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Multimorbidade em idosos e seus fatores associados em 2010 e 2021

Resumo

O presente estudo teve como objetivo comparar os fatores associados à multimorbidade em idosos de 60 a 69 anos, em 2010 e 2021. Trata-se de um estudo transversal comparativo, composto por dois estudos transversais. Ambas as coletas de dados foram realizadas de forma individual por entrevistadores treinados e deu-se por inquérito domiciliar, no município de Coxilha-RS, Brasil. Utilizou-se para análise inferencial bivariada, exato de Fisher e qui-quadrado, e multivariada o teste de regressão de Poisson com variância robusta com nível de significância de p 0,05. Detectou-se que a prevalência de multimorbidade teve uma diminuição significativa, passando de 66,5% em 2010, para 41,6% em 2021. Ser dependente para atividades básicas e instrumentais da vida diária associou-se a maior prevalência para a multimorbidade no ano de 2010, contudo no ano de 2021 o ser dependente para atividades instrumentais, não saber ler/escrever e não trabalhar apresentou maior prevalência para a multimorbidade. Por fim, concluise que as condições de saúde dos idosos diferiram significativamente apontando que os cuidados de saúde também precisam ser reavaliados para tornarem-se mais efetivos

Palavras-Chave:
Multimorbidade; Idoso; Atividades Cotidianas

Abstract

The present study aimed to compare the factors associated with multimorbidity in older adults aged 60 to 69 years, in 2010 and 2021. This is a comparative cross-sectional study, comprised of other two cross-sectional studies. Both data collections were individually conducted by trained interviewers through household surveys in the municipality of Coxilha-RS, Brazil. Bivariate inferential analysis was conducted using Fisher's exact test and chi-square test, while multivariate analysis employed Poisson regression with robust variance with a significance level of p 0.05. It was observed that the prevalence of multimorbidity significantly decreased, decreasing from 66.5% in 2010 to 41.6% in 2021. Dependency for basic and instrumental activities of daily living was associated with higher prevalence of multimorbidity in the year 2010. However, in 2021, being dependent on instrumental activities, being unable to read/write, and being unemployed showed higher prevalence for multimorbidity. In conclusion, it is evident that the health conditions of older adults differed significantly over the years, highlighting the necessity for a reevaluation of healthcare practices to become more effective

Keywords
Multimorbidity; Older adults; Daily Activities

INTRODUÇÃO

Na população idosa a maior prevalência de doenças crônicas é uma realidade, para as quais cada uma possui um tratamento específico. Contudo, a presença de multimorbidade, frequentemente definida como a presença de duas ou mais condições de saúde física ou mental crônicas concomitantes11 Marengoni A, Angleman S, Melis R, et al. Aging with multimorbidity: a systematic review of the literature. Ageing research reviews. 2011;10(4):430-439. Available from:https://doi.org/10.1016/j.arr.2011.03.003
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,22 Chudasama YV, Khunti K, Gillies CL, et al. Healthy lifestyle and life expectancy in people with multimorbidity in the UK Biobank: A longitudinal cohort study. PLoS Med., 2020;17(9):e1003332.Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1003332
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e os desafios gerados por essa condição tornaram-se um problema mundial. Tendo em vista as evidências dos impactos negativos da multimorbidade sobre o indivíduo, os seus familiares, cuidadores e para o próprio sistema de saúde22 Chudasama YV, Khunti K, Gillies CL, et al. Healthy lifestyle and life expectancy in people with multimorbidity in the UK Biobank: A longitudinal cohort study. PLoS Med., 2020;17(9):e1003332.Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1003332
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,33 Barnett K, Mercer SW, Norbury M, et al. Epidemiology of multimorbidity and implications for health care, research, and medical education: a cross-sectional study. Lancet, 2012;380(9836),37–43.Available from: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(12)60240-2.
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.

Logo os indivíduos com multimorbidade demandam de uma ampla gama de cuidados visando a compreensão da complexidade única que envolve cada realidade44 Mitchell KB, Bartell S. Multimorbidity and Resident Education. Fam Med., 2021;53(7):531-534. Available from: https://doi.org/10.22454/FamMed.2021.106319.
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. Neste aspecto, os determinantes sociais têm ganhado destaque na literatura nas últimas décadas, haja vista a necessidade de atuar frente a iniquidades que afetam o acesso ao direito universal a saúde55 Pellegrini Filho A. Public policy and the social determinants of health: the challenge of the production and use of scientific evidence. Cadernos de Saúde Pública, 2011; 27(1):s135–s140. Available from: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400002.
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. Dentre as quais pode-se citar a escolaridade, as diferentes condições de acesso a informações de saúde, gerenciamento dos hábitos de vida e autocuidado66 Silva DSMD, Assumpção DD, Francisco PMSB, et al. Doenças crônicas não transmissíveis considerando determinantes sociodemográficos em coorte de idosos. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 2022; 25(5):e210204. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1981-22562022025.210204.pt.
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,77 Costa ÂK, Bertoldi AD, Fontanella AT, et al. Does socioeconomic inequality occur in the multimorbidity among Brazilian adults? RevSaude Publica, 2020; 54(1):138-149. Available from: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054002569..

