposição de categorias (ex.: animal de fazenda e animal selvagem), dificuldade para representar de forma pictórica (ex.: elemento químico) e categorias abstratas (ex.: emoção). Os mesmos impedimentos são reafirmados para o estudo de normas com idosos (Van Erven, 2007), que fizeram uso de 43 das 69 categorias utilizadas por Janczura (1966).

Considerando o caráter essencialmente cultural, dinâmico e semiótico da linguagem, além das limitações já citadas para que fosse possível a utilização de normas já existentes, destaca-se a necessidade da coleta de dados em todas as cinco regiões brasileiras, visando contemplar as diversidades e peculiaridades de cada uma delas. O uso de instrumentos que propõem avaliar e orientar acerca de possíveis alterações ou deterioração de funções cognitivas demanda um empenho na produção de dados normativos que considerem a diversidade cultural e diferentes níveis de acesso à escolarização em pessoas de grupos não clínicos. Considerou-se, também, a idade dos participantes como importante variável. Na realização deste estudo, buscou-se a participação de pessoas com mais de 40 anos.

Dessa forma, o objetivo deste estudo foi fornecer normas brasileiras de associação semântica para 20 categorias, apresentar a frequência absoluta dos conceitos, o número de conceitos apresentados para cada categoria, o número de erros e respostas em branco, levando em consideração duas apresentações: somente o primeiro conceito e com os cinco exemplares solicitados. Posteriormente, são apresentados os conceitos que foram comuns a todas as regiões dentro da categoria, ou seja, ao menos tiveram frequência igual a um, em cada uma das cinco regiões brasileiras.

Método

Participantes

Participaram do estudo 236 pessoas entre 40 e 88 anos, sendo que 160 eram do sexo feminino (67,8%) e 76, do sexo masculino. A seleção da amostra foi realizada por meio de estratificação da população brasileira, levando em consideração os dados do Censo de 2010 (IBGE, 2011) para distribuição de habitantes por faixas etárias (40-49 anos, 50-59 anos, 60-69 anos e 70-79 anos, 80 anos ou mais) em cada uma das cinco regiões. Os participantes foram convidados por conveniência do pesquisador, após preencher os critérios acima citados.

A amostra estudada contou com 20 respondentes da região Centro-Oeste, 18 da região Norte, 46 da região Sul, 94 respondentes do Sudeste e 58 da região Nordeste. Como critério de inclusão, os participantes deveriam ter nascido e morar na região no momento da coleta.

Dentre os participantes que preencheram todos os dados do questionário (90,2%), a maioria (27,2%) pertence à classe econômica B2, seguida pelas classes B1 (26,3%), C1 (15,5%), A2 (15%), C2 (8,9%), D (4,7%) e A1 (2,3%). Em relação à escolaridade, a maior parte dos respondentes (23,72%) apresentava ensino médio completo; 20,3% ensino fundamental incompleto; 15,7% ensino superior completo; 14,4% pós-graduação; 12,7% ensino superior incompleto; 5,9% ensino fundamental completo; 5,5% ensino médio incompleto e 1,3% não apresentavam nenhuma escolaridade.

Instrumentos

Questionário de dados sociodemográficos: objetivou obter informações a respeito dos participantes, tais como idade, sexo, escolaridade, local de nascimento e classe econômica.

Questionário de itens para categorias semânticas: desenvolvido para fins desta pesquisa, é composto por 20 categorias semânticas (frutas, animais, móveis, joias, ferramentas de carpinteiro, meios de comunicação, artigos escolares, peças de vestuário, instrumentos musicais, utensílios de cozinha, instrumentos de limpeza, meios de transporte, coisas que servem para iluminar, artigos de higiene pessoal, objetos usados pela costureira, objetos associados ao esporte, doces, brinquedos, partes do corpo e coisas de bebê). Das 20 categorias estudadas, 10 foram extraídas dos estudos de (Battig e Montague 1969), quatro delas do estudo de (Petersen et al. 1992) e seis foram criadas pelo Núcleo de Estudos em Avaliação Psicológica e Psicopatologia (NEAPP) da UFRGS. Ao responderem o questionário, os participantes receberam a seguinte instrução "vou apresentar a você diferentes categorias de palavras e vou solicitar que você escreva as cinco primeiras palavras concretas que lhe vierem à cabeça e que digam respeito àquela categoria", seguida por dois exemplos. A forma de responder aos questionários (verbal ou escrita) foi registrada, mas não controlada nesse estudo. Quando respondido de forma verbal, o avaliador realizava o registro das respostas na planilha.

