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NARRATIVAS DE HOMENS TRANS: UMA ANÁLISE DISCURSIVA NO FACEBOOK

Narratives of trans men: a discourse analysis on Facebook

RESUMO

Objetivo:

A presente pesquisa analisa o uso de uma mídia social como ferramenta de ativismo para um grupo politicamente situado na margem do cenário político atual do Brasil. O trabalho objetiva revelar como as narrativas de homens trans vêm sendo construídas em postagens do grupo do Facebook Homens trans e simpatizantes”.

Método:

Utiliza o método Análise do Discurso, com abordagem qualitativa.

Resultado:

Identificou-se que as narrativas perpassaram por questões de família, saúde e preconceito. O contexto das narrativas de homens trans continuou o mesmo em relação a estudos anteriores, quando não, piorou em questão de positividade das mensagens, o que influi, diretamente, no modo como esses sujeitos são compreendidos e atuam em sociedade.

Conclusões:

Conclui-se ressaltando a importância do grupo analisado para o caso dos homens trans e o potencial das mídias sociais no processo de ativismo, como forma de sociabilidade em ambientes informacionais.

PALAVRAS-CHAVE:
Homens trans; Mídias sociais; Facebook; Análise do Discurso

ABSTRACT

Objective:

The study analyses the use of a social network as a tool for activism of a group situated in the margins of the current political scenario of Brazil. It aims to reveal the narratives of trans men on Facebook as constructed within the group Homens trans e simpatizantes” (Trans men and allies).

Methods:

It uses the Discourse Analysis, in order to develop qualitative research.

Results:

It was identified that the narratives involved questions related to family, health, and prejudice. The context of the trans men’s narratives remained the same in relation to the previous studies, when not, it worsened in terms of the positiveness, which directly influences in the way these subjects are understood and act in society.

Conclusions:

It was concluded that social media is important for activism and the socialization of experiences of these subjects in information environments.

KEYWORDS:
Trans men; Social media; Facebook; Discourse Analysis

1 INTRODUÇÃO

As mídias sociais se constituem como um ambiente informacional digital de poder na era das redes. Analisadas desde uma perspectiva foucaultiana (2003), elas se posicionam como o universo do núcleo informacional, pois, possibilitam aos sujeitos informacionais utilizarem seus ambientes como divulgação dos seus interesses e necessidades informacionais. Diante disso, as pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e outras identidades (LGBT+) se apoderam dessas mídias como ambientes de sociabilidade e ativismo, como um espaço de poder e de transformação política. Vale destacar que, nessa pesquisa, optamos por utilizar o acrônimo LGBT+, já que ele é utilizado para se referir às pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais e outras identidades de gênero. Portanto, se aproxima das políticas públicas do estado que representa as orientações, identidades e expressões de gênero (BOITA; BAPTISTA; HABIB; SABARÁ el al, 2022BOITA, T.; BAPTISTA, J. T.; HABIB, I.; SABARÁ, D. Museologia Comunitária LGBT+: Museu Transgênero de História da Arte e Ponto de Memória Aquenda as Indacas no ensino de Museologia. Museologia & Interdisciplinaridade, [S. l.], v. 11, n. 21, p. 18-28, 2022. DOI: 10.26512/museologia.v11i21.41417. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/museologia/article/view/41417. Acesso em: 30 nov. 2022.
https://periodicos.unb.br/index.php/muse...
).

Nesse ínterim, este estudo tem como enfoque os homens trans e as suas narrativas no Facebook, sendo seu objeto de estudo as postagens escritas pelos usuários do grupo do Facebook Homens trans e simpatizantes”. O trabalho se encaixa na linha de outros trabalhos sobre ativismo de homens trans na mídia, como por exemplo o trabalho de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.), que aplica uma observação direta netnográfica, de modo a destacar as mudanças discursivas ocorridas nas narrativas desse público.

Brito (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) indica que as pessoas trans têm uma participação mínima nos conteúdos criados e disponibilizados em ambientes informacionais para a comunidade LGBT+. Aqui, entendem-se ambientes informacionais digitais em sua vasta tipologia, como aplicativos, redes sociais e websites (CAMARGO; VIDOTTI, 2011CAMARGO, L. S. de A. de; VIDOTTI, S. A. B. G. Arquitetura da Informação: uma abordagem prática para o tratamento de conteúdo e interface em ambientes informacionais digitais. Rio de Janeiro: LTC, 2011.). Almeida (2012ALMEIDA, G. Homens trans: novos matizes na aquarela da masculinidade? Estudos Feministas, v. 20, n. 12, p. 513-523, 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2012000200012&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 13 nov. 2019.
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, p. 514) explica que “os homens trans são diferentes entre si, em função dos próprios marcadores sociais de diferenças, como a classe social, a raça/cor, a orientação sexual, a geração, a origem geográfica, entre outras”. Tendo isso em vista, a representação e a participação de homens trans nas atividades cotidianas da sociedade estão enraizadas de preconceitos, esses advindos, até mesmo, por parte da “comunidade gay”. A questão explicitada é enraizada de forma preconceituosa pelo fato dos homens trans possuírem uma (vagina) e, assim, não representarem a ideia da totalidade masculina.

Tendo em vista esse cenário, o objetivo desta pesquisa é delinear o modo como as narrativas de homens trans vêm sendo construídas em suas postagens no grupo do Facebook Homens trans e simpatizantes”. Righeto (2018RIGHETO, G. Competência da Informação de pessoas trans da cidade de Florianópolis. 2018. 353 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2018.) discute que as a narrativas devem considerar as experiências de todos os envolvidos, tanto do narrador quanto ao pesquisador, que interagem nesse processo. Ainda, segundo o autor, o pesquisador (ou o ouvinte) torna-se o próprio ser discursivo, por já ter incorporado a história ouvida como uma experiência adquirida nesse contexto. Nesse ponto de vista, a análise do discurso trará os subsídios metodológicos necessários ao desenvolvimento dos objetivos aqui propostos.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

A internet e a Web sociabilizam as ferramentas de comunicação, tornando possível a comunicação entre as pessoas, a qualquer hora e lugar. As redes sociais se destacam na difusão das informações, do conhecimento, do compartilhamento, da construção coletiva de ideias e da potencialização de movimentos emergidos na sociedade. Consequentemente aponta-se o desenvolvimento de comunidades virtuais. Romeiro (2019ROMEIRO, N. L. Vamos fazer um escândalo: a trajetória da desnaturalização da violência contra a mulher e a folksonomia como ativismo em oposição a violência sexual no Brasil. 2019. 168 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019., p. 100) explica que “em uma mídia social é possível formar mais de uma rede social, mais possibilidades de comunicação, interação, produção de conteúdo, entre outras atividades em um único canal.” A autora ainda destaca o posicionamento que as mídias sociais têm no que diz respeito aos processos de ativismo e sociabilidade e visibilidade político, criando assim, redes que vão além do digital.

As mídias sociais proporcionam aspectos de sociabilidade, apresentando uma ideia de liberdade, enquanto um ativismo social para as pessoas trans. Nesse sentido, entende-se que esses ambientes informacionais digitais: “são espaços de interação, lugares de fala, construídos pelos atores de forma a expressar elementos de sua personalidade ou individualidade” (RECUERO, 2009RECUERO, R. Redes sociais na internet. Porto Alegre, Brasil: Sulina, 2009. Disponível em: http://www.pontomidia.com.br/raquel/arquivos/redessociaisnainternetrecuero.pdf. Acesso em: 01 fev. 2020.
http://www.pontomidia.com.br/raquel/arqu...
, p. 26). Diante disso, torna-se fundamental apresentar dados e informações que representem as pessoas no ciberespaço. Por meio da descrição de perfis pessoais, bem como da aparência de páginas em redes sociais, apontam-se os gostos e as características peculiares de cada indivíduos, tornando possível a comunicação entre os atores na rede. As mídias sociais consolidam-se como um espaço propício para as práticas colaborativas e para o atual contexto comunicacional, onde cada vez mais cria-se uma representatividade e interação, mostram-se culturas e conquista-se fãs tanto virtuais como na realidade, possibilitando, assim, a sociabilidade entre indivíduos (FRANÇA; CARVALHO, 2017FRANÇA, M. N.; CARVALHO, A. M. G. de. Monitoramento de mídias sociais em bibliotecas universitárias públicas federais. Informação & Tecnologia, v. 4, n. 2, p. 260-283, 2017. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/itec/article/view/40199/21049. Acesso em: 15 mar. 2020.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/ite...
). Recuero (2009RECUERO, R. Redes sociais na internet. Porto Alegre, Brasil: Sulina, 2009. Disponível em: http://www.pontomidia.com.br/raquel/arquivos/redessociaisnainternetrecuero.pdf. Acesso em: 01 fev. 2020.
http://www.pontomidia.com.br/raquel/arqu...
, p. 27) assinala que não se trata apenas de uma representação no ciberespaço, e sim de apropriações que “funcionam como uma presença do “eu” no ciberespaço, um espaço privado e, ao mesmo tempo, público. Essa individualização dessa expressão, de alguém “que fala” através desse espaço é que permite que as redes sociais sejam expressas na Internet”.

