Open-access DESAFIOS NA ORIENTAÇÃO DE PESQUISADORES QUALITATIVOS CRÍTICOS NO BRASIL E NA COLÔMBIA

CHALLENGES IN GUIDING CRITICAL QUALITATIVE RESEARCHERS IN BRAZIL AND COLOMBIA

DESAFÍOS EN LA ORIENTACIÓN DE INVESTIGADORES CUALITATIVOS CRÍTICOS EN BRASIL Y COLOMBIA

Resumo

O artigo analisa desafios no processo de orientação de pesquisadores qualitativos críticos nas pós-graduações em saúde pública/coletiva com base nas experiências de uma pesquisadora brasileira e um pesquisador colombiano. Discute-se o significado de “crítico” e como esse conceito vem sendo empregado no campo da saúde, de modo a ser demarcado o que se entende por pesquisador qualitativo crítico. Na sequência, os autores refletem sobre suas experiências em seus respectivos programas, indicando potencialidades e desafios no processo, bem como estratégias de que lançam mão para desenvolver essa complexa missão.

Palavras-chave
Pesquisa qualitativa; Pesquisa crítico-qualitativa; Orientação de pesquisadores; Saúde coletiva

Abstract

The article analyzes challenges in the process of guiding critical qualitative researchers in postgraduate studies in public/collective health based on the experiences of a Brazilian researcher and a Colombian researcher. The meaning of “critical” is discussed and how this concept has been used in the health field, in order to define what is meant by a critical qualitative researcher. Next, the authors reflect on their experiences in their respective programs, indicating potentialities and challenges in the process, as well as strategies they use to develop this complex mission.

Keywords
Qualitative research; Critical-qualitative research; Guidance of researchers; Collective health

Resumen

El artículo analiza los desafíos en el proceso de orientación de investigadores cualitativos críticos en cursos de posgrado en salud pública/colectiva a partir de las experiencias de una investigadora brasileña y un investigador colombiano. Se discute el significado de “crítico” y cómo se ha utilizado este concepto en el campo de la salud, con el fin de definir qué se entiende por investigador cualitativo crítico. A continuación, los autores reflexionan sobre sus experiencias en sus respectivos programas, señalando potencialidades y desafíos en el proceso, así como estrategias que utilizan para desarrollar esta compleja misión.

Palabras clave
Investigación cualitativa; Investigación crítico-cualitativa; Orientación de investigadores; Salud colectiva

1 O QUE SIGNIFICA O CONCEITO DE CRÍTICA NO CAMPO DA SAÚDE?

Uma primeira posição bastante generalizada na Saúde Coletiva (SC) é definir “crítico” como adesão a uma escola ou tradição sociológica – notadamente o materialismo histórico-dialético –, mesmo que a utilização seja num enquadramento hipotético-dedutivo caracterizando o que Prasad (2017) nomeia “positivismo qualitativo”, sem qualquer relação com os fundamentos do paradigma interpretativo ao qual se vinculam todas as pesquisas qualitativas.

O lugar epistemológico do materialismo histórico na SC é indiscutível, haja vista ter sido a base da epidemiologia social e crítica que é um dos discursos fundadores da Saúde Coletiva, nos anos 1960/1970, operando um corte epistemológico Althusser (1967) com a saúde pública tradicional. Alguns pensam ter ocorrido uma ruptura nos termos de Bachelard (2001), mas, na verdade, foi um corte, e a Epidemiologia não nos deixa mentir. Portanto, tem um mérito reconhecido ao servir de base para o assim chamado “Pensamento Crítico em Saúde na América Latina”.

Contudo, já em 1979, ano de criação da ABRASCO no Brasil, Jean François Lyotard anunciava em seu livro A condição Pós-Moderna o esgotamento das grandes narrativas para compreender os fenômenos contemporâneos (Lyotard, 2006); isso já àquela época. Por grandes narrativas, eu me refiro a sistemas como o “Marxismo”, “Freudismo”, Funcionalismo”, “Positivismo” e mesmo monoteorias, a exemplo de Foucault. O que Lyotard adverte é a submissão do fenômeno a esses sistemas, ou seja, uma pesquisa que serve mais para comprovar teorias, sem qualquer reflexividade. E esse é um problema para os chamados “estudos críticos” no campo da Saúde Coletiva. A Saúde Coletiva, ao que me parece, continua reproduzindo, hegemonicamente, um pensamento moderno, binário, linear, quantitativo, cujo tempo é o futuro. Produzem-se incontáveis estimativas, cálculos cada vez mais sofisticados, e, infelizmente, pesquisas qualitativas que não ultrapassam a descrição.

No campo qualitativo, as lacunas relativas aos fundamentos dão lugar a estudos descritivos, superficiais, ou os já aludidos estudos que usam teoria num enquadramento hipotético-dedutivo, ou seja, para comprová-las. As graduações na Saúde seguem reproduzindo o modelo biomédico, aprofundando-o, o que ocorre também na maior parte dos estudos de pós-graduação no nosso campo. A Epidemiologia é a formação discursiva hegemônica na Saúde Coletiva. É bom lembrar que, atualmente, muitos epidemiologistas orientam o que pensam ser Pesquisas Qualitativas. Igualmente, nos conselhos editoriais e agências de fomento emitem pareceres sobre artigos qualitativos e projetos arguindo-os do ponto de vista do paradigma positivista, e é preciso muita fundamentação para evidenciar aos editores os equívocos (Nunes, 2006).

Ainda na direção do que afirma Lyotard (2006), os filósofos que pensam o pós-moderno admitem que a modernidade como época já finalizou e que nos encontramos no que Michel Maffesoli nomeia como “período”, que é o intervalo ou transição entre duas épocas, no caso, a modernidade e a pós-modernidade. A pós-modernidade aponta para a necessidade de uma perspectiva transdisciplinar (conceito pouco assimilado na Saúde) e, sobretudo, complexa, que permita trabalhar com a ambiguidade e a contradição, vistas não mais como contradição a ser superada, como na dialética hegeliana, mas como tensão entre opostos que não encontram uma síntese, mantendo-se em tensão. Maffesoli usa a figura retórica do oxímoro para representar isso, a expressão da coexistência em tensão, indicando a necessidade de avançarmos em direção a uma nova épistémè, que se expressa na complexidade, ou pensamento complexo.

