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Open-access Um Capítulo Esquecido na História da Psicologia? Sexualidades Desviantes, Psicopatologia e Normalidade

A Forgotten Chapter in the History of Psychology? Deviant Sexualities, Psychopathology, and Normality

¿Un Capítulo Olvidado en la Historia de la Psicología? Sexualidades Desviadas, Psicopatología y Normalidad

Resumo

Este artigo tem como objetivo produzir uma análise histórica sobre as intersecções entre Psicologia e sexualidade desviantes da norma no Brasil, de fins do século XIX a meados da década de 1980. Esta temporalidade foi escolhida por abarcar o surgimento das pesquisas científicas sobre sexualidade e desvios sexuais, a consolidação dos estudos psicológicos sobre a temática e o processo mais recente de despatologização da homossexualidade. Em termos teóricos e metodológicos, foram adotados os pressupostos da História Social da Psicologia e da historiografia das homossexualidades no Brasil. Desse modo, buscou-se compreender como as ideias, concepções e práticas psicológicas foram mudando ao longo do tempo, em conexão com as transformações socioculturais e políticas que ocorreram durante o século XX. Para isto, foram utilizadas fontes primárias e secundárias de pesquisa com vistas à produção de interpretações sobre as conexões entre as ideias, os atores e os eventos narrados. Argumenta-se, ao longo do artigo, que as ideias e práticas psicológicas estão intrinsecamente conectadas aos contextos socioculturais e políticos de seu tempo, sendo os movimentos dinâmicos e os conflitos presentes nesses contextos fatores determinantes para a sua constituição.

Palavras-chave: História da Psicologia; Sexualidade; Homossexualidade; Brasil

Abstract

This article aims to produce a historical analysis of the intersections between Psychology and sexualities that deviate from the norm in Brazil, from the late 19th century to the mid-1980s. This period was chosen because it encompasses the emergence of scientific research on sexuality and sexual deviations, the consolidation of psychological studies on the subject and the most recent process of de-pathologization of homosexuality. Theoretically and methodologically, the assumptions of the Social History of Psychology and the historiography of homosexualities in Brazil were adopted. Therefore, we sought to understand how psychological ideas, conceptions and practices have changed over time, in connection with the sociocultural and political transformations that occurred throughout the 20th century. For this, primary and secondary sources of research were used to produce interpretations about the connections between the ideas, the actors and the narrated events. It is argued, throughout the article, that the psychological ideas and practices are intrinsically connected to the sociocultural and political contexts of their time, being the dynamic movements and conflicts present in these contexts determining factors for their constitution.

Keywords: History of Psychology; Sexuality; Homosexuality; Brazil

Resumen

Este artículo tiene como objetivo realizar un análisis histórico de las intersecciones entre la Psicología y las sexualidades desviadas de la norma en Brasil desde finales del siglo XIX hasta mediados de la década de 1980. Esta temporalidad fue elegida por abarcar el surgimiento de las investigaciones científicas sobre sexualidad y desvíos sexuales, la consolidación de los estudios psicológicos sobre el tema y el más reciente proceso de despatologización de la homosexualidad. En el marco teórico y metodológico, se adoptaron los presupuestos de la Historia Social de la Psicología y de la historiografía de las homosexualidades en Brasil. De esta manera, se pretende comprender cómo las ideas, concepciones y prácticas psicológicas han cambiado a lo largo del tiempo, en conexión con las transformaciones socioculturales y políticas ocurridas durante el siglo XX. Para ello, se utilizaron las fuentes de investigación primarias y secundarias con miras a generar interpretaciones sobre las conexiones entre las ideas, los actores y los eventos narrados. Se argumenta, a lo largo de este artículo, que las ideas y las prácticas psicológicas están intrínsecamente conectadas a los contextos socioculturales y políticos de su tiempo, y los movimientos dinámicos y los conflictos presentes en estos contextos fueron los factores determinantes para su constitución.

Palabras-clave: Historia de la Psicología; Sexualidad; Homosexualidad; Brasil

Introdução

Nas últimas três décadas, a temática da sexualidade ganhou um grande destaque na Psicologia brasileira, sobretudo a partir das discussões sobre diversidade sexual e de gênero. A partir da década de 1990, centenas de pesquisas psicológicas foram publicadas sobre a temática (Pizzinato et al., 2020; Sposito, 2015), que também passou a integrar, de forma prioritária, as políticas do Sistema de Conselhos (Aragusuku & Lara, 2019). No entanto, ainda são poucas, dispersas e iniciais as pesquisas que trabalharam este tema a partir de uma perspectiva historiográfica. A despeito de algumas poucas iniciativas (e.g. Belmonte, 2009; Eddine, 2018; Macedo & Sívori, 2018; Mota et al., 2018; Silva, 2005; Silva & Silva, 2020), não existem ainda trabalhos que produzam reflexões mais ampliadas sobre o fenômeno, de modo a conectar os diversos fragmentos do passado (ideias, personagens, eventos, conflitos etc.) em uma narrativa histórica contextualizada e de longa duração.

O campo da História da Psicologia no Brasil também tem dado pouca atenção ao fenômeno da sexualidade e dos ditos desvios sexuais, como é possível observar em suas principais obras e espaços de divulgação científica (e.g. Campos, 2008; Jacó-Vilela et al., 2008; Jacó-Vilela & Oliveira, 2018). Nas próprias revistas especializadas em Memória e História da Psicologia (Mnemosine e Memorandum), é notável a falta de pesquisas sobre o assunto. Mesmo com as chamadas recentes pela produção de uma História Social da Psicologia (Jacó-Vilela et al., 2018; Portugal et al., 2018), recuperando temas secundarizados, ainda são incipientes o uso das fontes primárias e a análise de grandes temporalidades.

Tentando preencher esta lacuna na literatura brasileira, este artigo tem como objetivo produzir uma análise histórica sobre as intersecções entre Psicologia e sexualidade desviantes da norma no Brasil, de fins do século XIX a meados da década de 1980. Esta temporalidade foi escolhida por abarcar o surgimento das pesquisas científicas sobre a sexualidade (com a definição dos desvios sexuais), a consolidação dos estudos psicológicos sobre a temática e o processo mais recente de despatologização da homossexualidade. Desse modo, buscou-se compreender como as ideias, concepções e práticas psicológicas foram mudando ao longo do tempo, em conexão com as transformações socioculturais e políticas que ocorreram durante o século XX.