No entanto, há que se tematizar os limites e os riscos que as mídias sociais podem trazer aos seus usuários, como é o caso do usoinadequado e a exposição de dados pessoais de usuários, os efeitos da desinformação, da atuação dos algoritmos, dos crimes de ódio, das fake news, do cancelamento de pessoas, da clonagem de perfis, do uso de robôs, da criação de “bolhas” de socialidade, os fenômenos de filter bubble ou echo chamber, dentre outros. Tais limites impactam de maneira bastante distinta nos diferentes grupos que nelas se formam e circulam e, portanto, devem ser levados em consideração pelos indivíduos em suas ações.

Na Sociedade da Informação, contexto em que a atual sociedade vivencia, uma grande necessidade de exposição se faz presente no ambiente virtual, como meio de existência no mundo digital, o que proporciona o crescimento da sociabilidade na Web. Na visão de Lazarte (2000LAZARTE, L. Ecologia cognitiva na sociedade da informação. Ciência da Informação, v. 29, n. 2, p. 43-51, 2000. Disponível em: http://revista.ibict.br/ciinf/article/view/886. Acesso em: 15 out. 2019.
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, p. 43), a “Sociedade da Informação é identificada com um mundo em que a informação é a nova mercadoria, esta direção de mudança é inevitável, e sua abrangência é global”. Logo, a Sociedade da Informação tem suas premissas nas tecnologias de informação e comunicação, valorizando o conhecimento e exemplificando-se por meio das mídias sociais e formas de poder. Segundo aponta também Lazarte (2000, p. 51) “As tecnologias e formas de organização e interação social dela derivadas oferecem elementos de grande valia para o ser humano”. Nessa discussão, enquadram-se as mídias sociais, como redes sociais específicas e que tecem discussões efetivas e práticas de sociabilidade na internet. Nesse contexto, o Facebook é uma rede social que estabelece relações entre os usuários, por meio de grupos, páginas, mensagens e outras interações entre os usuários dessa rede.

O Facebook foi criado em 2004 por Mark Zuckerberg e, desde então, se tornou uma das redes sociais mais acessadas por todo o mundo. O processo de interação nessa mídia vai além do simples contato, permitindo relacionamentos em uma sociedade ativa e sociável (FACEBOOK, 2020). Algumas interações, como “postar”, curtir, comentar, compartilhar, seguir, amar, rir, ficar bravo ou decepcionado, são algumas das linguagens criadas e realizadas nas redes sociais existentes atualmente no Facebook. Além dessas linguagens, a folksonomia das hashtags se apresenta ainda mais como um espaço de militância e de tessituras na busca e divulgação da informação. A folksonomia é uma forma de categorizar as informações disponíveis na Web, dada a linguagem representada pelos usuários (SILVA; BLATMAN, 2007SILVA, F. C. C. da; BLATTMANN, U. A colaboração e a interação na web 2.0. Revista ACB, v. 12, n. 2, p. 191-215, 2007. Disponível em: http://www.aulasemparedes.com.br/wp-content/uploads/2014/09/Colaboracao-e-interacao-na-web-2_0.pdf. Acesso em: 10 fev. 2020.
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) e compreende a liberdade do usuário em apresentar os termos de acordo com as suas necessidades e as suas vivências. As tags apresentadas propiciam a materialização dos aspectos cognitivos de uma dada realidade. “A vantagem que tem maior destaque é o cunho colaborativo/social das folksonomias. Os usuários compartilham com outros as suas etiquetas, que podem ser ou não adotadas na classificação de um mesmo recurso por outros” (CATARINO; BAPTISTA, 2009CATARINO, M. E.; BAPTISTA, A. A. Folksonomias: características das etiquetas na descrição de recursos da Web. Informação & Informação, v. 14, n. 1, p. 46-67, 2009., p. 53). O usuário, ao apresentar os termos que lhe convém, possibilita uma navegação aberta, de acordo com as suas necessidades informacionais, além de uma pluralidade linguística. Este é o caso da comunidade LGBT+, que intensifica uma linguagem no contexto dos ambientes informacionais digitais para que os sujeitos LGBT+ venham construir o seu ativismo, bem como a sociabilidade na internet (BRITO, 2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.).

Assim, a internet torna-se um meio essencial de expressão e organização para esses tipos de manifestações, que coincidem numa dada hora e espaço, provocam seu impacto através do mundo da mídia e atuam sobre instituições e organizações (empresas, por exemplo), por meio das repercussões do seu impacto sobre a opinião pública (CASTELLS, 2016CASTELLS, M. Sociedade em rede. 17. ed. São Paulo: Paz & Terra, 2016.). Nesse sentido, o público LGBT+ tem se apropriado das tecnologias em seus ativismos cotidianos como forma de resistências.

Além das mídias sociais, enfoque central deste trabalho, outros ambientes e unidades de informação tem ganhado espaço e força política. À título de exemplo, e que concatena com o objeto da pesquisa, é o Museu Transgenero de História e Arte (MUTHA), um ambiente informacional todo voltado à memória e resistência de pessoas trans. A Museologia LGBT+ constrói memórias e espaços de luta que vão além das suas exposições, como é o caso do Museu da Diversidade Sexual da cidade de São Paulo. O espaço é incorporado com tecnologias digitais de comunicação em seu acervo e em suas formas de divulgação e acesso (LADEIA; CASTRO, 2022LADEIA, M.; CASTRO, T. A Museologia LGBT existe? reconstruindo os passos do movimento LGBT+ junto à museologia brasileira. Museologia & Interdisciplinaridade, [S. l.], v. 11, n. 21, p. 231-248, 2022. DOI: 10.26512/museologia.v11i21.41439. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/museologia/article/view/41439. Acesso em: 22 out. 2022.
https://periodicos.unb.br/index.php/muse...
).

Para se entender melhor a apropriação da informação, com enfoque na transexualidade nas mídias sociais, destacam-se os estudos de gênero e sexualidade, enfatizando-se os homens trans.

Conforme Tedesco (2018TEDESCO, C. de S. “Nós somos complexos”: historiografia Queer na contemporaneidade - uma análise da operação historiográfica no National Museum: LGBT History and Culture. 2018. 85 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Licensiatura em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018. Disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/218454/001123195.pdf?sequence=1. Acesso em: 24 nov. 2022.
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), o termo transexual surgiu na década de 1950, na medicina dos Estados Unidos. Na época, designava as pessoas que sentiam que pertenciam ao sexo oposto. A discussão girava em torno da formação do gênero, relacionando-o com a mente. Considerava-se, assim, um sexo psicológico.

É importante ressaltar que a transexualidade faz parte da literatura psiquiátrica desde o século XIX. Até o início de 2018, o termo transexualismo estava presente na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10), representando um transtorno mental de personalidade e pensamento. Ainda, constava no Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais (PEREIRA; GAUDENZI; BONAN, 2021PEREIRA, P. L. N.; GAUDENZI, P.; BONAN, C. Masculinidades trans em debate: uma revisão de literatura sobre masculinidades trans no Brasil. Saúde e Sociedade, v. 30, n. 3, p. 1-15, 2021. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MxvJdzwBN5bjMYXH6jndRpF/. Acesso em: 24 nov. 2022.
https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MxvJdzw...
). Hoje, embora não sendo considerada mais uma doença mental, as pessoas trans não estão eximidas das formas moralizantes de controle impostas pela sociedade.

Foucault (2012FOUCAULT, M. A história da sexualidade: a vontade de saber. 22. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2012.) discute a construção da sexualidade como uma construção social, ou seja, a percepção de gênero vai além do entendimento de orientação sexual, com a ideia do homem sentir prazer pela mulher ou a mulher pelo homem (heterossexualidade) ou a mulher gostar de outra mulher ou o homem de outro homem (homossexualidade). Essa construção, discutida por Foucault, desconstrói a ideia do biológico e parte para uma vivência de cunho social. As vivências da sexualidade, na atualidade, permitem uma visão mais externalizada, isto é, as pessoas LGBT+, em especial as pessoas trans, utilizam das suas narrativas para uma construção ativista e explicativa de suas abordagens sociais. A sociedade volta-se para questões referentes às diferenças entre a homossexualidade e a heterossexualidade (FOUCAULT, 2012FOUCAULT, M. A história da sexualidade: a vontade de saber. 22. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2012.).

O preconceito, muitas vezes velado, compõe a transfobia e a violência sofrida por pessoas transformacionais (HABIB, 2019HABIB, I. G. Corpos transformacionais: os estados corporais e as políticas dos corpos transgêneros na cena contemporânea. In: ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA, 6., 2019., Salvador. Anais... Salvador: Associação Brasileira de Pós-Graduação em Artes Cênicas., 2019. p. 1072-1086. Disponível em: https://proceedings.science/anda/anda-2019/papers/corpos-transformacionais--os-estados-corporais-e-as-politicas-dos-corpos-transgeneros-na-cena-contemporanea. Acesso em: 03 dez. 2020.
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).

