Resumos
O presente trabalho realizou uma revisão da literatura das principais teorias sobre o funcionamento emocional: jamesianas, psicoevolucionistas, cognitivas e sociais. Com objetivo de integrar as propostas, foi desenvolvido um modelo constituído por aspectos cognitivos na avaliação do evento eliciador que conduzem a possíveis reações (impressão subjetiva, comportamento expresso e/ou alterações fisiológicas) e retroalimentam a interpretação. Esse modelo foi usado como base para apresentar características de expressão das emoções, sendo que seis emoções básicas foram discutidas (alegria, medo, surpresa, tristeza, nojo e raiva) com foco em seus aspectos expressivos faciais e cognitivos. Foi possível concluir que uma abordagem integrativa do fenômeno emocional pode trazer informações importantes para o trabalho do psicólogo.
emoções; expressões faciais; estados emocionais
This study conducted a literature review of the main theories about emotional functioning: jamesian, psychoevolutionary, cognitive and social. Aiming on integrating the proposals, a model was developed, consisting of cognitive aspects in the evaluation of the eliciting event leading to possible reactions (subjective impression, expressed behavior and/or physiological changes) and feedback to appraisal. This model was used as the basis for presenting characteristics of emotional expressions, and six basic emotions were discussed (joy, fear, surprise, sadness, disgust and anger) focusing on their facial and cognitive expressive aspects. It concluded that an integrative approach to the emotional phenomenon could provide important information for psychologists' work.
emotions; facial expressions; emotional states
En este estudio se llevó a cabo una revisión de literatura de las principales teorías del funcionamiento emocional: jamesianas, psicoevolucionistas, cognitivas y sociales. Con el objetivo de integrar las propuestas, fue desarrollado un modelo que consiste en la evaluación de los aspectos cognitivos del evento provocador, que conduce a posibles reacciones (impresión subjetiva, comportamiento expreso y/o cambios fisiológicos) y retroalimentan la interpretación. Este modelo se utilizó como base para presentar las características de expresión de las emociones, y se discutieron seis emociones básicas (alegría, miedo, sorpresa, tristeza, asco y rabia) centrándose en sus aspectos expresivos faciales y cognitivos. Un abordaje integral del fenómeno emocional puede aportar informaciones importantes en el trabajo de los psicólogos.
emociones; expresiones faciales; estados emocionales
Introdução
A definição de emoção pode parecer ser óbvia e simples, uma vez que esse termo é
utilizado no cotidiano com frequência. Frases, como "nossa viagem foi emocionante",
"fiquei emocionado com tal filme", "fulana é tão emotiva", ilustram essa situação.
Contudo, na ciência psicológica, a definição de emoção não tem se mostrado tão simples.
O presente trabalho pretende fazer inicialmente uma exposição breve dos principais
grupos de teorias sobre emoções, sugerindo um modelo integrativo e, então, focando em um
dos seus componentes, a expressão emocional. Para atingir esse objetivo, parte-se do
entendimento atual, na literatura, de que as emoções não são mais compreendidas como uma
reação única, mas como um processo que envolve múltiplas variáveis. Nesse sentido,
emoção poderia ser definida como uma condição complexa e momentânea que surge em
experiências de caráter afetivo, provocando alterações em várias áreas do funcionamento
psicológico e fisiológico, preparando o indivíduo para a ação (Atkinson, Atkinson, Smith, Bem, & Nolen-Hoeksema, 2002Atkinson, R. L., Atkinson, R. C., Smith, E. E., Bem, D. J., &
Nolen-Hoeksema, S. (2002). Introdução à psicologia de Hilgard. Porto Alegre:
Artmed.; Davis & Lang, 2003Davis, M., & Lang, P. J. (2003).. Emotion In M. Gallagher & R.
J. Nelson (Eds.), Handbook of psychology - volume 3: Biological psychology. New
Jersey: John Wiley & Sons.; Frijda, 2008Frijda, N. H. (2008). The psychologists' point of view. In M. Lewis, J.
M. Haviland-Jones, & L. F. Barrett (Eds.), Handbook of emotions (pp. 68-87). New
York: Guilford.; Gazzaniga &
Heatherton, 2005Gazzaniga, M. S., & Heatherton, T. F. (2005). Ciência psicológica:
Mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed.; Levenson, 1999Levenson, R. W. (1999). The intrapersonal functions of emotion.
Cognition and, Emotion 13(5), 481-504. doi:10.1080/026999399379159.
https://doi.org/10.1080/026999399379159...
).
Quando se trata de definir os componentes da emoção, a maioria dos modelos teóricos atuais inclui reação muscular interna, comportamento expresso, impressão afetiva subjetiva e cognições. A literatura comumente considera que o estudo dos aspectos subjetivos e cognitivos das emoções foi negligenciado entre as décadas de 1930 a 1960 devido à, então, popularidade do behaviorismo e sua crítica aos processos "mentalistas" (Goodwin, 2005Goodwin, J. C. (2005). História da psicologia moderna. São Paulo: Cultrix.; Ledoux, 1996Ledoux, J. (1996). The emotional brain: The mysterious underpinnings of emotional life. New York: Simon & Schuster.; Mandler, 2003Mandler, G. (2003).. Emotion In D. K. Freedheim & I. B. Weiner (Eds.), Handbook of psychology - volume 1: History of psychology (pp. 157-175). New Jersey: John Wiley & Sons.; Niedenthal, Krauth-Gruber, & Ric, 2006Niedenthal, P. M., Krauth-Gruber, S., & Ric, F. (2006). Psychology of emotion: Interpersonal, experiential, and cognitive approaches. New York: Psychology Press.; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology, biology and evolution. Washington, DC: American Psychological Association.; Schultz & Schultz, 2009Schultz, D. P., & Schultz, S. E. (2009). História da psicologia moderna. São Paulo: Cengage Learning.; Strongman, 2003Strongman, K. T. (2003). The psychology of emotion: From everyday life to theory. Chichester: John Wiley & Sons.). É a partir desse fato que se inicia uma apreciação das principais teorias.