Em termos teóricos e metodológicos, adotou-se uma perspectiva externalista de historiografia da Psicologia (Massimi et al., 2008), que se atenta fundamentalmente à interação dinâmica entre ideias, atores, eventos e contexto social. A adoção desta perspectiva se deu em consonância com as discussões presentes na História Social da Psicologia (Portugal et al., 2018) e na historiografia das homossexualidades no Brasil (Bortolozzi, 2021; Figari, 2007; Green, 2019; Trevisan, 2018). Portanto, o foco não se encontra apenas na compreensão das ideias psicológicas, mas também na sua circulação em meio a processos socioculturais e políticos permeados por relações de poder. Para tal fim, foram utilizadas fontes primárias e secundárias de pesquisa com vistas à produção de interpretações sobre as conexões entre as ideias, os atores e os eventos narrados. As fontes secundárias estão disponíveis na literatura historiográfica de referência sobre o assunto. As fontes primárias foram obtidas por meio de acervos e bibliotecas virtuais e físicas (com destaque para a Biblioteca Dante Moreira Leite do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo) e de acervo privado construído a partir da compra de obras antigas em sebos.

Importante destacar que esta análise histórica privilegiou a homossexualidade em detrimento a outras categorias, identidades e comunidades sexuais. Este viés se deu pelos próprios materiais disponíveis (nas fontes primárias e secundárias) e pelas dificuldades em definir fronteiras precisas entre a homossexualidade e a transexualidade nas pesquisas psicológicas do período estudado. No entanto, reconhece-se que as categorias transexual e travesti existem desde o final do século XIX (Green, 2019; Trevisan, 2018) e que há uma lacuna nas pesquisas históricas em Psicologia acerca desta questão. Juno Nedel (2020) traz importantes reflexões sobre os desafios da produção de uma historiografia trans no Brasil, traçando caminhos teóricos e conceituais que podem ser incorporados por pesquisas futuras.

O artigo foi dividido em quatro tópicos. O primeiro discute o surgimento do estudo científico da sexualidade normal e patológica em fins do século XIX. No segundo tópico, são analisadas as primeiras abordagens de estudo das “inversões sexuais” no Brasil. O terceiro aborda o processo de institucionalização da Psicologia e a emergência de espaços de sociabilidade homossexual em meados do século XX. Por fim, o quarto e último tópico trata sobre as mobilizações políticas de homossexuais e o processo de despatologização da homossexualidade na Psicologia brasileira até meados da década de 1980.

A invenção da sexualidade e das ciências sexuais: a definição da norma e dos desvios

Ao longo do século XIX, diversas áreas de saber se consolidaram como disciplinas ou especialidades por meio da delimitação de objetos de estudo - como as patologias, o corpo humano, o mundo animal, a cultura, a sociedade, a mente e as emoções, dentre tantos outros. O método científico possibilitaria então a compreensão das leis e dos mecanismos que regem estes objetos enquanto fenômenos naturais, possibilitando o desenvolvimento de técnicas para a sua manipulação. Desse modo, esforços pela compreensão e controle do mundo natural foram empenhados nas mais diversas áreas, com destaque àqueles direcionados ao desvelamento da natureza humana (sua anatomia, sua psicologia e suas patologias).

A partir deste espírito cientificista e naturalista, que acompanhou as revoluções industriais e a reconfiguração das sociedades europeias, a sexualidade emergiu como um objeto de investigação científica (Ariés & Béjin, 1987; Foucault, 1988; Weeks, 2002). Tornou-se assim o objeto de estudo das “ciências sexuais” (termo guarda-chuva que abarca as diversas áreas da saber empenhadas em seu estudo), que passaram a produzir pesquisas e propagar conhecimentos sobre a natureza da sexualidade humana e suas reverberações psicológicas e sociais (Giami & Levinson, 2021).

Por meio do seu estudo científico, a sexualidade passou a ser classificada por tipologias que delimitam a norma e os desvios. Compreender e tipologizar os desvios (ou patologias) sexuais era uma das principais tarefas das ciências sexuais do século XIX - para facilitar o desenvolvimento de técnicas eficazes de controle e recondução dos desviantes à normalidade. Existia também um ideário de desenvolvimento da humanidade por meio da eugenia (melhoria das “qualidades raciais”), tornando o estudo científico da sexualidade e da raça um ponto essencial neste processo de controle dos “degenerados” e de normalização do corpo social (Caponi, 2012).

Portanto, acadêmicos europeus do século XIX aceleraram a sedimentação de um conceito moderno de sexualidade, delimitando a sua importância na organização das relações sociais e da vida humana. Como definido pelo psiquiatra alemão Richard von Krafft-Ebing (1886/1894), no influente e pioneiro Psychopathia Sexualis: “A sexualidade é o fator mais poderoso na existência individual e social; o incentivo mais forte à utilização de força e aquisição de propriedade, à fundação de um lar, e ao despertar de sentimentos altruístas” (p. 1). Neste livro, Krafft-Ebing organizou uma tipologia de psicopatologias sexuais - como a sodomia, o amor lésbico, o incesto, a necrofilia, o masoquismo, a homossexualidade ou inversão sexual. A partir destas bases, o estudo da sexualidade humana foi continuado por outros autores de referência, como Havelock Ellis, Magnus Hirschfeld, Iwan Bloch e Sigmund Freud, conhecidos por defenderem reformas jurídicas pela despenalização da homossexualidade (Clark et al., 2010).

Os efeitos deste processo de nomeação tipológica da sexualidade anormal pelas ciências sexuais não ficaram restritos ao meio acadêmico, provocou também reconfigurações discursivas que influíram sobre os campos cultural, sociopolítico e jurídico a partir da constituição de “sujeitos sexuais”. Ao longo deste processo, a definições científicas foram absorvidas pela linguagem jurídica e os Estados europeus passaram a normatizar as relações sexuais a partir da tipologia científica. Através da nomeação jurídico-científica das sexualidades desviantes, tivemos a emergência de novas identidades coletivas que influíram sobre o campo sociocultural.