O Corpo Transformacional é aquele que, a partir da alteração dos seus estados corporais, tem, dentre outros aspectos, sua qualidade de movimento, sua forma e sua existência alteradas. A mudança de um estado corporal para o outro, ou seja, a transformação corporal, pode se dar por estratégias de movimentação baseadas em tarefas físicas, por indicações de movimento, pelo trabalho corporal imagético, e por acoplamentos e reacoplamentos em redes de materialidades que incluem corpos humanos e não-humanos, como organismos, dispositivos tecnológicos, espaço-tempo, coisas, forças, conceitos abstratos e epifenômenos - as produções de efeitos materiais podem se dar também a partir da memória, imaginação e pensamento. Essas redes de (re)associações/dissociações atuam na potencialização, amplificação ou distorção da experiência física, sempre dissolvendo as dicotomias presentes nas separações entre corpo e mente, corpo e espaço, organismo e máquina, físico e não-físico. Um Corpo Transformacional transforma materialidades, sendo simultaneamente transformado por elas. (HABIB, 2019HABIB, I. G. Corpos transformacionais: os estados corporais e as políticas dos corpos transgêneros na cena contemporânea. In: ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA, 6., 2019., Salvador. Anais... Salvador: Associação Brasileira de Pós-Graduação em Artes Cênicas., 2019. p. 1072-1086. Disponível em: https://proceedings.science/anda/anda-2019/papers/corpos-transformacionais--os-estados-corporais-e-as-politicas-dos-corpos-transgeneros-na-cena-contemporanea. Acesso em: 03 dez. 2020.
https://proceedings.science/anda/anda-20...
, p. 3).

Rohden (1998ROHDEN, F. O corpo fazendo a diferença. Mana, Rio de Janeiro, v. 4, n. 2, p. 127-141, 1998. DOI: 10.1590/S0104-93131998000200007. Acesso em: 24 nov. 2022.
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) destaca que a concepção de sexo varia nos pensamentos filosóficos e científicos de acordo de acordo com os diferentes momentos históricos. A noção grega de sexo único foi sucedida pela concepção binária de sexo, em que homens e mulheres constituem biologias diferenciadas, assim como tipos corporais específicos.

Esse pensamento deu origem a um sistema de gênero binário, que pressupõe a heterossexualidade como condição natural e compulsória. “A transexualidade, no entanto, coloca em questão a crença no binarismo e na incomensurabilidade entre os sexos ao evidenciar que o trânsito de mulher para homem e de homem para mulher não apenas é possível, como cada vez mais frequente” (PEREIRA; GAUDENZI; BONAN, 2021PEREIRA, P. L. N.; GAUDENZI, P.; BONAN, C. Masculinidades trans em debate: uma revisão de literatura sobre masculinidades trans no Brasil. Saúde e Sociedade, v. 30, n. 3, p. 1-15, 2021. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/MxvJdzwBN5bjMYXH6jndRpF/. Acesso em: 24 nov. 2022.
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, p. 2-3).

Nesse sentido Nunan (2003NUNAN, A. Homossexualidade: do preconceito aos padrões de consumo. Rio de Janeiro: Caravansarai, 2003.) lembra algumas diferenciações entre esses conceitos, quais sejam: O Sexo é o aspecto biológico da identidade sexual, sendo determinado pelas características físicas; a orientação sexual é o aspecto relativo à atração sexual e afetiva em relação a outras pessoas; e o gênero, no conceito de identidade do indivíduo, é um conceito histórico e cultural, que leva em conta uma construção social do indivíduo em relação ao como ele se sente. Nas palavras de Greenblatt (2011GREENBLATT, E. The treatment of LGBTIQ concepts in the Library of Congress Subject Headings. In: GREENBLATT, E. Serving LGBTIQ library and archives users: essays on outreach, service, collections and access. Jefferson: McFarland, 2011. p. 212-228., p. 221) “Sex is between your legs, while gender is between your ears”, ou seja, “O sexo está entre as suas pernas, enquanto o gênero está entre as suas orelhas” (tradução nossa). No contexto da identidade de gênero, a transexualidade envolve um fenômeno complexo, uma vez que ela apresenta elementos que não fazem parte do sexo biológico do cotidiano das pessoas (ARÁN, 2006ARÁN, M. A. Transexualidade e a gramática normativa do sistema sexo-gênero. Ágora, v. 9, n.1, p. 49-63, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-14982006000100004&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 19 dez. 2019.
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). Isto posto, as vivências das pessoas LGBT+ se configuram em espaços de resistência e cidadania, por não apresentarem um padrão exposto pela sociedade heteronormativa atual (Almeida, 2012ALMEIDA, G. Homens trans: novos matizes na aquarela da masculinidade? Estudos Feministas, v. 20, n. 12, p. 513-523, 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2012000200012&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 13 nov. 2019.
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
). Nessa mesma prerrogativa, de acordo com Vieira Junior (2018) e Arán (2006ARÁN, M. A. Transexualidade e a gramática normativa do sistema sexo-gênero. Ágora, v. 9, n.1, p. 49-63, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-14982006000100004&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 19 dez. 2019.
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), a transexualidade é um fenômeno complexo, da mesma forma, o processo identitário trans se vê transversalizado de maneira que há uma diversidade de pessoas trans ocupando todos os espaços, inclusive as mídias sociais, que são o foco desta pesquisa.

Trans homens, assim como os outros termos de autodesignação, procuram dar vistas ao conflito entre características masculinas e femininas designadas / atribuídas / assignadas, a partir da observação (anterior ou posterior ao nascimento) de órgãos genitais, e a subjetividade do gênero das pessoas. Essas transubjetividades ultrapassam o binarismo esperado socialmente, rompem com a heteronorma da sexualidade e negam o determinismo da anatomia dos corpos como critério único para a construção de gênero. (NERY, COELHO, SAMPAIO, 2016NERY, J. W.; COELHO, M. T. A. D.; SAMPAIO, L. L. P. João W. Nery - a trajetória de uma trans homen no Brasil: do escritor ao ativista. Periódicus, v. 1, n. 4, p. 169-178, nov. 215 - abr. 2016. DOI: https://doi.org/10.9771/peri.v1i4.15430. Acesso em: 24 nov. 2022.
https://doi.org/10.9771/peri.v1i4.15430...
, p. 173).

Como abordado por Ávila (2014ÁVILA, S. N. FTM, transhomem, homens trans, trans, homem: a emergência de transmasculinidades no Brasil contemporâneo. 2014. 243 p. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC. Disponível em: https://www.academia.edu/28328771/FTM_transhomem_homem_trans_trans_homem_A_emerg%C3%AAncia_de_transmasculinidades_no_Brasil_contempor%C3%A2neo. Acesso em: 24 nov. 2022.
https://www.academia.edu/28328771/FTM_tr...
), homens trans são homens que nasceram com corpos biológicos femininos e que se identificam com o gênero masculino, transformando seus corpos em masculino. “A masculinidade é uma configuração da prática em torno da posição dos homens na estrutura das relações de gênero” (CONNELL, 1995CONNELL, R. W. Políticas da Masculinidade. Educação e Realidade, v. 20, n. 2, p. 185-206, 1995. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/educacaoerealidade/article/view/71725/40671. Acesso em: 24 nov. 2022.
https://seer.ufrgs.br/index.php/educacao...
, p. 188). Portanto, as masculinidades são construídas na esfera da produção social, uma vez que “[...] a configuração de práticas enfatiza aquilo que as pessoas fazem e não o que é esperado ou imaginado” (ÁVILA, 2014ÁVILA, S. N. FTM, transhomem, homens trans, trans, homem: a emergência de transmasculinidades no Brasil contemporâneo. 2014. 243 p. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC. Disponível em: https://www.academia.edu/28328771/FTM_transhomem_homem_trans_trans_homem_A_emerg%C3%AAncia_de_transmasculinidades_no_Brasil_contempor%C3%A2neo. Acesso em: 24 nov. 2022.
https://www.academia.edu/28328771/FTM_tr...
, p. 35).

Desse modo, um homem trans é uma pessoa homem, mas que nasce num corpo feminino, o que pode gerar desconfortos ao indivíduo, por não refletir a sua identidade de gênero (UCHÔA, 2016). Para amenizar esse desconforto, alguns optam pela harmonização corpórea, que vão desde a aplicação de hormônios até cirurgias. Todavia, nem todos homens trans realizam procedimentos de mudança corporal, já que a masculidade e a feminilidade não são definidas pela aparência, comportamento, papéis ou orientação sexual.

3 METODOLOGIA

Quanto aos procedimentos metodológicos, esta pesquisa se apresenta como de natureza qualitativa, do tipo descritiva, aplicada e utiliza-se do método análise do discurso para a análise dos dados.

[...] tratar a emergência de uma nova identidade como um evento discursivo não é introduzir uma nova forma de determinismo linguístico ne privar os sujeitos de agência. É se recusar a uma separação entre a ‘experiência’ e a linguagem, e em seu lugar insistir na qualidade produtiva do discurso. (SCOTT, 2001SCOTT, J. W. “Experiência”. Falas de Gênero, n. 13, p. 42-73, 2001., p. 66).

O universo de pesquisa é o grupo do Facebook intitulado “Homens Trans e Simpatizantes” onde os pesquisadores, imersos nesse local, observaram as interações e as narrativas desses homens em suas postagens. O grupo, atualmente, possui mais de 11 mil membros, que apresentam relatos sobre as suas vivências e como se dá o processo da transexualidade no seu cotidiano. Vale destacar que as narrativas foram agrupadas por categorias, de acordo com as temáticas descritas no grupo, sendo excluídas as que tinham cunho apenas de entretenimento, como gifs de saudações e mensagens sem vínculo de discussão.

