Resumos
A estenose de veia central é uma das situações mais frequentes em pacientes com insuficiência renal crônica em hemodiálise. A angioplastia com o uso de stent-graft tem obtido bons resultados nestes casos. O sistema de liberação dos stents é de calibre maior, podendo dificultar sua navegabilidade em áreas de estenose ou tortuosidade acentuadas. A técnica do varal é comumente utilizada para o tratamento endovascular do aneurisma de aorta, permitindo atingir bom mecanismo de estiramento e facilitando a navegação do sistema de entrega da endoprótese. Descrevemos o caso de uma angioplastia de veia central com stent-graft na qual foi utilizada a técnica do varal para permitir a transposição da área de estenose.
derivação arteriovenosa cirúrgica; angioplastia; diálise renal
The central vein stenosis is one of the most common conditions in patients with chronic kidney failure in a hemodialysis program. In these cases, angioplasty using stent-grafts has obtained good results. The stent-graft delivery system is generally of large diameter what can hinder its navigability in very severe stenosis or tortuosities. The through-and-through technique is commonly used for endovascular treatment of aortic aneurysms, making possible to achieve a good mechanism of stretch and easy navigation of the endograft delivery system. We report a case of a central venous stenosis in wich a stent-graft was inserted using the through-and-through technique in order to cross the lesion.
arteriovenous shunt, surgical; angioplasty; dialysis
RELATO DE CASO
Utilização da técnica do varal para angioplastia de estenose de veia central com stent-graft
Utilization of the through-and-through technique for central vein angioplasty using stent-graft
Ricardo Wagner da Costa MoreiraI; David Domingos Rosado CarrilhoII; Liana Berúcia Freire de OliveiraIII; Charmy Cleython Fernandes de AraújoIV; Raissa Gabriela Vieira da Câmara BarrosV; Bruno Alexandre Barbosa do NascimentoV
ICirurgião Vascular da Clínica Vascular de Natal; Professor auxiliar da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Natal (RN), Brasil
IICirurgião Vascular da Clínica Vascular de Natal Natal (RN), Brasil
IIICirurgiã Vascular da Clínica Vascular de Natal; Cirurgiã Vascular da UFRN Natal (RN), Brasil
IVMédico Nefrologista do Hospital Estadual Monsenhor Walfredo Gurgel e do Natal Hospital Center Natal (RN), Brasil
VAcadêmica(o) de Medicina da UFRN Natal (RN), Brasil
Correspondência Correspondência Ricardo Wagner da Costa Moreira Av. Campos Sales, 759 / apto 800 Tirol CEP 59020-300 Natal (RN), Brasil E-mail: ricardowcm@yahoo.com.br
RESUMO
A estenose de veia central é uma das situações mais frequentes em pacientes com insuficiência renal crônica em hemodiálise. A angioplastia com o uso de stent-graft tem obtido bons resultados nestes casos. O sistema de liberação dos stents é de calibre maior, podendo dificultar sua navegabilidade em áreas de estenose ou tortuosidade acentuadas. A técnica do varal é comumente utilizada para o tratamento endovascular do aneurisma de aorta, permitindo atingir bom mecanismo de estiramento e facilitando a navegação do sistema de entrega da endoprótese. Descrevemos o caso de uma angioplastia de veia central com stent-graft na qual foi utilizada a técnica do varal para permitir a transposição da área de estenose.
Palavras-chave: derivação arteriovenosa cirúrgica; angioplastia; diálise renal.
ABSTRACT
The central vein stenosis is one of the most common conditions in patients with chronic kidney failure in a hemodialysis program. In these cases, angioplasty using stent-grafts has obtained good results. The stent-graft delivery system is generally of large diameter what can hinder its navigability in very severe stenosis or tortuosities. The through-and-through technique is commonly used for endovascular treatment of aortic aneurysms, making possible to achieve a good mechanism of stretch and easy navigation of the endograft delivery system. We report a case of a central venous stenosis in wich a stent-graft was inserted using the through-and-through technique in order to cross the lesion.