Os sujeitos desviantes e degenerados passaram a ser identificados pelo Estado a partir de seus tipos sexuais (homossexuais, invertidos, travestis, lésbicas, hermafroditas etc.) e, paralelamente, passaram também a se identificar e a ressignificar tais tipos sexuais a partir de suas práticas coletivas e comunitárias - inclusive reivindicando a legitimidade e naturalidade de suas identidades sexuais por meio da produção literária e da auto-organização política. Como destacado por Michel Foucault (1988) em relação à polivalência dos efeitos, em termos de poder, do discurso científico sobre a sexualidade:

[…] o aparecimento, no século XIX, na psiquiatria, na jurisprudência e na própria literatura, de toda uma série de discursos sobre as espécies e subespécies de homossexualidade, inversão, pederastia e “hermafroditismo psíquico” permitiu, certamente, um avanço bem marcado dos controles sociais nessa região da “perversidade”; mas, também, possibilitou a constituição de um discurso “de reação”; a homossexualidade pôs-se a falar por si mesma, a reivindicar sua legitimidade ou sua “naturalidade” e muitas vezes dentro do vocábulo e com as categorias pelas quais era desqualificada do ponto de vista médico (p. 96).

Outro efeito vinculado ao surgimento da sexualidade moderna é o enfraquecimento do monopólio da religião na definição da natureza sexual humana e na normatização jurídica sobre o que é permitido e o que é interdito. As sexualidades desviantes deixaram de ser definidas por seu elemento pecaminoso e herético, e passaram a ser consideradas patologias ou anomalias existentes no mundo natural. Esta mudança de concepção levou parte das elites políticas e intelectuais a considerar os “desviantes” como “doentes”, que não deveriam sofrer sanções criminais, mas sim passar por intervenções médico-psiquiátricas e psicológicas de recondução à normalidade (Foucault, 1988).

Por outro lado, também ocorreram permanências e os desvios sexuais eram vistos conjuntamente como psicopatologias (de ordem psicofisiológica, não intencional) e desvios de caráter (de ordem moral, intencional), com formas híbridas de racionalismo científico e moralismo cristão (Ariés & Béjin, 1987; Figari, 2007). Diferente do ordenamento jurídico eclesial que previa a morte pelo desvio pecaminoso da sodomia, onde o “ato” era punido com a vida (intervenção no “corpo”); os Estados modernos passaram a prever a recondução dos “sujeitos desviantes” à normalidade (intervenção na “mente”), seja pelo tratamento médico-psiquiátrico (consultas psiquiátricas ou psicológicas, medicalização, passagem por hospícios, etc.) ou pelo encarceramento por tempo determinado, como forma de pedagogia punitiva, a depender da gravidade da infração (Weeks, 2002).

A Psicologia se tornou um saber fundamental para a compreensão e o controle da sexualidade humana, pois o entendimento dos mecanismos psicológicos do sexo nos possibilitaria desvelar as forças que impulsionam o comportamento sexual, seja normal ou patológico. Nesta perspectiva, o médico inglês Havelock Ellis publicou a referenciada coleção Studies in the Psychology of Sex, com seis volumes publicados entre 1897 e 1928, tratando sobre diversos temas relacionados às interações entre psicologia, sociedade e sexualidade, com destaque para o famoso volume II sobre a “inversão sexual” (Ellis, 1900/1915). Em paralelo, Sigmund Freud desenvolvia as bases da Psicanálise em Viena, enfatizando o papel central da sexualidade na constituição da psique humana. A teoria psicanalítica elaborou novas formulações sobre a psicologia do sexo - suas variações, anomalias e patologias (Freud, 1920, 1905/1977) - tendo forte influência sobre a Psicologia e a Psiquiatria de início do século XX.

O estudo psicológico das “inversões sexuais” no Brasil de final do século XIX a meados do século XX

Seguindo as produções acadêmicas oriundas do continente europeu, médicos brasileiros começaram a produzir conhecimentos sobre os desvios sexuais, discutindo-os à luz do cenário nacional e de estudos de caso locais. Diversos destes estudos pioneiros no Brasil recorreram à Psicologia para explicar a gênese e as causas das patologias sexuais. Os conhecimentos psicológicos também deram subsídios para a produção de novas técnicas de controle, cura e prevenção dos desvios.

O período de final do século XIX e início do século XX é marcado por um processo de autonomização da Psicologia enquanto uma ciência independente (Antunes, 2006). De acordo com Antonio Soares (1979), ao longo deste processo, uma parte significativa dos pioneiros em Psicologia foi composta por médicos, sobretudo por psiquiatras influenciados pela teoria psicanalítica. Alinhados ao espírito de seu tempo, expoentes da Medicina brasileira atuavam ativamente no controle das “patologias e degenerações” que afligiam a população e prejudicavam o projeto nacional de desenvolvimento e progresso. Por exemplo, a Liga Brasileira de Higiene Mental, fundada em 1923, congregou importantes médicos pioneiros em Psicologia e promoveu durante décadas um programa abertamente eugênico, racista e higienista para o Brasil (Figueira & Boarini, 2014; Nascimento & Mandelbaum, 2020). Isto é, defendeu que a ciência poderia harmonizar e aperfeiçoar a sociedade a partir da eliminação dos “indivíduos inaptos” e dos “degenerados” (Kehl, 1925).

Uma das obras pioneiras que abriram o campo de estudo dos desvios sexuais no Brasil foi Atentados ao pudor: estudos sobre as aberrações do instinto sexual, escrita pelo professor de direito criminal Francisco Viveiros de Castro (1894/1943). O autor buscou descrever do ponto de vista médico-legal uma tipologia dos desvios sexuais, colocando lado a lado assassinos, suicidas, necrófilos, zoófilos, hermafroditas (pessoas com características sexuais ambíguas ou que “mudam de sexo”), tríbades (mulheres adeptas do “amor lésbio”) e pederastas (invertidos, sodomitas). Em sua concepção, “Há o criminoso e há o degenerado. O primeiro deve ser punido, o segundo é irresponsavel. O papel da justiça portanto deve ser a investigação mais completa, mais minuciosa do estado mental do acusado (Viveiros de Castro, 1894/1943, p. 297). Cabia assim ao degenerado passar por tratamento psiquiátrico e psicológico e, se necessário, por recolhimento nos “asilos de alienados”.

