Open-access Avaliação da educação interprofissional para a tomada de decisão compartilhada em farmacoterapia: uma revisão de escopo sobre métodos e instrumentos

Evaluación de la educación interprofesional para la toma de decisionescompartida en farmacoterapia: una revisión del alcance sobre métodos einstrumentos

Resumo

Este estudo teve como objetivo descrever os métodos de pesquisa e instrumentos utilizados na avaliação de estratégias de educação interprofissional para a tomada de decisão compartilhada em farmacoterapia. Os tipos de avaliação empregados foram categorizados segundo o modelo adaptado de Kirkpatrick. Foi conduzida uma revisão de escopo, seguindo as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses Extension for Scoping Reviews (Prisma-ScR). Entre os 21 estudos selecionados, houve predomínio dos métodos quantitativos na avaliação das experiências educacionais (n=18). Destes, o aspecto mais comum avaliado foi “atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional”, por meio de instrumentos validados (n=13). Foram identificados dez diferentes instrumentos, que se mostraram em conformidade com as competências colaborativas do Interprofessional Education Collaborative. A variedade de instrumentos sinaliza a crescente produção de conhecimento acerca do assunto, mas aponta o desafio de realizar análises comparativas entre experiências educacionais ao redor do mundo.

Educação interprofissional; Tomada de decisão compartilhada; Avaliação de programas e instrumentos de pesquisa; Revisão

Resumen

El objetivo de este estudio es describir los métodos de investigación e instrumentos utilizados en la evaluación de estrategias de educación interprofesional para la toma de decisiones compartida en farmacoterapia. Los tipos de evaluación empleados se caracterizaron según el modelo adaptado de Kirkpatrick. Se realizó una revisión de alcance, siguiendo las recomendaciones del PRISMA-ScR. Entre los 21 estudios seleccionados, predominaron los métodos cuantitativos en la evaluación de las experiencias educativas (n=18). De ellos, el aspecto más común evaluado fue el de “actitudes y percepciones de los alumnos con relación a la educación y a la práctica interprofesional", por medio de instrumentos validados (n=13). Se identificaron diez diferentes instrumentos, que se mostraron en conformidad con las competencias colaborativas del Interprofessional Education Collaborative . La variedad de instrumentos señala la creciente producción de conocimiento sobre el asunto, pero muestra el desafío de realizar análisis comparativos entre experiencias educativas alrededor del mundo.

Educación interprofesional; Toma de decisiones compartida; Evaluación de programas e instrumentos de investigación; Revisión

Abstract

This study aimed to describe the research methods and instruments used in the evaluation of interprofessional education strategies for shared decision making in drug therapy. The types of evaluation employed were categorized according to Kirkpatrick’s adapted model. A scoping review was conducted, following the PRISMA-ScR recommendations. Among the 21 selected studies, there was a predominance of quantitative methods in the evaluation of educational experiences (n=18). Of these, the most common aspect evaluated was “students’ attitudes and perceptions towards interprofessional education and practice” by means of validated instruments (n=13). Ten different instruments were identified and found to be in line with the Interprofessional Education Collaborative competencies. The variety of instruments signals the growing production of knowledge about this topic, but points to the challenge of conducting comparative analyses between educational experiences around the world.

Interprofessional education; Decision making, shared; Evaluation of research programs and tools; Review

Introdução

A farmacoterapia é um dos recursos mais utilizados nos sistemas de saúde atuais para prevenção, manutenção e recuperação da saúde. No entanto, a prescrição e a utilização inapropriada de medicamentos vêm causando grandes danos à saúde das pessoas, havendo necessidade de intervenções para minimizar a morbimortalidade decorrente1 . A interação de dois ou mais profissionais da Saúde para a tomada de decisão em farmacoterapia é necessária para a melhora de resultados na saúde dos pacientes2 , 3 .