As narrativas foram coletadas entre os meses de junho e julho de 2020 e intituladas por letras, assim sendo: A, B, C, D e E, sem a identificação dos sujeitos informacionais, abrangendo os assuntos religião, vivência familiar, saúde e retificação de documentos. Para a análise das narrativas foram utilizadas as mesmas categorias elencadas por Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.), nas que a narrativa A explicitou uma vivência familiar positiva, já que a mãe aceitou a identidade de gênero do filho; a narrativa B trouxe um questionamento quanto a uma determinada cirurgia e sua possibilidade perante o Sistema Único de Saúde (SUS); a narrativa C disse respeito à retificação da carteira de trabalho após a alteração do nome social; a narrativa D questionou a ideia de igrejas inclusivas; a narrativa E buscou recomendações sobre médicos que atendiam homens trans; já a narrativa F trouxe o relato de uma violência doméstica sofrida pelo usuário da rede social. As narrativas descritas foram divididas, em categorias, pois, os assuntos tratados nas narrativas coletadas pelos autores adentravam em diversos domínios, perpassando por questões de família, saúde e preconceito. O Quadro 1 apresenta um agrupamento das narrativas por assunto.

Quadro 1
Apresentação e assuntos das narrativas coletadas

Para este novo estudo, foram coletadas postagens similares ao trabalho citado de 2019, a fim de detectar mudanças discursivas e ampliar o estudo netnográfico realizado por esses autores.

A análise do discurso na perspectiva de Foucault (1971FOUCAULT, M. Sobre a arqueologia das ciências: resposta ao círculo epistemológico. In: LIMA, L. da C. (ed.). Estruturalismo e teoria da linguagem. Petrópolis: Vozes, 1971. p. 19-55.) procura entender um enunciado na singularidade de seu acontecimento, determinando as condições de sua existência, fixando seus limites e estabelecendo correlações com outros enunciados aos quais possa estar ligado. Foucault (1969) concebe a formação discursiva como uma dispersão, na qual o discurso é formado e influenciado por 1) objetos, que coexistem e se transformam em um espaço comum; 2) diferentes tipos de enunciados; 3) conceitos, em suas formas de aparecimento e transformação; e 4) sistemas de relações diversas, que formam temas e teorias. Dito isso, o enunciado ocorre quando alguém emite um conjunto de signos, que pode ser replicado; já a enunciação não se repete. Tendo em vista esse cenário, este estudo elencou a categoria relação discurso-interdiscurso para participar do procedimento de análise de dados. Para tanto, as novas narrativas coletadas foram parafraseadas, analisadas metaforicamente, bem como delimitadas em suas condições de produção e contexto. A categoria de análise foi escolhida pelo fato de a análise do discurso visar a compreensão das condições nas quais um discurso foi produzido, sendo a partir dessas condições que surgem os interdiscursos. Destaca-se que a relação discurso-interdiscurso objetiva tomar o interdiscurso como objeto, procurando “apreender não uma formação discursiva, mas a interação entre formações discursivas diferentes” (BRANDÃO, 2004BRANDÃO, H. H. N. Introdução à Análise do Discurso. 2. ed. Campinas: Unicamp, 2004., p. 107).

Diversos trabalhos tem utilizado como metodologia a Análise do Discurso de matriz foucaltiana na Ciência da Informação (FREITAS, 2010; GASPAR; REIS, 2010; MARTÍNEZ-ÁVILA, 2012MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Problems and characteristics of Foucauldian Discourse Analysis as a research method. In: SMIRAGLIA, R. P.; LEE, Hur-Li. Cultural Frames of Knowledge. Würzburg: Ergon, 2012. p. 99-110.; SILVA; BAPTISTA; 2015; MORAES et al., 2016; CASTANHA et al., 2017; LIMA; MORAES, 2017; MELLO, VALENTIM, 2021). A Análise do Discurso tem sido aplicado a temáticas diversas, como no conceito de autor (MARTÍNEZ-ÁVILA et al., 2015), nas ontologias (MARTÍNEZ-ÁVILA; FOX, 2015), no conceito de bibliotecas hibridas (SILVA et al., 2017), na dimensão cultural da International Society for Knowledge Organization (ISKO) (EVANGELISTA et al., 2018EVANGELISTA, I. V.; BARROS, T. H. B.; MORAES, J. B. E. Uma análise do discurso da dimensão cultural da ISKO. Informação & Sociedade, v. 28, n. 2, 2018. DOI: 10.22478/ufpb.1809-4783.2018v28n2.38123. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.22478/ufpb.1809-4783....
), em politicas de indexação (GARCIA et al., 2019GARCIA, V. C.; REDIGOLO, F. M.; BARROS, T. H. B.; MORAES, J. B. E. Política de indexação e seus sentidos: um estudo a partir da análise do discurso. Informação & Informação, v. 24, n. 1, p. 169-189, 2019. DOI: 10.5433/1981-8920.2019v24n1p169. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.5433/1981-8920.2019v2...
), no acesso aberto (EVANGELISTA; BARROS, 2020EVANGELISTA, I. V.; BARROS, T. H. B. Uma análise do discurso sobre a temática acesso aberto nos anais do edicic ibérico no período de 2013 a 2017. Biblios, n. 78, p. 17-34, 2020. DOI: 10.5195/biblios.2020.800. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.5195/biblios.2020.800...
), no conceito de Ciência da Informação (LIMA et al., 2015) e na Organizaçao do Conhecimento (TERRA; SABBAG, 2021TERRA, M. V. S. C.; SABBAG, D. M. A. Ciência da Informação e Organização do Conhecimento no Brasil à luz da reflexão epistemológica francesa de análise do discurso. InCID, v. 12, n. 2, p. 52-69, 2021. DOI: 10.11606/issn.2178-2075.v12i2p52-69. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.11606/issn.2178-2075....
).

Embora este trabalho não esteja focado na teoria Queer, pode-se dizer que existe uma forte relação entre a dita teoria e os estudos de Foucault. Muitas pesquisas da teoria Queer (sendo uma das principais referências, a autora Judith Butler) se baseiam nos estudos de Foucault (BROWNE; NASH, 2010BROWNE, K.; NASH, C. J. Queer methods and methodologies: intersecting Queer theories and Social Science research. Farnham: Ashgate, 2010., p.5), e não são conceitos opostos. A escolha de não nos focarmos na teoria Queer para o presente estudo se justifica na medida em que a Análise de Discurso e a categorização não costumam ser usuais nos estudos Queer.

Por outro lado, um dos pesquisadores pioneiros da aplicação da teoria Queer na Ciência da Informação foi D. Grant Campbell (CAMPBELL, 2000CAMPBELL, D. G. Queer Theory and the creation of contextual subject access tools for gay and lesbian communities. Knowledge Organization, v. 27, n. 3, p. 122-131, 2000.; 2004CAMPBELL, D. G. A Queer eye for th faceted guy: how a universal classification principle can be applied to a distinct subculture. Advances in Knowledge Organization, v. 9, p.109-113, 2004.; ADLER; CAMPBELL; KEILTY, 2014ADLER, M. D.; CAMPBELL, D. G.; PATRICK K. Resistance and possibility: rethinking the concept of subject access from Queer theoretical perspectives. Proceedings of the American Society for Information Science and Technology, v. 51, n. 1, p.1-3, 2014. DOI: https://doi.org/10.1002/meet.2014.14505101014. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1002/meet.2014.145051...
), que tem realizado análises do discurso na área da Ciência da Informação, em temáticas como a web semântica (CAMPBELL, 2007CAMPBELL, D. G. The birth of the new web: a Foucauldian reading of the semantic web. Cataloging & Classification Quarterly, v. 43, n. 3-4, p. 9-20, 2007. DOI: 10.1300/J104v43n03_01. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1300/J104v43n03_01...
), Resource Description and Access (RDA) e Resource Description Framework (RDF) (CAMPBELL, 2011CAMPBELL, D. G. RDA and RDF: a discourse analysis of two standards of resource description. NASKO, v. 3, p. 207-216, 2011. DOI: https://doi.org/10.7152/nasko.v3i1.12804. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.7152/nasko.v3i1.12804...
). Em relação à aplicação da Análise do Discurso em temática trans no Brasil destaca-se o trabalho de Arruda e Araújo (2021ARRUDA, A. M. A.; ARAÚJO, R. F. Travestis e pessoas transexuais na mídia alagoana: análise do discurso em portais online. Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação, v. 17, p. 1-20, 2021. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/165919. Acesso em: 17 out. 2022.
http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapc...
), que têm analisado o conteúdo das publicações noticiosas e dos comentários dos leitores nas notícias sobre pessoas travestis e transexuais nos portais midiáticos online de Alagoas. No cenário internacional e outros campos do conhceimento também tem sido feitas análises do discurso específicas na temática trans (ZITZ et al., 2014ZITZ, C.; BURNS, J.; TACCONELLI, E. Trans men and friendships: a Foucauldian discourse analysis. Feminism & Psychology, v. 24, n. 2, p. 216-237, 2014. DOI: 10.1177/0959353514526224. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1177/0959353514526224...
; DIRKS, 2016DIRKS, D. A. Transgender people at four big ten campuses: a policy discourse analysis. Review of Higher Education, v. 39, n. 3, p. 371-393, 2016. DOI: 10.1353/rhe.2016.0020. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1353/rhe.2016.0020...
; RIBEIRO; GOMES, 2020RIBEIRO, S. de S.; GOMES, M. C. A. Práticas sociodiscursivas de resistência motivadas pela iterabilidade de violências: análise discursivo-crítica dos relatos de homens trans estudantes. Trabalhos em Linguística Aplicada, v. 59, n. 3, p. 1784-1808, 2020. DOI: 10.1590/01031813814331620201005. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1590/0103181381433162...
; WEST et al., 2021WEST, A.; WADA, K.; STRONG, T. Authenticating and legitimizing transgender and gender non-conforming identities online: a discourse analysis. Journal of LGBTQ Issues in Counseling, v. 15, n. 2, p. 195-223, 2021. DOI: 10.1080/15538605.2021.1914275. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1080/15538605.2021.19...
; SHOOK et al., 2022SHOOK, A. G.; TORDOFF, D. M.; CLARK, A.; HARDWICK, R.; ST. PIERRE NELSON, W.; KANTROWITZ-GORDON, I. Trans youth talk back: a Foucauldian Discourse Analysis of transgender minors' accounts of healthcare access. Qualitative Health Research, v. 32, n. 11, p. 1672-1689, 2022. DOI: 10.1177/10497323221114801. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1177/1049732322111480...
; HALLIWELL et al., 2022HALLIWELL, S. D.; DU PLESSIS, C.; HICKEY, A.; GILDERSLEEVE, J.; MULLENS, A. B.; SANDERS, T.; CLARK, K. A.; HUGHTO, J. M. W.; DEBATTISTA, J.; PHILLIPS, T. M.; DAKEN, K.; BROMDAL, A. A Critical Discourse Analysis of an Australian incarcerated trans woman's letters of complaint and self-advocacy. ETHOS, v. 50, n. 2. p. 208- 232, 2022. DOI 10.1111/etho.12343. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/etho.12343...
; JACOBSEN, 2022JACOBSEN, K.; DEVOR, A.; HODGE, E. Who counts as trans? A Critical Discourse Analysis of trans tumblr posts. Journal of Communication Inquiry, v. 46, n.1, p. 60-81, 2022. DOI: https://doi.org/10.1177/01968599211040835. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1177/0196859921104083...
).