Ainda existia no período pouca precisão nas terminologias utilizadas, seja por se tratar de uma temática nova ou pela falta de consenso na comunidade científica. No entanto, terminologias como “inversão sexual” e “homossexualidade” passaram a ser utilizados com mais frequência para se referir às transgressões da heterossexualidade e da dita normalidade psicossexual (e.g. Irajá, 1958/1918; Jaime, 1947/1953; Silva, 1971). A metáfora da inversão ressoava com a concepção binária de sexualidade (masculino e feminino), na qual o degenerado “invertia” a norma sexual (seja anatômica, comportamental ou psicológica), produzindo homossexuais, lésbicas, travestis1 etc. Desse modo, os “invertidos” eram tratados como degenerados, violadores da normalidade, que deviam ser corrigidos terapeuticamente. Caso persistissem com o comportamento desviante (agora como vício), deveriam ser punidos criminalmente como atentadores à ordem pública e ao pudor2.

Esta inter-relação entre interdição, controle e tratamento tornaram a temática das inversões sexuais um domínio da Medicina Legal ao longo da primeira metade do século XX. Apesar das práticas homoeróticas não poderem ser enquadradas em si como crimes, a estigmatização de seus praticantes os empurravam para espaços públicos inseguros, por ser o lugar onde as interações sexuais poderiam ocorrer em anonimato. Desse modo, esses sujeitos eram vítimas fáceis de crimes - ou mesmo recorriam ao crime em meio às condições de vulnerabilidade - e tais espaços eram frequentemente vasculhados pela polícia sob justificativa de combate ao atentado ao pudor, amplificando a marginalização.

Esta associação entre crime e homossexualidade fortalecia a imagem social do degenerado que precisava ser estudado em sua gênese, como forma de prevenção, e contido criminalmente quando atentasse à ordem pública. Como descrito por Jorge Jaime (1947/1953), em sua tese médico-legal Homossexualismo masculino:

O pederasta é um criminoso consumado. Atenta contra a moral pública nos cinemas, rouba nas casas comerciais, assassina nos quartos fechados e usa de meios secretos para perpetrar injúria, difamação e calúnia. A imprensa diária constantemente assinala homicídios em que homossexuais passivos morrem estrangulados nas mãos dos homens que lhes extorquem dinheiro, e rapazes são esfaqueados por sodomitas ciumentos (p. 25).

Isto é, na concepção do autor, são sujeitos psicologicamente inclinados à criminalidade. O estudo de Jaime é único por possuir um apêndice com diversas cartas de amor e amizade escritas por e trocadas entre “pederastas”. No entendimento do autor, tais cartas possibilitariam o estudo do “psiquismo” e da “mentalidade” desses sujeitos a partir da análise de suas vidas e narrativas. Ao longo do livro, Jaime inclusive destacou um ponto para discutir as “causas psíquicas do homossexualismo”, recorrendo, de modo semelhante a outros trabalhos médico-legais, à teoria psicanalítica e às explicações de Freud sobre a natureza da inversão sexual.

A Psicanálise teve significativa influência nas primeiras pesquisas sobre sexualidade no Brasil, moldando os primórdios da Sexologia enquanto ciência e prática profissional (Russo & Carrara, 2002; Russo et al., 2011). O médico e sexólogo pioneiro Hernani de Irajá escreveu diversos livros sobre os desvios sexuais, alguns bastante populares e de grande circulação (Ezabella, 2010, 2021). De acordo com Alessandro Ezabella (2010), o seu trabalho mais conhecido, a obra Psicoses do amor, chegou a ganhar 15 edições de 1918 a 1969. Em seu capítulo sobre a homossexualidade, a partir de uma descrição psicológica, Irajá (1918/1958) apresentou que “a anomalia psico-sexual, modificadora do instituto natural, que deixa o indivíduo como que insensível aos encantos do sexo oposto e que o arrasta francamente ao sexo a que pertence, denomina-se inversão sexual” (p. 186).

Outro pioneiro no campo da Sexologia, o psicanalista Gastão Pereira da Silva relatou que, em suas décadas de atuação profissional (ao menos desde os anos de 1930), recebeu milhares de cartas de pacientes que o confidenciaram sobre suas tendências homossexuais (Silva, 1971). O autor reconheceu que o “problema da homossexualidade” permanecia sem solução e que ainda não existiam terapias eficaz de reversão. A despeito disso, em sua visão, o “que existe em realidade é que há homossexuais que se rebelam contra a cura e os que desejam livrar-se da inversão” (Silva, 1971, p. 81), e que muitos vão para a análise apenas por pressões sociais e familiares, quando deveria haver um “desejo sincero de alcançar a cura” (p. 84). Como conhecido na literatura contemporânea, muitos desses invertidos “rebeldes” ou “não empenhados na cura” foram confinados em hospícios e passaram por tratamentos psicológicos e psiquiátricos mais agressivos - como terapias de aversão, medicalização e eletrochoque (Green, 2019) - mesmo sem resultados comprovados.

A institucionalização da Psicologia e a emergência do “mundo homossexual”

O período de meados do século XX foi perpassado pela consolidação da Psicologia como um campo científico e profissional autônomo no Brasil, momento em que ocorreu a criação dos primeiros cursos e a fundação das primeiras associações e revistas científicas da área (Jacó-Vilela, 2011; Lisboa & Barbosa, 2009). Como apresentado no tópico anterior, iniciativas em Psicologia já existiam no país desde o final do século XIX, impulsionadas sobretudo por médicos psiquiatras e também por educadores interessados no estudo dos processos psicopedagógicos (Soares, 1979). Tais iniciativas se converteram, nesse período, em um movimento crescente de institucionalização acadêmica e profissional, fortalecendo o reconhecimento da Psicologia no cenário nacional.