Isso nos leva a outra possibilidade de definir crítico, fundada, no plano epistemológico, na reflexividade e no distanciamento. A filosofia atribui a Kant, na Crítica da Razão Pura (2012), que todos conhecemos ou de que já ouvimos falar, a introdução do termo (muito embora eu pense que essa posição “crítica” já se expressasse na ironia e na maiêutica socráticas, assim como nelas já se expressavam uma postura fenomenológica e dialética). Nessa perspectiva, eu defino o crítico, fundamentalmente, como estranhamento. Mas estranhar o quê e quem?

Primeiramente nós mesmos: estranhar nossas perguntas; nossos referenciais: por que escolhemos certos autores e excluímos outros? Colocarmo-nos questões como: o que queremos que nossas pesquisas encontrem? O que precisa ser “reduzido” no sentido da fenomenologia de Husserl e Merleau-Ponty de um colocar entre parênteses o que sabemos para podermos ver o novo? O que nossas questões têm a ver conosco, como nossa subjetividade, nossas implicações, nossos estigmas? Para que nossa pesquisa contribuirá?

O crítico implica superar a metodolatria que contribui para nos escravizarmos quando nos esquecemos de que as regras do método nos servem, sim, porém até certo ponto, porque para fazer uma pesquisa qualitativa de qualidade é preciso confiança, imaginação e criatividade. O pesquisador é parte do método. E isso é condição de rigor e não defeito, como os positivistas supõem, sem se colocarem as mesmas perguntas em relação aos seus instrumentos estruturados.

Na pesquisa, que considero a mais rigorosa das metodologias, se coloca como critério central a reflexividade, em todo o processo de investigação, no sentido de reconhecer as relações de poder, se são democráticas, se o processo de pesquisa é emancipatório e ético. Essa perspectiva do crítico vai ao encontro do que Guba e Lincoln (2011), já em 1989, sinalizavam quando propuseram a Avaliação de 4ª geração ao falar de um processo qualitativo, interativo e negociado com os atores. E isso deveria começar com a construção da pergunta e, sobretudo, pela reflexão sobre as propriedades dos resultados, ou seja, uma reflexão ético-política: o porquê e o para quem da investigação e o conceito de “responsive” que antevê possíveis impactos dos resultados nos atores implicados.

Estranhar também nossa posição como intérprete e sujeito epistêmico: nossos valores, de que lugar estamos produzindo aquele conhecimento. Isso que indagamos na operação epistemológica que nomeamos posicionalidade. A quem serve esse conhecimento e o lugar dos participantes na produção negociada de “evidências”?

Mas como alcançar isso? Isso remete a uma questão já colocada na filosofia: virtude se ensina? Isso precisa sair da abstração e adentrar as ações de pesquisa. O pesquisador qualitativo precisa Saber e Saber-ser.

Esses objetivos requerem um posicionamento ético que, para mim, encontra fundamento na ética radical do filósofo lituano Emmanuel Levinas (1974), que buscou inspiração em Husserl e em Heidegger. O pensamento de Levinas questiona o primado da ontologia (O Ser dominou a filosofia antiga e medieval, passando ao EU na modernidade), postulando a ética entendida como “responsabilidade pelo outro”. Levinas constrói sua trajetória de pensamento traçando uma crítica ao conceito de Ser, a partir de dois sentidos do des-intér-essément (que ele apresenta no livro Autrement q´être ou au-delà de l´éssence, não traduzido para o português), sendo o primeiro e mais comum a gratuidade da relação, cujo móvel não é o interesse. Para Levinas, a relação com o Outro é face a face, anterior a toda anterioridade e desprovida de toda mediação. Segundo o próprio Lévinas (1974, p. 171):

A relação com o outro não poderia ser pensada como um encadeamento com um outro eu, nem como a compreensão do outro, do qual faria desaparecer a alteridade, nem como comunhão com ele em torno de algum terceiro termo”. O “outro” que não é o “eu” é “outro diferente”, desconhecido, não-familiar, estranho, em uma posição intersubjetiva assimétrica

[tradução nossa].

O Outro incita o mim-mesmo à “responsabilidade”, que é o cerne da ética levinasiana (Levinas, 1974). A “responsabilidade” pelo Outro é ilimitada, absoluta e ultrapassa a própria liberdade do mim-mesmo. Para essa responsabilidade absoluta não interessa a contrapartida do outro – é nesse sentido que a relação é desinteressada. E aqui volta a preocupação de se pensar ciência e pesquisa na Saúde numa época em que ambas viraram mercadorias, o cuidado que devemos ter para não nos envolver e nem os participantes das nossas pesquisas nesse processo (produção de papers, reiteração de valores que não são emancipatórios, disputas por editais etc.). Assim, os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) muitas vezes não resolvem os problemas das relações de poder e dos interesses que medeiam a investigação.

Quanto ao ético-político, posso dizer numa frase: seria a aplicação dessa ética que acabo de mencionar no sentido de desenvolver pesquisas voltadas à justiça social, à superação de iniquidades, desigualdades, exclusões e preconceitos, numa perspectiva universal e planetária. Colocar-se a indagação: a quem serve esta pesquisa? Quais os impactos sobre os participantes?

