Open-access Influência de uma sessão de exercício aeróbico submáximo e máximo sobre o transporte mucociliar e função autonômica em tabagistas

Influencia de una sesión de ejercicio aeróbico submáximo y máximo sobre el transporte mucociliar y la función autonómica en fumadores

RESUMO

O objetivo do estudo foi avaliar e correlacionar o comportamento da depuração mucociliar e do sistema nervoso autônomo de fumantes após sessões de exercício aeróbico submáximo e máximo. Foram avaliados 25 fumantes e 15 não fumantes, entre 30 e 50 anos. Ambos os grupos foram submetidos ao teste do tempo de trânsito de sacarina (TTS) e variabilidade da frequência cardíaca (VFC) antes e após uma sessão de exercício submáximo (teste de caminhada de seis minutos) e máximo (teste de exercício cardiopulmonar). Teste t pareado ou Wilcoxon foi utilizado para análise intragrupos e o teste t não pareado ou Mann-Whitney para a análise intergrupos. A correlação foi realizada utilizando os coeficientes de Pearson ou Spearman (p <0,05). Houve redução significativa do TTS após exercícios submáximo e máximo em ambos os grupos. Após o exercício submáximo, ambos grupos apresentaram redução significativa do intervalo RR e aumento da FC em comparação ao repouso, no grupo de não fumantes houve reduções significativas nos índices RMSSD, HFms² e SD1. Após o exercício máximo, ambos grupos apresentaram reduções significativas no SDNN, RMSSD, intervalo RR, LF e HF, em ms² e un, SD1 e SD2, além do aumento da FC, LFun e da razão LF/HF. Houve correlação positiva entre TTS e LFms² (r = 0,520, p = 0,008) após o exercício máximo para o grupo de fumantes. Conclui-se que independentemente da intensidade do exercício aeróbio, houve um aumento na depuração mucociliar em fumantes, mas essa alteração parece ser influenciada pelo sistema nervoso autônomo apenas frente o exercício máximo.

Descritores: Depuração Mucociliar; Sistema Nervoso Autônomo; Tabagismo; Exercício

RESUMEN

El objetivo de este estudio fue evaluar y correlacionar el comportamiento de la depuración mucociliar y del sistema nervioso autónomo de fumadores después de sesiones de ejercicio aeróbico submáximo y máximo. Se evaluaron a 25 fumadores y a 15 no fumadores de entre 30 y 50 años de edad. Ambos grupos se sometieron a la prueba de tiempo de tránsito de sacarina (TTS) y la variabilidad de la frecuencia cardíaca (VFC) antes y después de una sesión de ejercicio submáximo (prueba de caminata de seis minutos) y de ejercicio máximo (prueba de esfuerzo cardiopulmonar). Para el análisis intragrupo se utilizó la prueba t pareada o Wilcoxon, y para el análisis intergrupal, la prueba t no pareada o Mann-Whitney. Para realizar la correlación se utilizaron los coeficientes de Pearson o Spearman (p<0,05). Hubo una reducción significativa en TTS después de ejercicios submáximo y máximo en ambos grupos. Después del ejercicio submáximo, ambos grupos mostraron una reducción significativa en el intervalo RR y un aumento en la FC en comparación con el reposo; en el grupo de no fumadores hubo reducciones significativas en los índices RMSSD, HFms² y SD1. Después del ejercicio máximo, ambos grupos mostraron reducciones significativas en SDNN, RMSSD, intervalo RR, LF y HF, en ms² y un, SD1 y SD2, además de un aumento de FC, LFun y la relación LF/HF. Hubo una correlación positiva entre TTS y LFms² (r=0,520, p=0,008) después del ejercicio máximo para el grupo de fumadores. Se concluye que, de manera independiente a la intensidad del ejercicio aeróbico, hubo un aumento de la depuración mucociliar en los fumadores, pero este cambio parece haber sido influido por el sistema nervioso autónomo solamente en el ejercicio máximo.