Principais teorias sobre emoções
O senso comum até hoje dita que as expressões emocionais têm origem em algum evento interno, ou seja, nós sentimos alguma coisa e então expressamos uma emoção. A ordem desses fatores, porém, pode não ser exatamente essa. Uma das primeiras referências nesse sentido foi (James 1890James, W. (1890). The principles of psychology. New York: Holt.), que afirmava que os humanos primeiro percebem o estímulo, havendo uma reação do organismo, e a percepção desse movimento das vísceras seria, então, o próprio sentimento. Segundo os exemplos do próprio autor, nós não correríamos porque sentimos medo, mas sim sentiríamos medo porque começamos a correr. Nas suas considerações, James citou os trabalhos de Lange e esse modelo é, até hoje, chamado de James-Lange. Apesar de pouco intuitiva, essa proposta mostrou-se popular na primeira metade do século XX, especialmente, graças ao surgimento do behaviorismo, respaldando o conceito de que os comportamentos não teriam origem interna, mas externa e observável (James, 1890James, W. (1890). The principles of psychology. New York: Holt.; Skinner, 1953/2003Skinner, B. F. (1953/2003). Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes.).
Na década de 1960, a ideia foi adaptada e reestruturada, resultando no conceito de
feedback facial, ou seja, a movimentação muscular da face teria
um efeito causal na experiência subjetiva da emoção, na forma de recompensa ou
punição (Buck, 1980Buck, R. (1980). Nonverbal behavior and the theory of emotion: The
facial feedback hypothesis. Journal of Personality and Social Psychology, 38(5),
811-824. doi:10.1037/0022-3514.38.5.811.
https://doi.org/10.1037/0022-3514.38.5.8...
; Strongman, 2003Strongman, K. T. (2003). The psychology of emotion: From everyday life
to theory. Chichester: John Wiley & Sons.; Tomkins,
1962Tomkins, S. S. (1962). Affect, imagery, consciousness: The positive
affects (Vol. 2). New York: Springer.). Diversas pesquisas foram desenvolvidas desde então, buscando
examinar essas hipóteses, utilizando, em seus métodos, aparatos para manter
tensionados os músculos típicos de uma emoção a fim de gerar a impressão subjetiva,
como morder uma caneta com os lábios abertos para simular alegria (Gazzaniga & Heatherton, 2005Gazzaniga, M. S., & Heatherton, T. F. (2005). Ciência psicológica:
Mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed.) ou, até mesmo,
avaliando pessoas que se submeteram a aplicação de botox (Davis, Senghas, Brandt, & Ochsner, 2010Davis, J. I., Senghas, A., Brandt, F., & Ochsner, K. N. (2010). The
effects of botox injections on emotional experience. Emotion, 3.(3), 433-440.
doi:10.1037/a0018690.
https://doi.org/10.1037/a0018690...
).
Embora algumas dessas pesquisas tenham sugerido uma influência leve e demorada da
postura muscular no afeto subjetivo, os resultados ainda não são unânimes, e muitas
críticas se acumularam ao longo do tempo, entre elas: emoções distintas possuem
reações viscerais semelhantes (Cannon, 1927Cannon, W. (1927). The James-Lange theory of emotions: A critical
examination and an alternative theory. The American Journal of Psychology, 39(1/4),
106-124. doi:10.2307/1415404.
https://doi.org/10.2307/1415404...
);
pessoas com paralisia assim mesmo relatam experiência emocional subjetiva (Lowe & Carroll, 1985Lowe, J., & Carroll, D. (1985). The effects of spinal injury on the
intensity of emotional experience. British Journal of Clinical Psychology, 24(2),
135-136. doi:10.1111/j.2044-8260.1985.tb01327.x.
https://doi.org/10.1111/j.2044-8260.1985...
); estados emocionais
podem ser gerados apenas por meio do pensamento, sem uma ação física (Mayer & Salovey, 1999Mayer, J. D., & Salovey, P. (1999). O que é inteligência emocional?
In P. Salovey & D. J. Sluyter (Eds.), Inteligência emocional na criança:
Aplicações na educação e no dia-a-dia (pp. 15-49). Rio de Janeiro:
Campus.); a percepção é mais
rápida do que a reação muscular; a ausência de autoconhecimento pode levar à
identificação de uma excitação corporal como sendo certa emoção, quando na verdade é
outra; nem sempre os indivíduos têm consciência de que estão vivenciando uma emoção;
o efeito placebo pode provocar estados emocionais sem que alterações fisiológicas
tenham sido provocadas; entre outras (para uma revisão mais aprofundada dessas
críticas, sugere-se Ekman, 1993Ekman, P. (1993). Facial expression and emotion. American Psychologist,
48(4), 384-392. doi:10.1037/0003-066X.48.4.384.
https://doi.org/10.1037/0003-066X.48.4.3...
; Gazzaniga & Heatherton, 2005Gazzaniga, M. S., & Heatherton, T. F. (2005). Ciência psicológica:
Mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed.; Mandler, 2003Mandler, G. (2003).. Emotion In D. K. Freedheim & I. B. Weiner
(Eds.), Handbook of psychology - volume 1: History of psychology (pp. 157-175). New
Jersey: John Wiley & Sons.; Niedenthal et al., 2006Niedenthal, P. M., Krauth-Gruber, S., & Ric, F. (2006). Psychology
of emotion: Interpersonal, experiential, and cognitive approaches. New York:
Psychology Press.; Plutchik,
2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.; Prinz, 2007Prinz, J. J. (2007).: Emotion Competing theories and philosophical
issues. In D. M. Gabbay, J. Woods, & P. Thagard (Eds.), Philosophy of psychology
and cognitive science (pp. 247-266). North Holland: Elsevier.). Assim sendo, as
propostas baseadas em James, atualmente, não possuem mais a aceitação como na sua
forma original, tendo sido adaptadas ou incorporadas a novas contribuições teóricas.
Outros modelos amplamente referenciados atualmente são as abordagens
psicoevolucionistas, as cognitivistas ou de apreciação (appraisal) e
as sociais.
As teorias psicoevolucionistas propõem que os estados emocionais existem hoje como
reflexo da evolução das espécies, ou seja, como respostas adaptativas a situações que
ocorrem no meio. Desde (Darwin 1872/2000Darwin, C. (1872/2000). A expressão das emoções no homem e nos animais.