Eu gostaria ainda de mencionar a dimensão dialógica da pesquisa qualitativa, um momento que as orientações precisam cuidar. E convoco o pensamento de Buber (1988), “o filósofo do diálogo”, que nos adverte para o que chama “fala genuína” e “mera conversação”. Como diz Amatuzzi (1988), no livro O resgate da fala autêntica, referindo-se a Buber (1988), o simples falar, ainda que sincero, não caracteriza o diálogo. É preciso que haja mutualidade, ou seja, falar e escutar o outro”. E ele ilustra esse palavreado com a situação, aliás, bem frequente, em que pessoas, mesmo estando juntas e falando muito, não se escutam. Isso bem pode acontecer nas nossas técnicas de pesquisa que demandam entrega e horizontalidade de poder para que se construa um diálogo capaz de tocar a centralidade do outro. É a relação que configura essa possibilidade. A filosofia do diálogo deve ser o fundamento de toda e qualquer técnica de pesquisa, ou seja, produção de material discursivo.

Para finalizar, lembrando Paulo Freire, só podemos pensar numa pesquisa crítica comprometida com a justiça social trazendo à tona a força da palavra própria, o “dizer sua própria palavra” (2021). Todos sabemos que Freire acentua a importância da problematização, da criticidade, do conhecimento, ou seja, do cognitivo. Mas também valoriza a dimensão afetiva, o compromisso, a intencionalidade, uma disposição prévia, noutros termos, um reencantamento que as orientações precisam estimular nos jovens pesquisadores. O cognitivo e o ético-político precisam caminhar junto com o afetivo nas nossas pesquisas. No dizer de Madel Luz (2012), “Unir o que a épistémè moderna divorciou”. Radicalizar a Presença (no sentido filosófico) dos pesquisadores, tanto na direção de uma formação consistente como no saber Ser.

Ser crítico, para mim, é isso. E, portanto, ultrapassa muito a mera adesão a uma teoria, muito embora os questionamentos das relações de poder exijam uma teoria crítica, mas empregada de uma forma complexa. E, mais que isso, a desconstrução e reconstrução do próprio pesquisador tradicional, mediante a reflexividade.

Mas quem é esse pesquisador crítico?

2 QUEM É ESSE PESQUISADOR CRÍTICO?

A formação de um pesquisador qualitativo crítico implica a construção de um perfil de formação. Neste sentido, é necessário interrogarmo-nos sobre o pesquisador enquanto sujeito e enquanto pesquisador. Um primeiro conjunto de questões refere-se ao porquê e ao para quê da sua investigação, bem como à racionalidade que desenvolve. As respostas a estas questões conduzem a perguntas sobre os princípios que segue, o que se refere à forma como atua ou como concretiza esses princípios no seu procedimento de pesquisa. Estas condições do pesquisador qualitativo crítico que sustentam o perfil formativo que proponho são apresentadas de seguida.

As respostas às questões “porquê” e “para quê” remetem, as primeiras, para motivações éticas e políticas, e as segundas para os objetivos ou fins prosseguidos em resposta a essas motivações. Por isso, Lyotard (2006) afirma que o pesquisador, em primeira instância, é um sujeito prático no sentido aristotélico, ou seja, um sujeito moral e político. Em relação às motivações éticas e políticas, o pesquisador crítico e pós-crítico está comprometido com a justiça social, ou seja, com as lutas pela equidade, a garantia de oportunidades para todas as pessoas poderem viver a vida que valorizam e a superação das várias formas de opressão, discriminação e exclusão resultantes das diferenças de cultura, classe, etnia, raça, gênero, sexualidade e geração. Por isso, o pesquisador crítico assume uma responsabilidade ética e política.

Por isso, o pesquisador crítico, para além do raciocínio exigido pelas questões técnicas ou pelo conhecimento teórico, precisa desenvolver um outro tipo de racionalidade que recupere os sentimentos, as emoções, os desejos, a preocupação pelo outro e pela justiça, fundamental para o raciocínio ético e político. Esse tipo de raciocínio corresponde à phronesis aristotélica (Granda, 2004), que tem a ver com questões de natureza humana, como a política, a ética e o direito.

O pesquisador qualitativo crítico faz pesquisa não apenas para desenvolver conhecimento, mas também para ampliar a compreensão da realidade dos sujeitos com os quais trabalha, a fim de promover ações para transformar as condições que perpetuam as injustiças. É uma ação comprometida com a solução dos problemas dos atores que participam da pesquisa em resposta a uma concepção de justiça como virtude, no sentido aristotélico, ou seja, na medida em que se refere ao outro (Aristóteles, 2003). Esta ação pode ter lugar em diferentes esferas, como a política, a denúncia e no campo dos programas, projetos e ações comunitárias. Em suma, o pesquisador crítico não é apenas um acadêmico, mas também um ativista.

Além disso, como traduzir a prática da pesquisa a partir de uma perspectiva crítica em relação à ciência, em que a verdade, o rigor e os métodos são postos em questão? Outras perguntas decorrem destas: como se desenvolve a pesquisa no âmbito de um campo científico plural, cujas correntes e perspectivas estão em tensão? Quem faz a pesquisa? Para quem é feita a pesquisa? A quem pertence a pesquisa? A quem pertencem os resultados? Quais são os valores que sustentam a pesquisa, na sua conceptualização, execução e avaliação?

O pesquisador crítico precisa transcender a ideia hegemônica de método como aquelas “regras certas e fáceis pelas quais aquele que as observa exatamente nunca tomará nada falso por verdadeiro, e [...] chegará ao conhecimento verdadeiro” (Descartes, 2002, p. 24). Assim, em seu livro Verdade e Método, Gadamer (2006) critica a ideia cartesiana que associa método à verdade e argumenta que os métodos podem se tornar uma moda que leva à imitação e não à construção de algo novo.