Palabras clave: Depuración Mucociliar; Sistema Nervioso Autónomo; Tabaquismo; Ejercicio

ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate and to correlate the behavior of mucociliary clearance and the autonomic nervous system of smokers after submaximal and maximal aerobic exercise sessions. We evaluated 25 smokers and 15 nonsmokers aged between 30 and 50 years. Both groups were submitted to the saccharin transit time (STT) test and heart rate variability (HRV) before and after a submaximal (six-minute walk test) and maximal (cardiopulmonary test) exercise. Paired t-test or Wilcoxon were used for intragroup analysis and the unpaired t-test or Mann-Whitney for intergroup analysis. The correlation was performed using Pearson or Spearman coefficients (p<0.05). Saccharine transit time reduced significantly after submaximal and maximal exercises in both groups. After the submaximal exercise, both groups presented significant reduction of the RR interval and increased heart rate (HR). In the nonsmoker group there were significant reductions in the RMSSD, HFms² and SD1 indexes. After maximal exercise, both groups showed significant reductions in SDNN, RMSSD, RR, LF and HF interval, in ms² and normalized units, SD1 and SD2, in addition to the increase in HR, LFun, and LF/HF ratio. STT positively correlated with LFms² (r = 0.520, p = 0.008) after the maximal exercise for the smoker group. We concluded, that regardless of the intensity of aerobic exercise, mucociliary clearance increases in smokers, but this alteration seems to be influenced by the autonomic nervous system only during maximum exercise.

Keywords: Mucociliary Clearance; Autonomic Nervous System; Smoking; Exercise

INTRODUÇÃO

O tabagismo pode promover diversas alterações no organismo, dentre elas, as que ocorrem na modulação autonômica1 e no transporte mucociliar (TMC) 2), (3. Na modulação autonômica, ocorre ativação simpática e retirada vagal4 e em decorrência das alterações da mucosa respiratória, composição do muco, estrutura e função ciliar2), (5), (6, tabagistas apresentam aumento do tempo de TMC o que pode estar diretamente associado a carga tabagística6, entretanto, após a cessação do tabagismo esse quadro pode ser revertido7.

O exercício físico também pode acelerar o tempo da TMC8, sugerindo que a hiperventilação pulmonar e estimulação simpática9 após o exercício acelera o batimento ciliar, o que facilita a eliminação de partículas nocivas ao sistema respiratório, potencializando sua ação de defesa10), (11. No entanto, em tabagistas ainda não está claro os efeitos do exercício aeróbico submáximo e máximo na depuração mucociliar e a influência do sistema nervoso autônomo frente a diferentes intensidades de exercício.

Portanto, considerando que o tabagismo promove alterações tanto no TMC quanto na modulação autonômica e que o exercício físico pode acelerar o TMC o que, pelo menos em partes, está relacionado à alterações do sistema nervoso autônomo, é de suma importância para a prática clínica avaliar se isso também ocorre em indivíduos tabagistas frente à diferentes intensidades do exercício físico, já que o exercício físico é um recurso terapêutico que pode ser utilizado no tratamento clínico de tabagistas. Portanto, este estudo teve por objetivo avaliar as alterações e relações do comportamento do TMC nasal e da modulação autonômica de tabagistas após um estímulo de exercício aeróbico submáximo e máximo.

METODOLOGIA

Estudo prospectivo e transversal realizado com 69 participantes com idade entre 30 e 50 anos, alocados para o grupo tabagistas (n=44) e grupo de não tabagistas (controle, n=25). Destes, 29 perderam follow-up, sendo 14 por não comparecimento e 15 por outras razões. Assim, a amostra final inclui 40 participantes, sendo 25 tabagistas e 15 não tabagistas (Figura 1).

