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Terapia fonoaudiológica de linguagem e teoria das inteligências múltiplas: investigação em prontuários

Resumo:

OBJETIVO:

investigar as evoluções linguísticas de pacientes com alteração de linguagem, com foco sobre a(s) área(s) de interesse acessada(s) na terapia fonoaudiológica, compreendidas a partir da Teoria das Inteligências Múltiplas.

MÉTODOS:

esta pesquisa configura-se como quanti-qualitativa. Foram investigadas 562 evoluções terapêuticas de 41 prontuários de pacientes atendidos no Setor de Linguagem, de um Serviço Fonoaudiológico vinculado a uma universidade federal do Brasil, tendo sido realizados dois tipos de análise dos dados: análise de conteúdo, por meio da organização de categorias de análise para interpretação dos dados e, análise estatística, com aplicação do Teste Qui-quadrado .

RESULTADO:

tanto na análise estatística dos dados, quanto na análise de conteúdo, ficou evidente que, quanto mais as estratégias terapêuticas contemplassem a(s) área(s) de interesse do paciente em terapia, melhor era o seu desempenho na linguagem verbal/inteligência linguística, foco da intervenção fonoaudiológica.

CONCLUSÃO:

ao se acessar outras área(s) de interesse, relacionadas as inteligências múltiplas, pode-se promover um maior desenvolvimento da linguagem verbal/ inteligência linguística dos pacientes que apresentam um déficit ou alteração na mesma.

Descritores:
Terapia da Linguagem; Fonoaudiologia; Inteligência

Abstract:

PURPOSE:

to investigate the linguistic evolutions of patients with language disorders, with a focus on the area (s) (s) of interest accessed (s) in speech therapy, ranging from the Theory of Multiple Intelligences.

METHODS:

this research appears as quantitative and qualitative. The 562 therapeutic developments of 41 records of patients treated at the Department of Language, Speech and Hearing a service linked to a federal university of Brazil were investigated, two types of data analysis were conducted: content analysis through the organization of categories of analysis to data interpretation and, statistical analysis, with application of Chi-square test.

RESULT:

both the statistical analysis of the data, as the content analysis, it became evident that the more therapeutic strategies beheld (s) area (s) of interest of the patient in therapy, it was his best performance in verbal language/intelligence linguistic focus of language intervention.

CONCLUSION:

when accessing other area (s) of interest related to multiple intelligences, can promote further development of verbal language/linguistic intelligence of patients with a deficit or alteration in it.

Keywords:
Language Therapy; Speech, Language and Hearing Sciences; Intelligence

Introdução

A organização das estratégias terapêuticas e os resultados efetivados no atendimento fonoaudiológico podem ser investigados com base em diferentes aspectos e perspectivas. Neste sentido, pensa-se que a Teoria das Inteligências Múltiplas pode configurar-se como um conhecimento que tem muito a agregar à fonoterapia.

A referida teoria explica a complexidade da cognição, apresentando o entendimento de que o potencial intelectual humano diferencia-se em oito tipos de inteligências identificadas. Em cada sujeito, a interação e a manifestação de habilidades, referentes a cada uma delas, mostram-se -se de forma singular 11 Gardner H. O nascimento e a Difusão de um "Meme". In: Gardner H et al. Inteligências Múltiplas ao redor do mundo. 1ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. P. 16-30. 22 Gardner H. Inteligencias múltiples: la teoria em la práctica. 1ª ed. Buenos Aires: Paidós, 2011.. As referidas inteligências: Linguística (linguagem verbal), Lógico-matemática, Espacial, Cinestésico-corporal, Musical, Interpessoal, Intrapessoal e Naturalística.

Apesar das especificidades inerentes a cada um das oito inteligências, essas se inter-relacionam e, por isso, podem interferir no desenvolvimento umas das outras. Esta afirmação tem seu embasamento, dentre outros, no fato de que a complexidade das atividades que o ser humano realiza, na maioria das vezes, exige que sejam mobilizadas e utilizadas habilidades inerentes à mais de uma inteligencia.