Assim, segundo Kincheloe e McLaren (2005) as ações do pesquisador crítico assemelham-se às do “bricoleur”, que realiza um ato criativo e emergente à medida que é construído durante o desenvolvimento da investigação e em resposta ao contexto e às necessidades, também elas emergentes. Esse ato criativo requer o desenvolvimento de uma perspectiva transdisciplinar, que exige também uma sólida formação em ciências sociais e humanas. Consequentemente, a ação do pesquisador requer um “processo cognitivo de alto nível de construção e reconstrução, de diagnóstico, de negociação e de reajustamento [...em que o método é entendido como] uma tecnologia de justificação, isto é, uma forma de defender o que afirmamos fazer e o processo pelo qual o conhecemos” (Kincheloe; McLaren, 2005, p. 318)

Pode, então, recolher elementos teóricos e metodológicos de múltiplos métodos, incluindo “etnografia, análise textual, semiótica, hermenêutica, psicanálise, fenomenologia, historiografia, análise do discurso, e também análise filosófica, análise literária, crítica estética e formas teatrais e dramáticas de observar e fazer sentido” (Kincheloe, 2005, p. 323). Isso implica um profundo esforço epistemológico e metodológico para ultrapassar posições ecléticas e, assim, estruturar os diferentes contributos teóricos e disciplinares no quadro de uma proposta teórica coerente e articulada, como propõe Zemelman (2021) com a sua proposta de pensamento epistêmico.

Assim, o pesquisador crítico precisa transcender a “metodolatria”, como propôs Janesick (1994), para não perder de vista a centralidade dos achados. Nesse sentido, o método deve ser entendido como uma prática social, como um processo em construção e negociação numa relação dialética com o objeto: método e objeto constituem os polos dialéticos necessários à identidade um do outro (Kohan, 2003; Garza; Arce, 1998). Esse raciocínio é fundamental para que o método seja assumido em sua devida medida e não se torne uma camisa de força para resolver o que é realmente pertinente e necessário (Adorno, 2006).

O pesquisador crítico precisa então reconhecer que a pesquisa que realiza é uma opção entre várias correntes e perspectivas teóricas, epistemológicas, éticas e políticas, que são mediadas pelo seu estatuto cultural, social, étnico, racial, de gênero, de classe e geracional, o que determina diferentes conjuntos de possibilidades para produzir diferentes versões da realidade. Tais opções e posições são também uma questão de gosto, que tem a ver com o afetivo e o estético (Denzin; Lincoln, 2005; Feyerabend, 1975).

Assim, o pesquisador que supera a “metodolatria” deverá recorrer a uma pesquisa baseada em princípios epistemológicos, teóricos, políticos e éticos. Cada um terá de identificar esses princípios nos quais basear a sua pesquisa para poder dar conta dela. A seguir, gostaria de destacar cinco princípios como síntese da discussão anterior: pesquisa transformadora, participativa e dialógica, prática de pesquisa reflexiva e pesquisa como educação.

2.1 UMA PESQUISA TRANSFORMADORA

Se é verdade que os movimentos pós-críticos questionam o ideal moderno de um sujeito autônomo e emancipado, na medida em que nos encontramos imersos, ou mais ainda, configurados por processos de governamentalidade e de subjetivação, no âmbito de uma realidade produzida por discursos e mediada por relações de poder, isso não significa que se renuncie à aspiração à justiça social e à superação das injustiças. Nesse sentido, o pesquisador crítico está comprometido com a transformação humana, social e planetária que também considera a justiça para além dos seres humanos e tem em conta o meio ambiente e a preservação da vida.

2.2 PESQUISA PARTICIPATIVA

Uma pesquisa que se faz com o outro, com os participantes, na medida em que se entende que o pesquisador e o pesquisado fazem parte do mesmo mundo que partilham com eles. Por isso, o participante é concebido como um alter, no âmbito de uma perspectiva dialética pesquisador/participante. As relações são transformadas, pois compreendem que juntos constroem conhecimento para ampliar a compreensão da realidade e prepará-los para a ação. Nas palavras de Freire (1975), a compreensão das contradições que limitam os sujeitos a serem mais como seres humanos inacabados traçam o caminho da ação para a sua transformação e a da sociedade, e, como aponta Sen (2010), a vivência da vida que valorizam.

2.3 PESQUISA DIALÓGICA

A compreensão da vida que os sujeitos vivem e da realidade social que constroem, e que por sua vez os constrói, exige uma disponibilidade para o diálogo e para a escuta (Gadamer, 2006). Dessa forma, é possível uma compreensão intersubjetiva do mundo e dos atores sociais num processo de negociação cultural (Bruner, 2009). Esse processo de diálogo e negociação cultural requer uma abordagem hermenêutica, ou seja, interpretativa, à luz das diferentes compreensões e cosmovisões da realidade que os sujeitos históricos, cultural e socialmente situados produzem. Segundo Freire (1975), essa compreensão da realidade é medida por processos de problematização que permitem a emergência de contradições que limitam as oportunidades de viver a vida que é valorizada. Dessa forma, investigadores e participantes ampliam a compreensão da realidade para uma ação transformadora.

2.4 UMA PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO REFLEXIVA

O pesquisador, enquanto sujeito moral, requer processos de autorreflexão, autoanálise e autoavaliação para a sua autoconstrução (Bauman, 2006). Dessa forma, podem realizar uma prática de pesquisa eticamente reflexiva em relação aos princípios da ciência, suas repercussões morais e suas consequências para a justiça social. Nesse sentido, a reflexão configura-se como a base para a aprendizagem que a experiência de pesquisa produz (Freire, 1975; Stenhouse, 1985) e que possibilita a transformação do pesquisador e da forma de compreender a ciência e o método de pesquisa. Assim, o método é entendido como um produto da práxis – prática refletida à luz de fundamentos epistemológicos, teóricos, éticos e políticos – o que implica um processo de negociação em resposta às exigências emergentes da pesquisa.

2.5 PESQUISA COMO EDUCAÇÃO

O pesquisador que realiza uma pesquisa dialógica e participativa voltada para a transformação do sujeito e da sociedade está imerso num processo educativo. A pesquisa com os participantes, para juntos compreenderem a realidade e transformá-la, é em si mesma educativa. Por isso Freire (1975) diz que pesquisa e educação são duas faces da mesma moeda e observa que a educação por si só não transforma a sociedade, mas transforma o sujeito que fará a transformação. É importante evidenciar essa relação pesquisa-educação para consolidar os processos educativos na pesquisa crítica.