Os critérios de inclusão foram: indivíduos fisicamente inativos (que não realizassem atividade física regular por 20 minutos contínuos, três vezes na semana), função pulmonar normal confirmada por espirometria e ausência de doenças cardiorrespiratórias, metabólicas, neuromusculares e esqueléticas conhecidas. Para o grupo tabagista foram incluídos indivíduos com histórico de consumo tabagístico de, no mínimo, 20 cigarros por dia por pelo menos um ano. Os critérios de exclusão foram: não compreensão ou não colaboração do voluntário em relação aos procedimentos e métodos da pesquisa, ausência em um dos protocolos de exercício, infecções respiratórias recentes, desvio de septo nasal, histórico de cirurgia ou trauma nasal e etilismo ou qualquer condição adversa de saúde que pudesse interferir no desempenho do exercício ou modulação autonômica.

Figura 1
Fluxograma do estudo

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa (processo nº 223.033). Os sujeitos foram informados sobre os objetivos e procedimentos do estudo e após assinarem o termo de consentimento foram incluídos na pesquisa.

O protocolo foi realizado em três dias não consecutivos. Todas as avaliações foram realizadas no período matutino em ambiente com temperatura (22,93±1,32°C) e umidade relativa do ar controladas (53,96±3,82%). Os indivíduos foram instruídos a realizarem refeições leves 2-h antes das avaliações e a se absterem de álcool, cafeína, cigarro e atividade física vigorosa por 12-h antes das avaliações.

No primeiro dia de protocolo, todos os indivíduos foram submetidos a uma avaliação inicial, que incluía entrevista para coleta de dados pessoais, mensuração antropométrica, estado geral de saúde (comorbidades e história de cirurgia e trauma nasal), histórico tabagístico e nível de dependência à nicotina avaliado por meio do teste de Fagerstrom12. A mensuração do monóxido de carbono do ar exalado (COex, ponto de corte de 10 ppm13) foi avaliado por meio da técnica padrão usando o analisador de monóxido de carbono (Micro CO, Micro Medical Ltd. apparatus, Rochester, Kent, UK) 14, e a avaliação da função pulmonar foi realizada por meio da espirometria (VEF1/CVF >70% - Spirobank 3.6, Medical International Research, Rome, Italy) de acordo com as normas do American Thoracic Society e European Respiratory Society15 utilizando valores de referência para a população brasileira16.

Os outros dois dias de protocolo foram realizados com um intervalo mínimo de 48 horas entre eles. Em um dos dias realizou-se o exercício físico submáximo por meio do teste de caminhada de seis minutos (TC6’) de acordo com o guia da American Thoracic Society17 e no outro o exercício físico máximo por meio do teste progressivo exaustivo em esteira ergométrica18 com analisador de gases (VO2000, Medical Graphics, EUA). Foi considerado exercício máximo quando pelo menos dois dos seguintes critérios foram atendidos: FC atingida >90% da FC máxima (220-idade); percepção subjetiva de esforço19 acima de 17; eventual platô no gráfico de consumo de oxigênio (VO2 l/min) diante de um aumento na carga de esforço e relação dos equivalentes respiratórios dióxido de carbono e consumo de oxigênio (QR) >1,119)- (21.

Antes da realização dos protocolos de exercício físico, os indivíduos permaneceram sentados em repouso por 20 minutos para estabilização das variáveis cardiorrespiratórias e captação da frequência cardíaca batimento a batimento por meio de um cardiofrequencímetro Polar S810i (Polar Electro, Kempele, Finlândia) 22), (23. Em seguida, realizou-se a coleta de COex e foi realizado o teste de tempo de trânsito de sacarina (TTS) 2),(3),(7),(8),(24),(25.

Os protocolos de exercícios foram iniciados após a primeira percepção de um gosto doce na boca. Para evitar a influência da frequência respiratória sobre o TMC as avaliações foram repetidas após dez minutos do término de ambos os exercícios, deste modo, coletou-se novamente o COex, em seguida o TTS e a frequência cardíaca batimento a batimento foi coletada até a percepção do gosto da sacarina.