O Brasil passava por um acelerado processo de industrialização e urbanização, que vinha produzindo mudanças significativas em sua estrutura demográfica e socioeconômica (Bortolozzi, 2021; Green, 2019). Enquanto uma ciência especializada no reajustamento psíquico e comportamental, a Psicologia começou a ganhar destaque e influência no projeto nacional de desenvolvimento. Instituída pelo Estado Novo, em 1944, a Fundação Getúlio Vargas criou o Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP), em 1947, com o objetivo de “contribuir para o ajustamento entre o trabalhador e o trabalho, mediante o estudo científico das aptidões e vocações do primeiro e dos requisitos psicofisiológicos do segundo” (Instituto de Seleção e Orientação Profissional, 1949, p. 7). O ISOP se tornou um dos primeiros e principais centros de promoção do ensino e da prática em Psicologia no Brasil. Pouco depois, em 1949, o instituto criou uma das primeiras revistas brasileiras do campo: a Arquivos Brasileiros de Psicotécnica.

Outra iniciativa de destaque foi a criação da Sociedade de Psicologia de São Paulo (SPSP), em 1945, por professoras(es) da Universidade de São Paulo (USP) que depois atuariam na criação de um dos primeiros cursos de graduação em Psicologia no Brasil. Em 1949, de forma pioneira, a SPSP criou o periódico Boletim de Psicologia como seu órgão oficial de divulgação científica. Estas duas iniciativas - a Arquivos e o Boletim - contribuíram significativamente para a consolidação científica da Psicologia no Brasil e se tornaram representativas do que existia de mais avançado na época, abarcando diferentes subáreas e temáticas. Gradualmente, ao longo da década de 1950, outras revistas e centros de formação foram criados em diversas localidades do país. Em meio a este processo de expansão, posteriormente, em 1962, o Estado brasileiro regulamentaria o ensino e a prática profissional em Psicologia através da promulgação da Lei nº 4.119/19623.

Neste mesmo período, ocorreram também transformações na sociedade brasileira vinculadas à moral e aos costumes, com o florescimento de novas subculturas sexuais e de novos espaços de sociabilidade homoerótica (Bortolozzi, 2021; Figari, 2017; Green, 2019; Trevisan, 2018). Os anos pós-Segunda Guerra e pós-Estado Novo foram marcados por momentos de prosperidade econômica e por processos de democratização e liberalização que influenciaram a vida cultural do país (Green, 2019). Associadas ao Nazismo, as ideias higienistas e eugênicas perdiam força no meio acadêmico e logo a Medicina Legal seria substituída pela Sexologia como saber dominante no campo dos desvios sexuais.

As grandes metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, presenciaram nas décadas de 1950 e 1960 uma emergência do “mundo homossexual” (Hooker, 1965): locais de encontro, praias, bares, festas, concursos de beleza, jornais e revistas, grupos de amizade, clubes de leitura etc. Espaços de sociabilidade onde homossexuais e travestis4 se encontravam, compartilhavam experiências e se apoiavam mutuamente. Influenciados pelos movimentos existentes na Europa e na América do Norte, grupos de homossexuais começaram a falar sobre si e sobre suas vidas, demarcando uma identidade coletiva e abrindo espaços para a defesa de sua normalidade. Identidades e demandas que foram duramente perseguidas após o recrudescimento da Ditadura Militar com o AI-5, em 1968 (Cowan, 2016; Green, 2019).

Tais transformações sociais e culturais não passaram despercebidas pela nascente Psicologia brasileira. De 1949 a 1972, as revistas Arquivos Brasileiros de Psicotécnica e Boletim de Psicologia publicaram 17 artigos sobre a temática da homossexualidade (2 na Arquivos e 15 na Boletim). Apesar de não se tratar de um número surpreendente de artigos, tais documentos evidenciam que parte do mainstream da Psicologia brasileira era atuante na questão, trabalhando na proposição de técnicas terapêuticas de tratamento, prevenção e cura da homossexualidade.

Publicados na Arquivos, dois artigos oriundos de estudos de caso - “Estudo da homossexualidade mediante o teste de Rorschach”, de Isabel Adrados (1964), e “Um caso de homossexualismo psíquico”, de Athayde Ribeiro da Silva (1967) - trouxeram importantes elementos para a compreensão destas técnicas psicoterapêuticas. Adrados (1964), uma reconhecida especialista do uso do Rorschach, discutiu sobre como este teste psicológico poderia ser utilizado para detectar a homossexualidade, mesmo em seu estado latente e não consumado. De modo bastante enfático, a autora apresentou que:

Quando submetidos [homossexuais substitutivos, não verdadeiros] a um tratamento psicoterápico competente e convenientemente orientados podem regredir e enquadrar sua conduta dentro da normalidade. Mais complexos e difíceis de tratar, na maior parte das vêzes incuráveis, são os casos de homossexualidade verdadeira ou neurose sexual. Êstes indivíduos não se limitam a evitar qualquer ligação amorosa ou sexual com o sexo oposto, mas não aceitam a própria identidade biológica sexual, de tal forma que sentem e atuam como se fôssem do outro sexo. As mulheres adotam um papel ativo, e os homens, passivo. Aqui teremos de lidar com uma verdadeira inversão psicológica. A conduta destas criaturas tem um caráter compulsivo porque obedece a uma necessidade emocional imperativa, profunda e potente (p. 68).

Já Athayde Ribeiro (1967), um dos pioneiros da Psicologia do Esporte, trouxe um estudo de caso clínico de um jovem de 23 anos, de classe média, que chegou ao Centro de Psicologia Aplicada do ISOP em busca de atendimento psicológico devido a suas tendências homossexuais, ainda não consumadas. O paciente foi acompanhado por aproximadamente 2 anos, sob “tratamento de base analítica”, e havia iniciado psicoterapia de grupo, onde conheceu uma mulher que tinha o mesmo problema, facilitando a sua integração. Ao fim, foi relatado que ele havia mudado de atitude, era agora desinibido e falava abertamente “de seus sentimentos íntimos e de sua luta consigo mesmo” (Silva, 1967, p. 93).