3 QUAL É O SIGNIFICADO DA PESQUISA QUALITATIVA CRÍTICA NO CAMPO DA SAÚDE PÚBLICA

É necessário reconhecer o modo como a pesquisa qualitativa crítica é efetuada no âmbito do campo mais vasto da saúde pública. A saúde pública pode ser entendida a partir de diferentes correntes ou discursos, tais como a epidemiologia causal, a tríade ecológica, os determinantes sociais da saúde, a medicina social, a saúde coletiva, a epidemiologia ecossocial, a determinação social da saúde e a epidemiologia etnossocial (Almeida Filho; Paim, 1999; Breilh, 2003). Esta condição indica a existência de uma pluralidade de discursos que estão em tensão.

Para efeitos de exposição, algumas tendências na saúde pública poderiam ser identificadas como um campo composto por dois polos discursivos que nos permitem caracterizar as tensões. Assim, haveria um polo que se pode designar por clássico ou hegemônico, baseado nos discursos biomédico e do risco. Deste lado, concebe-se uma realidade causal e determinista, de acordo com uma perspectiva funcionalista e estruturalista da sociedade, no âmbito de uma racionalidade objetiva e neutra orientada para o controle. Inscreve-se numa visão positivista e objetiva da ciência. A saúde tem uma conotação populacional em que o sujeito é excluído e gira em torno da doença como um estado ou situação e segundo uma relação antropocêntrica em relação ao meio ambiente. É apoiada por uma concepção utilitarista da justiça que sustenta os discursos da maximização dos recursos, da eficiência e da rentabilidade econômica.

Por outro lado, haveria um polo crítico da saúde pública alimentado pelos discursos das correntes ecossocial (Krieger, 1994), etnossocial (Almeida Filho, 2020), da determinação social da saúde (Breilh, 2003; Granda, 2008) e da Saúde Coletiva. Nessa perspectiva, a realidade é concebida como dialética e em estado de fluxo que sustenta uma ideia de sociedade contraditória, como produto histórico em constante mudança num cenário de tensão e conflito entre reprodução e resistência a respeito das condições de injustiça. Inscreve-se numa visão de ciência plural ao reconhecer a existência de discursos epistemológicos em tensão (positivismo, hermenêutica, teoria crítica, pós-estruturalismo, pós-modernismo, descolonialismo, entre outros). Consequentemente, assume-se uma racionalidade que aceita não só uma racionalidade teórico-instrumental, mas também a racionalidade da prudência (phronesis aristotélica) ou racionalidade prática (em termos kantianos) (Kant, 2012) necessária para ações éticas e políticas ligadas ao ideal de transformação e emancipação. A saúde é entendida como uma criação histórica e sociocultural do sujeito e da sociedade em uma relação dialética. Dessa forma, resgata-se o sujeito superando a dicotomia sujeito/sociedade, tendo uma visão de saúde como uma vida mediada pelas determinações sociais da saúde e, portanto, em relação às oportunidades (capacidades) de viver a vida que se valoriza (Sen, 2010). Requer, assim, uma perspectiva de justiça baseada na equidade que supere também o antropocentrismo, abraçando uma visão que assegure a vida em geral (Breilh, 2013).

Tendo em conta a discussão anterior, é evidente que a investigação qualitativa crítica é efetuada no âmbito da saúde pública crítica. Além disso, é necessário reconhecer que a saúde pública, enquanto domínio transdisciplinar, atravessa as diferentes disciplinas do domínio da saúde, mas também das ciências sociais e humanas. Por essa razão, é necessário apropriar-se das teorias das disciplinas das ciências sociais e humanas necessárias para ampliar a compreensão dos fenômenos estudados pela saúde pública. Por conseguinte, os métodos das ciências sociais e humanas que enriquecem a capacidade de investigação em saúde pública também deverão ser adotados. Assim, muitos dos métodos qualitativos críticos correspondem a adaptações de métodos dessas disciplinas ao nosso campo.

4 A TESE NO CONTEXTO DE UM PROGRAMA DE FORMAÇÃO DE DOUTORADO

O ensino da pesquisa qualitativa crítica requer o fortalecimento de uma consciência crítica, o que, segundo Freire (1975), implica ampliar a compreensão da realidade para poder atuar de forma mais responsável sobre ela. Compreender a realidade, em nosso caso, significa compreender o campo da ciência, analisar e discutir suas diferentes correntes e perspectivas, seus debates e contradições, para que os estudantes possam ressignificar a pesquisa e suas ações como pesquisadores, o que é um ponto de partida para consolidar sua capacidade de transformação. Para avançar nesse caminho, é necessário ter uma boa base epistemológica para abordar a análise da pesquisa e os diferentes métodos dos campos das ciências biomédicas, bem como das ciências sociais e humanas.

O processo de formação epistemológica implica um esforço individual e coletivo de conscientização e autoconsciência que exige um processo reflexivo que proporcione ao sujeito a oportunidade de voltar-se para si mesmo e para sua condição, situada em um contexto social, cultural e político. Dessa forma, eles consolidam sua compreensão de uma sociedade com opções e oportunidades desiguais e injustas que os levam a visualizar um mundo sonhado e diferente (Freire, 2004).

Dessa forma, os estudantes se conscientizam de como constroem uma perspectiva epistemológica, que envolve conhecimento, mas também valores, a fim de assumir a responsabilidade pela qual e por que conhecem (Bruner, 2009). Porque o pesquisador precisa se tornar crítico, não apenas do conhecimento dos outros, mas também do seu próprio.

No entanto, como a pesquisa qualitativa crítica é uma pesquisa com intenção, que exige uma ação consciente e responsável em relação à sociedade, aos sujeitos e aos valores, ela é uma pesquisa comprometida com causas, sonhos, utopias e ideais e, portanto, também é política (Freire, 2004). Por esse motivo, a base epistemológica é acompanhada de uma sólida formação ética e política.