Além das repercussões relacionadas a saúde, um estudo holandês estimou um incremento significativo no custo para com o cuidado de saúde de uma pessoa com multimorbidade em comparação aos que possuem somente uma doença crônica88 Chen YH, Karimi M, Rutten-van Mölken MP. The disease burden of multimorbidity and its interaction with educational level. PLoSOne.2020; 15(12): e0243275. Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0243275.
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. Portanto, acredita-se que os fatores que afetam as condições de saúde e suas repercussões podem ser diferentes ao longo do tempo, devido a diferentes níveis de informação, alteração nos cuidados de saúde, mudança de políticas de saúde, o que demandaria reavaliações periódicas quanto as políticas públicas de saúde.

Portanto, este estudo traz por objetivo analisar, os fatores associados a condição de multimorbidade entre os idosos de 60 a 69 anos em 2010 e 2021 estabelecendo um comparativo da realidade de uma mesma faixa etária.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal comparativo entre os anos de 2010 e 2021, de base censitária, realizados com a mesma metodologia, os quais teve como população-alvo os idosos, residentes no município de Coxilha, Rio Grande do Sul (RS), Brasil. Para esses estudos foram analisados os idosos entre 60 e 69 anos nos anos de 2010 e 2021. A coleta de dados foi realizada de forma individual por entrevistadores treinados e deu-se por inquérito domiciliar utilizando questionário estruturado aplicado ao idoso.

A linha de base do estudo que ocorreu no ano de 2010, período em que de acordo com dados do censo do IBGE de 2010, o município possuía índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,706 e população com cerca de 2.800 habitantes, sendo 352 indivíduos eram idosos. Na linha de base houve uma perda de 5,6%, configurada por recusa em participar da pesquisa ou o participante não ter sido encontrado após três tentativas de visita, totalizando 332 idosos. Destes, 192 foram incluídos por possuírem idade entre 60 e 69 anos. No ano de 2021, foram avaliados 520 idosos, deste 302 foram incluídos por possuírem entre 60 e 69 anos.

A variável desfecho, multimorbidade, foi definida como a existência de duas ou mais doenças crônicas em um indivíduo11 Marengoni A, Angleman S, Melis R, et al. Aging with multimorbidity: a systematic review of the literature. Ageing research reviews. 2011;10(4):430-439. Available from:https://doi.org/10.1016/j.arr.2011.03.003
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. Para tal, analisou-se a presença autorreferida de dez doenças crônicas – reumatismo, enfisema pulmonar, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, acidente vascular cerebral (AVC), artrite/artrose, problemas cardíacos, câncer, doenças de Parkinson e doença de Alzheimer.

Analisaram-se as variáveis sociodemográficas quanto a sexo, cor, estado marital, renda, escolaridade e zona de moradia. A capacidade funcional foi avaliada por meio da análise das atividades básicas e instrumentais da vida diária, para tal utilizou-se uma versão adaptada das escalas de Lawton e Katz, adaptação essa realizada na forma de agrupamento das respostas. Considerou-se dependente para as atividades básicas da vida diária (ABVD)os idosos que referiram muita dificuldade, não conseguir ou necessitar de ajuda para alimentar-se, vestir-se, cuidar da aparência, deitar e levantar da cama, ir ao banheiro e/ou locomover-se. Da mesma forma, classificou-se como dependente para atividades instrumentais da vida diária (AIVD) os idosos que possuíam muita dificuldade, não conseguiam ou necessitavam de ajuda para andar no plano, subir e descer escadas, ir da cadeira para a cama e vice-versa, andar perto de casa, medicar-se na hora, cortar unhas dos pés, utilizar transporte público, administrar finanças e/ou sair de casa99 MASCARELLO, A. Condições de vida e saúde dos idosos no município de Coxilha-RS [dissertação de mestrado]. Passo Fundo (Brasil): Universidade de Passo Fundo, Programa de Pós Graduação em Envelhecimento Humano; 2012. 132 p. Disponível em: http://tede.upf.br/jspui/bitstream/tede/1091/1/2012Andreia_Mascarelo.pdf..