Existiram também exemplos de técnicas psicológicas para além dos testes e do tratamento psicanalítico. Como no caso do artigo “Terapia comportamental e homossexualismo”, escrito por Geraldina Porto Witter (1972), que defendeu o uso combinado de técnicas aversivas de extinção dos comportamentos inadequados e técnicas de reforço das respostas heterossexuais para o tratamento da “homossexualidade” e do “travestismo”. E do artigo “Prevenção da homossexualidade masculina”, de Ryad Simon (1972), que aplicou um modelo epidemiológico preventivo para teorizar sobre métodos de controle da homossexualidade, considerada uma doença mental.

Enquanto que grupos de homossexuais e travestis se auto-organizavam e fortaleciam uma cena cultural própria (com peças, bailes, performances artísticas, escritos etc.), reivindicando espaços na vida pública brasileira, psicólogas(os) de São Paulo se mobilizavam para pensar em soluções para o crescente problema das psicopatologias sexuais. Em novembro de 1971, a Sociedade de Psicologia de São Paulo (1972) realizou um “Ciclo de Debates sobre o Homossexualismo”, dividido em três dias de debates e 14 exposições de “eminentes especialistas”5. Como verificável no dossiê resultante deste evento - publicado no ano seguinte, na edição nº 63 do Boletim - foram discutidas as melhores técnicas psicológicas de prevenção e cura da homossexualidade. Naquele mesmo ano de 1971, com o recrudescimento do regime militar, os tradicionais bailes de homossexuais e travestis haviam sido proibidos no carnaval do Rio de Janeiro (Green, 2019), para citar apenas um exemplo do clima de censura e repressão aos grupos considerados desviantes ou subversivos (Cowan, 2016).

As lutas sexuais e as mudanças éticas e epistemológicas na Psicologia brasileira

A despeito da intensa repressão do início dos anos de 1970, esta década é descrita como um momento de grande avanço para a auto-organização cultural e política de gays, lésbicas e travestis no Brasil (Bortolozzi, 2021; Green, 2019; Simões & Facchini, 2009). Este avanço esteve conectado às transformações ocorridas no cenário internacional, com a emergência dos movimentos de contracultura na Europa e na América do Norte, sobretudo após 1968, que passaram a questionar radicalmente a tradição, a moralidade e as normas sexuais vigentes até então (Belmonte, 2009). Aliados às mobilizações da contracultura, movimentos de libertação homossexual surgiram em diversas localidades, demandando o fim da perseguição social e política das minorias sexuais.

A partir da pressão de tais movimentos e do desenvolvimento de novas pesquisas científicas, em uma decisão pioneira, a American Psychiatric Association votou pela remoção da homossexualidade de sua lista de transtornos mentais em 1973. Ação seguida pela American Psychological Association dois anos depois, com a aprovação de uma resolução que impeliu “todas/os profissionais de saúde mental a tomar a liderança na remoção do estigma de doença mental que há tempos vem sendo associado às orientações homossexuais” (Conger, 1975, p. 633). Gradualmente, foram desenvolvidas novas abordagens psicológicas que romperam com o passado patologizante das sexualidades antes desviantes. Mesmo que de modo ainda minoritário e incipiente, os próprios saberes da Psicologia começaram a ser utilizados em uma perspectiva de promoção de direitos humanos, bem-estar e saúde, independentemente da orientação sexual (Clarke et al., 2010).

No Brasil, o momento de perseguição política que marcou o início da década de 1970 dificultou o surgimento de movimentos de reivindicação por direitos para homossexuais. No entanto, as ações no campo cultural se tornaram cada vez mais visíveis e se multiplicaram em todo o país (Bortolozzi, 2021; Green, 2019; Trevisan, 2018). Como exemplos, temos o sucesso do grupo Dzi Croquettes, fundado em 1972, que trouxe aos palcos dos teatros brasileiros performances de contracultura sexual; e a grande recepção (de crítica e público) dada ao álbum de estreia do Secos & Molhados em 1973-1974, marcado pela estética andrógina de Ney Matogrosso. Isto é, o mundo homossexual que emergiu nas décadas anteriores continuava a se expandir na vida pública brasileira, resistindo à investidas normalizadoras das instituições acadêmicas (médicas e psicológicas) e à repressão do regime militar.

Ao final desta década, com a emergência das lutas por democracia e do processo gradual de abertura política, surgiram as primeiras organizações políticas de homossexuais no Brasil (Green, 2019; Figari, 2007; Simões & Facchini, 2009). O ano de 1978 é definido como o ano de fundação do movimento homossexual brasileiro, por ser o ano de lançamento do jornal Lampião da Esquina, no Rio de Janeiro, e de criação do Grupo de Afirmação Homossexual - Somos, em São Paulo. Em meio ao momento histórico de crescente mobilização social, estes movimentos deslocaram o debate da sexualidade para o campo da política, reivindicando o fim da repressão sexual e a luta por direitos.

As mobilizações pela redemocratização também influenciaram os rumos da Psicologia brasileira, que se abriu às demandas do sindicalismo por transformações no mundo do trabalho e dos movimentos sociais pelo fim das opressões (com destaque para os movimentos negro, feminista e ecológico, para além do homossexual). Este processo de politização ocorreu principalmente por meio das entidades de Psicologia, que atuaram como espaços de mobilização (Hur, 2009, 2012). Também ocorreu um processo de crise ética e epistemológica nas produções acadêmicas, com o questionamento sobre qual o lugar das pesquisas psicológicas em um contexto de desigualdades sociais (Prado & Machado, 2021). Iniciou-se assim um debate sobre o compromisso da Psicologia com a transformação da realidade social, protagonizado sobretudo por novas abordagens marxistas e construcionistas.