Existem diferentes linhas de análise de discurso que caminham entre uma análise baseada em uma materialidade textual e outra análise mais baseada em práticas sociais e culturais (BUDD, 2006BUDD, J. Discourse analysis and the study of communication in LIS. Library Trends, v. 55, n. 1, p. 65-82, 2006.). Na linha de Critical Discourse Analisys (CDA) - Análise Crítica do Discurso de Fairclough (2003FAIRCLOUGH, N. Analysing discourse: textual analysis for social research. Londres: Routledge, 2003., p. 3, tradução nossa), se indica que “a análise textual é uma parte essencial da análise do discurso, mas, a análise do discurso não se caracteriza por ser apenas uma análise linguística de textos”. Na CDA (uma linha que se difere da vertente puramente foucaltiana, como indica Martínez-Ávila (2012MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Problems and characteristics of Foucauldian Discourse Analysis as a research method. In: SMIRAGLIA, R. P.; LEE, Hur-Li. Cultural Frames of Knowledge. Würzburg: Ergon, 2012. p. 99-110.), a metáfora tem um papel fundamental no estudo do objeto (HART, 2008HART, C. Critical discourse analysis and metaphor: toward a theoretical framework. Critical Discourse Studies, v. 5, n. 2, p. 91-106, 2008. DOI: 10.1080/17405900801990058. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.1080/1740590080199005...
; MUSOLFF, 2012MUSOLFF, A. The study of metaphor as part of critical discourse analysis. Critical Discourse Studies, v. 9, n. 3, p. 301-310, 2012. DOI: http://dx.doi.org/10.1080/17405904.2012.688300. Acesso em: 17 out. 2022.
http://dx.doi.org/10.1080/17405904.2012....
).

Este trabalho aplica uma variante de análise de discurso que combina a investigação das práticas sociais e culturais do grupo de homens trans no Facebook, materializadas nas suas postagens. Todo discurso nasce do trabalho sobre outros discursos. Daí a propriedade que uma palavra constitutiva de um discurso tem de assumir diferentes significados (polissemia) e as diversas maneiras encontradas para se expressar algo que já foi dito (paráfrase). Embora para Michael Foucault o discurso não seja sinônimo de fala, buscou-se analisar, aqui, as condições de produção e os contextos dos discursos em seu modo textual (texto escrito pelos usuários na plataforma Facebook).

Para Foucault (1969FOUCAULT, M. L’archéologie du savoir. Paris: Gallimard, 1969.), a Análise do Discurso procura entender um enunciado na singularidade de seu acontecimento, determinando as condições de sua existência, ou condições de produção, o que fixa seus limites e estabelece correlações com outros enunciados aos quais possa estar ligado. As metáforas, por serem figuras de linguagem precedidas por uma comparação implícita, foram utilizadas nesta análise de modo a compreender conceitos por detrás das frases dos enunciados.

Para tanto, trabalhou-se com uma análise que delineou as continuidades e as descontinuidades entre o estudo de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) e a presente pesquisa, o que permitiu verificar os limites entre o domínio do pensável e do dizível em determinada época e lugar.

4 RESULTADOS

Continuando com a investigação das narrativas de homens trans no grupo de Facebook Homens trans e simpatizantes”, primeiramente, são revisadas algumas narrativas estudadas por Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.). A saber:

NARRATIVA A: Meninos e meninas. Eu me assumi pra minha mãe que sou trans.. Ela olhou pra mim e disse Q ótimo meu bb eu já sábia .. Ela disse que vai me apóia em tudo que for preciso pra mim ser feliz.. Minha mãe é tudo pra mim 😍❤

NARRATIVA B: Alguém que tenha feito a MASTECTOMIA e possa me ajudar sobre como comprar o colete pós cirúrgico?

NARRATIVA C: Bom dia. Sobre a carteira de trabalho depois de retificar os documentos; eu tenho que tirar segunda via ou tirar uma nova? (Tenho registro na carteira)

NARRATIVA D: Boa noite, meninos! Quem aqui de São Paulo pode me indicar uma igreja inclusiva pra ir?Eu e meu marido somos crentes e queremos ir! Conhecer trans crentes pra trocar ideia, falar de Deus e fazer amizades.

NARRATIVA E: Alguém pode me indicar um médico que atenda homens trans na grande São Paulo? Procurando Recomendações

NARRATIVA F: Olá pessoas....Fui vítima de agressão pelo meu padrasto e disse que eu sempre serei menina pois não tenho pinto. Não aguento mais. Alguém pode me ajudar a ir na delegacia? ☹

As discussões realizadas por Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) resultaram no fato de a narrativa A explicitar uma vivência positiva, na qual o sujeito relata a aceitação da mãe no que diz respeito a sua identidade sexual. Isso destaca e conforta os outros homens trans sobre o como a aceitação da família é fundamental nesse processo, já que a sociedade os oprime fortemente. A narrativa B trata de um questionamento sobre a cirurgia da Mastectomia (cirurgia de retirada dos seios). Essa cirurgia, conhecida também como Mastec, já é possível de ser realizada no Brasil pelo (SUS). Essa cirurgia é um sonho para muitos homens trans, pois, costuma se caracterizar como algo libertador. No grupo, muitos homens trans apresentam vídeos contando as suas experiências e como essa ideia de liberdade é desenhada após o procedimento cirúrgico. A narrativa C diz respeito à retificação da carteira de trabalho após a alteração de nome social. A retificação de documentos é algo primordial para as pessoas LGBT+, já que carrega a sua nova identidade, o nome social. Nos ambientes de trabalho as conquistas de homens trans com os novos documentos fomenta essa visibilidade na sociedade atual. A narrativa D apresenta um questionamento de um casal gay, abordando um questionamento sobre a existência de igrejas inclusivas, ou seja, aqueles templos que aceitam a comunidade LGBT+. Além disso, enfatiza-se a necessidade desse ambiente (igreja) ser um espaço de amizade e construção de vivências com todos. Entre esses movimentos religiosos, estão as igrejas protestantes inclusivas para a comunidade LGBT+, que nasceram nos Estados Unidos em meados da década de 60 e encontraram, no Brasil, espaço para crescer (SILVA; SIMIÃO; SILVA, 2017SILVA, R. C. da; LIMA, L. de M.; SUENAGA, C. M. K.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D.; MORAES, J. B. E. de. Bibliotecas híbridas: uma análise discursiva da Biblioteca Central de Liverpool. Ibersid: Revista de Sistemas de Información y Documentación, v. 11, n.1, p. 75-82, 2017. DOI: https://doi.org/10.54886/ibersid.v11i1.4330. Acesso em: 17 out. 2022.
https://doi.org/10.54886/ibersid.v11i1.4...
). A narrativa E busca recomendações sobre médicos que atendam homens trans. O relato de muitos desses homens, no grupo, descreve o preconceito de médicos que não o quiseram atender, por não terem a aparência feminina. Relacionando-se com a Narrativa A, que também apresentou um posicionamento sobre a saúde, entende-se que o corpo, para os homens trans, representa algo muito significativo. Por fim, a Narrativa F descreve uma realidade de violência na família. Um rapaz relata que foi vítima de violência doméstica. Dantas e Neto (2012)DANTAS, M. L. G.; NETO, A. de F. P. O discurso homofóbico nas redes sociais da internet: uma análise no facebook “Rio sem Homofobia-Grupo Público”. Cadernos do Tempo Presente, v. 19, p. 27-41, 2015. Disponível em: http://www6.ensp.fiocruz.br/repositorio/sites/default/files/arquivos/DiscursoHomofobico.pdf. Acesso em: 16 jan. 2020.
http://www6.ensp.fiocruz.br/repositorio/...
comentam que a violência contra as pessoas LGBT+ pode assumir uma forma física e simbólica. A violência simbólica promove e fortalece a exclusão das pessoas a colocando em uma situação inferior aos demais.