A formação ética transcende a bioética baseada em propostas “principialistas” (Beauchamp, 2001), razão pela qual é necessário assumir uma perspectiva mais ampla que reconheça a justiça como o objeto central da ética (Sandel, 2009).

A teoria da filosofia moral e a filosofia política, como parte de um processo de reflexão, são úteis para aprender das experiências, fortalecer nossa argumentação moral e apoiar nossa transformação como sujeitos morais. Podemos usá-las para avançar nossa compreensão de nossas ações e, em particular, de nossa prática de pesquisa

(Arias-Valencia; Peñaranda, 2015).

Por outro lado, as formações epistemológica, ética e política também devem abordar as relações de poder e os interesses que medeiam a interação com os participantes da pesquisa, o que implica reconhecer, por parte do pesquisador, em suas interpretações, os fatores condicionantes resultantes de seu habitus, gênero, etnia, raça e até mesmo condição geracional (Denzin; Lincoln, 2005).

Portanto, na formação dos estudantes, é preciso promover um ambiente de aprendizagem seguro que facilite e promova debates no âmbito de um processo de reflexão conjunta no qual eles possam estar dispostos a aprender e a se transformar como produto do diálogo do conhecimento, da negociação cultural e da problematização. Assim, a aprendizagem é entendida em um processo de construção coletiva do qual participam alunos e educadores.

Na nossa experiência de doutorado, concretizamos essa orientação no eixo de pesquisa da seguinte forma. O eixo começa com um curso de epistemologia que inclui um componente de ética com a orientação mencionada acima. Esse curso oferece uma contextualização histórica, teórica e disciplinar dos debates científicos, com os seguintes objetivos:

  • Gerar uma experiência de aprendizagem que permita ao estudante avançar no conhecimento, análise e reflexão dos fundamentos epistemológicos da pesquisa em saúde pública como insumo básico para consolidar sua capacidade de pesquisa e desenvolver uma posição crítica, ética e autônoma.

  • Fortalecer o conhecimento e a reflexão epistemológica do estudante como base para a compreensão dos debates atuais da ciência em geral e da pesquisa em saúde pública em particular.

  • Promover a análise do estudante sobre as influências epistemológicas, teóricas, políticas e éticas das ciências biomédicas, sociais e humanas na pesquisa em saúde pública.

  • Consolidar os fundamentos epistemológicos, éticos e políticos do estudante para facilitar a abordagem dos métodos de pesquisa que lhe permitirão superar a primazia do metodológico-instrumental (metodolatria).

  • Estimular a compreensão e a reflexão do estudante sobre a relevância da promoção de posições plurais na pesquisa em saúde pública como requisito para promover a riqueza científica e a exploração de alternativas de pesquisa mais ágeis para promover a transformação da sociedade.

  • Fortalecer a reflexão crítica e proativa do estudante sobre os debates acerca dos critérios de avaliação da pesquisa em saúde pública no âmbito de uma perspectiva pluralista da ciência.

  • Promover a reflexão epistemológica, ética e política sobre a pesquisa em saúde pública como base para a formação transdisciplinar, que é fundamental na pesquisa e na prática da saúde pública.

No segundo curso do eixo de pesquisa, estabelece-se uma ponte entre a reflexão epistemológica, ética e política e os métodos de pesquisa qualitativa, como a etnografia, a teoria fundamentada, a pesquisa narrativa e a pesquisa-ação, entre outros. Assim, a partir de uma reflexão epistemológica, ética e política, os referenciais teóricos disciplinares que deram origem a esses métodos são abordados em uma perspectiva transdisciplinar. Vale a pena mencionar algumas dessas referências teóricas das ciências sociais e humanas, incluindo da antropologia, a antropologia cultural; da sociologia, o interacionismo simbólico e a teoria crítica; e da filosofia, a hermenêutica e a fenomenologia.

No terceiro curso do eixo de pesquisa, avança-se na fundamentação teórica dos métodos, estudando suas diferentes correntes e vertentes e a forma como se expressam na práxis da pesquisa. Dessa forma, os fundamentos epistemológicos, éticos e políticos são relacionados com a fundamentação teórica dos métodos, cuja concretização metodológica é tratada no quarto curso. Neste último curso, essa relação é completada com a apresentação das diferenças no trabalho de campo e na coleta e análise de informação como resultado das diferentes perspectivas epistemológicas, éticas, políticas e teóricas dos métodos de pesquisa.

A chamada para estudantes de doutorado é feita por linhas de pesquisa, nas quais os alunos são admitidos desde o início do programa. Eles recebem um diretor de tese que faz parte da linha na qual desenvolverão seu projeto de pesquisa. O aluno também pode ter o apoio de um codiretor e/ou de um comitê de tese formado por dois outros professores, além do diretor. Normalmente, esse apoio do corpo docente é composto por professores de diferentes disciplinas, o que promove o apoio transdisciplinar durante o desenvolvimento da tese de doutorado, que nesse programa tem duração de quatro anos.

O eixo “linha de seminário de pesquisa e desenvolvimento da tese de doutorado” inclui a linha de seminário de pesquisa e a construção, o desenvolvimento, e a avaliação da tese de doutorado. No seminário da linha de pesquisa, avança-se na construção teórica do objeto específico de pesquisa. Com a participação de outros professores e estudantes interessados no assunto, a produção coletiva dos fundamentos teóricos da linha de pesquisa é realizada como uma contribuição para os diferentes projetos de pesquisa. Trata-se de uma instância em que os estudantes têm a oportunidade de discutir suas ideias e o progresso de seu projeto de tese de doutorado com outros pesquisadores que fazem parte da linha de pesquisa. O seminário da linha de pesquisa estabelece um programa acadêmico semestral de acordo com os interesses e as necessidades dos estudantes.