São Paulo: Companhia das Letras.),
entende-se que, embora certas formas de manifestação das emoções possam ser
aprendidas, existem expressões, especialmente as faciais, que são inatas, tanto para
os seres humanos quanto para chimpanzés e outros primatas. Isso poderia ser
verificado, por exemplo, em crianças que nascem cegas e, ainda assim, expressam
sorrisos de felicidade ou choro na tristeza, da mesma maneira que pessoas sem
problemas de visão. Outro fator levado em conta foi a similaridade na expressão de
estados emocionais entre culturas diferentes, ou seja, o fato de que, em todas as
culturas, alegria é expressa com sorriso, raiva com franzimento das sobrancelhas e
tensão dos lábios, e assim por diante. Esses dados levaram à consideração da
existência de emoções básicas ou primárias características da espécie humana. Nesse
sentido, as emoções humanas teriam evoluído de um conjunto finito de estados
emocionais, sendo que cada um deles possuía sua funcionalidade adaptativa e expressão
típica (Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.; Gazzaniga, Ivry, &Mangun, 2006Gazzaniga, M. S., Ivry, R. B., & Mangun, G. R. (2006). Neurociência
cognitiva. Porto Alegre: Artmed.; Lundqvist & Öhman, 2005Lundqvist, D., & Öhman, A. (2005). Caught by the evil eye. In L. F.
Barrett, P. M. Niedenthal, & P. Winkielman (Eds.), Emotion and consciousness (pp.
97-122). New York: Guilford.; Markham & Wang, 1996Markham, R., & Wang, L. (1996). Recognition of emotion by chinese
and australian children. Journal of Cross-Cultural Psychology, 27(5), 616-643.
doi:10.1177/0022022196275008.
https://doi.org/10.1177/0022022196275008...
; Plutchik,
2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.). Por exemplo, segundo os autores dessas teorias, ao longo da
evolução, indivíduos que demonstraram uma reação clara e distinta frente a um perigo,
dessa maneira comunicando a presença da ameaça ao resto do grupo e permitindo o
preparo ou fuga, apresentaram vantagem evolutiva e foram selecionados, resultando na
existência da emoção chamada de medo.
Já as abordagens cognitivistas, embora não discordem totalmente da origem evolutiva
nem neguem a influência das alterações viscerais, destacam a avaliação da situação
como sendo a principal característica da emoção. A avaliação seria uma atividade
cognitiva da qual o indivíduo pode ter consciência ou não, e que aconteceria de
maneira muito rápida - estudos mostram que em menos de 250 ms - e teria efeito
determinante na emoção gerada (Atkinson & Adolphs,
2005Atkinson, A. P., & Adolphs, R. (2005). Visual emotion perception:
Mechanisms and processes. Em L. F. Barrett, P. M. Niedenthal, & P. Winkielman
(Eds.), Emotion and consciousness (pp. 150-182). New York: Guilford.; Bargh & Ferguson, 2000Bargh, J. A., & Ferguson, M. J. (2000). Beyond behaviorism: On the
automaticity of higher mental processes. Psychological Bulletin, 126(6), 925-945.
doi:10.1037/0033-2909.126.6.925.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.126.6....
;
Clore, Storberck, Robinson, & Centerbar,
2005Clore, G. L., Storberck, J., Robinson, M. D., & Centerbar, D. B.
(2005). Seven sins in the study of unconscious affect. In L. F. Barrett, P. M.
Niedenthal, & P. Winkielman (Eds.), Emotion and consciousness (pp. 384-408). New
York: Guilford.; Prinz, 2007Prinz, J. J. (2007).: Emotion Competing theories and philosophical
issues. In D. M. Gabbay, J. Woods, & P. Thagard (Eds.), Philosophy of psychology
and cognitive science (pp. 247-266). North Holland: Elsevier.; Schachter & Singer, 1962Schachter, S., & Singer, J. (1962). Cognitive, social, and
physiological determinants of emotional state. Psychological Review, 69(5), 379-399.
doi:10.1037/h0046234.
https://doi.org/10.1037/h0046234...
). Por exemplo, se um
indivíduo recebe a notícia de demissão da empresa, pode entender a situação como uma
consequência da competitividade do mundo moderno, para a qual não se vê preparado e
sentir-se triste. Por outro lado, se tiver a interpretação de que era um funcionário
dedicado e competente e, mesmo assim, foi demitido, pode se sentir injustiçado e com
raiva.
Outro grupo de teorias sobre as emoções são as sociais. Nesse grupo, descarta-se a
influência de aspectos biológicos, mas não se negam os aspectos cognitivos. A ênfase
está no valor social que tem a expressão da emoção, sendo que esta é compreendida
como um papel social que é construído pela cultura e, ao mesmo tempo, influencia e
altera a cultura. Uma vez que, nas interações, as pessoas estão constantemente
avaliando e interpretando as reações emocionais próprias e das outras pessoas,
frequentemente de maneira não consciente, as emoções teriam, então, um papel crucial
na manutenção das relações sociais (Gergen,
1985Gergen, K. J. (1985). The social constructionist movement in modern
psychology. American Psychologist, 40(3), 266-275.
doi:10.1037/0003-066X.40.3.266.
https://doi.org/10.1037/0003-066X.40.3.2...
; Juslin & Laukka, 2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
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;
Niedenthal et al., 2006Niedenthal, P. M., Krauth-Gruber, S., & Ric, F. (2006). Psychology
of emotion: Interpersonal, experiential, and cognitive approaches. New York:
Psychology Press.; Ratner, 2000Ratner, C. (2000). A cultural-psychological analysis of emotions.
Culture Psychology, 6(1), 5-39. doi:10.1177/1354067X0061001.
https://doi.org/10.1177/1354067X0061001...
; Stets & Turner, 2008Stets, J. E., & Turner, J. H. (2008). The sociology of emotions. In
M. Lewis, J. M. Haviland-Jones, & L. F. Barrett (Eds.), Handbook of emotions (pp.
32-46). New York: Guilford.; Strongman,
2003Strongman, K. T. (2003). The psychology of emotion: From everyday life
to theory. Chichester: John Wiley & Sons.). Assim, os efeitos da cultura estariam presentes em diversas áreas da
vivência emocional. Um exemplo representativo seria um indivíduo numa sociedade,
percebendo que seu salário é menor do que considera justo, paga altas taxas e não
recebe o retorno desejado do governo, poderia se sentir frustrado com maior
frequência e, então, pequenos atos que interferissem no seu bem-estar e autonomia,
como uma discussão no trânsito, poderiam levá-lo a reações agressivas extremas.
Além disso, estudos constantemente confirmam a existência da influência cultural. Por
exemplo, (Blais, Jack, Scheepers, Fiset e Caldara
2008Blais, C., Jack, R. E., Scheepers, C., Fiset, D., & Caldara, R.