Na continuação do estudo, seis novas narrativas referentes a essas categorias foram coletadas do grupo do Facebook. Para proceder à análise considera-se o discurso enquanto produto, que impõe uma materialidade do enunciado ou de um grupo de enunciados, em prol de caracterizar a formação discursiva que norteia as narrativas. A materialidade, neste estudo, está na postagem compartilhada no ambiente digital em questão.

NARRATIVA A: Meninos vocês tomam algo pra secar os intrusos? Se sim o que indicam?

Análise discursiva:

Paráfrase: “Meninos, vocês tomam alguma substância para diminuir/ocultar os seios? Se sim, quais vocês indicam?”

Metáforas: a) “Meninos, vocês tomam alguma substância para diminuir os seios?” Equivale a tomar medicamentos para ocultar o tecido mamário, prática comum entre pessoas que não querem que seus peitos tenham aspecto feminino.

b) “Se sim, quais vocês indicam?”. Implica no compartilhamento de informação e experiências entre os participantes do grupo, sem se pensar nos meios como os produtos serão adquiridos.

Condições de produção: a) O discurso foi produzido por um enunciador preto, que aparenta ter entre 22/23 anos, morador de uma cidade do interior do Estado do Rio de Janeiro e executivo do ramo de consumo inteligente; ou não; porque as informações colocadas pelo usuário no Facebook nem sempre são verdadeiras. Não há descrição do status de relacionamento.

b) O discurso foi escrito, e não oralizado.

c) Não há uso de emoticons, pois, o autor da narrativa busca trazer um tom de seriedade em seu discurso.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: A narrativa foi produzida por um homem trans em período de transição de sexo e o discurso dessa narrativa, além de servir para consumo próprio, pode atingir àqueles membros do grupo que ainda buscam meios de ocultar os seus seios. Sendo assim, torna-se imprescindível o cuidado com a orientação ao uso de medicamentos, uma vez que, quando não prescritos por um profissional da saúde, podem se tornar um risco à vida de quem os ingerem. Cabe ressaltar, aqui, que os medicamentos para a diminuição dos seios podem ter altos custos e, para serem adquiridos de forma lícita, devem advir de um médico especializado que conheça todo o histórico do paciente. Portanto, há necessidade de a pessoa ter condições financeiras para tal. Há outros meios de ocultar seios que não seja ingerindo substâncias. O sujeito enunciador do discurso possui condições financeiras para a compra de medicamentos, que podem facilmente ser adquiridos pela internet ou, até mesmo no local onde ele mora, já que trata-se de uma cidade de médio porte.

NARRATIVA B: Gente parece loucura minha sei lá. Meu maior sonho e de muitos meninos é a MastectomiaMas será que sou só eu que morro de medo de entrar na faca?

Análise discursiva:

Paráfrase: “Gente, assim como muito de vocês, tenho o sonho de realizar o procedimento de remoção total das mamas , mas, tenho medo da cirurgia. Sou só eu que tenho esse medo? ”.

Metáforas: a) “Gente, assim como muito de vocês, tenho o sonho de realizar o procedimento de remoção total das mamas ”. Implica no desejo de muitos homens trans em ocultar as mamas definitivamente, sem terem que utilizar outros meios para tal, como o uso de medicamentos ou de faixas. O uso do emoticon “coração vermelho” ressalta o amor pela realização do procedimento, expressando de paixão.

b) “mas, tenho medo da cirurgia”. Destaca a insegurança para com meios pelos quais a Mastectomia é realizada.

c) “Sou só eu que tenho esse medo? ”. Relaciona-se à necessidade do ser humano em ouvir a opinião do outro no que diz respeito às suas dúvidas e aflições, bem como de compartilhar as suas inseguranças. O uso do emoticon “chorando de rir” destaca a vontade do sujeito em olhar a situação sob uma perspectiva descontraída. O emoticon “sinal de tudo certo” afere, ironicamente, que a situação está sob controle.

Condições de produção: a) O discurso foi produzido por um enunciador branco, casado, que aparenta ter entre 25/30 anos e é morador da capital do Estado do Paraná; ou não; porque as informações colocadas pelo usuário no Facebook nem sempre são verdadeiras. Não há descrição dos vínculos empregatícios.

b) O discurso foi escrito, e não oralizado.

c) O enunciador utiliza emoticons para ressaltar suas enunciações.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: A narrativa foi produzida por um homem trans em período de transição de gênero, como forma de compartilhar seus medos e aflições quanto ao procedimento da Mastectomia. O sujeito busca os melhores meios para ocultar suas mamas. O enunciador demonstra querer um meio efetivo para o processo, em detrimento dos cuidados paliativos, como é o caso do uso de faixas e de substâncias para a diminuição mamária. Contudo, a insegurança em relação a tal procedimento é constatada não somente por parte desse usuário, mas de muitos outros membros do grupo, uma vez que trata-se de uma cirurgia delicada. O sujeito é casado e demonstra estar tranquilo para com a sua aparência, embora mantenha seu desejo de mudança. Todavia, prefere pensar na melhor solução para a situação e compartilhar com os demais membros do grupo as suas visões sobre o assunto. A situação reforça o uso das redes sociais como locais de interação, compartilhamento e tomada de decisões.

NARRATIVA C: Boa tarde. Alguém sabe me dizer se tem alguma lei ou algo que eu possa fazer para incluir o nome social na faculdade? Fiz a solicitação na Uninove e eles informam que eu tenho que ter o RG ou algum documento que comprove a mudança..

Análise discursiva:

Paráfrase: “Boa tarde. Alguém saberia me informar sobre os meios legais para se incluir o nome social na faculdade? Fiz a solicitação na Uninove, mas, eles me informaram que devo ter um documento que comprove a mudança.”

Metáforas: a) “Boa tarde. Alguém saberia me informar sobre os meios legais para se incluir o nome social na faculdade?”. Implica o desejo de reconhecimento de gênero em sociedade, mais especificamente, da legislação brasileira para tal.

b) “Fiz a solicitação na Uninove, mas, eles me informaram que devo ter um documento que comprove a mudança.” Reflete a burocracia brasileira imposta às pessoas trans que desejam o reconhecimento institucionalizado de seu gênero.

Condições de produção: a) O discurso foi produzido por um enunciador negro, solteiro, empregado em uma empresa de prestação de serviços de assistências especializadas para veículos, imóveis e pessoas, estudante de um curso Tecnólogo em Radiologia, que aparenta ter entre 22/25 anos, é morador da Grande São Paulo e já realizou o processo de transição de gênero; ou não; porque as informações colocadas pelo usuário no Facebook nem sempre são verdadeiras.

b) O discurso foi escrito, e não oralizado.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: O discurso foi enunciado por um homem trans que já realizou o processo de transição de gênero, mas, ainda não completou o preenchimento de todos os meios legais para a inclusão do nome social em seus documentos oficiais, em âmbito brasileiro. Esse cenário remete à burocracia brasileira impostas a esse tipo de situação que, ao mesmo tempo em que busca manter os direitos dessas pessoas na sociedade, se mostra como sendo um impasse para a total inclusão desses indivíduos em suas comunidades. A própria palavra inclusão, cujo significado é fazer figurar ou fazer parte de um grupo, impõe uma condição diferenciada no alcance dos direitos legais dos homens trans no Brasil, uma vez que, quando instituídos, os direitos não precisam ser tratados de maneira a fazer constar uma certa categoria de pessoas, mas sim, os cidadãos brasileiros como um todo. Isso pode ser percebido pelo fato de, mesmo que o sujeito analisado seja da área da saúde, inferindo-se o seu conhecimento das legislações da Saúde LGBTQ, o mesmo ainda possui dúvidas acerca da temática.

NARRATIVA D: Pessoal, eu creio que juntei todos os documentos e certidões necessários pra retificação de nome e gênero mas agora tô sem saber o que fazer, tipo eu vou pra um cartório de registro, né? Mas o que eu falo pra moça lá? Eu sei lá, ela pode se negar também a fazer? ?

Análise discursiva:

Paráfrase: “Pessoal, acredito que juntei todos os documentos necessários para a minha retificação de nome e gênero. No entanto, quais são os procedimentos de agora em diante? Devo ir ao cartório? Há alguma chance de a pessoa responsável para tal se negar a fazer o registro?”