Procedimentos

Para realização do presente estudo, professores de sete universidades das regiões brasileiras foram contatados (PUC-Goiás, UFAM, UFBA, UFMG, UFP, UFRJ e USF). Na região Sul, os três primeiros autores do presente artigo foram responsáveis pela coleta. Por meio de uma pesquisa de levantamento (Robson, 1993), os participantes responderam de forma individual a um questionário de dados sociodemográficos e ao questionário de itens por categoria semântica. As coletas foram realizadas nos estados de Goiás, Bahia, Paraíba, Amazonas, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Todos os procedimentos éticos em relação a trabalhos científicos foram atendidos.

Os procedimentos de pesquisa adotados foram os mesmos, independentemente da forma de resposta (verbal ou escrita). O tempo para responder aos questionários era livre. Os dados foram digitados tal qual apareciam nos protocolos. Palavras incomuns para os digitadores eram verificadas em dicionário e em sites de busca para avaliar sua existência. A digitação dos dados foi adequada às normas culta da língua. Análises de frequência foram realizadas no programa estatístico SPSS 17.

Algumas adequações foram feitas em relação à categorização das respostas. Palavras com plural foram transformadas em singular (ex.: a palavra "mesas" foi substituída por "mesa") e substantivos de gênero regular foram agrupados. Grupos de palavras e frases com frequência igual a um que apresentavam equivalência semântica foram unidos (ex.: "jogo de sofás" foi considerado como um item pertencente a "sofá", na categoria móveis). Palavras estrangeiras, quando apropriado, foram traduzidas ao português (ex.: "shampoo" foi reescrito "xampu"), ou mantidas no formato apresentado (ex: e-mail). Foram considerados como sendo o mesmo conceito, as palavras sinônimas (ex.: "tangerina", "mexerica" e "bergamota") e mantido aquele que apresentasse maior frequência (nesse caso, "bergamota"). Quando as respostas representavam marcas comerciais, foram substituídas pela sua denominação, mesmo quando sua frequência fosse mais representativa (ex.: "Bombril" foi denominada "palha de aço"). Gêneros irregulares não sofreram mudanças, e ambos permaneceram no banco de dados (ex.: "boi" e "vaca"). Itens com frequência igual a um foram agrupados em categorias superiores, quando estas existiam (ex.: "coruja" que apresentava frequência igual a um foi agrupada em "ave"). Esses critérios de adequação de respostas em conceitos únicos foi baseado em (Janczura 1996).

Resultados

Para a avaliação das respostas, três juízes, de forma conjunta, foram solicitados a julgar as respostas em: a) resposta relacionada à categoria, b) erro ou c) resposta em branco. Como resultado, obteve-se para a produção dos cinco itens: 96,2% das respostas corretas (ou seja, respostas pertencentes às categorias); 1,8% foram consideradas erros e 2% representaram respostas em branco. Seguindo o mesmo critério, quando considerada somente a primeira resposta, obteve-se: 99% das respostas corretas; 0,82% consideradas erros e 0,21% respostas em branco.

A apresentação dos resultados segue padronização dos estudos de (Janczura 1996), que apresenta tamanho da categoria (T), ou seja, a quantidade de diferentes exemplares emitidos como resposta; número de respostas corretas (C); respostas em branco (B); número de erros (E) e frequência absoluta das respostas ao lado de cada exemplar. O presente trabalho foi realizado por meio de coleta de respostas múltiplas, diferindo do estudo anterior, que se utilizou da coleta de um exemplar para cada categoria. São apresentados dois conjuntos de normas para cada categoria: o primeiro lista a frequência de aparição dos conceitos, levando-se em consideração as cinco respostas emitidas pelos participantes (Tabela 1); e o segundo bloco apresenta as normas do primeiro conceito emitido pelos participantes a cada uma das categorias, em ordem de frequência (Tabela 2). A Tabela 1 e a Tabela 2 apresentam os dez conceitos mais frequentes para cada categoria. As normas completas, com todos os conceitos por categoria podem ser obtidas por meio do e-mail da primeira autora (bordignon.suelen@gmail.com).

Tabela 1
Normas de Categorias Semânticas de acordo com as Cinco Respostas Emitidas
Tabela 2
Normas de Categorias Semânticas de acordo com a Primeira Resposta Emitida

São apresentados, na Tabela 3, os três conceitos mais frequentes em todas as regiões brasileiras. A tabela apresenta o percentual de cada um dos conceitos dentro da categoria (ex.: dentre todas as frutas citadas pela região Nordeste, o exemplar "banana" representa 11,4%). Da mesma forma, as normas completas de todos os conceitos que tiveram frequência igual ou superior a um em todas as regiões e as frequências absolutas de aparição de cada um dos conceitos por região são disponibilizadas por meio da solicitação a primeira autora (bordignon.suelen@gmail.com).