O compartilhamento da tomada de decisão acontece quando profissionais de Saúde e pacientes colaboram entre si, a melhor evidência é compartilhada e as preferências dos pacientes são respeitadas, sendo estes considerados como membros efetivos da equipe de saúde4 . Nesse contexto, torna-se importante a abordagem da tomada de decisão compartilhada em farmacoterapia na formação de futuros profissionais para o trabalho interprofissional em saúde.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a educação interprofissional (EIP) “ocorre quando estudantes de duas ou mais profissões aprendem sobre os outros, com os outros e entre si para possibilitar a colaboração eficaz e melhorar os resultados na saúde”5 (p. 7). Portanto, a EIP tem como objetivo final garantir uma atenção à saúde segura e eficaz6 , 7 .

Iniciativas de EIP têm sido desenvolvidas nas graduações em Saúde em diferentes países, apresentando resultados positivos8 - 11 . Para auxiliar no desenvolvimento dessas atividades educacionais, 38 competências-chave para a prática colaborativa interprofissional foram definidas e organizadas pelo Interprofessional Education Collaborative (IPEC); e subdivididas em quatro domínios: valores e ética; papéis e responsabilidades; comunicação interprofissional; e trabalho em equipe12 , 13 .

Tendo em vista a importância de se fomentar e conhecer a forma como as experiências educacionais interprofissionais têm sido implementadas, é necessário também conhecer como a avaliação dessas atividades tem sido conduzida nas pesquisas. Neste artigo, entende-se o termo “avaliação” como o processo de coleta de evidências que permitem o julgamento da efetividade e do valor de uma atividade educacional14 .

Peltonen et al .15 realizaram uma revisão de escopo sobre os instrumentos existentes para mensuração da colaboração interprofissional em saúde, com foco nos profissionais em serviço, sem o olhar específico para a avaliação dos estudantes em formação que participam das atividades de EIP.

Com base no exposto, uma revisão de escopo foi conduzida por nossa equipe de pesquisa para identificar estudos que descrevem e avaliam experiências de EIP envolvendo aspectos sobre a tomada de decisão em farmacoterapia16 . O presente estudo é um desdobramento dessa revisão e tem como objetivos específicos descrever os métodos de pesquisa e os instrumentos empregados na avaliação de tais experiências educacionais na perspectiva do estudante, assim como analisar os instrumentos quantitativos que avaliam “atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional” referente às competências-chave colaborativas13 .

Metodologia

Foi conduzida uma revisão de escopo, que compreende um tipo de estudo adequado para mapear a literatura disponível em determinada área de pesquisa, sendo incluída toda a literatura relevante, independentemente da qualidade metodológica, uma vez que o objetivo é justamente apresentar um panorama sobre um determinado tema17 , 18 .

O protocolo da revisão foi desenvolvido usando a estrutura metodológica proposta pelo Joanna Briggs Institute18 e foi registrado no Open Science Framework (osf.io/kfy27). Esta revisão segue o Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses Extension for Scoping Reviews (Prisma-ScR)19 .

Busca sistemática e elaboração da pergunta de pesquisa

Foi preparada uma estratégia de busca utilizando o acrônimo PCC – sendo que “P” refere-se à população; “C”, ao conceito; e o segundo “C”, ao contexto18 – com o objetivo de identificar estudos primários que descrevem e avaliam experiências de EIP envolvendo a tomada de decisão em farmacoterapia. Os resultados obtidos nesta revisão originaram dois estudos: o primeiro, já publicado, tem como foco as abordagens de ensino e aprendizagem utilizadas nesse contexto16 . Já no presente estudo, os artigos foram analisados para responder à seguinte pergunta: quais os métodos de pesquisa e instrumentos empregados na avaliação dessas experiências em EIP para tomada de decisão em farmacoterapia, na perspectiva do estudante?