A inteligência linguística, entendida aqui como sinônima de linguagem verbal, está prejudicada nos pacientes nos quais investigou-se as evoluções terapêuticas contidas nos seus prontuários de atendimento, manifestando-se como um atraso ou distúrbio de linguagem 33 Zorzi JL. A Intervenção Fonoaudiológica nas Alterações da Linguagem Infantil. 1ª ed. Rio de Janeiro, Revinter, 1999. 55 Giacchini V, Tonial A, Mota HB. Aspectos de linguagem e motricidade oral observados em crianças atendidas em um setor de estimulação precoce. Rev Distúrb Comun. 2013;25(2):253-65.. Esta inteligência caracteriza-se como uma competência intelectual que se materializa na compreensão e produção oral e/ou de leitura e escrita 11 Gardner H. O nascimento e a Difusão de um "Meme". In: Gardner H et al. Inteligências Múltiplas ao redor do mundo. 1ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. P. 16-30. 22 Gardner H. Inteligencias múltiples: la teoria em la práctica. 1ª ed. Buenos Aires: Paidós, 2011. 66 Gardner H. Estruturas da Mente: A Teoria das Inteligências Múltiplas.Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994..

A partir das Inteligencias Múltiplas, pode-se mais facilmente visualizar identificar áreas de interesse e potencialidades individuais. Esta identificação pode auxiliar fonoaudiólogos e outros profissionais, que tomem a referida teoria como uma base teórica que sustente sua clínica, qualificando sua atuação junto às pessoas as quais atendem. Neste sentido, acredita-se que estimulando outras inteligências em terapia, para além da inteligencia linguística, pode-se chegar a um maior desenvolvimento linguístico.

O objetivo desta pesquisa é investigar as evoluções linguísticas de pacientes com alteração de linguagem, com foco sobre as áreas de interesse acessadas na terapia fonoaudiológica, compreendidas a partir da Teoria das Inteligências Múltiplas.

Métodos

A pesquisa, na qual se fez a coleta de dados para a escrita do artigo, foi aprovada em abril de 2013 pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria, sob protocolo no. 14702713.2.0000.5346.

Foram analisadas as evoluções terapêuticas de 41 prontuários de pacientes, que constituíram a amostra desta pesquisa, sendo incluídos todos pacientes atendidos no Setor de Linguagem, de um Serviço de Fonoaudiológico vinculados a mesma IES. Dessa forma, constitui-se como dados deste estudo, todas as evoluções registradas nos prontuários dos pacientes, a cada dia de atendimento realizados pelos acadêmicos no Estágio Supervisionado em Linguagem Oral e Escrita

Quanto aos critérios de inclusão dos prontuários na pesquisa, foram observados os seguintes itens: todos os prontuários de crianças e adolescentes atendidos no Setor de Linguagem, que apresentavam a ficha de acompanhamento e evolução do paciente, com relato dos objetivos, estratégias e resultados de cada sessão. Ao observar estes critérios foram excluídos da pesquisa seis prontuários que não continham a ficha de evolução, também três prontuários relativos à pacientes adultos, com a finalidade de deixar a amostra uniformizada, concentrando a pesquisa no público-alvo crianças e adolescentes em atendimento.

A caracterização dos pacientes dos quais foram analisados a ficha de evolução contida nos prontuários é a seguinte: idade mínima quatro anos (49 meses) e máxima 17 anos (206 meses); 15 do sexo feminino e 17 do sexo masculino. Os prontuários que fizeram parte da amostra, continham as seguintes hipóteses diagnósticas dos pacientes: Distúrbio de Linguagem, Atraso de linguagem, Distúrbio de linguagem fazendo parte de um atraso global do desenvolvimento, Distúrbio de linguagem decorrente de síndromes (a esclarecer ou já esclarecidas), Distúrbio de linguagem associado a transtornos globais do desenvolvimento, Dificuldade de aprendizagem associada ou não a outros fatores, Distúrbio de aprendizagem, Dispraxia verbal ou bucolinguofacial associada ou não a outros fatores e Distúrbio de linguagem oral e escrita 77 Jakubovicz R, Leme MP. Exercícios de linguagem.Rio de Janeiro: Revinter, 2012. 88 Befi-Lopes DM, Nuñes CO, Cáceres AM. Correlação entre vocabulário expressivo e extensão média do enunciado em crianças com alteração específica de linguagem. Rev CEFAC. 2013;15(1):51-7.. É importante ressaltar que o foco deste estudo voltou-se somente à apreciação das evoluções de terapia de uma forma geral, assim a variável patologia não foi explorada nesta pesquisa.