Metáforas: a) “Pessoal, acredito que juntei todos os documentos necessários para a minha retificação de nome e gênero.” Reflete a burocracia brasileira referente à documentação necessária para tal procedimento.

b) “No entanto, quais são os procedimentos de agora em diante? Devo ir ao cartório?” Implica na confusão referente ao caminho ao qual percorrer para a retificação de nome e gênero. Além disso, inferem-se lacunas no compartilhamento de informações acerca do passo a passo do processo pelos órgãos brasileiros.

c) “Há alguma chance de a pessoa responsável para tal se negar a fazer o registro?” Equivale aos preconceitos ainda presentes na sociedade brasileira no que se refere às pessoas LGBTQ.

Condições de produção: a) O enunciador do discurso não possui foto em seu perfil pessoal, assim como não permite a identificação de informações pessoais, como cidade de moradia, local onde trabalha, estuda, idade, status de relacionamento etc.

b) O discurso foi escrito, e não oralizado.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: A burocracia brasileira para a retificação de nome e gênero é extensa e necessita de um grande trâmite de documentação, o que pode ser confuso para a pessoa que busca realizar esse procedimento. O primeiro passo para dar início à retificação do registro é reunir todos os documentos exigidos pelo Provimento nº 73/2018 do CNJ. Posteriormente, há de se checar a data de emissão das certidões de nascimento e de casamento (se for o caso). As certidões podem ter, no máximo, 90 dias. Em seguida, é necessário emitir outras certidões online e solicitar a certidão dos Cartórios de Protesto. Além das certidões, o provimento exige o Registro Geral (RG), o Cadastro de Pessoa Física (CPF), o título de eleitor. Com todos os documentos e todas as certidões em mãos, é preciso ir ao cartório e elaborar o Requerimento de Alteração de Registro Civil. Se a pessoa interessada em fazer a retificação tiver entrado com um processo judicial no passado, ela deverá comprovar que o processo foi arquivado para poder retificar administrativamente no cartório. Há site oficiais do Governo Brasileiro que explicam esse processo, além de ambientes não oficiais, como blogs, por exemplo, que disseminam tais informações de maneira estruturada ou não. No entanto, embora encaminhando para o cenário de igualdade entre seus cidadãos, no Brasil ainda podem ser percebidos preconceitos para com as pessoas trans, o que é visto na ocultação das informações pessoais do indivíduo que realizou a postagem.

NARRATIVA E: Gente, eu gostaria de saber se algum menino trans aqui é do candomblé... Quero saber como vocês fazem já que é uma religião com uma doutrina sexista. Como vocês conversaram com o pai ou mãe de santo de vocês? Eu frequento um terreiro, ainda não sei quem é meu orixá, mas tenho medo de entrar pro axé e ser tratado no feminino, ter q usar a saia, tem o pano que protege o útero (esse n tenho problema de usar), mas no geral pelos costumes serem difundidos dessa forma eu gostaria de saber oq rola :/

Análise discursiva:

Paráfrase: “Gostaria de saber se algum menino trans do grupo é do Candomblé e como lida com a questão sexista da religião, mais especificamente, como conversa com o seu pai ou mãe de santo. Eu frequento um terreiro, ainda não sei quem é meu orixá, mas, tenho medo de ser tratado no feminino e ter que usar vestimentas de mulher, como saia e pano de proteção ao útero (este último não tenho problema em usar). Pelos costumes difundidos na religião, gostaria de saber como fica essa questão. ;/”

Metáforas: a) “Gostaria de saber se algum menino trans do grupo é do Candomblé e como lida com a questão sexista da religião, mais especificamente, como conversa com o seu pai ou mãe de santo.” Expressa a influência negativa do sexismo na religião para o bem-estar psicológico e físico de seus integrantes.

b) “Eu frequento um terreiro, ainda não sei quem é meu orixá, mas tenho medo de ser tratado no feminino e ter que usar vestimentas de mulher, como saia e pano de proteção ao útero (este último não tenho problema em usar).” Equivale à intimidação do integrante da religião perante a possibilidade de utilização, em público, de vestimentas opostas à sua caracterização de gênero. Isso é reforçado pelo fato de o indivíduo dizer que não vê problema em usar o pano de proteção ao útero, esse com características externas não tão femininas, mas, não saias, já que essas, culturalmente, servem a mulheres.

c) “Pelos costumes difundidos na religião, gostaria de saber como fica essa questão. ;/” Reforça a dúvida e a intimidação do enunciante perante o sexismo da religião, o que é intensificado pelo uso dos caracteres do emoticon “carinha intrigada”, demonstrando confusão de pensamentos, discordância e insatisfação com uma determinada situação.

Condições de produção: a) O discurso foi produzido por um enunciador pardo, estudante de Biologia, morador do interior do Estado de Sergipe, que aparenta ter 22/23 anos e encontra-se em processo de transição de gênero; ou não; porque as informações colocadas pelo usuário no Facebook nem sempre são verdadeiras. Não há informação acerca do status de relacionamento do indivíduo.

b) O discurso foi escrito, e não oralizado.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: O enunciado foi produzido por um integrante do próprio Candomblé, e o discurso dessa narrativa pretende atingir a comunidade dessa religião, frequentadores de terreiros. Sendo assim, torna-se importante e relevante que esse sujeito esteja bem informado acerca das práticas sexistas da religião. Por ser um homem trans, é perceptível que se sente acuado frente ao cenário em questão, uma vez que há dúvidas em relação ao uso de vestimentas femininas, que pode vir a ser obrigatório durante as práticas no terreiro. O que se pretende, de fato, é demonstrar uma discordância quanto ao sexismo em religiões, bem como, intuitivamente, demandar o respeito pela identidade de gênero. Há, ainda, a dúvida do enunciador relativa a identificação do seu gênero enquanto masculino pela sociedade como um todo.

NARRATIVA F: Eai pessoal blz então como eu não tenho ninguém pra desabafar irei desabafar aqui mesmo eu ando tendo crises por conta de eu não conseguir tomar T e não ter binderetc sinto cada dia que passa uma dor enorme no coração um vazio me sinto cada dia feio e horrível não tenho vontade de sair de casa por vergonha dos meus intrusos e as pessoas me chamar por ela isso me machuca mais ainda todos os dias acordo querendo morrer e não tenho ninguém pra desabafar pois minha família pouco se importa comigo e oq estou sentindo eu me sinto sozinho no mundo e sem ajuda de ninguém e isso tá me matando aos poucos eu não sei oque fazer mais da minha vida tudo está desmoronando mais e mais cada dia que passa Isso e um desabafo desculpe.

Análise discursiva:

Paráfrase: “Olá, pessoal, tudo bem? Eu não tenho ninguém para desabafar, então, vou falar por aqui. Eu ando tendo crises de ansiedade por não conseguir tomar Testosterona e não ter faixa para prender o tecido mamário e ficar com a aparência de um peito liso. A cada dia que passa me sinto mais vazio, feio, sem vontade de sair de casa, pois, tenho vergonha dos meus seios. As pessoas me chamam por “ela”. Isso me machuca e todos os dias acordo com vontade de morrer. Minha família não se importa comigo, com o que eu estou sentindo, se eu me sinto sozinho no mundo. Não tenho ajuda de ninguém, e isso está me matando aos poucos. Tudo está desmoronando a cada dia, e eu não sei o que fazer da minha vida. Isso é um desabafo! Me desculpem.”

Metáforas: a) “Olá, pessoal, tudo bem? Eu não tenho ninguém para desabafar, então, vou falar por aqui.” Implica na solidão que muitos seres humanos vivem hoje em dia, perante a globalização, demarcada pela volatilidade das relações culturais.

b) “Eu ando tendo crises de ansiedade por não conseguir tomar Testosterona e não ter faixa para prender o tecido mamário e ficar com a aparência de um peito liso.” A ansiedade é uma doença presente em todas as faixas etárias e sociais, desencadeada por diferentes fatores. Aqui, ela advém de um descontentamento do indivíduo quanto à sua aparência física, o que impacta negativamente no seu psicológico.

c) “A cada dia que passa me sinto mais vazio, feio, sem vontade de sair de casa, pois, tenho vergonha dos meus seios.” A ansiedade gera um vazio existencial na vida das pessoas, neste caso, reforçado pelo descontentamento do indivíduo com a sua aparência física, além de aumentar a intensidade com que as suas dores são sentidas.

d) “As pessoas me chamam por “ela”. Isso me machuca e todos os dias acordo com vontade de morrer.” Remete ao cuidado necessário para com o uso de pronomes quando se referindo às pessoas trans.

e) “Minha família não se importa comigo, com o que eu estou sentindo, se eu me sinto sozinho no mundo.” A falta de apoio familiar impacta negativamente nos sintomas da ansiedade, o que pode levar a uma depressão.

f) “Não tenho ajuda de ninguém, e isso está me matando aos poucos.” Reforça a ideia de liquidez trazida pela globalização, onde o ser humano precisa se ocupar de n tarefas na sociedade, deixando de lado, muitas das vezes, o cuidado com o outro.

g) “Tudo está desmoronando a cada dia, e eu não sei o que fazer da minha vida. Isso é um desabafo! Me desculpem.” Implica em sintomas depressivos por parte do enunciador e na sua necessidade de ser ouvido por alguém, nem que seja por desconhecidos.