Keywords: arteriovenous shunt, surgical; angioplasty; renal dialysis.
Introdução
A estenose ou oclusão de veia central é um problema comum nos pacientes com insuficiência renal crônica e geralmente está relacionada ao uso prévio de cateteres1. A incidência do problema tem sido relatada na literatura como presente em 25 a 40% dos pacientes em hemodiálise2. Essas lesões comumente são muito rígidas e de difícil recanalização quando ocluídas, de forma que quando se tornam sintomáticas podem levar a edema do membro homolateral ao acesso arteriovenoso ou edema da face1. De acordo com a Kidney Disease Outcomes Quality Initiative (KDOQI), toda fístula arteriovenosa (FAV) com estenose de pelo menos 50% deve ser tratada3. Opções terapêuticas disponíveis são: ligadura da fístula arteriovenosa, intervenção cirúrgica com criação de uma ponte veno-venosa ou abordagem endovascular com angioplastia transluminal percutânea da lesão estenótica com ou sem a colocação de stent1.
Apesar de não existirem estudos na literatura que indiquem a superioridade do stent em relação à angioplastia com balão, há claramente um grupo de pacientes que não é responsivo somente a este tipo de angioplastia, necessitando do implante de stent4,5. O uso de stents recobertos, ou stent-graft, parece trazer melhores resultados do que quando utilizados os não recobertos, com perviedade relatada de até 100% em 9 meses4,5.
O uso de stent-graft em veias centrais requer sempre a utilização de calibres maiores devido ao diâmetro das veias subclávias e braquiocefálicas. O cateter sobre o qual os stent-grafts de grande calibre estão montados (shaft) apresenta diâmetro também maior, o que pode tornar mais difícil a navegação do sistema em áreas tortuosas ou a transposição em áreas de estenose muito acentuada, condições frequentemente encontradas em pacientes com estenose de veia central.
O tratamento endovascular de aneurisma da aorta abdominal e torácica utiliza endopróteses de grande calibre do sistema de entrega, e, em aortas tortuosas ou com áreas de estreitamento, a navegação do sistema pode tornar-se difícil. Nessas condições, algumas técnicas mostram-se úteis, como é o caso da do varal6,7.
A técnica do varal utilizada para correção de aneurisma de aorta consiste na passagem de um fio-guia da artéria femoral até a braquial e posterior tração das suas extremidades, com retificação por um mecanismo de estiramento. Dessa forma, proporciona melhor passagem do sistema condutor da endoprótese e posterior colocação do stent com maior facilidade4,8,9.
O presente artigo tem como objetivo relatar o procedimento de angioplastia de veia braquiocefálica utilizando stent-graft associado à técnica do varal como forma de contornar a dificuldade de progressão do sistema de liberação, permitindo a realização do procedimento endovascular com sucesso.
O Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, determina que, para os artigos no formato de relato de caso, é necessário apenas o consentimento informado por escrito do paciente, o qual foi feito neste caso.
Relato do caso
Paciente do sexo masculino, com 57 anos, hipertenso e diabético, em hemodiálise por meio de uma fístula arteriovenosa bráquio-basílica esquerda. Tem história de uso de múltiplos cateteres para hemodiálise de longa e curta permanência em região cervical e femoral bilateralmente. A aproximadamente três meses da realização do estudo, referiu que houve início de edema progressivo no membro superior esquerdo e face, associado a pequenas variações de fluxo durante as sessões de hemodiálise, porém nunca inferior a 350 mL/min. No exame físico apresentava edema acentuado em todo o membro superior esquerdo e hemiface esquerda, além de FAV com bom frêmito.
O paciente foi submetido a arteriografia, a qual evidenciou FAV bráquio-basílica pérvia, anastomose sem estenoses e presença de estenose significativa em toda a extensão da veia braquiocefálica esquerda, com circulação colateral a nível cervical (Figura 1).