(2008). Culture shapes how we look at faces. PLoS ONE, 3(8).
doi:10.1371/journal.pone.0003022
https://doi.org/10.1371/journal.pone.000...
) perceberam que culturas diferentes focam em regiões distintas do
rosto para reconhecer a expressão emocional, com caucasianos ocidentais, observando
predominantemente a região dos olhos e boca, e leste-asiáticos, a região central da
face. Já (Scollon, Diener, Oishi e Biswas-Diener
2004Scollon, C. N., Diener, E., Oishi, S., & Biswas-Diener, R. (2004).
Emotions across cultures and methods. Journal of Cross-Cultural Psychology, 35(3),
304-326. doi:10.1177/0022022104264124.
https://doi.org/10.1177/0022022104264124...
) observaram que americanos de descendência europeia, americanos de
descendência asiática, japoneses, indianos e hispânicos apresentaram diferenças tanto
na vivência quanto na frequência das emoções. Segundo as pesquisas de (Singh-Manoux e Finkenauer 2001Singh-Manoux, A., & Finkenauer, C. (2001). Cultural variations in
social sharing of emotions: An intercultural perspective. Journal of Cross-Cultural
Psychology, 32(6), 647-661. doi:10.1177/0022022101032006001.
https://doi.org/10.1177/0022022101032006...
), ingleses e
indianos apresentaram maneiras próprias de compartilhar emoções entre si.
Outro ponto importante levantado pelas teorias sociais, que não é focado nas teorias anteriores, é que a expressão corporal não precisa ser coerente com a experiência subjetiva e, até mesmo, com a interpretação da situação. Por exemplo, em uma conversa com um grupo de pessoas com as quais ainda não se tem familiaridade, uma pessoa pode achar engraçado um comentário que foi feito e ter a vivência subjetiva de alegria. Contudo, para não transmitir uma mensagem de desrespeito, mantém a expressão facial séria.
Levando-se em conta as informações anteriores e as extensas contribuições de seus autores, entende-se que seria possível integrar aspectos das teorias em um único modelo, apresentado na Figura 1. Trata-se, logicamente, de um modelo simplificado. A um evento percebido pelo sujeito seguem-se cognições, que podem ser conscientes ou inconscientes, e que atribuem um valor ao acontecimento. Essa interpretação (cognição) é um reflexo do seu histórico de vida, das suas experiências individuais, sociais e, portanto, da forma como ele percebe o mundo. Se aquele evento possuir valor afetivo, podem ocorrer as reações que estão agrupadas no conjunto de contorno tracejado. As possíveis reações são: afetos subjetivos (impressão subjetiva); mudanças corporais típicas do sistema nervoso autônomo (alterações fisiológicas), como sudorese, dilatação das pupilas ou alteração do batimento cardíaco e da respiração; e, um grupo de reações comportamentais (comportamento expresso), que inclui desde expressões faciais, vocais, alterações na postura e até movimentação. Todas essas três reações podem ocorrer simultaneamente (por exemplo, ao escutar uma piada e espontaneamente dar risada, o coração acelerar e sente-se bem); apenas duas (por exemplo, ao escutar os comentários desagradáveis de uma pessoa, alterando-se a respiração e sentindo-se incomodado, porém sem alterar a expressão facial); apenas uma (por exemplo, dar um sorriso simples de bom dia) ou mesmo nenhuma, que seria o caso do evento não ter valor para o indivíduo.
Deve-se atentar ao fato de que, dentro do conjunto das reações, não necessariamente precisa haver coerência entre elas. Por exemplo, frente a comentários que um indivíduo considera insultos, pode haver sentimentos e reações internas típicos da raiva, mas ele sorri, gesticula e fala com voz suave, a fim de regular a situação em que se encontra.
Há ainda duas outras setas no modelo. A seta, que sai do grupo de reações e retorna para a cognição, indica que as próprias reações do indivíduo podem ser avaliadas, adicionando-se às interpretações anteriores, resultando em mais reações, semelhantes ou diferentes. Esse fenômeno das emoções é chamado de retroalimentação (Frijda, 2008Frijda, N. H. (2008). The psychologists' point of view. In M. Lewis, J. M. Haviland-Jones, & L. F. Barrett (Eds.), Handbook of emotions (pp. 68-87). New York: Guilford.).
Já a seta pontilhada, que sai do evento e se dirige direto ao grupo de reações, representa casos em que a informação não passa imediatamente pela cognição. Esse fenômeno pode ser exemplificado com uma situação em que o indivíduo percebe um objeto se movendo perto de si e, imediatamente, contrai o corpo, ficando em alerta, para só então perceber que se tratava apenas de uma folha, e não de algo realmente ameaçador. De acordo com (Ledoux 1996Ledoux, J. (1996). The emotional brain: The mysterious underpinnings of emotional life. New York: Simon & Schuster.), nessas situações, a informação segue uma via neuronal direta para o tálamo, que provoca a reação muscular, demorando um pouco mais para chegar ao neocórtex, onde se considera que esteja o julgamento. A seta está representada pontilhada por não se tratar de um fenômeno comum, havendo inclusive críticas de que Ledoux estudou esse circuito em animais, e que ele talvez não exista nos humanos (Clore et al., 2005Clore, G. L., Storberck, J., Robinson, M. D., & Centerbar, D. B. (2005). Seven sins in the study of unconscious affect. In L. F. Barrett, P. M. Niedenthal, & P. Winkielman (Eds.), Emotion and consciousness (pp. 384-408). New York: Guilford.).
Considerando-se a proposta apresentada, a seguir, será feita uma revisão da expressão emocional. Mais especificamente, serão considerados os seguintes componentes psicológicos do modelo: as interpretações feitas sobre a situação (representantes do grupo "cognição"), os sentimentos resultantes (impressão subjetiva) e as expressões faciais e vocais, assim como as tendências de ação (comportamento expresso).
A expressão emocional
No que diz respeito à expressão de emoções, vários aspectos do comportamento expresso
podem ser levados em conta. A expressão vocal é uma das formas de manifestação de uma
emoção. Diferentes estados emocionais implicam em alterações na frequência (altura ou
tom), no volume e no ritmo (tempo). Em um artigo clássico, (Spencer 1857Spencer, H. (1857). The origin and function of music. Fraser's Magazine,
56, 396-408.) considerou que, como as emoções são expressas por
variações vocais, e como toda música tem sua origem na voz, o propósito da música
seria a necessidade de comunicação emocional. Essa hipótese foi corroborada em
estudos recentes que relacionam as características vocais com as musicais (Juslin & Laukka, 2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.129.5....