Dois tipos de análise dos dados foram realizados: análise de conteúdo e análise estatística, sendo que a primeira voltou-se à investigação dos dados qualitativos e a segunda dos dados quantitativos. Assim, esta pesquisa configura-se como quanti-qualitativa, de cunho exploratório. Quanto a componente qualitativa do estudo, realizou-se a análise de conteúdo, nesta metodologia elege-se categorias de análise a partir da leitura detalhada e atenta dos dados, que serviram à interpretação dos mesmos99 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.. Ainda, quanto a componente quantitativa, fez-se análise estatística, com o teste apropriado ao tratamento dos elementos quantificáveis.

A pesquisa documental nos prontuários dos pacientes atendidos Estágio Supervisionado em Linguagem Oral e Escrita, resultou em um levantamento de 562 evoluções contidas nas fichas, de todo o período que os pacientes estavam em terapia.

A análise de conteúdo foi realizada à partir de três categorias, selecionadas à partir da leitura e releitura do material, com foco no objetivo do trabalho. Sendo assim, acredita-se ser importante que a escolha destas categorias não seja feita a priori, mas sim selecionadas a partir do estudo aprofundado dos dados coletados 99 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011..

A Figura 1 ilustra o desmembramento do registro das evoluções nas categorias de análise, sendo cada linha a representação de apenas um registro de evolução. Foram escolhidos registros que representam as oito inteligências múltiplas acessadas na terapia de linguagem.

Figura 1:
Exemplos das categorias de análise de conteúdo

A categoria "Estratégia" foi escolhida no intuito de buscar detalhamento nas atividades desenvolvidas em terapia e, com isso, compreender melhor as duas outras categorias. O foco de estudo na categoria "Resultado" esteve na apreciação do desempenho na linguagem verbal e motivação em relação à(s) área(s) de inteligência acessadas em terapia (uma ou mais inteligência(s) múltipla(s)), para além da inteligência linguística. Já a categoria "Recursos utilizados", foi investigada à partir do questionamento se recursos que ultrapassam os materiais que envolvam a inteligência linguística e sua relação com a segunda categoria.Por fim, na última categoria "Inteligencia(s) acessada(s)", foi possível identificar qual(is) inteligencia(s) abordada(s) na(s) atividade(s) desenvolvidas na terapia fonoaudiológica.

A análise de conteúdo também possibilitou aos pesquisadores a identificação das areas de interesse de cada paciente, visualizadas à partir da Teoria das Inteligências Múltiplas. Assim, após a leitura, reflexão e discussão sobre o registros das evoluções, caracterizou-se a(s) referida(s) área(s), bem como a manifestação em relação à esta(s) em cada atendimento. Para conseguir realizar-se a análise estatística fez-se a exploração e transformação dos dados qualitativos em dados quantitativos das evoluções de cada atendimento realizado, por meio da pesquisa nas fichas de evolução dos prontuários.

Após o levantamento e organização das evoluções em tabelas, foram codificados os resultados da terapia e o acesso à(s) area(s) de interesse do paciente em cada evolução, estipulando um número de identificação de cada dado, para se conseguir fazer a análise estatística.

Os resultados registrados pelos terapeutas, foram classificados em quatro categorias, com seus respectivos números: "contemplou totalmente o objetivo de desenvolvimento da linguagem verbal trabalhando com determinada(s) inteligência(s)", número 1; "contemplou parcialmente", número 2; "não contemplou", número 3; e "não foi possível identificar", número 4. A última categoria foi utilizada quando o terapeuta não registrou o resultado da terapia e/ou quando não foram encontrados, no registro, aspectos relativos à linguagem verbal. Ainda,foi codificado o acesso à(s) área(s) de interesse do paciente, com base nas oito inteligencias múltiplas, a saber: "contemplou totalmente a(s) área(s) de interesse(s) do paciente", número 1; "contemplou parcialmente", número 2; "não contemplou", número 3; "não foi possível identificar", número 4.

Nesta pesquisa utilizou-se o programa estatístico BioEstat 5.0, pois entendeu-se que esse era apropriado ao tratamento dos dados. Um profissional estatístico aplicou o Teste Qui-quadrado e realizou a análise de resíduos dos mesmos. A referida análise buscou identificar a existência de correlações com significância estatística entre a contemplação das áreas de interesse dos pacientes nas estratégias terapêuticas entendidas, neste artigo, a partir da Teoria das Inteligências Múltiplas e, as categorias de identificação do resultado.