Tabela 3
Frequência nas Regiões Brasileiras dos Três Itens mais Comuns por Categoria

Discussão

Além de ser uma fonte de conhecimento sobre o modo como as pessoas organizam as informações categoricamente, as normas aqui apresentadas podem servir de base para a criação de tarefas de avaliação cognitiva. Uma das motivações para o desenvolvimento dessas normas foi a construção de itens para um instrumento visoverbal de avaliação de memória e aprendizagem, que se utilizará de pistas categóricas. A construção desse instrumento deverá ser apresentada em estudos futuros, e as presentes normas auxiliarão não somente na criação desse instrumento como de outros.

O artigo fornece normas associativas para 20 categorias semânticas para a população brasileira acima de 40 anos e apresenta dados de frequências absolutas dos exemplares, tamanho da categoria, número de respostas corretas, incorretas e em branco. Disponibiliza, também, os conceitos relativos à análise com as cinco respostas produzidas e, somente, com o primeiro item produzido em cada categoria. Os conceitos comuns às cinco regiões brasileiras de cada categoria são destacados.

As normas disponibilizadas neste estudo apresentam algumas diferenças em relação àquelas já acessíveis na literatura brasileira (Janczura, 1996; Van Erven, 2007). A seleção das categorias para normatização neste trabalho levou em consideração a maior probabilidade de produção de exemplares que pudessem ser desenhados posteriormente, que apresentassem reduzida conotação emocional e a busca pela não sobreposição de categorias. Buscava, também, coletar dados em todas as cinco regiões brasileiras, respeitando a diversidade dos aspectos culturais. A idade dos participantes foi considerada, fazendo parte da amostra pessoas acima de 40 anos.

Em relação às categorias coletadas, identifica-se que doces foi a que mais produziu conceitos que, possivelmente, apresente maiores dificuldades para serem desenhados ou identificados. Em relação à sobreposição de categorias, as normas coletadas apresentaram conceitos comuns a mais de uma categoria (ex.: bicicleta e carro como meio de transporte e brinquedo; barco em meio de transporte e objetos associados ao esporte). Essa sobreposição de itens em categorias distintas, também, ocorre no estudo de (Battig e Montague 1969), (Janczura 1996) e (Van Erven 2007), e em função de determinados conceitos pertencerem a diversas categorias semânticas. No uso desse banco de dados, destaca-se a necessidade de avaliar os conceitos que pertencem a mais de uma categoria na construção de instrumentos e tarefas que não tenham essa intenção. Conforme se infere da revisão teórica, bem como de constatação empírica, confirmou-se que existem itens que são mais adequados e outros menos, seja pela estabilidade ou multiplicidade de nomes.

O presente estudo fez uso da geração de cinco exemplares para cada categoria, utilizado por vezes, por outros pesquisadores em normas de associação (Yoon et al., 2004). Tendo em vista que estudos nacionais consideram o primeiro exemplar na geração de normas, há limitações para a realização de comparações entre eles. É notável, no entanto, que a ordem de frequência dos conceitos, na análise das cinco respostas e das primeiras, foi similar. Apesar de serem conhecidas algumas das limitações quanto à solicitação de cinco exemplares, ao invés de um, para cada categoria (Nelson, McEvoy, & Bajo, 1988), essa forma de coleta gerou um maior número de conceitos por categoria, ou seja, aumentou o set size.

Na análise da primeira resposta emitida, o tamanho da categoria varia de 10 a 41 conceitos por categoria. Esse número aumenta para 24 a 109 conceitos por categoria quando levado em consideração as cinco respostas emitidas pelos participantes. É importante salientar que, ao coletar somente um item, perde-se a oportunidade de compreender se há exemplares tão prototípicos ou representativos quanto o primeiro recordado, que competem com este em sua frequência. O set size aumentado propicia a compreensão de itens menos prototípicos em maior escala, tendo em vista que, na solicitação de geração, somente do primeiro exemplar, a probabilidade de itens menos prototípicos aparecerem é menor. À medida que o número de conceitos por categoria aumenta, entende-se que há uma perda na força de associação semântica deles, por diminuir a frequência de respostas de cada conceito associado à categoria.

Em comparação aos outros bancos de dados, percebe-se que há uma similaridade no que diz respeito aos itens mais frequentes quando avaliadas as mesmas categorias semânticas. Por exemplo, na categoria brinquedos (primeira resposta emitida), no presente estudo, obteve-se, em ordem com maior frequência, "boneca, bola e carro". Tais achados também foram encontrados nos estudos de (Janczura 1996) e (Battig e Montague 1969). Van Erven (2004) encontrou resultados parecidos, (ordem de frequência: boneca, carro e bola), com pouca diferença na frequência de respostas para os itens "bola" e "carro", mostrando uma similaridade, mesmo em culturas distintas.