Para a análise descritiva realizou-se frequência absoluta e relativa simples. Para análise inferencial bivariada (teste Exato de Fisher e qui-quadrado) e multivariada realizou-se o teste de regressão de Poisson com variância robusta. Para análise multivariada empregou-se o procedimento stepwise backward selection procedure, ou seja, no modelo de regressão foram incluídas as variáveis com p<0,20 retirando as variáveis uma a uma conforme a perda de significância estatística. O nível de significância considerado foi de p<0,05%.

O estudo de linha de base foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Passo Fundo sob parecer 148/2010. De igual forma a segunda onda da pesquisa foi enviada ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Passo Fundo e aprovado sob parecer nº 4.586.122. Todos os participantes do estudo serão preservados por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

DISPONIBILIDADE DE DADOS

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo está disponível mediante solicitação ao autor correspondente Emanuelly Casal Bortoluzzi.

RESULTADOS

Foram analisados 192 idosos no ano de 2010 e no ano de 2021 foram 302 idosos na faixa etária de 60 a 69 anos. Na Tabela 1, encontram-se dispostas as variáveis sociodemográficas e de saúde quanto a sua prevalência e a diferença estatística nos dois momentos analisados, sobre as quais percebe-se uma diminuição significativa de idosos com multimorbidade dentro da mesma faixa etária dos que não sabem ler, de analfabetos ou com menor escolaridade, dependentes para ABVD e AIVD e de idosos que continuam trabalhando.

Tabela 1
. Análise bivariada, por meio da Regressão de Poisson, das variáveis investigadas dos idosos com 60 a 69 anos de idade em2010 (primeira onda) e 2021 (segunda onda).

Na Tabela 2, consta a análise bivariada referente a fatores associados a multimorbidade entre os idosos de 60 a 69 anos no ano de 2010 e 2021. Neste percebe-se que a dependência para atividades básicas e instrumentais da vida diária e não possuir um trabalho mostraram-se fatores associados a multimorbidade em ambos os períodos. Contudo, no ano de 2021, acrescenta-se as variáveis sexo, renda, saber ler e escrever e zona de moradia como fatores associados a presença de multimorbidade.

Tabela 2
Análise multivariada, por meio da Regressão de Poisson, das variáveis sociodemográficas e de saúde de acordo com a multimorbidade entre os idosos de 60 a 69 anos (2010 n=192; 2021 n=302)
Tabela 3
. Modelo final da razão de prevalência ajustada, por meio da Regressão de Poisson com variância robusta, para fatores associados a multimorbidade nos idosos de 60 a 69 anos no ano de 2010 (n=192) e 2021 (n=302).

Na análise multivariada, na qual foram incluídas as variáveis com valor de significância ≤0,20 na análise bivariada, como resultado destaca-se que a condição associada com a maior prevalência de multimorbidade foi o ser dependente para AIVD. No ano de 2010 também se mostrou associado a maior prevalência de multimorbidade, além da dependência para AIVD, o ser dependente para ABVD. Já entre os idosos com 60 a 69 anos em 2021 não trabalhar e não saber ler e escrever aumentou a prevalência de multimorbidade em 1,15 e 1,26 vezes, respectivamente.

DISCUSSÃO

O presente estudo apresenta o perfil e a comparação entre as características investigadas nos idosos na faixa etária de 60 a 69 anos, nos anos de 2010 e 2021. Ser dependente para ABVD e AIVD e não saber ler e escrever apresentaram prevalência significativamente maior no ano de 2010. Contudo, no ano de 2021, ser dependente para ABVD, não saber ler/escrever e não trabalhar estiveram associados a uma maior prevalência de multimorbidade. Esses achados apontam para a necessidade de adequação das políticas públicas de saúde segundo a realidade do momento específico, percebendo que mesmo numa mesma realidade geográfica e contexto sociocultural, os determinantes mudam em cada geração e isso deve ser considerado.

Destaca-se que a população possui diferença significativa quanto a prevalência de multimorbidade, apresentando maior prevalência em 2010. Ainda, aponta-se que o percentual de idosos que não saber ler e escrever, dependentes para ABVD e AIVD e que continuam inseridos no mercado de trabalho, mostrou-se inferior em 2021 em comparação a realidade encontrada no ano de 2010. Igualmente, no presente estudo, contrapondo-se à literatura, a renda não representou significância frente a multimorbidade33 Barnett K, Mercer SW, Norbury M, et al. Epidemiology of multimorbidity and implications for health care, research, and medical education: a cross-sectional study. Lancet, 2012;380(9836),37–43.Available from: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(12)60240-2.
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,1515 Andrade BF, Thumé E, Facchini LA, et al. Education and income-related inequalities in multimorbidity among older Brazilian adults. PLoSOne, 2022; 17(10):e0275985. Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0275985.
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,1616 Knies G, Kumari M. Multimorbidity is associated with the income, education, employment and health domains of area-level deprivation in adult residents in the UK. Sci Rep., 2022;12(1):7280. Available from: https://doi.org/s41598-022-11310-9.
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. Reforçando que no presente estudo o nível de instrução foi determinante, diferentemente da renda referida pelo indivíduo.