A frequência cardíaca batimento a batimento foi registrada em repouso, na posição sentada durante 20 minutos antes e após os protocolos de exercício até a percepção do gosto doce na boca durante o TTS. Para análise dos índices de variabilidade da frequência cardíaca (VFC) em cada protocolo, foram selecionados 256 intervalos RR (oscilações dos intervalos entre batimentos cardíacos consecutivos) na fase mais estável durante o repouso inicial e durante a avaliação final do TTS, ou seja, 256 batimentos cardíacos prévios ao momento exato que os indivíduos relataram terem sentido o gosto da sacarina.

O trecho selecionado foi submetido a uma filtragem digital (software Polar Precision Performance SW, versão 4.01.029) complementada por manual e somente séries com mais de 95% de batimentos sinusais foram incluídas no estudo. O software Kubios (Biosignal and Medical Image Analysis Group, Department of Physics, University of Kuopio, Kuopio, Finland) 26 foi utilizado para cálculo dos índices de VFC, como: intervalos RR, raiz quadrada da média do quadrado das diferenças entre os intervalos RR normais adjacentes (RMSSD, expresso em ms) e desvio-padrão da média dos intervalos RR normais (SDNN, expresso em ms). No domínio frequência foram analisados os componentes espectrais de baixa (LF, 0,04 - 015 Hz) e alta frequência (HF, 0,15 - 0,40 Hz), em unidades normalizadas (un) e em milissegundos ao quadrado (ms2) e a razão entre estes componentes (relação LF/HF) 22),(27),(28. A análise realizada no domínio da frequência foi calculada utilizando o algoritmo da Transformada Rápida de Fourier29.

O plot de Poincaré foi realizado para calcular os seguintes índices: SD1 (desvio-padrão da variabilidade instantânea batimento a batimento) e SD2 desvio-padrão dos intervalos RR contínuos da variabilidade de longa duração) 22),(27),(29.

Para análise foi utilizado o programa estatístico SPSS 22.0. A normalidade dos dados foi realizada por meio do teste de Shapiro-Wilk. Para a comparação intragrupos foi utilizado o teste t pareado ou teste de Wilcoxon, de acordo com a normalidade dos dados. Para análise entre os grupos utilizou-se o teste t não pareado para dados com distribuição normal ou teste de Mann-Whitney para aqueles com distribuição não normal. As análises de correlações foram realizadas por meio dos coeficientes de Pearson ou Spearman de acordo com a normalidade dos dados. O nível de significância adotado para todos os testes foi de p<0,05.

RESULTADOS

Na Tabela 1 estão apresentadas as características basais dos dois grupos avaliados.

Tabela 1
Caracterização da amostra quanto ao gênero, idade, medidas antropométricas, índices espirométricos, capacidade física e histórico tabagístico

Na análise intragrupo tanto no exercício submáximo quanto máximo houve redução no TTS pós-exercício em ambos os grupos. Já nos índices da VFC o grupo tabagista apresentou redução significativa apenas do intervalo RR e aumento significativo da FC em comparação ao momento pré-exercício submáximo enquanto que no grupo controle foram observados valores significativamente menores dos índices RMSSD, intervalo RR, HFms² e SD1 e aumento significativo da FC no pós-exercício em comparação ao momento pré-exercício submáximo. Com relação ao exercício máximo, ambos os grupos apresentaram redução significativa dos índices SDNN, RMSSD, intervalo RR, LFms2, HFms² e un, SD1 e SD2 e aumento dos índices FC, LFun e relação LF/HF (Tabela 2).

Tabela 2
Dados de monoximetria, TMC e variabilidade da frequência cárdica dos grupos antes e após exercício submáximo e máximo

A Tabela 3 apresenta as análises dos deltas intragrupos e entre os grupos. O grupo tabagista apresentou diminuição significativa durante o exercício máximo em comparação ao exercício submáximo para os índices SDNN, RMSSD, intervalo RR, LFms², HFms² e un, SD1 e SD2 e aumento no índice FC e LF/HF. No grupo controle também houve diminuição significativa dos índices SDNN, RMSSD, intervalo RR, HFms² e un, SD1 e SD2 e aumento dos índices FC, LFun e LF/HF no exercício máximo comparado com o submáximo.