).
A gesticulação também é considerada um componente importante da expressão emocional.
Contudo, trata-se de uma manifestação muito dependente da cultura em que o indivíduo
está inserido. Por esse motivo, os gestos são entendidos como gírias visuais, que
servem para expressar estados emocionais, mas que são aprendidos, e não inatos,
normalmente servindo para enfatizar o que está sendo comunicado (Ekman, 1993Ekman, P. (1993). Facial expression and emotion. American Psychologist,
48(4), 384-392. doi:10.1037/0003-066X.48.4.384.
https://doi.org/10.1037/0003-066X.48.4.3...
; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.).
Não obstante as formas apresentadas, esmagadora maioria das pesquisas foca na expressão facial. (Ekman 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times Book.) e (Plutchik 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology, biology and evolution. Washington, DC: American Psychological Association.) consideram que essa situação possa ser explicada pelo fato de justamente a face ser a região corporal humana com maiores recursos para expressão, uma que seus principais músculos estão concentrados na região oral, sendo também responsáveis pela mastigação, o que resulta na possibilidade de movimentação em diversas direções. Músculos que também estão envolvidos na expressão facial são os músculos das sobrancelhas, da testa, das pálpebras e do pescoço, embora estes possuam menor liberdade de direções.
Na literatura é comum se encontrar a nomenclatura "emoções básicas" para distinguir diversas classes desse fenômeno. Porém, assim como não existe um consenso quanto ao modelo teórico que explica o funcionamento emocional, também não existe uma definição em relação a quantas e quais são as emoções básicas. Contudo, a maioria dos autores costuma citar as seguintes ou alguma variação delas: alegria, medo, surpresa, tristeza, nojo e raiva. Suas expressões faciais típicas estão representadas na Figura 2.
Expressões faciais típicas de seis emoções básicas: a. alegria, b. medo, c. surpresa, d. tristeza, e. nojo, f. raiva.
Considera-se que a emoção alegria ocorra diante do ganho de algo avaliado como sendo
de valor, para o quê se segue uma tendência de retenção ou repetição. O que se ganha
pode ser desde um objeto até uma situação ou evento que seja valorizado. Como
consequência da expressão de alegria, normalmente tem-se o ganho de recursos e uma
interação positiva com o que propiciou a situação (Fredrickson, 1998Fredrickson, B. L. (1998). What good are positive emotions? Review of
General Psychology, 2(3), 300-319. doi:10.1037/1089-2680.2.3.300.
https://doi.org/10.1037/1089-2680.2.3.30...
; Galati, Miceli, &
Sini, 2001Galati, D., Miceli, R., & Sini, B. (2001). Judging and coding facial
expression of emotions in congenitally blind children. International Journal of
Behavioral Development, 25(3), 268-278.
doi:10.1080/01650250042000393.
https://doi.org/10.1080/0165025004200039...
; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.). Alegria
também é comumente referenciada como contentamento, jovialidade e júbilo (Rotter, 2000Rotter, J. C. (2000). Happiness: Is it real or just an illusion? The
Family Journal, 8(4), 387-389. doi:10.1177/1066480700084009.
https://doi.org/10.1177/1066480700084009...
). De acordo com (Galati, Manzano e Sotgiu 2006Galati, D., Manzano, M., & Sotgiu, I. (2006). The subjective
components of happiness and their attainment: A cross-cultural comparison between
Italy and Cuba. Social Science Information, 45(4), 601-630.
doi:10.1177/0539018406069594.
https://doi.org/10.1177/0539018406069594...
), o significado de
alegria atualmente tornou-se muito próximo de satisfação com a vida e bem-estar
subjetivo, sendo que esses termos têm sido frequentemente utilizados para descrever o
mesmo tipo de fenômeno. Em um estudo com participantes italianos e cubanos, os
autores fizeram levantamentos de objetos que os participantes consideravam fazê-los
feliz. Foi possível identificar elementos transculturais, como saúde, família, amor e
dinheiro como eliciadores de alegria, embora o nível em que esses componentes
proporcionassem felicidade fosse diferente.
No que diz respeito à expressão facial característica da emoção alegria (Figura 2a), encontra-se o erguimento do músculo
zigomático maior, que vai dos lábios até as bochechas, resultando na elevação típica
do sorriso. A expressão autêntica da alegria ainda implica na contração de um músculo
orbital que resulta no rebaixamento da pele entre as pálpebras e a sobrancelha.
Pesquisas apontam que cerca de apenas 10% das pessoas conseguem contrair
voluntariamente esse músculo para provocar uma expressão falseada de alegria (Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.). Quanto à expressão vocal da alegria, as características
típicas são tons altos e variados, ritmo rápido com poucas pausas entre as palavras,
e volume alto (Juslin & Laukka, 2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.129.5....
;
Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal
of Voice, 9(3), 235-248.).
O medo é despertado frente a um evento causado pelo ambiente ou por outra pessoa, e
que é avaliado como ameaçador, gerando a interpretação de incerteza ou falta de
controle em relação ao que pode ocorrer, tipicamente resultando numa resposta de fuga
que objetiva colocar o indivíduo de volta em segurança. Alguns modelos localizam a
ansiedade dentro da categoria medo, pois, em ambos os casos, considera-se a emoção
como uma resposta a um perigo, presente ou não (Dumont, Yzerbyt, Wigboldus, & Gordijn, 2003Dumont, M., Yzerbyt, V., Wigboldus, D., & Gordijn, E. H. (2003).
Social categorization and fear reactions to the September 11th terrorist attacks.
Personality and Social Psychology Bulletin, 29(12), 1509-1520.
doi:10.1177/0146167203256923.
https://doi.org/10.1177/0146167203256923...
; Ekman & Cordaro, 2011Ekman, P., & Cordaro, D. (2011). What is meant by calling emotions
basic. Emotion Review, 3(4), 364-370. doi:10.1177/1754073911410740.
https://doi.org/10.1177/1754073911410740...
; Hodiamont, 1991Hodiamont, P. P. G. (1991). How normal are anxiety and fear?
International Journal of Social Psychiatry, 37(1), 43-50.
doi:10.1177/002076409103700106.
https://doi.org/10.1177/0020764091037001...
; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.;
Thalmann, 2013Thalmann, Y. A. (2013). Le décodeur des émotions. Paris:
First-Gründ.).
De acordo com (Ekman 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.), a expressão facial
típica do medo é a abertura das pálpebras superiores e tensão leve das pálpebras
inferiores, abertura da mandíbula, estiramento horizontal dos lábios e levantamento
das sobrancelhas (Figura 2b). (Marsh, Adams Jr. e Kleck 2005Marsh, A. A., Adams Jr., R. B., & Kleck, R. E. (2005). Why do fear
and anger look the way they do? Form and social function in facial expressions.
Personality and Social Psychology Bulletin, 31(1), 73-86.
doi:10.1177/0146167204271306.
https://doi.org/10.1177/0146167204271306...
) encontraram que a
expressão facial do medo do adulto assemelha-se à face típica do bebê, sugerindo uma
função adaptativa social associada a essa expressão, no sentido de busca de
recebimento de cuidado e tratamento não agressivo. (Tamietto, Geminiani, Genero e Gelder 2007Tamietto, M., Geminiani, G., Genero, R., & de Gelder, B. (2007).
Seeing fearful body language overcomes attentional deficits in patients with neglect.
Journal of Cognitive Neuroscience, 19, 445-454.
doi:10.1162/jocn.2007.19.3.445.
https://doi.org/10.1162/jocn.2007.19.3.4...
) encontraram que mesmo pacientes
com déficits de atenção são capazes de perceber informações de medo na postura
corporal das outras pessoas de maneira mais rápida do que outras emoções. Já no que
diz respeito à expressão vocal, no medo os tons também são altos e variados, com
ritmo mais rápido e volume alto (Juslin & Laukka,
2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.129.5....
; Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal
of Voice, 9(3), 235-248.).
A emoção surpresa é gerada por um evento inesperado ou a interrupção súbita de um
estímulo, provocando uma pausa permitindo que o indivíduo tenha tempo para se
orientar (Ekman & Cordaro, 2011Ekman, P., & Cordaro, D. (2011). What is meant by calling emotions
basic. Emotion Review, 3(4), 364-370. doi:10.1177/1754073911410740.
https://doi.org/10.1177/1754073911410740...
; Galati et al., 2001Galati, D., Miceli, R., & Sini, B. (2001). Judging and coding facial
expression of emotions in congenitally blind children. International Journal of
Behavioral Development, 25(3), 268-278.
doi:10.1080/01650250042000393.
https://doi.org/10.1080/0165025004200039...
; Goddard, 1997Goddard, C. (1997). Contrastive semantics and cultural psychology:
"Surprise" in malay and english. Culture & Psychology, 3(2), 153-181.
doi:10.1177/1354067X9700300204.
https://doi.org/10.1177/1354067X97003002...
; Plutchik,
2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.; Thalmann, 2013Thalmann, Y. A. (2013). Le décodeur des émotions. Paris:
First-Gründ.). A surpresa é
uma das emoções mais breves, durando apenas alguns segundos. Uma vez que se
compreende o que está acontecendo, surpresa tende a se combinar com outra emoção,
positiva ou negativa, dependendo do evento eliciador, ou não ser seguida por nenhuma
outra, caso não seja avaliado como importante.
A ativação muscular da surpresa é muito semelhante ao medo (Figura 2c), sendo que as sutis diferenças estão no não levantamento das pálpebras inferiores, na abertura da boca e no enrugamento da testa devido ao erguimento das sobrancelhas (Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times Book.; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology, biology and evolution. Washington, DC: American Psychological Association.). Quanto à voz, tipicamente o tom é alto e variado e o ritmo rápido (Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal of Voice, 9(3), 235-248.), porém essas características podem ser influenciadas pela presença de outras emoções.
A tristeza surge quando há perda de algo ou alguém considerado de valor, gerando
sensação de abandono e a busca por uma ligação novamente com o mesmo ou com outro
objeto, sendo as manifestações mais frequentes o choro, o afastamento e o silêncio.
São diversos os tipos de perda que podem eliciar a tristeza, desde a rejeição de uma
pessoa querida ou importante, a perda da saúde ou parte do corpo, e até a perda de um
objeto valorizado. Trata-se de uma das emoções mais duradouras. A angústia pode ser
incluída nesse grupo, e inclui agitação associada a desesperança (Denham, Mason, & Couchoud, 1995Denham, S. A., Mason, T., & Couchoud, E. A. (1995). Scaffolding
young children's prosocial responsiveness: Preschooler's responses to adult sadness,
anger, and pain. International Journal of Behavioral Development, 18(3), 489-504.
doi:10.1177/016502549501800306.
https://doi.org/10.1177/0165025495018003...
; Ekman & Cordaro, 2011Ekman, P., & Cordaro, D. (2011). What is meant by calling emotions
basic. Emotion Review, 3(4), 364-370. doi:10.1177/1754073911410740.
https://doi.org/10.1177/1754073911410740...
; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.; Thalmann,
2013Thalmann, Y. A. (2013). Le décodeur des émotions. Paris:
First-Gründ.).
As reações faciais da tristeza (Figura 2d)
incluem o rebaixamento das extremidades dos lábios, elevação leve das bochechas,
resultando no aperto dos olhos, elevação do centro das sobrancelhas e inclinação das
pálpebras superiores, geralmente acompanhada do olhar para baixo (Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.). A voz costuma ter pouca variação de
tons, que são baixos, com um discurso pausado e mais lento, em volume mais baixo
(Juslin & Laukka, 2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.129.5....
; Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal
of Voice, 9(3), 235-248.).
O nojo, também chamado de aversão, é eliciado por objetos considerados repulsivos e
indesejáveis, com a tendência subsequente de expulsão ou remoção do objeto (Beaumont & Wagner, 2004Beaumont, S. L., & Wagner, S. L. (2004). Adolescent-parent verbal
conflict: The roles of conversational styles and disgust emotions. Journal of
Language and Social Psychology, 23(3), 338-368.
doi:10.1177/0261927X04266813.
https://doi.org/10.1177/0261927X04266813...
; Berle, 2007Berle, D. (2007). Graded exposure therapy for long-standing
disgust-related cockroach avoidance in an older male. Clinical Case Studies, 6(4),
339-347. doi:10.1177/1534650106288965.
https://doi.org/10.1177/1534650106288965...