Neste ponto, é necessário observar a existência de uma relação dialética entre o método e o objeto de pesquisa, conforme discutido anteriormente. Isso significa que os estudantes assumem uma perspectiva crítica em relação tanto à saúde pública quanto à pesquisa qualitativa. Implica que os cursos do eixo de formação em saúde pública abordam perspectivas críticas sobre a saúde pública que envolvem contribuições teóricas críticas das diferentes disciplinas que compõem a saúde pública como um campo transdisciplinar: ciências sociais e humanas, ciências da saúde, bem como matemática e bioestatística.

Dessa forma, o projeto de tese de doutorado é construído pelos estudantes por meio da integração das contribuições teóricas e metodológicas dos eixos de formação em saúde pública, formação em pesquisa e do seminário da linha de pesquisa e desenvolvimento da tese de doutorado. Isso é feito progressivamente durante os quatro primeiros semestres, à medida que os ensaios e produtos avaliativos dos cursos das três áreas de formação são vinculados à construção do projeto de tese de doutorado.

5 MAIS ESTRATÉGIAS...

A primeira coisa que tenho a dizer sobre os processos de acompanhamento de dissertações e teses crítico-qualitativas é que eles nos exigem muito. São processos difíceis de serem conduzidos e carregados de emoção, uma vez que são vidas que se entrelaçam e emergem vicissitudes. As dificuldades se situam em vários planos e vão da já mencionada insuficiente formação em teoria social dos alunos, passando pela dificuldade de escrita que normalmente leva a um “estilo positivista” uma vez que a maioria dos alunos vem de uma graduação informada pelo modelo biomédico e leva tempo para o letramento qualitativo, que envolve, dentre outros aspectos, outro formato “estético-expressivo” de escrita, expressão usada por Letícia Robles-Silva (2021, p. 237). Essa dificuldade leva o orientador à necessidade de ler incontáveis versões, até que se alcance um texto escrito qualitativamente. Além disso, no meu caso, atuando numa Faculdade de Medicina, outra dificuldade é chegarmos à composição de bancas de defesa, num coletivo que quase não dispõe de pesquisadores qualitativos. O que fazemos é buscar examinadores em cursos como Psicologia, Sociologia e Filosofia, haja vista as bancas serem compostas também por examinadores externos ao Programa.

Na literatura praticamente inexistem artigos focalizando o percurso de um acompanhamento (denominado orientação). Eu mesma jamais expus sobre esse tema e foi muito enriquecedor pensar sobre isso, recensear as estratégias e constatar que emergem de um processo singular de criação, diálogo e inventividade, ou improviso. Não existem fórmulas prontas sobre como acompanhar a construção de pesquisas qualitativas críticas. O próprio verbete orientação ou supervisão é polissêmico e impreciso e designa, na maior parte das definições, uma relação vertical que contradiz tudo o que dissemos há pouco sobre diálogo e ética. Isso porque, mesmo quando adotamos o “guiar” como significado, não raro, na academia, disso se subentende uma relação vertical na qual o orientador sabe o caminho e ao orientando cabe obedecer. Esse tipo de orientação não forma pesquisadores qualitativos críticos.

Exceção nessa lacuna bibliográfica é o inspirador texto de Consuelo Chapela intitulado “Andar um camino juntos: acompañamento en la formación de pesquisadores cualitativos críticos”, publicado em 2018, no capítulo 3 da coletânea internacional “Formación en Investigación Cualitativa Crítica en el campo de la salud” (Chapela, 2018). Infelizmente, por ser uma editora universitária, o acesso fica um pouco limitado, mas é um texto que toda a comunidade deveria ler. Nesse capítulo, Chapela afirma sua opção pelo caráter emancipador inerente à formação de pesquisadores qualitativos críticos. Nessa direção, ela diz

[...] questiono o termo ‘direção de teses’ [...] assim como ‘supervisor de teses’ [porque] levam a carga das formas convencionais de conceber os estudantes e são inconsistentes com a autonomia, criatividade, caráter único (ou seja, singularidade) e responsabilidade necessárias à pesquisa qualitativa, particularmente, a pesquisa qualitativa crítica. ‘A qualidade de um estudo qualitativo crítico depende da autonomia das e dos investigadores, que não será possível se os aprendizes se subordinam a uma direção de tese’ [...] ‘Proponho então que a formação em investigação qualitativa crítica é incompatível com direção ou supervisão de tese. A palavra acompanhamento representa melhor minha intenção e prática com estudantes em formação qualitativo-crítica’

(Chapela, 2018)

E assume que o termo acompanhamento é mais pertinente e congruente com o que se define como pesquisas qualitativas críticas.

Acompanhamento é uma palavra que se põe ao lado da palavra estudante, não à frente, para puxar ou empurrar, mas ao lado, para caminhar juntos com a finalidade de estudo acordada entre ambos

(Chapela, 2018)

Concordando com Chapela, adoto então esse termo, cujo significado respeita a autonomia e o lugar dos estudantes como autores dos seus trabalhos. Contudo, mesclarei com a palavra “orientação” nesta exposição, haja vista sua institucionalização, no Brasil, mas sempre com o significado de acompanhamento.

Chapela sinaliza que busca se colocar nas relações de acompanhamento como alguém que entende que a responsabilidade de reflexão e criação é dos estudantes: “Conseguir chegar, entrar e me retirar do caminho de formação me causa grande satisfação” (Chapela, 2018, p. 98) entendendo que a importância do seu trabalho junto ao acompanhado deve se dar no sentido de ajudar a obter clareza, coerência entre as ideias e habilidade para comunicá-las.

Uma orientação crítica necessita que se desenvolvam na relação os elementos já aqui discutidos relativos ao Saber e ao Saber-Ser. Considero que o processo de orientação é o lugar onde mais efetivamente os alunos podem desenvolver as habilidades de um pesquisador qualitativo crítico na acepção já antes demarcada. Mas é uma estratégia de alcance limitado, haja vista a já aludida carência de profissionais devidamente qualificados para orientá-los. Noutras palavras, há que desenvolver na relação de orientação o que se espera que o aluno exercite em suas próprias pesquisas.