Em um segundo momento foi programado o tratamento endovascular da estenose encontrada, utilizando um stent-graft, realizada punção da veia basílica e colocado introdutor 4F para realizar angiografias de controle durante o procedimento. Na sequência houve punção da veia femoral comum direita e colocação de introdutor 12F. Seguiu-se heparinização sistêmica com 5 mil UI de heparina. Houve transposição da área de estenose utilizando fio-guia 0,035" hidrofílico e cateter Headhunter 5F, e troca do fio-guia 0,035" por um fio-guia 0,025" adequado ao stent-graft. Foi utilizado um stent-graft Viabahn® 13×100 mm (W. L. Gore, Flagstaff, EUA), mas não se conseguiu a transposição da lesão com o sistema de entrega do Viabahn, e qualquer tentativa de empurrar o sistema com mais força ocasionava a saída do fio-guia da área de estenose, sendo necessário transpor a estenose novamente.
Por meio do introdutor posicionado na veia basílica foi introduzido um cateter goose-neck, e a extremidade do fio-guia 0,025" posicionada na veia axilar foi "laçada", estabelecendo-se, assim, a técnica do varal e proporcionando um mecanismo de estiramento suficiente para permitir a navegação do sistema (Figura 2). Após isto, o Viabahn conseguiu transpor a lesão e foi adequadamente posicionado e liberado. Foi realizada pós-dilatação com cateter-balão Conquest® 12×40 mm (Bard, Covington, EUA). Para o posicionamento adequado deste balão foi necessário manter a técnica do varal, porém utilizando um fio-guia 0,035" Amplatz Extra-stiff (Figura 3). Procedeu-se à retirada dos introdutores e hemostasia por compressão local.
A angiografia de controle mostrou tratamento adequado da lesão e desaparecimento da circulação colateral, um sinal indireto da efetividade da angioplastia.
Discussão
As estenoses e tortuosidades acentuadas podem tornar extremamente difícil a progressão dos cateteres-balão ou dispositivo de liberação dos stents-graft, por estes serem mais calibrosos. Neste caso, a dificuldade ocorreu devido ao calibre do sistema de entrega do stent-graft dificultar a passagem do sistema na área de estenose e, principalmente, à dificuldade de navegabilidade nas tortuosidades presentes ao longo da veia subclávia e braquiocefálica.
A chamada técnica do varal é classicamente descrita para a correção endovascular de aneurisma de aorta abdominal e torácica2,6,7. Conseguimos transportar a experiência adquirida com o uso desta técnica para solucionar o problema encontrado durante uma angioplastia de veia central. Neste caso, o fio-guia foi passado desde a veia femoral até a da FAV, proporcionando o mecanismo de estiramento suficiente para conseguir a navegabilidade do sistema de liberação do stent-graft.
Dessa forma, a técnica do varal mostra que é útil não apenas para os casos de tratamento endovascular de aneurisma da aorta, mas também obtendo sucesso em casos de angioplastia de veia central.
Submetido em: 05.12.11.
Aceito em: 02.03.12.
Fonte de financiamento: nenhuma.
Conflito de interesses: nada a declarar.
Contribuições dos autores
Concepção e desenho do estudo: RWCM
Análise e interpretação dos dados: RWCM, DDRC, LBFO
Coleta de dados: RGVCB, BABN
Redação do artigo: RWCM, RGVCB, BABN
Revisão crítica do texto: DDRC, LBFO, CCFA
Aprovação final do artigo*: RWCM, DDRC, LBFO, CCFA, RGVCB, BABN
Análise estatística: RWCM
Responsabilidade geral pelo estudo: RWCM
*Todos os autores leram e aprovaram a versão final submetida ao J Vasc Bras
Trabalho realizado no Hospital Promater Natal (RN), Brasil.
Trabalho apresentado como pôster eletrônico durante o Congresso SoBRICE 2011, entre 10 e 13 de agosto de 2011 em Búzios (RJ).
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Correspondência
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
17 Out 2012 -
Data do Fascículo
Set 2012
Histórico
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Recebido
05 Dez 2011 -
Aceito
02 Mar 2012