; Plutchik,
2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.; Thalmann, 2013Thalmann, Y. A. (2013). Le décodeur des émotions. Paris:
First-Gründ.). De acordo com
(Ekman 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.), o nojo aparece como uma
emoção separada a partir dos quatro a oito anos. Antes disso, existe o desgosto
brando ou rejeição por coisas com sabor ruim, mas ainda não a aversão.
Como resposta muscular típica da face (Figura
2e), tem-se o franzimento do nariz, rebaixamento das sobrancelhas (o que pode
ser confundido com raiva), erguimento das pálpebras inferiores e erguimento das
bochechas, resultado em contração dos lábios (Ekman,
2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.; Rozin, Lowery, & Ebert,
1994Rozin, P., Lowery, L., & Ebert, R. (1994).Varieties of disgust faces
and the structure of disgust. Journal of Personality and Social Psychology, 66,
870-881. doi:10.1037/0022-3514.66.5.870.
https://doi.org/10.1037/0022-3514.66.5.8...
). Na voz, há baixa variação do tom e o ritmo é mais lento (Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal
of Voice, 9(3), 235-248.).
A raiva surge ao se deparar com um obstáculo avaliado como hostil, interferindo no
que se está fazendo ou intencionando fazer. Se se tem a percepção de que a
interferência é intencional, em vez de acidental, de modo a parecer que a pessoa
interferindo escolheu essa ação, o nível de raiva pode ser ainda maior. Além de
pessoas, a frustração com objetos inanimados também pode causar raiva. Essa emoção
gera uma tendência de ataque que visa remover aquele impedimento e mudar a situação
atual, frequentemente de modo que destrua ou prejudique o alvo (Ekman & Cordaro, 2011Ekman, P., & Cordaro, D. (2011). What is meant by calling emotions
basic. Emotion Review, 3(4), 364-370. doi:10.1177/1754073911410740.
https://doi.org/10.1177/1754073911410740...
; Galati
et al., 2001Galati, D., Miceli, R., & Sini, B. (2001). Judging and coding facial
expression of emotions in congenitally blind children. International Journal of
Behavioral Development, 25(3), 268-278.
doi:10.1080/01650250042000393.
https://doi.org/10.1080/0165025004200039...
; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.; Thalmann, 2013Thalmann, Y. A. (2013). Le décodeur des émotions. Paris:
First-Gründ.).
A expressão facial característica dessa emoção (Figura
2f) corresponde ao rebaixamento das sobrancelhas em direção ao nariz. Além
disso, ocorre abertura das pálpebras e tensão dos lábios (Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.). A voz eleva-se, tanto no volume quanto nos tons,
que também são variados, e o ritmo das palavras é maior, com menos pausas (Juslin & Laukka, 2003Juslin, P. N., & Laukka, P. (2003). Communication of emotions in
vocal expression and music performance: Different channels, same code? Psychological
Bulletin, 129(5), 770-814. doi:10.1037/0033-2909.129.5.770.
https://doi.org/10.1037/0033-2909.129.5....
; Scherer, 1995Scherer, K. R. (1995). Expression of emotion in voice and music. Journal
of Voice, 9(3), 235-248.).
Como já mencionado, além das seis emoções básicas apresentadas, é possível encontrar
propostas teóricas que listam uma quantidade diferente. Por exemplo, o modelo de
(Plutchik 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.) acrescentou duas emoções:
aceitação, no sentido de se sentir parte de um grupo, recebendo cuidado e carinho; e
expectativa, no sentido de interesse e curiosidade em algo diferente. Há ainda
modelos que não trabalham com emoções básicas, mas com dimensões onde os afetos se
distribuem. Por exemplo, (Posner, Russell e Peterson
2005Posner, J., Russell, J. A., & Peterson, B. S. (2005). The circumplex
model of affect: An integrative approach to affective neuroscience, cognitive
development, and psychopathology. Development and Psychopathology, 17, 715-734.
doi:10.1017/S0954579405050340
https://doi.org/10.1017/S095457940505034...
) propuseram um modelo circumplexo com dois eixos: as dimensões
prazer-desprazer e ativação-desativação. Já (Fontaine, Scherer, Roesch e Ellsworth 2007Fontaine, J. R. J., Scherer, K. R., Roesch, E. B., & Ellsworth, P.
C. (2007). The world of emotions is not two-dimensional. Psychological Science,
18(12), 1050-1057.) propuseram quatro dimensões:
avaliação-prazer, potência-controle, ativação e imprevisibilidade. Estudos com
neuroimagem estão começando a ser conduzidos buscando descobrir se as emoções ocorrem
em regiões específicas do cérebro - o que daria suporte às teorias de emoções básicas
- ou se ocorrem em diversas regiões em interação - o que daria suporte às teorias
construtivistas sociais. Infelizmente, os resultados ainda não são conclusivos,
havendo evidências para ambos os casos (Lindquist,
Wager, Kober, Bliss-Moreau, & Barrett, 2012Lindquist, K. A., Wager, T. D., Kober, H., Bliss-Moreau, E., &
Barrett, L. F. (2012). The brain basis of emotion: A meta-analytic review. Behavioral
and Brain Sciences, 35(3), 121-143. doi:10.1017/S0140525X11000446.
https://doi.org/10.1017/S0140525X1100044...
; Vytal & Hamann, 2010Vytal, K., & Hamann, S. (2010). Neuroimaging support for discrete
neural correlates of basic emotions: A voxel-based meta-analysis. Journal of
Cognitive Neuroscience, 22(12), 2864-2885.
doi:10.1162/jocn.2009.21366
https://doi.org/10.1162/jocn.2009.21366...
).
Os modelos de emoções básicas também propõem que estas se agrupam para formar emoções complexas. Na verdade, a maioria dos estados emocionais das pessoas seria formada por mais de uma emoção (Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology, biology and evolution. Washington, DC: American Psychological Association.). Por exemplo, decepção seria a mistura de surpresa e tristeza; remorso, a mistura de tristeza e nojo; saudade, a mistura de alegria e tristeza; e assim por diante. Deve-se destacar, contudo, que nem sempre a mistura das mesmas emoções básicas resultará na mesma complexa, pois isso depende da intensidade e da avaliação da pessoa. Por exemplo, um atleta que conquistou uma vitória difícil, ao subir ao pódio, pode estar "chorando de felicidade". Isso seria uma mistura de alegria e tristeza, mas não se pode dizer que o atleta está sentindo saudade.