Embora haja bastante similaridade dos resultados entre os estudos, alguns itens como, por exemplo, "meia" para artigos de vestuário, apresentou maior frequência no estudo internacional de (Battig e Montague 1969) - segundo item mais frequente; e nos estudos brasileiros, tem frequência reduzida. Outro exemplo é o item "luva" da mesma categoria, que, nos estudos brasileiros, apresenta frequência igual a 1, tanto no estudo presente como no de (Janczura 1996), não foi listado no estudo de Van Erven (2004), e apresenta maior frequência no estudo internacional (Battig & Montague, 1969). Tais achados devem estar associados a questões climáticas dos locais no qual as coletas foram realizadas e reforçam a importância de normas de categorização semânticas brasileiras.

Os resultados apontaram que os conceitos mais frequentes nas categorias, também, o foram quando consideradas sua frequência por região brasileira. Porém, destaca-se que alguns conceitos, como, por exemplo, "metrô", não foi emitido pelos participantes de todas as regiões. Esse dado reforça o cuidado dos pesquisadores na utilização dessas normas, levando em consideração a diversidade cultural brasileira para maior validade na interpretação dos achados de pesquisa.

Da mesma forma, faz-se necessário a devida atenção e cuidado na escolha dos exemplares das categorias, como itens de instrumentos e tarefas de avaliação, tendo em vista que itens mais frequentes são os que apresentam maior rapidez de acesso como pertencentes à categoria (Janczura & Nelson, 2006). Tendo em vista o objetivo do teste, como é o caso de testes de habilidades, pode-se optar pela seleção de itens com diferentes gradações de dificuldades, ou seja, poder-se-ia pensar em itens com diferentes forças de associação com a categoria (Koriat, 200), porém, sem deixar de levar em conta a presença deles em todas as regiões. Esse cuidado tem sua importância principal na validade da avaliação, tendo em vista que o desconhecimento em função da não familiaridade de um conceito não pode ser julgado como deficiência cognitiva.

Por fim, no que diz respeito às respostas dos participantes, o número considerado como erros e em branco foi menor nesse estudo (análise do primeiro item), comparado com de (Janczura 1996). (Battig e Montague 1969) não realizaram essa avaliação, listando todas as respostas dadas pelos participantes. Um dos motivos pode ter sido a decisão dos autores desse artigo em manter alguns itens como pertencentes a uma determinada categoria, apesar de conceitualmente não o serem. Optou-se por validar o conhecimento tácito dos participantes relativo a categorias que apresentaram frequência elevada em conceitos que categoricamente estariam incorretos. Assim, por exemplo, foram considerados como pertencentes à categoria ferramentas de carpinteiro os exemplares "formão" e "betoneira", o que de fato faz parte dos instrumentos para a construção. Porém, quando se considera as cinco respostas emitidas, o número de respostas consideradas como "em branco", nesse estudo, é superior ao estudo de (Janczura 1996). Esse resultado faz sentido, tendo em vista a maior dificuldade de emitir cinco conceitos de cada categoria do que somente um, e a cada conceito apresentado reduz-se um do universo possível de alternativas dentro da categoria semântica.

Considerações Finais

O estudo apresenta normas brasileiras de associação para 20 categorias semânticas e tem a pretensão de fornecer contribuições a pesquisadores que atuam, principalmente, na área de neuropsicologia e na construção de instrumentos de avaliação cognitiva, como testes de memória, aprendizagem, linguagem, entre outros. Destaca-se a preocupação do presente estudo com a representatividade das cinco regiões brasileiras, buscando-se fornecer dados mais confiáveis quando de sua generalização para o Brasil.

A amostra reduzida (embora estratificada) impossibilitou algumas análises mais robustas. Estudos futuros com a ampliação da amostra possibilitariam análises quantitativas de padrões de categorização por região, idades e escolaridade.

De modo geral, os resultados deste estudo estão de acordo com a literatura e bancos de dados brasileiros sobre a temática (Janczura, 1996; Van Erven, 2007). Por meio da coleta de dados em todas as regiões brasileiras, este estudo amplia o conhecimento de como os brasileiros acima de 40 realizam associações dentro das categorias semânticas, quais são os conceitos mais prototípicos por categoria em cada região, além de apresentar conceitos comuns às regiões.

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  • 1
    Agradecimento especial à Dra. Terezinha de Jesus Cordeiro van Erven pela colaboração e disposição de seu material de normas de categorias semânticas para idosos.
  • Este estudo recebeu apoio do CNPq para sua realização.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2014
  • Revisado
    27 Jun 2014
  • Aceito
    16 Jan 2015
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