Pode-se explicar a não relação entre dependência para ABVD e multimorbidade no ano de 2021 pela melhor condição de saúde dos idosos dessa faixa etária na segunda onda da pesquisa, hipótese fortalecida pela presença significativamente menor de multimorbidade entre a população, em comparação aos idosos no ano de 2010. Já para as atividades instrumentais mostraram-se presentes em ambos os contextos, o que pode justificar-se pela maior complexidade dessas tarefas em comparação as atividades básicas1010 Qian J, Ren X. Association between comorbid conditions and BADL/IADL disability in hypertension patients over age 45: Based on the China health and retirement longitudinal study (CHARLS). Medicine (Baltimore), 2016; 95(31): e4536. Available from: https://doi.org/10.1097/MD.0000000000004536.
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.

Por conseguinte, a presença de dependência nas atividades instrumentais pode ser um fator limitante para a manutenção das atividades laborais. Mesmo entre os idosos aposentados é frequente, em especial entre os que possuem a faixa etária estudada, que continuem tendo uma atividade laboral, mesmo com o decréscimo da capacidade física1111 Pinto AH, Lange C, Pastore CA, et al. Capacidade funcional para atividades da vida diária de idosos da Estratégia de Saúde da Família da zona rural. Ciência & Saúde Coletiva, 2016; 21(11): 3545–3555. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-812320152111.22182015.
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. Nesse aspecto pode-se apontar inclusive fatores que são alvos constantes de discussão frente ao serviço de previdência pública, onde se contrapõe a maior expectativa de vida e as repercussões físicas e mentais mais frequentes entre os idosos, reconhecendo a interrelação entre os aspectos físicos e sociais1212 Gómez F, Osorio-García D, Panesso L, et al. Healthy aging determinants and disability among older adults: SABE Colombia. Revista Panamericana de Salud Pública, 2021; 45(1): 1-9. Available from: https://doi.org/10.26633/RPSP.2021.98.
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13 Ci Z. Does raising retirement age lead to a healthier transition to retirement? Evidence from the US Social Security Amendments of 1983. Health Economics, 2022; 31(10): 2229-2243. Available from: https://doi.org/10.1002/hec.4572.
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-1414 Yuan B,Zhang T, Li J. Late-life working participation and mental health risk of retirement-aged workers: How much impact will there be from social security system?. Journal of Occupational and Environmental Medicine, 2022; 64(7):e409-e416.Available from: https://doi.org/10.1097/JOM.0000000000002561.
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No presente estudo ficou evidenciado que, não saber ler e escrever é um fator relacionado a uma maior prevalência de multimorbidade de forma significativa, entre os idosos investigados no ano de 2021. Essa interrelação entre fatores pode ser corroborada pelo estudo de Chen et al.88 Chen YH, Karimi M, Rutten-van Mölken MP. The disease burden of multimorbidity and its interaction with educational level. PLoSOne.2020; 15(12): e0243275. Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0243275.
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o qual aponta que a multimorbidade afeta mais as pessoas com menor escolaridade, e que o impacto negativo frente as atividades da vida diária foram cerca de três vezes maior nos indivíduos com menor escolaridade. Quanto a escolaridade, reconhecidamente apresenta-se constantemente como uma variável que influência em aspectos relacionados a saúde77 Costa ÂK, Bertoldi AD, Fontanella AT, et al. Does socioeconomic inequality occur in the multimorbidity among Brazilian adults? RevSaude Publica, 2020; 54(1):138-149. Available from: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054002569.,1515 Andrade BF, Thumé E, Facchini LA, et al. Education and income-related inequalities in multimorbidity among older Brazilian adults. PLoSOne, 2022; 17(10):e0275985. Available from: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0275985.
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16 Knies G, Kumari M. Multimorbidity is associated with the income, education, employment and health domains of area-level deprivation in adult residents in the UK. Sci Rep., 2022;12(1):7280. Available from: https://doi.org/s41598-022-11310-9.
https://doi.org/s41598-022-11310-9...
-1717 Nascimento-Souza MA, Firmo JOA, Souza Júnior PRBD, et al. Sociodemographic and residential factors associated with multimorbity: results of Brumadinho Health Project. Revista Brasileira de Epidemiologia, 2022; 25(1): e220006. Available from: https://doi.org/10.1590/1980-549720220006.supl.2.
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O analfabetismo ou menor escolaridade pode ser relacionada a maior dificuldade de compreender e realizar cuidados em saúde e adotar hábitos de favoreçam a prevenção e controle das doenças crônicas, como a prática de atividade física1818 Chudasama YV, Khunti KK, Zaccardi F, et al. Physical activity, multimorbidity, and life expectancy: a UK Biobank longitudinal study. BMC Med., 2019; 17(1):108-120. Available from: https://doi.org/10.1186/s12916-019-1339-0.
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e controle do peso corporal1919 Kivimäki M, Strandberg T, Pentti J, et al. Body-mass index and risk of obesity-related complex multimorbidity: an observational multicohort study. Lancet Diabetes Endocrinol., 2022; 10(4): 253-263.Available from: https://doi.org/10.1016/S2213-8587(22)00033-X.
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.