Estas mudanças na Psicologia ocorreram nos mais diversos níveis, principalmente por meio da atuação orgânica das novas gerações que lutavam por transformações nos antigos paradigmas do campo. Na edição nº 14, de julho de 1979, o jornal Lampião publicou um texto sobre a participação de integrantes dos grupos Somos e Eros em um debate na Faculdade de Psicologia de Itatiba (SP) sobre a homossexualidade. O debate foi organizado por um grupo de estudantes que estava insatisfeito com a ementa da disciplina de Psicopatologia Clínica, que intitulava a homossexualidade de doença. Tais estudantes entraram em contato primeiro com um grupo feminista, que as(os) indicou para o Lampião, para assim chegarem nos movimentos de homossexuais. Como relatado no texto escrito pelo Grupo Somos (1979):

Todos estavam muito curiosos e a advertência inicial [que se retirariam caso o debate girasse em torno da homossexualidade como patologia] tinha perdido completamente o sentido. As primeiras perguntas foram sobre as nossas opiniões a respeito de “causas” e “curas”. Porém, deixamos claro que nenhum de nós estava disposto a tratar de tais temas. Para nós, a homossexualidade é um dado normal e o nosso objetivo básico é a luta pelo direito à nossa sexualidade (p. 2).

Naquele mesmo ano, a revista Rádice, pequeno periódico carioca de Psicologia e contracultura em circulação desde 1976, publicava suas primeiras matérias sobre a homossexualidade (Belmonte, 2009). A Rádice representava um movimento vanguardista de contestação na Psicologia (Santos & Jacó-Vilela, 2005) - uma contraciência, nas palavras de Pilar Belmonte (2009) - atuando na luta contra todo tipo de opressão e na discussão de novas abordagens críticas de prática clínica, com a esquizoanálise. Em quatro matérias diferentes, em 1979, a revista publicou depoimentos e entrevistas com homossexuais, que relataram suas vidas, suas tentativas fracassadas de “cura” promovidas por psicólogos e psiquiatras, seus processos de aceitação e os questionamentos em relação à normalidade (Belmonte, 2009).

As demandas dos movimentos homossexuais também passaram a ressoar no mainstream das discussões acadêmicas da Psicologia brasileira. Em 1981, no III Encontro Nacional de Psicólogos, sediado no Rio de Janeiro, foi realizada uma mesa redonda intitulada “O espaço do homossexualismo na psicologia contemporânea”, que abordou a temática a partir de uma perspectiva de questionamento de sua patologização, apesar dos titubeios em apresentar isso abertamente e da permanência do debate sobre as causas da homossexualidade. Coordenada pela psicóloga social Monique Augras, a mesa contou com a participação do psicólogo e sexólogo Araguari Chalar da Silva, do psicólogo clínico João Alberto Vizeu e da então mestranda Leila Dupret, que realizava uma pesquisa sobre homossexualidade feminina (Augras et al., 1982). Passados 10 anos desde a realização do “Ciclo de Debates sobre o Homossexualismo” em São Paulo, era notável a mudança de postura da Psicologia em relação à temática.

Na década de 1980, psicólogas(os) mobilizados(as) em torno de novas pesquisas sexológicas (como Araguari Silva) tiveram um papel fundamental na afirmação da normalidade da orientação homossexual. Atuante no Centro de Sexologia de Brasília, fundado em 1980 (Russo et al., 2011), Antonio Isidro da Silva aplicou os preceitos da análise do comportamento na promoção do bem-estar e da saúde sexual, inclusive para homossexuais. Em suas palavras, “Não se trata de mudar a orientação sexual mas de fortalecer a já existente dentro de um contexto mais gratificante” (Silva, 1986, p. 191).

No entanto, o caso mais emblemático é o da psicóloga Marta Suplicy, que ficou nacionalmente conhecida por sua participação em um quadro sobre sexualidade, constantemente atacado por grupos conservadores, no programa “TV Mulher”, exibido na Rede Globo de 1980 a 1986. Em seu livro Conversando sobre sexo, Suplicy (1983/1987) tratou a homossexualidade como uma orientação sexual tão normal quanto a heterossexualidade, chegando a falar sobre a noção de homofobia. De 1983 (primeira edição) a 2000, o livro ganhou 21 edições, sendo uma das obras sobre sexualidade mais vendidas do Brasil.

Portanto, é notório como o período entre os anos de 1970 e 1980 foi marcado pelo início de um processo de mudança de paradigma na Psicologia brasileira em relação à homossexualidade. Os eventos destacados neste tópico evidenciam este processo de transformações e o surgimento de ideias e práticas psicológicas desvinculadas do paradigma patologizante - uma novidade deste período histórico em comparação com as décadas anteriores. Logicamente, isso não significa dizer que não existia mais uma intensa repressão social às sexualidades ditas desviantes ou que profissionais da Psicologia haviam abandonado por completo as antigas técnicas de prevenção e cura da homossexualidade. A patologização da homossexualidade foi mantida no Código Internacional de Doenças (CID) até 1990, quando foi publicada a sua décima edição, após mais de dez anos desde a última grande revisão (CID-9, 1978). Nos anos de 1980, tivemos também o surgimento da epidemia de HIV/Aids no Brasil, que afetou significativamente as comunidades e movimentos de homossexuais (Bortolozzi, 2021; Trevisan, 2018), dificultando a luta contra a discriminação e a patologização. Existiam ainda muitas permanências e se tratava de fato de um processo gradual de mudanças, que se desenrolaria ao longo de décadas6.

Se no período anterior as pesquisas psicológicas atuavam unicamente na produção de técnicas de prevenção e cura das “inversões sexuais”, no período subsequente se tornava cada vez mais comum a concepção de que existiam diferentes “orientações sexuais”, sendo a homossexualidade uma das orientações possíveis dentro do espectro da normalidade. Por exemplo, partir da década de 1980, novas produções em Psicologia que propunham técnicas de prevenção e cura da homossexualidade se tornaram escassas - até cessarem por completo nas décadas seguintes. Tais mudanças ocorreram em paralelo ao avanço dos movimentos homossexuais no Brasil, em um contexto de mobilizações pela redemocratização e de intensas discussões éticas na Psicologia. Abriram-se assim espaços para novas perspectivas epistemológicas que posteriormente, da década de 1990 em diante, impactariam significativamente as produções acadêmicas e as instituições da Psicologia brasileira (e.g. Aragusuku & Lara, 2019; Pizzinato et al., 2020; Prado & Machado, 2021; Sposito, 2015).