As buscas foram realizadas em sete bases de dados: Medline (PubMed), Excerpta Medica Database (Embase), Cochrane Library, PsycInfo, Education Resources Information Center (Eric), Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs). Para cada base de dados, uma estratégia específica foi construída com os descritores MeSH ou seus descritores DeCs correspondentes em inglês e português, e a combinação deles com seus sinônimos (estratégias de busca disponíveis na plataforma Open Science Framework: osf.io/kfy27).

A busca manual foi conduzida por meio da verificação das referências de todos os estudos incluídos e da pesquisa referente aos últimos dez anos nos três periódicos que obtiveram o maior número de artigos recuperados na busca: Journal of Interprofessional Care, Currents in Pharmacy Teaching and Learning e American Journal of Pharmaceutical Education.

Critérios de elegibilidade

Foram empregados os seguintes critérios de inclusão: estudos primários com todos os desenhos metodológicos que respondessem à pergunta de pesquisa; e artigos escritos em inglês, português ou espanhol, sem restrição de data de publicação. Foram excluídos: artigos de revisão; artigos cuja população não era composta por pelo menos dois ou mais alunos de graduação em Saúde e Assistência Social; e artigos que não abordaram a experiência de EIP a respeito da tomada de decisão sobre farmacoterapia.

Seleção de estudos; e extração e análise de dados

Os artigos identificados na busca, após a retirada de duplicatas, foram reunidos no software Rayyan®20 . O processo de seleção dos artigos foi conduzido por quatro pesquisadoras independentes trabalhando em duplas (Kirla Barbosa Detoni e Ariane Lopes André; Cristiane de Paula Rezende e Bárbara Taciana Furtado), em duas etapas: (1) triagem de título e resumo; e (2) leitura de texto completo. As discrepâncias foram resolvidas por consenso e discussão com uma quinta revisora (Simone de Araújo Medina Mendonça).

Os dados extraídos dos artigos selecionados foram organizados em uma planilha de Excel®, desenvolvida pela equipe de pesquisadoras. As duplas de pesquisadoras extraíram os dados de maneira independente. Posteriormente, em conjunto, a equipe realizou a discussão das informações coletadas e a atualização da planilha. Foram coletados dados relacionados aos seguintes aspectos: a) características do estudo (país de origem e ano de publicação); b) objetivos da pesquisa; c) métodos de pesquisa e instrumentos utilizados para avaliação das experiências educacionais; e d) validação dos instrumentos quantitativos na língua original e no Brasil.

Os resultados foram sintetizados de forma narrativa e foi conduzida uma análise descritiva, sendo determinadas medidas de frequência absoluta e relativa. Os tipos de avaliação empregados nos estudos foram categorizados segundo o modelo adaptado de Kirkpatrick21 , que é uma versão ligeiramente modificada do modelo original22 , ampliada com a adição de dois itens de avaliação nos níveis 2 e 4, e que tem sido sugerida por estudiosos na área de EIP14 . Esse modelo adaptado apresenta os seguintes níveis de avaliação: reação, contemplando a perspectiva dos participantes sobre a experiência educacional (nível 1); modificação de atitudes e percepções dos estudantes (nível 2a); aquisição de conhecimentos e habilidades (nível 2b); mudança de comportamento, contemplando a aplicação do aprendizado na prática (nível 3); mudanças organizacionais (nível 4a); e benefício para pacientes/usuários (nível 4b).

O conteúdo dos instrumentos quantitativos validados utilizados para a avaliação da modificação de atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional foi analisado conforme as competências colaborativas propostas pelo IPEC13 . Para isso, foi realizada a busca da versão completa desses instrumentos. Os itens de cada instrumento foram analisados pela autora principal e categorizados em um dos quatro domínios das competências-chave do IPEC: valores e ética; papéis e responsabilidades; comunicação interprofissional; e trabalho em equipe. A categorização foi feita comparando-se o conteúdo dos itens dos instrumentos com a descrição das competências e subcompetências do documento oficial do IPEC (versão 2016)13 . Em seguida, foram realizadas reuniões com Kirla Barbosa Detoni e Simone de Araújo Medina Mendonça para análise colaborativa da categorização desses itens.