Cabe apontar que a diminuição significativa de idosos analfabetos encontrada no presente estudo e descrita na literatura2020 Macinko J, Mullachery PH. Iniquidades em saúde relacionadas à educação em doenças não transmissíveis: uma análise da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013 e 2019. Cadernos de Saúde Pública, 2022; 38(1): e00137721. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00137721.
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demonstra uma possível melhora efetiva das políticas públicas educacionais as quais reconhecidamente repercutem positivamente nas políticas públicas de saúde2121 França T, Magnago C. Políticas, programas e ações de educação na saúde: perspectivas e desafios. Saúde em Debate, 2019; 43(spe1): 4–7. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0103-11042019S100.
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. Possibilitando que os indivíduos tenham maiores chances de realizarem uma autogestão de saúde mais adequada, seja quanto a hábitos de vida, ou quanto a correta utilização de medicamentos.

Deve-se mencionar que o período de realização da coleta de dados de 2021 coincide com a pandemia da covid-19, com reconhecidas repercussões na saúde pública, as quais são de consenso mundial. Os estudos apontam que a população idosa e com multimorbidade apresentou uma maior taxa de mortalidade2222 Muraro AP, Rocha R, Boing AC, et al. Óbitos por condições de saúde posteriores à COVID-19 no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 2023; 28(2):331–336. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232023282.16752022.
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, o que pode ter influenciado em uma menor prevalência da condição estudada no estudo realizado de 2021. Considerando essa hipótese, fortalece a justificativa da relevância de conhecimento sobre a multimorbidade e seus fatores associados, sobre os quais é possível atuar quanto a prevenção e controle, possibilitando a melhora nas condições de saúde da população idosa.

O estudo apresentou como principal limitação a utilização de informações autorreferidas o que pode causar subnotificação de alguma condição. Contudo, destaca-se que esta é uma pesquisa censitária, de base populacional, com ampla gama de informações, realizada em dois momentos distintos, fato que possibilita informações mais precisas sobre o público-alvo.

CONCLUSÃO

O presente estudo conclui que entre os idosos de 60 a 69 anos, em 2010, a dependência nas atividades básicas e instrumentais da vida diária estiveram associados à multimorbidade. Já nesta mesma faixa etária em 2021, ser dependente para as atividades instrumentais da vida diária, não saber e escrever e não trabalhar foram as condições que se mostraram associadas a multimorbidade.

Analisar municípios de pequeno porte possibilita uma análise mais ampla e complexa, como a executada neste estudo censitário, trazendo assim informações quanto as mudanças nas condições de saúde ao longo do tempo. Espera-se que os resultados e a iniciativa em estudar os idosos residentes em municípios de pequeno porte sejam considerados de estímulo a futuras pesquisas, haja vista que a maioria dos estudos focaliza os grandes centros, realidade que pode não representar a todos, e contribuam para a diminuição da prevalência de multimorbidade por meio de ações frente aos fatores associados. Ainda, ao conhecer a realidade dos idosos jovens permite atuar frente a prevenção e melhor qualidade de vida nas faixas etárias subsequentes.

AGRADECIMENTO

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – código de financiamento 001.

  • Não houve financiamento para a execução desse trabalho.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS

    Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo está disponível mediante solicitação ao autor correspondente Emanuelly Casal Bortoluzzi.

REFERÊNCIAS

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Editado por

Editado por: Isac Davidson S. F. Pimenta

Disponibilidade de dados

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo está disponível mediante solicitação ao autor correspondente Emanuelly Casal Bortoluzzi.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    09 Out 2023
  • Aceito
    29 Fev 2024
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