Tabela 3
Magnitude de resposta dos grupos avaliados de acordo com os deltas de exercício submáximo e máximo na monoximetria, transporte mucociliar e índices de variabilidade da frequência cardíaca. Dados expressos em média e desvio-padrão

Houve correlação positiva entre TTS e o índice LFms² (r= 0,520; p=0,008) no exercício máximo para o grupo tabagista e correlação negativa entre TTS e os índices SDNN (r= -0,833; p<0,0001), RMSSD (r= -0,614; p=015), HFms2 (r= -0,645; p=0,009), SD1 (r= -0,623, p=0,013) e SD2 (r= -0,832; p<0,0001) no grupo controle pós exercício máximo.

DISCUSSÃO

Os resultados do presente estudo mostraram aceleração do TMC nasal de tabagistas e não tabagistas após uma sessão de exercício físico submáximo e máximo. Com relação à VFC, no exercício submáximo ambos os grupos apresentaram redução do intervalo RR e aumento da FC e no grupo não tabagista também foram observadas reduções dos índices RMSSD, HFms² e SD1 e aumento dos índices LFun e relação LF/HF, no entanto não houve diferença na magnitude de resposta entre os grupos neste estímulo. Já para o exercício máximo ambos os grupos apresentaram alterações nos índices da VFC caracterizadas por diminuição da modulação parassimpática e aumento dos índices FC, LFun e relação LF/HF. Além disso, foi observado uma correlação positiva entre o TTS e o índice LFms² no grupo tabagista e correlação negativa entre TTS e os índices SDNN, RMSSD, HFms2, SD1 e SD2 no grupo não tabagista pós exercício máximo.

A aceleração do TMC em ambos os grupos após o exercício corrobora com resultados obtidos em outros estudos10),(11),(24),(30. Ramos et al. 24 compararam o comportamento do TMC de indivíduos tabagistas frente a três estímulos (exercício aeróbico moderado isolado - 60-70% VO2max, exercício aeróbico moderado combinado ao fumo e fumo isolado) e verificaram que todos os estímulos aceleraram o TMC em comparação ao repouso. Outros autores também encontraram aceleração do TMC frente ao exercício, porém em indivíduos saudáveis10),(11.

A resposta mucociliar acelerada frente ao exercício físico parece ser influenciada, pelo menos em parte, pelo sistema nervoso autônomo (SNA), pois a hiperventilação pulmonar estimula os receptores centrais (quimioceptores) que por sua vez, estimulam a atividade autonômica do ramo simpático e como consequência, há o aumento dos níveis de catecolaminas (epinefrina e norepinefrina) que aceleram o batimento ciliar10), (31. Concomitantemente, essa hiperventilação promove a irradiação cortical sobre a região bulbar que resulta na retirada vagal progressiva32, potencializando a atuação simpática sobre o batimento ciliar e reduzindo o TTS10.

Após o exercício submáximo e máximo, tanto tabagistas como não tabagistas apresentaram redução dos intervalos RR (ms) e aumento da FC, indicando que a frequência cardíaca desses indivíduos se mantém elevada no período pós-exercício analisado. No exercício submáximo apenas o grupo controle apresentou diminuição significativa dos índices RMSSD, HFms² e SD1 no período pós exercício em comparação ao repouso, sugerindo que esses indivíduos ainda não tiveram recuperação da modulação parassimpática pós-exercício. Esse comportamento não foi observado no grupo tabagista que, exceto para os intervalos RR, não apresentou diferenças significativas para os índices de VFC nessa mesma condição, o que indica que esses indivíduos estavam recuperados do ponto de vista autonômico. Os resultados apresentados podem estar relacionados à menor intensidade realizada no TC6’ pelos tabagistas, pois neste teste o participante faz seu próprio ritmo, diferente do teste máximo onde se é imposto uma velocidade e inclinação até o seu esforço máximo. Deste modo, a recuperação da modulação autonômica cardíaca no trabalho submáximo com menor intensidade é mais rápida, o que pode ter acontecido antes do término da avaliação do TMC nasal neste grupo.