Resultados e discussão

Foram identificadas cinco mil publicações nas bases de dados e 1.261 foram excluídas devido à duplicidade. Foram selecionados para leitura completa 103 artigos, sendo 42 oriundos das buscas nas bases de dados e 61, da busca manual. Ao final, foram incluídos 21 estudos nesta revisão de escopo ( figura 1 ). As características gerais dos estudos estão descritas no quadro 1 .

Figura 1
Descrição do processo de seleção dos artigos conforme o fluxograma Prisma-SCR

Quadro 1
Características gerais dos estudos incluídos na presente revisão de escopo sobre métodos e instrumentos utilizados na avaliação da educação interprofissional para a tomada de decisão compartilhada em farmacoterapia

O ano de publicação dos estudos variou de 1995 a 2020, sendo 90% (n=19) destes publicados após 2010, o que mostra que o interesse pela temática aumentou nos últimos anos. Nessa revisão, também ficou evidente a carência de estudos em EIP publicados no Hemisfério Sul. Quase a totalidade das pesquisas foi conduzida na América do Norte (n=10; 47%) e na Europa (n=9; 43%); além da Ásia (n=2; 9%) e Oceania (n=1; 4%).

Avaliando os artigos segundo o modelo adaptado de Kirkpatrick21 , seis estudos23 , 24 , 28 , 34 , 41 , 42 apresentaram a perspectiva dos estudantes sobre a experiência educacional (nível 1), e 15 estudos25 - 30 , 32 , 35 - 40 , 42 , 43 apresentaram a modificação de atitudes e percepções dos estudantes (nível 2a). A aquisição de conhecimentos e habilidades (nível 2b) foi demonstrada em sete estudos26 - 28 , 31 , 34 , 38 , 43 . Os estudos não contemplaram os níveis de avaliação educacional nos seguintes quesitos: mudança de comportamento (nível 3) e mudanças organizacionais (nível 4a). O benefício para pacientes/usuários (nível 4b) foi contemplado por Branch-Mays et al .33 . É importante destacar que alguns estudos incluíram a avaliação educacional em mais de um nível.

Similar aos resultados encontrados neste estudo, outras revisões da literatura apontam que a maioria das pesquisas em EIP apresentam avaliações referentes aos níveis 1-2b, que têm foco nos resultados relacionados à aprendizagem dos estudantes a curto prazo9 . Em geral, esses resultados são apropriados para educadores e organizações educacionais e profissionais. Contudo, os autores dessas revisões destacam que é necessário que mais pesquisas avaliem as mudanças que a EIP pode provocar no contexto real da prática clínica (nível 4), incluindo as mudanças organizacionais e benefícios para pacientes e usuários, uma vez que esses resultados podem ser mais apropriados para stakeholders nacionais, como gestores, formuladores de políticas. O instituto de Medicina dos Estados Unidos também reforça a necessidade de as pesquisas avaliarem a conexão entre a EIP e seu impacto na prática, incluindo o impacto na saúde do paciente e da população e nos resultados para o sistema de Saúde como um todo2 .

Dois estudos utilizaram exclusivamente instrumentos de avaliação qualitativos26 , 41 e sete empregaram métodos de avaliação tanto qualitativos quanto quantitativos25 , 28 , 30 , 31 , 36 , 39 , 43 . Os métodos de coleta de dados qualitativos empregados nesses estudos incluíram: questões abertas incluídas ao final de instrumentos quantitativos (n=5)25 , 28 , 31 , 41 , 43 ; feedback reflexivo em grupo (n=2)26 , 37 e grupo focal (n=1)36 . Hardisty et al .30 utilizaram múltiplos métodos de coleta de dados, incluindo observação, entrevistas e grupos focais. Os métodos de avaliação qualitativos empregados, de forma geral, foram pontuais e não incluíram a complexidade e a profundidade demandadas nas pesquisas qualitativas. Esses resultados, portanto, destacam a necessidade de aprofundar e conduzir pesquisas qualitativas mais robustas para compreender melhor os processos e as relações envolvidas na oferta de atividades educacionais interprofissionais.