Resultados

Na investigação das 562 evoluções, com base na análise de conteúdo, pode-se visualizar a trajetória de cada paciente no serviço, e assim, conseguir identificar sua(s) área(s) de interesse a partir do estudo aprofundado e detalhadado das evoluções contidas nos 41 prontuários pesquisados.

O estudo por meio das categorias "Estratégia", "Resultado", "Recursos utilizados" e "Inteligências Acessadas", levou ao resultado da importância da terapia fonoaudiológica de linguagem efetivar-se por meio de recursos diferenciados e estratégias que não limitam-se somente à oralidade e/ou escrita e/ou leitura. Ao retomar o exemplo da leitura e execução da receita, apresentada na Figura 1, pode-se visualizar no registro o quão a atividade de leitura, que corresponde à uma das capacidades da linguagem verbal/inteligência linguística, tornou-se mais atraente e de certa forma, fácil, contribuindo para um melhor desempenho do paciente.

Ao acessar a(s) área(s) de interesse do paciente, tira-se o foco da habilidade verbal que está deficitária, e ressalta-se outras, que possivelmente, são mais desenvolvidas, uma vez que ele busca fazer atividades que envolvam essa(s). Logo, propiciam que, na maioria das vezes, mais prontamente o paciente consiga realizar atividades, que contemplem os objetivos propostos no planejamento terapêutico e no plano de sessão, que estão voltados à linguagem verbal/inteligência linguística.

São exemplos de registros que ilustram a afirmação acima:

"Brincadeira de amarelinha [...] brincadeira com massinha de modelar [...] C. demonstrou coordenação [...] c. gostou da brincadeira, fazendo formas de bichos e dizendo que daria presenta para a Fono ";

"[...] a casinha de bonecas, mais animais de estimação e utensílios de cozinha [...] estimular a linguagem e a necessidade da paciente de dormir em quarto separado [...] Paciente vocalizou bastante durante a interação [...] além disso continuou a produção das onomatopéias, [...] comportamento mais calmo do que nas outras."

"Atividade no computador, A. procurou outra receita de bolo [...] A. escreveu a receita [...] demonstrou-se empolgada com a possibilidade de cozinhar novamente".

"Interação com posto de gasolina e carros [...] M. mostrou-se comunicativo e faceiro [...] começou a espelhar verbos e está mantendo a concentração por um período maior"

É válido ressaltar que, nem sempre quando o terapeuta, acessava em terapia a(s) área(s) de interesse do paciente, seu desempenho na linguagem verbal/inteligência linguística era bom. Porém, os registros deste tipo de ocorrência foram raros, em torno de 50 evoluções, e, ainda, na maioria das vezes este desempenho prejudicado estava relacionado com algum fator externo à terapia. Segue um excerto de resultado que exemplifica tal situação, na qual se trabalhou com a área de interesse do paciente, observada em 15 registros de evoluções, sendo esta música, contemplando a inteligência musical: "Estava agitado derrubou cadeiras, jogou brinquedos na terapeuta e também cuspiu. Acalmou-se somente com as bolinhas de sabão".

O comportamento do paciente demonstra que possivelmente questões extraterapia estavam intervindo no seu desempenho. Em outro exemplo de paciente, o terapeuta ressalta estes fatores extraterapia, inclusive registrando apenas este resultado: "Foi trabalhado o vídeo do Barney e pintura de desenhos O paciente estava sonolento, foi dormir tarde." Assim, apesar de ambos terapeutas terem organizado a terapia à partir do acesso à área de interesse do paciente, não se conseguiu realizar um trabalho efetivo.

A análise estatística foi realizada observando o valor de 1.96 para considerar o resultado como com significância estatística, como destacado na Tabela 1, ainda, o p valor considerado foi < 0,001. Verificou-se nesta análise, a associação com significância estatística, entre os itens "contemplou totalmente"; "contemplou parcialmente"; "não contemplou"; e "não foi possível identificar" o desenvolvimento da inteligência linguística com os itens "contemplou totalmente"; "contemplou parcialmente"; e "não foi possível identificar" a(s) área(s) de interesse(s) do paciente, respectivamente.

Tabela 1:
Análise de resíduos do teste qui-quadrado. Resultado do teste estatístico

A referida tabela mostra que o grau de desempenho na linguagem verbal/inteligência linguística é correspondente nas categorias analisadas. Em outras palavras, quando a estratégia terapêutica "contemplou totalmente a(s) área(s) de interesse(s) do paciente" foi estatisticamente significante o resultado "contemplou totalmente o desenvolvimento da inteligência linguística". Esta correspondência repetiu-se nos demais itens.