Considerações finais

Neste artigo, buscou-se construir uma história das intersecções entre Psicologia e sexualidade ditas desviantes no Brasil, de fins do século XX a meados da década de 1980, abarcando desde o surgimento do interesse científico na temática, com a definição das patologias sexuais, ao processo mais recente de despatologização da homossexualidade. Desse modo, foi analisado como a Psicologia se posicionou em relação ao tema ao longo da história, evidenciando as transformações que ocorreram em torno de suas ideias, discursos e práticas. A década de 1980 marcou um momento inicial de mudanças no campo, com o enfraquecimento das antigas abordagens que patologizavam a homossexualidade e a emergência de novas perspectivas que afirmaram a normalidade das orientações não-heterossexuais. Certamente, novas pesquisas sobre esse período poderão aprofundar a compreensão deste processo de mudança de paradigma na Psicologia (ainda em andamento no presente), produzindo reflexões sobre as relações entre sexualidade, ciência e política.

As décadas posteriores, não abordadas neste artigo, são mais conhecidas tanto pelo público em geral quanto pela literatura acadêmica, período em que o debate sobre diversidade sexual e de gênero se consolidou como um campo de ativismo político, uma temática de pesquisa nas Ciências Humanas (dentre elas a Psicologia) e um espaço de produção de políticas públicas no Brasil. Em contrapartida, as ideias, os atores e os eventos narrados aqui ainda são pouco conhecidos nos círculos acadêmicos da Psicologia brasileira, tratando-se um capítulo quase esquecido de sua história.

Adentrar no universo dos arquivos e das fontes primárias fez escancarar a complexidade da pesquisa historiográfica e os cuidados que devem ser tomados contra os anacronismos. Os textos históricos devem ser analisados em seu contexto, e analogias com o presente devem ser feitas com parcimônia. Seguindo tais inflexões, argumentou-se, neste artigo, que as ideias e práticas psicológicas estão intrinsecamente conectadas aos contextos socioculturais e políticos de seu tempo, sendo os movimentos dinâmicos e os conflitos presentes nesses contextos fatores determinantes para a constituição destas ideias e práticas. No caso da história da atuação da Psicologia em relação às sexualidades desviantes da norma, demonstrou-se que as mudanças nos discursos científicos ocorreram em confluência com as mudanças no contexto sociocultural e político brasileiro, que influíram nos processos de definição e normalização da homossexualidade.

A produção de uma história das relações entre Psicologia e sexualidades desviantes no Brasil envolve diversos desafios e, em hipótese alguma, objetivou-se aqui a narração de uma história “total”. As análises presentes neste artigo foram desenvolvidas a partir de um conjunto limitado de fontes primárias disponíveis ao alcance do pesquisador, além de se constituírem como uma narração histórica panorâmica que visa fomentar uma agenda de estudos futuros sobre a temática. De fato, existem diversas lacunas que podem ser preenchidas por novas pesquisas empíricas - como, por exemplo, o descentramento do eixo Rio-São Paulo, o aprofundamento de tópicos específicos (como a questão da transexualidade, determinados períodos ou eventos etc.) e a utilização de dados oriundos da memória oral.

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  • Errata
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    Foi acrescido:
    “Agradecimentos
    Agradeço a Remom Bortolozzi e a Alessandro Ezabella pelas múltiplas conversas sobre história e sexualidade e por seus exemplos inspiradores de preservação da memória por meio da construção de acervos, e a Fábio Ortolano pelas contribuições nos desenvolvimentos iniciais desta pesquisa durante o Curso de Especialização em Psicologia Política da USP. Agradeço também às funcionárias da Biblioteca Dante Moreira Leite da USP pelo suporte dado à condução da pesquisa.”
  • 1
    As categorias “transexualismo” e “travestismo” passaram a ser empregadas também nesse período, porém a literatura majoritariamente se referenciava a elas como um “tipo” de homossexualidade ou inversão - ou mesmo um “pseudo-hemafroditismo”. Algo bastante popularizado pelas teorias psicanalíticas e pela teoria endocrinológica dos estados intersexuais (Marañon, 1930).
  • 2
    Desde a criação do primeiro código penal brasileiro, em 1830, não há referências à criminalização da homossexualidade ou desvios sexuais. No entanto, existiam diversas tipificações criminais vinculadas aos costumes, às condutas e ao pudor público - presentes nos Códigos Penais de 1830, 1890 e 1940 - que eram utilizadas para reprimir qualquer tipo de prática sexual considerada desviante (Trevisan, 2018).
  • 3
    Importante destacar também outros marcos jurídicos, como a regulamentação da Lei nº 4.119, em 1964, e a posterior criação do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais de Psicologia, por meio do Decreto nº 5.766/1971, órgãos responsáveis pela fiscalização da prática profissional no país (Soares, 1979).
  • 4
    A despeito do enfoque dado à categoria homossexualidade neste artigo, optou-se aqui por evidenciar a presença de travestis nestes espaços de sociabilidade (Green, 2019; Trevisan, 2018). Como apontado por Yuri Fraccaroli (2022), é importante problematizar o enquadramento das identidades trans e travesti ao longo da história sob o guarda-chuva das homossexualidades.
  • 5
    De fato, nomes eminentes da Psicologia brasileira, muitos vinculados à Universidade de São Paulo, debateram neste evento. Para além de Geraldina Witter e Ryad Simon, nomes como Odette van Kolck, Theo van Kolck, Aidyl Macedo de Queiroz, Anna Nagelschmidt e Durval Marcondes estiveram presentes.
  • 6
    O próprio Conselho Federal de Psicologia ainda não se pronunciava sobre o assunto e só iria se comprometer enquanto uma instituição reguladora a partir da década de 1990, o que resultou na publicação da Resolução nº 01/1999 que proíbe a patologização da homossexualidade (Aragusuku & Lara, 2019).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    20 Abr 2022
  • Aceito
    04 Nov 2022
  • Corrigido
    08 Mar 2024
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