Todos os estudos que conduziram pesquisa quantitativa para avaliação da atividade educacional empregaram desenho de estudo transversal com a aplicação de questionário estruturado (n=18). Desses, 16 estudos realizaram avaliação pré e pós-intervenção educacional, e dois realizaram aplicação de questionário somente após a intervenção23 , 24 . De fato, entre as ferramentas de avaliação de atividades de EIP, os questionários estruturados têm sido os mais utilizados44 , possivelmente por sua facilidade de aplicação e análise dos dados.

Reeves et al .14 publicaram, em 2015, um guia para melhorar a qualidade das avaliações das iniciativas de EIP, com o intuito de gerar evidências mais robustas. Os autores destacam que, independentemente do tipo de pesquisa (quantitativa ou qualitativa), quesitos essenciais devem ser levados em consideração durante o planejamento da avaliação, como a definição do objetivo com base no contexto de aprendizagem, estrutura conceitual do projeto, nível acadêmico dos alunos e formulação da pergunta que se pretende responder com essa avaliação específica. Os autores também destacam a importância de identificar e engajar diferentes partes interessadas no processo avaliativo.

Essa revisão mostrou que instrumentos quantitativos validados são amplamente usados para avaliar as experiências educacionais. No total, foram identificados 12 instrumentos apresentados como validados nesses estudos. Dois deles têm como objetivo a avaliação dos estudantes em relação à “aquisição de conhecimentos e habilidades clínicas específicas”, no que tange à overdose de opioides34 e à síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)43 . Dez instrumentos têm como objetivo avaliar a modificação de atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional, a saber:

Esses dez instrumentos destacados eram previamente validados na literatura na língua inglesa, com exceção daquele utilizado por Chua et al .39 , que foi desenvolvido e validado pelos próprios autores. Os instrumentos AITCS II, IEPS, ISVS, RIPLS e SATP2C foram validados para o português brasileiro. A variedade de instrumentos validados identificados sinaliza a crescente produção de conhecimento acerca do assunto, mas, por outro lado, também aponta o desafio de realizar análises comparativas entre experiências educacionais interprofissionais ao redor do mundo. Não foi objetivo do presente estudo realizar a análise da qualidade dos processos de validação dos instrumentos.

Os itens presentes nos instrumentos validados que avaliaram a modificação de atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional foram avaliados pelas autoras de acordo com os quatro domínios das competências-chave colaborativas propostas pelo IPEC ( quadro 2 ).

Quadro 2
Distribuição dos itens de cada instrumento identificado nesta revisão que avalia a modificação de atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional, conforme os quatro domínios de competências colaborativas do IPEC

O domínio “trabalho em equipe” foi contemplado em todos os instrumentos avaliados, correspondendo a aproximadamente metade dos itens das escalas AITCS II (46%), T-TAQ (50%) e RIPLS (53%); e representando 60% dos itens na escala SPICE. O domínio “Papéis e responsabilidades” também foi contemplado em todos os instrumentos e predominou no SATP2C (67%), tendo menor importância no T-TAQ (10%) e SAIL-10 (10%).

O domínio “comunicação interprofissional” correspondeu à metade dos itens abordados no instrumento ICCAS e a aproximadamente 30% no ISVS e T-TAQ. Itens relacionados a esse domínio não foram identificados nos instrumentos SPICE e SATP2C. O domínio “Valores e ética” não foi identificado em três instrumentos (SPICE, ISVS e ICCAS), sendo a escala IEPS a que apresentou a maior proporção de itens relacionados a esse domínio entre os instrumentos avaliados (28%).