A partir da análise estatística dos dados, pode-se fazer a seguinte inferência: que quando mais área(s) de interesse do paciente for(em) contemplada(s) nas estratégias terapêuticas, a sessão fonoaudiológica tem maiores oportunidades de apresentar efetividade no seu objetivo que é um melhor desempenho na linguagem verbal/inteligência linguistica.

Tanto na análise estatística dos dados, quanto na análise de conteúdo, ficou evidente que, quanto mais as estratégias terapêuticas contemplassem a(s) área(s) de interesse do paciente em terapia, melhor era o seu desempenho na linguagem verbal/inteligência linguística, foco da intervenção fonoaudiológica. Logo, em ambas as análises foram encontrados os mesmos resultados, o que confere maior credibilidade à pesquisa.

Discussão

A terapia fonoadiológica, nos diferentes campos nos quais intervem, observa objetivos gerais e específicos que orientam as estratégias terapêuticas a serem desenvolvidas. Esses, são voltados à qualificação das habilidades comunicativas orais ou escrita.

As avaliações mostram qual(is) níveis linguísticos devem ser mais enfocados na terapia, e aí dá-se o início da sistematização do planejamento terapêutico, dos planos de sessões e, por fim, das estratégias terapêuticas.

Porém, o último item, que corresponde a(s) atividade(s) propostas para a terapia, ao se pensar nos resultados encontrados nesta pesquisa, devem contemplar outras capacidades/habilidades além da linguagem verbal/inteligência linguistica. Assim, mais do que a sistematização de objetivos que contemplem as necessidades dos pacientes, outros fatores precisam ser considerados para que a terapia fonoaudiológica em linguagem possa ter maior efetividade.

Dentre esses aspectos, destaca-se o acesso à(s) área(s) de interesse do paciente 1010 Cogo-Moreira H, Andriolo RB, Yazigi L, Ploubidis GB, Brando de Vila CR, Mari JJ .Music education for improving reading skills in children and adolescents with dyslexia. Cochrane Database of Systematic Reviews. 2012;15(8):1-24. 1111 Barnes J. Drama to promote social and personal well-being in six- and seven-year-olds with communication difficulties: the Speech Bubbles project. Perspectives in Public Health. 2014;134(2):101-9.. Entende-se que essas podem ser mais facilmente compreendidas e visualizadas à partir das inteligências múltiplas.

Esta forma de condução da terapia pode ser feita, por meio, de uma mediação qualificada, que proporciona ao paciente atividades com recursos e estratégias diferenciados. Esses podem contemplar, à partir das sua(s) área(s) de interesse, outros tipos de inteligência, além da inteligência linguística, foco da terapia.

É válido ressaltar que a singularidade da interação de cada paciente que vai auxiliar o terapeuta no direcionamento das estratégias terapêuticas, que acabam por qualificar os resultados obtidos na terapia11 Gardner H. O nascimento e a Difusão de um "Meme". In: Gardner H et al. Inteligências Múltiplas ao redor do mundo. 1ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. P. 16-30. 22 Gardner H. Inteligencias múltiples: la teoria em la práctica. 1ª ed. Buenos Aires: Paidós, 2011. 66 Gardner H. Estruturas da Mente: A Teoria das Inteligências Múltiplas.Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.. O estudo e preparação da terapia com base na Teoria das Inteligencias Múltiplas, proporciona ao terapeuta além daquelas atividades que já são desenvolvidas, e que contemplam área(s) de interesse do paciente, a oportunidade de conhecer uma ampla gama de atividades que contemplam a mesma inteligência.

Então, o referido estudo oportuniza ao fonoaudiólogo a ampliação das possibilidades de alternativas de estratégias terapêuticas, facilitando a sua atuação. Ao mesmo tempo, o profissional fonoaudiólogo pode contemplar tanto os interessese e possíveis potencialidades dos pacientes, quanto a sua área de dificuldade, motivadora da terapia fonoaudilógica, que é o déficit na linguagem verbal/inteligência linguística.