Já no exercício máximo, ambos os grupos apresentaram respostas autonômicas que indicam que eles ainda não se recuperaram no momento avaliado. Durante exercícios de alta intensidade a recuperação é mais lenta, pois as alterações induzidas no exercício são mais intensas33),(34 o que justifica as respostas apresentadas e permite avaliar a influência dessas modificações no TMC nasal.

Em relação à correlação da modulação autonômica e TMC nasal, os resultados mostraram uma correlação positiva entre o TTS e o índice LFms² no grupo tabagista e correlação negativa entre TTS e os índices SDNN, RMSSD, HFms2, SD1 e SD2 no grupo não tabagista pós exercício máximo. Tais alterações demonstram a influência dos ramos simpático e parassimpático do SNA sobre o batimento ciliar após o exercício máximo em ambos os grupos. Essa influência não foi observada com o exercício submáximo, pois este tipo de exercício produz menores efeitos sobre a modulação autonômica, sendo assim o aumento do TTS pode ter sido em partes provocado por efeitos mecânicos da hiperventilação pulmonar14. Resultado semelhante a esse, foi também encontrado por Santos et al. 30 que também não observaram nenhuma associação entre a modulação autonômica e a função mucociliar de tabagistas.

Como limitação do estudo podemos salientar a falta da avaliação do TMC em diferentes momentos pós-exercício, o que poderia auxiliar na melhor compreensão da ação da modulação autonômica e hiperventilação pulmonar sobre o batimento ciliar nasal. Outra limitação que pode ser considerada foi a ausência de um eletrocardiograma que pudesse assegurar que os indivíduos avaliados não apresentassem arritmias. No entanto, todos os cuidados necessários foram tomados em relação à captação da frequência cardíaca que originou a série de intervalos RR, exclusão de séries com mais de 5% de erro e filtragem e inspeção visual da série, o que nos deu segurança para sua utilização e, mesmo que o indivíduos apresentasse algum distúrbio de ritmo, isso não influenciou os resultados.

O presente estudo tem importante relevância clínica, pois sugere que a intensidade do exercício aeróbico influencia a resposta do TMC nasal de indivíduos tabagistas e não tabagistas aumentando a eficácia da função mucociliar no período pós-exercício, o que reflete em um mecanismo de defesa pulmonar mais eficiente contra infecções respiratórias e agentes nocivos ao trato respiratório. Além disso, os resultados mostraram também que a intensidade do exercício está relacionada a participação do SNA nesse processo.

CONCLUSÃO

Conclui-se que independente da intensidade do exercício aeróbico ocorre aumento do TMC nasal em tabagistas, no entanto tal alteração parece ser influenciado pelo sistema autonômico apenas frente um exercício máximo.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio financeiro no processo nº 2013/04091-0 que permitiu a realização deste estudo.

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  • 1
    Estudo realizado no Departamento de Fisioterapia, Faculdade de Tecnologia e Ciência, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Presidente Prudente (SP), Brasil.
  • 2
    Este trabalho é parte integrante da dissertação Transporte mucociliar e função autonômica de tabagistas submetidos ao esforço físico submáximo e máximo.
  • Trabalho apresentado no European Respiratory Society International Congress, 26 a 30 de setembro de 2015, Amsterdam.
  • Fonte de financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)
  • 6
    Aprovado pelo Comitê de Ética: Protocolo nº 223.033.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jan 2021
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2020
  • Aceito
    03 Out 2020
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