Os itens presentes nos instrumentos que não foram identificados pelas autoras como pertencentes a um dos quatro domínios das competências colaborativas do IPEC foram agrupados em “outros”. Os aspectos avaliados por esses itens referem-se a questões gerais, como satisfação em relação à experiência educacional, recomendação da atividade para outros alunos e preferência entre diferentes metodologias de ensino.

A análise realizada sobre os instrumentos mostrou que seus itens se encaixavam nas competências descritas pelo IPEC, sendo que a maioria dos itens avaliados se concentrou nos domínios “trabalho em equipe” e “papéis e responsabilidades”. O domínio “valores e ética”, de forma geral, foi o menos avaliado nos instrumentos. Os itens de menor destaque – em relação ao número de elementos a serem avaliados – refletem uma lógica de cuidado que privilegia principalmente, ainda, as questões técnicas, que é uma forte característica da formação de profissionais da área da Saúde. É importante pensar no trabalho interprofissional a partir de uma ótica que possa ser usada para equalizar as relações de poder entre paciente e profissional e entre os profissionais de Saúde. A interprofissionalidade deve buscar horizontalizar as relações, promover melhor e maior comunicação com ética e valores como o respeito e a dialogicidade.

As ferramentas apresentaram grande variabilidade no que diz respeito ao domínio da competência-chave avaliado. Entre os instrumentos analisados, RIPLS é o que possui mais itens relacionados ao domínio “trabalho em equipe” (53%) e STAP2C é o que mais apresenta itens envolvendo o domínio “papéis e responsabilidades” (69%). ICCAS é o instrumento que mais contemplou o domínio “comunicação interprofissional” e o IEPS, o que mais contemplou o domínio “valores e ética”. Nesse sentido, esperamos que esta análise auxilie os pesquisadores e os docentes na seleção de instrumentos que sejam mais assertivos, conforme a competência-foco daquela experiência educacional.

Esta revisão de escopo apresentou algumas limitações. Alguns dos estudos incluídos forneceram informações escassas, o que dificultou a extração de dados. Essa questão destaca a necessidade de melhorar a qualidade das descrições de artigos futuros, mas, ao mesmo tempo, reflete a realidade das publicações. Apesar de não ter sido realizada a busca na literatura cinzenta, esta revisão contou com uma extensa pesquisa bibliográfica em sete bases de dados eletrônicas, além da busca manual. Como limitação da própria metodologia da revisão de escopo, não foi realizada a análise da qualidade dos estudos incluídos, uma vez que o objetivo é apresentar um mapa da literatura sobre o assunto. Dessa forma, não foi possível estabelecer se os métodos e os instrumentos de avaliação empregados pelos estudos eram adequados aos processos de ensino e aprendizagem interprofissionais descritos.

Conclusão

Este estudo permitiu identificar os métodos e instrumentos utilizados na avaliação de experiências em EIP para tomada de decisão em farmacoterapia, revelando o predomínio do uso de métodos quantitativos. Foi identificado um grande número de instrumentos quantitativos validados com foco em avaliar a modificação das atitudes e percepções dos estudantes em relação à educação e à prática interprofissional. A análise desses instrumentos, conforme os domínios das competências-chaves descritas pelo IPEC, evidenciou que os domínios trabalho em equipe; e papéis e responsabilidades foram predominantes. A variedade de instrumentos sinaliza a crescente produção de conhecimento acerca do assunto, contudo, aponta o desafio de realizar análises comparativas entre experiências educacionais ao redor do mundo.

Agradecimentos

Agradecemos à Universidade Federal de Minas Gerais.

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  • Financiamento: Agradecemos às agências brasileiras de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).

Editado por

  • Editora: Francini Lube Guizardi
    Editor associado: Aylton Valsecki Junior

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    05 Out 2022
  • Aceito
    26 Jan 2023
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