Por exemplo, a inteligência naturalística, envolve tanto as questões de aproximação com a natureza, seja a partir de um trabalho com ou sobre animais ou plantas, como também, a questão da sensibilidade dos sentidos, por exemplo, o paladar, onde busca-se também o reconhecimento e aplicação de elementos para a obtenção do êxito na atividade desenvolvida. A própria inteligência naturalística ainda proporcionaria ao terapeuta uma série de outras ideias de trabalho, além das demais, que por meio da busca por investigações neste campo e o estudos das mesmas, pode-se se ter o embasamento visado 11 Gardner H. O nascimento e a Difusão de um "Meme". In: Gardner H et al. Inteligências Múltiplas ao redor do mundo. 1ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. P. 16-30. 1212 Armstrong T. As inteligências múltiplas na sala de aula. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001..

Em uma pesquisa desenvolvida na área da Fonoaudilogia, com crianças com implante coclear, foi asseverada a necessidade de se investigar e avaliar as múltiplas áreas de inteligência e, pontos fortes e fracos do desenvolvimento das crianças, nos diferentes espaços que frequenta, dentre estes, a terapia fonoaudiológica e a escola 1313 Sahli S, Laszig R, Aschendorff A, Kroeger S, Wesarg T, Belgin E. Comparison of learning preferences of Turkish children who had been applied cochlear implantation in Turkey and Germany according to theory of multiple intelligence. Int. J. Pediatr. Otorhinolaryngol. 2011;75(12):1576-84..

A investigação em outros campos do conhecimento, que não da saúde, tão pouco da Fonoaudiologia, tem envolvido-se com a aplicação da Teoria das Inteligencias Múltiplas como um qualificador das práticas que desenvolvem. Destaca-se estudos no campo da educação geral e ensino de línguas estrangeiras.

Assim, tem-se que a abordagem das diferentes inteligências múltiplas em atividades com crianças pré-escolares, é um excelente meio de promoção desenvolvimento cognitivo 1414 Abdulkader FA, Gundogdu K, Eissa MA. The effectiveness of a multiple intelligences-based program on improving certain reading skills in 5th-year primary learning disabled students. Electronic Journal of Research in Educational Psychology. 2009;7(3):673-90. 1515 Delgoshaei Y, Delavari N. Applying multiple-intelligence approach to education and analyzing its impact on cognitive development of pre-school children. Procedia - Social and Behavioral Sciences. 2012;32:361-6.. Da mesma forma, vários autores acreditam que a aprendizagem de línguas estrangeiras com metodologias que contemplam exclusivamente a inteligência linguística, não garante a efetividade e significação da mesma 1616 Glick BG, Armstrong J, Marchese M. Evidence of Multiple Intelligences in FLES Classrooms. Learning Languages. 2010;15(2):31-5. 1818 Azizullah M, Masoud RD, Najmeh H. Educational Psychology: An International Journal of Experimental Educational PsychologyExploring the relationship between reading strategy use and multiple intelligences among successful L2 readers. Intelligence. 2013;41(5):735-7..

Outros trabalhos abordam a importância de reconhecer os estilos cognitivos diferenciados de cada pessoa para, possivelmente, se qualificar o processo de ensino/aprendizagem 1212 Armstrong T. As inteligências múltiplas na sala de aula. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001. 1919 Chagas JF, Fleith DS. Habilidades, características pessoais, interesses e estilos de aprendizagem de adolescentes talentosos Revista de Psicologia da USF. 2010; 15(1):93-102. 2222 Tutwiler S, Lin M, Chang C. The use of a gesture-based system for teaching multiple intelligences: A pilot study. British Journal of Educational Technology. 2013;44(5):133-8.. Novamente, outro estudo que aponta o uso do reconhecimento das inteligências múltiplas como facilitador do desenvolvimento global 2323 Kail RV. Developmental analyses of individual differences in intelligence: Comments on Demetriou, Spanoudis, Shayer, Mouyi, Kazi, and Platsidou. Intelligence. 2013;41:735-7..

Em muitos registros de evoluções, estava implícito que a terapeuta procurou buscar contemplar, nas estratégias, áreas de interesse e diferentes inteligências múltiplas do paciente. Porém, em nenhum registro foi encontrada sistematicidade e clareza desta contemplação. Este dado afirma a relevância do desenvolvimento de pesquisas que abordem as possibilidades de atuação na terapia fonoaudiológica que possam estar embasadas na Teoria das Inteligencias Múltiplas.