Condições de produção: O discurso foi proferido por uma pessoa branca, que aparenta ter entre 15 a 20 anos, morador do interior do Estado do Rio Grande do Sul; ou não; porque as informações colocadas pelo usuário no Facebook nem sempre são verdadeiras. Não há informação acerca do status de relacionamento do indivíduo, nem sobre onde trabalha e/ou estuda.

Quanto ao contexto e ao interdiscurso: A narrativa demonstra a situação de muitas pessoas trans que se encontram marginalizadas perante a sociedade, seja pelo fato dos demais cidadãos não respeitarem sua identidade de gênero, seja porque são discriminadas e deixadas de lado pela família e conhecidos. São altos os índices de ansiedade e depressão na comunidade LGBTQ, doenças essas advindas da não identificação com o perfil do corpo de nascença, assim como pela pressão que a sociedade impõe sobre esses indivíduos, uma vez que esses podem passar por cenários de preconceito e discriminação. O Rio Grande do Sul, Estado onde o enunciador do discurso mora, é um dos Estados com menores índices de mortes por preconceito LGBTQ no país, no entanto, ele indaga que não possui apoio da família e de amigos próximos. Ou seja, embora o indivíduo more em um local relativamente seguro para o público LGBTQ+, encontra problemas em seu âmbito familiar. Esse fato pode ser evidenciado, além dos preconceitos passados de geração em geração, pela globalização e super preocupação dos indivíduos com o trabalho, em detrimento das vivências com os mais próximos.

O Quadro 2 apresenta um agrupamento dessas narrativas por assunto.

Quadro 2
Agrupamentos das novas narrativas coletadas

Tendo em vista esse cenário, pode-se dizer que as narrativas apresentadas na pesquisa relatam as vivências, discursos e tessituras de homens trans nas mídias sociais. Segundo Foucault (1969FOUCAULT, M. L’archéologie du savoir. Paris: Gallimard, 1969.), uma formação discursiva determina o que pode, ou não, ser dito em determinado contexto. Nesse sentido, os enunciados analisados são formações discursivas que demonstram memórias, em sua maior parte, traumáticas, que se configuram como categorias invisíveis aos enunciados, no entanto, percebidas na análise discursiva.

No que se refere à religião, enquanto o estudo de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) descrevia a narrativa coletada, apresentando o questionamento de um casal gay, que relatava a necessidade e a importância desses espaços religiosos e inclusivos, no presente estudo, o interdiscurso se debruça sobre certo receio em frequentar a umbanda, devido ao fato de o sujeito poder ser chamado no feminino, o que mostra um certo contraste em relação à primeira narrativa.

Em relação à categoria vivência familiar, Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) elencavam duas narrativas sob a ótica da vivência familiar foram: a primeira explicitava uma vivência muito positiva, na qual o sujeito relatou a aceitação da mãe no que diz respeito a sua identidade sexual; a segunda tratava de uma violência sofrida pelo padrasto, uma homofobia nítida. Duas narrativas distintas de uma realidade familiar. No presente estudo, o interdiscurso revela que a narrativa está atrelada um pouco em relação a saúde, mas, destaca a ausência de apoio da família nas decisões e vivências de um homem trans na sociedade, ou seja, continua corroborando com um cenário negativo.

Quanto às questões que envolvem a saúde, no anterior estudo elas se concentraram em dois discursos, sendo a primeira um questionamento sobre a cirurgia da Mastectomia no âmbito do SUS, enquanto a segunda designava um questionamento acerca dos médicos que atendiam homens trans. Na presente pesquisa, ambas narrativas coletadas diziam respeito ao processo de cirurgia de retirada de seios, uma relatando o modelo desse caminho cirúrgico e outra tratando a questão dos processos para se esconder os seios, até que não aconteça a mastectomia. Percebeu-se, assim, que o interdiscurso pauta-se em uma constância na busca pela mastectomia e cuidados médicos por homens trans.

Na categoria retificação de documentos observou-se que, enquanto no trabalho de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) a narrativa explicitava a retificação da carteira de trabalho após a alteração de nome social, na presente pesquisa a narrativa relatou a retificação de documentos com nome social para o ingresso em uma universidade. Dessa maneira, percebe-se, assim como já mencionado anteriormente, um interdiscurso voltado à importância do nome social para essas pessoas, uma vez que elas querem ser reconhecidas pela sua identidade de gênero.

Quanto ao teor das narrativas, na categoria religião, o enunciado do estudo de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) traz uma mensagem positiva, de inclusão social. Em contrapartida, o interdiscurso desta pesquisa aborda um enunciado depreciativo, em que a religião tenta impor seus dogmas sobre os ideais do indivíduo.

Enquanto os enunciados de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.), na categoria vivência familiar, se contrabalanceiam entre um aspecto positivo (ser aceito pela família) e depreciativo (agressão), o enunciado desta pesquisa mostra um interdiscurso depreciativo, onde a saúde mental do sujeito encontra-se abalada por fatores externos a ele.

Em ambas as pesquisas, a categoria saúde relata uma relação um interdiscurso de medo em se realizar procedimentos estéticos, mas, ao mesmo tempo, um sonho a ser alcançado. Já a categoria retificação de documentos é composta apenas por interdiscursos relacionados a dúvidas, não propagando ideais de positivismo ou depreciação. O Quadro 2 demonstra essas relações:

Quadro 2
Interdiscursos e relação de positividade versus depreciação nos enunciados abordados em ambas pesquisas

Pode-se, assim dizer, que da pesquisa de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) para esta, o contexto das narrativas de homens trans continuou o mesmo, quando não, piorou em questão de positividade das mensagens, o que influi, diretamente, no modo como esses sujeitos são compreendidos e atuam em sociedade. Posto isso, traz-se em voga a necessidade de inclusão e liberdade de expressão do público LGBTQ, não somente no âmbito dos ambientes web, como também no dia a dia da população.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As narrativas sobre as vivências de homens trans no Facebook aqui apresentadas refletem a importância das mídias sociais no processo de ativismo, como forma de sociabilidade nesses ambientes informacionais. Ressalta-se que as pessoas transexuais utilizam as tecnologias de informação e comunicação, em especial das mídias sociais, como canais de difusão de informações, a fim de atender suas necessidades, reforçando o seu posicionamento e a sua configuração social, assuntos tão necessários de serem discutidos atualmente.

Comparando os discursos analisados nesta pesquisa com estudos anteriores (BRITO; MARTÍNEZ-ÁVILA, 2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.) observa-se que fatores como a retirada de seios, a aceitação social pela identidade de gênero e o apoio familiar são fundamentais para os homens trans presentes no espaço analisado. Isso mostra que, passado um ano desde aquele estudo, os assuntos de discussão não se diferenciaram muito nessa mídia social, apenas mudaram de perspectiva, como é o caso da categoria saúde, onde o abuso físico sofrido pelo padrasto (primeira pesquisa), deu lugar à narrativa da depressão causada pela solidão em relação a parentes e amigos (segunda pesquisa). A busca pelo reconhecimento do nome social é uma constância em ambas as pesquisas, assim como a retirada e/ou não aparecimento das mamas, o que demonstra o desejo desses sujeitos de serem reconhecidos como homens pela sociedade.

A pesquisa demonstrou que os contextos de inserção social do público analisado, quando não para pior, não se modificou em relação às narrativas de Brito e Martínez-Ávila (2019BRITO, J. F.; MARTÍNEZ-ÁVILA, D. Vivências cotidianas de homens trans no Facebook: quais narrativas?. In: ROMEIRO, N. L.; MARTINS, C. W.; SANTOS, B. A. dos (ed.). Do invisível ao visível: saberes e fazeres das questões LGBTQIA+ na Ciência da Informação. Florianópolis: Rocha Gráfica e Editora, 2019. p. 501-517.). Para tanto, a necessidade em se realizar e promover estudos dessa natureza, bem como do acompanhamento desse público nas redes sociais. Seria pertinente, nesse caso, a supervisão das postagens do grupo do Facebook aqui analisado, em prol de se verificar se o teor de depreciação que essas pessoas sofrem estão diminuindo ou aumentando com o tempo, pois, trata-se de uma amostra do todo populacional.

As narrativas, bem como as comparações dos discursos aqui apresentadas, não esgotam a discussão de todas as vivências e experiências de homens trans, se restringindo a um grupo específico e elucidando algumas das temáticas envolvidas no processo de sociabilidade, em lugares de fala, nos âmbitos das mídias sociais. Nessa prerrogativa, estudos futuros poderiam se dedicar a outros ambientes de mídias sociais, envolvendo tipologias de grupos e características da comunidade LGBT+.

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  • CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA

    2) Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
  • FINANCIAMENTO

    Esta pesquisa foi financiada pela Fundação do Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
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  • PUBLISHER

    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação. Publicação no Portal de Periódicos UFSC . As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

EDITORES

Edgar Bisset Alvarez, Ana Clara Cândido, Patrícia Neubert e Genilson Geraldo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2022
  • Aceito
    25 Jan 2023
  • Publicado
    10 Fev 2023
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