Por isso, é importante ressaltar que, quando se diz que uma emoção é básica, não está
se referindo a um fenômeno único e isolado, cujas características são exatamente as
mesmas e, portanto, qualquer diferença implicaria em ser outra emoção básica,
refere-se sim a grupos que compartilham afetos, cognições e comportamentos
suficientemente semelhantes (Ekman & Cordaro,
2011Ekman, P., & Cordaro, D. (2011). What is meant by calling emotions
basic. Emotion Review, 3(4), 364-370. doi:10.1177/1754073911410740.
https://doi.org/10.1177/1754073911410740...
; Ortony & Turner, 1990Ortony, A., & Turner, T. J. (1990). What's basic about basic
emotions? Psychological Review, 97(3), 315-331.
doi:10.1037/0033-295X.97.3.315.
https://doi.org/10.1037/0033-295X.97.3.3...
).
Por exemplo, frente a uma criança que insiste em ser desobediente mesmo após
reprovações, uma mãe pode cerrar levemente as pálpebras superiores e inferiores,
respirando profunda e lentamente, e falando pausadamente, transmitindo a informação
de que está controlando sua raiva, porém prestes a explodir. Essa expressão facial é
absolutamente diferente da expressão tradicionalmente associada à raiva - olhos
arregalados, boca e sobrancelhas franzidas - que condiz mais adequadamente com a
situação de fúria. Apesar da diferença das expressões, ambas transmitem a mesma
informação, ou seja, que a pessoa está com raiva em níveis possivelmente semelhantes,
sendo inclusive a primeira expressão comumente chamada de "fuzilar com os olhos". Por
isso, ambas as expressões são agrupadas no conjunto de emoção básica chamada raiva. O
mesmo acontece com expressões de satisfação, contentamento, felicidade, euforia,
êxtase, etc., agrupando-se no conjunto de alegria; apreensão, preocupação, ansiedade,
pânico, pavor, etc., agrupando-se no conjunto de medo; e assim por diante.
Considerações Finais
O presente trabalho teve como objetivo fazer uma revisão do conceito emoção e sua
expressão. É praticamente unânime a compreensão de que a capacidade de expressar emoções
é inata, ou seja, a expressão de emoções básicas costuma ser idêntica em todos os povos
(Ekman, 2003Ekman, P. (2003). Emotions revealed. New York: Times
Book.; Plutchik, 2002Plutchik, R. (2002). Emotions and life: Perspectives from psychology,
biology and evolution. Washington, DC: American Psychological
Association.). Porém, o contexto cultural e a história individual
demonstram exercer influência predominante sobre a avaliação de quais estímulos
provocamemoções e em quais momentos pode-se ou deve-se expressar quais emoções (Gendron, Roberson, van der Vyver e Barrett, 2014Gendron, M., Roberson, D., van der Vyver, J. M., & Barrett, L. F.
(2014). Perceptions of emotion from facial expressions are not culturally universal:
Evidence from a remote culture. Emotion, 14(2), 251-262.
doi:10.1037/a0036052.
https://doi.org/10.1037/a0036052...
;
Niedenthal et al., 2006Niedenthal, P. M., Krauth-Gruber, S., & Ric, F. (2006). Psychology
of emotion: Interpersonal, experiential, and cognitive approaches. New York:
Psychology Press.). A literatura nessa
área é extensa e as informações levantadas e referenciadas nesta revisão foram
integradas numa proposta de modelo simplificado do funcionamento emocional, com o
propósito de oferecer uma linha geral de abordagem ao fenômeno da expressão emocional.
Nesse sentido, o modelo pretendeu apresentar as relações entre os componentes da emoção:
avaliação da situação, possíveis reações resultantes dessa avaliação e retroalimentação.
Esse modelo deve ser verificado em pesquisas quanto a sua utilidade. Isso poderia ser
feito, por exemplo, por meio de pesquisas que apresentassem estímulos afetivos e
verificassem a existência ou não de relação entre a interpretação individual desses
estímulos e a expressão facial e sentimentos despertados.
Ainda, deve-se levar em conta que o modelo é bastante abrangente e abre espaço para
interpretações de seus componentes de maneira mais específica. Por exemplo, (Scherer, Mortillaro e Mehu 2013Scherer, K. R., Mortillaro, M., & Mehu, M. (2013). Understanding the
mechanisms underlying the production of facial expression of emotion: A componential
perspective. Emotion Review, 5(1), 47-53.
doi:10.1177/1754073912451504.
https://doi.org/10.1177/1754073912451504...
) apresentaram um
modelo mais complexo focando nos diversos tipos de cognições que levariam às
interpretações da situação, suas potenciais combinações e consequentes expressões
faciais.O modelo daqueles autores poderia ser considerado uma especificação dos
componentes cognitivos e expressivos do modelo integrativo geral.
Também foi feita uma revisão de seis expressões emocionais básicas, adotando-se a visão de que várias emoções semelhantes ocorrem dentro de um mesmo grupo. Assim, percebe-se que as reações faciais são distintas tanto entre os grupos como dentro do grupo. Como diferencial, entende-se que o componente cognitivo - ou seja, a interpretação do evento eliciador - seja uma informação de valor para o psicólogopois a expressão emocional do indivíduo pode revelar dados importantes sobre como este percebe e se relaciona com o mundo, e, a partir disso, se começar a elaborar uma proposta de intervenção. Por exemplo, o indivíduo com excesso de tristeza provavelmente está atribuindo elevado valor à maioria das situações e interpretando o afastamento delas como perda, originando então o sentimento de abandono característico da tristeza, a que pode se seguir pessimismo, distimia ou depressão. Uma intervenção que estimulasse a reavaliação poderia ser benéfica.
Essas considerações apenas tangenciam o extenso universo que o estudo das emoções abarca. É necessário que se continue investigando tanto os aspectos individuais quanto sociais da emoção; tanto a normalidade quanto seus desvios, como o autismo; tanto os aspectos negativos e desajustados quanto a saúde, o bem-estar e a regulação ou inteligência emocional. Com a proposta e a verificação de modelos científicosintegradores, caminha-se para uma compreensão cada vez maior desse importante fenômeno que deixa marcas em todos os níveis: psicológico, fisiológico e social.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jan-Apr 2015
Histórico
-
Recebido
04 Fev 2014 -
Revisado
06 Nov 2014 -
Aceito
10 Dez 2014