Uma vez que a Teoria das Inteligencias Múltiplas não traz o detalhamento do desenvolvimento individual de cada uma das oito inteligências, pode-se pensar para investigações mais aprofundadas na aproximação entre a referida teoria e teoria(s) de linguagem que assumem diferentes bases epistemológicas, trazendo um enriquecimento tanto ao conhecimento científico, quanto as possíveis aplicações clínicas do mesmo. Uma das discussões possíveis e que merece maior aprofundamento investigativo é a aproximação das Teorias Conexionistas da Linguagem.

Este entendimento advêm do fato de que o conexionismo, como uma corrente empirista, apresenta outras possibilidades de delineamento da terapia de linguagem e Teoria das Inteligências Múltiplas. O conexionismo pode proporcionar o entendimento entre acesso a diferentes processos cognitivos e aquisição da linguagem 2424 Poersch, JMP. Simulações conexionistas: a inteligência artificial moderna. Linguagem em Discurso. 2004;4(2):441-58. 2626 Finger I. A abordagem conexionista de aquisição da linguagem. In: Quadros RM. Teorias de Aquisição da Linguagem. Santa Catarina: Editora da UFSC. 2008. P. 147-68..

Neste sentido, uma hipótese de pesquisa pode-se configurar sobre o acesso à outras inteligências, a fim de promover a linguagem verbal/inteligência linguística. Assim, com investigações mais aprofundadas, tem-se a oportunidade de averiguar as correlações entre as diferentes inteligências, com foco sobre a sistematização da terapia fonoaudiológica e os resultados da mesma.

Ao contextualizar estas correlações, tem-se que os recursos diferenciados e estratégias que ultrapassam o acesso limitado a vias de aprendizagem pode ser explicado na teoria, quando é abordada inteligência linguística. O autor sugere que quando uma área da inteligência linguística está deficitária, por exemplo, a escrita em códigos alfabéticos, que acessam principalmente a via auditiva para a aprendizagem, podem ser enfatizadas por outras áreas, como a espacial e cinestésico-corporal. Essas duas áreas são mais enfatizadas na aprendizagem de escrita em línguas com códigos ideográficos 66 Gardner H. Estruturas da Mente: A Teoria das Inteligências Múltiplas.Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.. Assim, inicia-se um trabalho por vias que não estão em déficit na criança, que acabam por potencializar o desenvolvimento da sua linguagem verbal/inteligência linguística.

Conclusão

Ao se acessar outras área(s) de interesse, relacionadas as inteligências múltiplas, pode-se promover um maior desenvolvimento da linguagem verbal/ inteligência linguística dos pacientes que apresentam um déficit ou alteração na mesma. Neste movimento terapêutico, tira-se o foco da área específica na qual eles apresentam dificuldade e a estratégia terapêutica passa a ser mediada e estimulada por outras área(s)/inteligência(s), que potencializam o tratamento da área em déficit.

Em outras palavras, altera-se e/ou incrementa-se e/ou a forma e a ênfase da terapia fonoaudiológica de linguagem, no intuito de qualificar o desempenho em linguagem verbal.

É importante destacar que o campo dos estudos foi o estágio curricular em Fonoaudiologia, logo os terapeutas estavam em processo de formação profissional. Acredita-se que a crescente experiência na atuação tende a proporcionar aos Fonoaudiólogos uma qualificação da sensibilidade em visuzualizar a(s) área(s) de interesse. Isso acentua-se mais nos pacientes que não desenvolveram fala, que exige do profissional maior atenção.

Por fim, destaca-se a existência de um desafio que é aproximar esta(s) área(s) com a intervenção em linguagem verbal/inteligência linguística. Por vezes, algumas inteligências e, talvez, os recursos específicos que mobilizam o interesse do paciente, podem ser mais difíceis do que outras para associar com a referida inteligência.

Neste sentido, ao pensar-se na ampla gama de atividades e possibilidades de recursos e atividades dentro de uma mesma inteligência, para se trabalhar com a linguagem verbal/inteligencia linguística, dependendo da área de intesse do paciente, por exemplo, cinestésico-corporal, pode-se ter desde uma estratégia simples como a brincadeira com massa de modelar, até trabalho de elaboração de circuitos com diversas atividades motoras. Logo, diferentes estratégias terapêuticas, trazem diferentes exigências e dificuldades ao trabalho do fonoaudiólogo.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2015

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2014
  • Aceito
    26 Mar 2015
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