Há um artigo publicado por Joan Eakin, em 2016, que se encontra no capítulo 10 do livro que lançamos em 2021, cujo título é Formando pesquisadores qualitativos críticos na terra dos ensaios clínicos randomizados (Eakin, 2021, p. 282-313). Nele Eakin menciona estratégias para formar pesquisadores qualitativos críticos que nos inspiram no Laboratório de Avaliação e Pesquisa Qualitativa (LAPQS/UFC) tanto no ensino como nas orientações, e as mencionarei como aproximações para expor como se dá o processo das orientações. Nesse artigo, Eakin, diferente de Chapela, não aborda as orientações propriamente ditas, mas destaca como estratégias-chave quatro aspectos que me ajudam a desenvolver o tema. São elas: 1) criar presença organizacional; 2) priorizar a formação metodológica de ponta; 3) ensinar habilidades pragmáticas de sobrevivência; e 4) forjar comunidades de apoio à prática.

Quanto à “Presença organizacional”, considero-me ainda muito distante do que ela recomenda. Contudo, conseguimos criar o LAPQS, que é um espaço onde temos desenvolvido nossas orientações de forma coletiva, ou seja, cada aluno apresenta seu projeto de dissertação ou tese, e todos(as) opinam, sugerem e verificam aspectos como congruência ontoepistemológica; reflexividade; alcance do “poder de informação” nas amostras, consoante Malterud (Malterud; Siersma; Guassora, 2016); consistência do quadro teórico, num processo orientado por bibliografia mais avançada. O LAPQS tem um site1 que possibilita certa visibilidade e divulga artigos e bibliografias pouco acessíveis no Brasil. Também temos recebido pesquisadores, do Brasil e do exterior, em estágios de pós-doutorado e isso tem fortalecido nosso grupo e as orientações, uma vez que todos participam das reuniões de orientação.

Outra dimensão dessa presença institucional é o fato de obtermos bolsas de agência de fomento, concorrermos e ganharmos editais, constarmos desde 2020 no AD Scientific Index, recebermos homenagens alusivas a mérito científico, dentre outros aspectos que conferem visibilidade à pesquisa qualitativa no interior da Faculdade de Medicina. Contudo, sendo um Laboratório no interior de uma Faculdade de Medicina, é ainda muito difícil enfrentar o capital intelectual cultural dominante “na terra dos ensaios clínicos randomizados” e no mercado de pesquisa. O obstáculo principal é que os concursos para docentes se vinculam ao currículo da graduação em medicina, no qual menos de 3% são dedicados às denominadas “humanidades médicas”, ou seja, ao que escapa ao modelo biomédico, elemento que impede fixarmos os profissionais formados no nosso Programa de Pós-Graduação. Um possível reforço será, no médio prazo, obter apoio de pesquisadores de outras unidades para compormos um grupo mais extenso e com mais possibilidades de ação na saúde, inspirando-nos na experiência do CQ da University of Toronto, descrita no artigo, ainda que a sobrecarga docente seja um obstáculo imperioso para a construção de parcerias. Não obstante todas essas dificuldades, as orientações em grupo têm se revelado uma estratégia importante para a orientação dos trabalhos de conclusão e para fortalecer os alunos como coletivo de pesquisa.

Em relação a “priorizar a formação metodológica ‘de ponta’”, acredito que já conseguimos avançar mais, sobretudo após a edição do nosso último livro, fruto de um estágio pós-doutoral no CQ/University of Toronto, que teve grande impacto no campo da saúde. Sua publicação impactou o campo e já inauguramos um curso dedicado ao estudo do livro, cabendo mencionar os vários convites para expor sobre fundamentos de pesquisa qualitativa em espaços comumente reservados aos epidemiologistas. Concordamos com a Dra. Eakin sobre a necessidade de resistir aos convites para ministrar cursos ou aulas voltados às técnicas pura e simplesmente, as “introduções panorâmicas” a que ela se refere no seu texto, que passam a ideia de que a PQ é algo superficial, uma quase-reportagem. Quanto a isso, ela afirma:

A melhor forma de construir um ambiente propício à investigação qualitativa crítica em ciências da saúde não é o proselitismo e recrutamento de novos pesquisadores para o lado qualitativo, mas elevar metodológica e teoricamente o nível de excelência da PQ

(Eakin, 2021, p. 295)

Infelizmente, diferente do que expôs Peñaranda, não dispomos no nosso Programa de um grupo de pesquisadores com domínio nos fundamentos, nem um conjunto de disciplinas ou módulos articulados, necessários à excelência na formação em pesquisa. Procuramos contornar isso, ainda que parcialmente, com currículos mais personalizados, nos quais os alunos buscam o conhecimento em outros departamentos e Programas de Pós-graduação nas Ciências Humanas e Sociais, mediante disciplinas ofertadas nas quais esses fundamentos são estudados e aprofundados.

Nos processos de acompanhamento, podemos consolidar esses conteúdos nas análises realizadas pelos alunos. Também é nesse processo que conseguimos os melhores resultados e os avanços mais importantes dos aspectos ético-políticos e críticos, adotando uma postura de orientação que possibilite estranhamentos, autocrítica no processo de investigação, aperfeiçoamento da escuta mediante exercícios específicos, “redução” fenomenológica para que se possa ouvir o Outro. Ou seja, desenvolver na relação de orientação o que se espera que o aluno exercite em suas pesquisas. Ainda assim, os resultados na formação, mesmo no caso de doutores, não expressam um conforto epistemológico, o que pode ser constatado quando se apresentam oportunidades de participação em eventos e os(as) alunos(as) se sentem inseguros(as) para desenvolver exposições alusivas aos fundamentos.

Contudo, é interessante observar como os alunos se estimulam e se implicam nas reuniões no LAPQS, inclusive solicitando bibliografia complementar e levantando questões muito instigantes para suas pesquisas e para a dos colegas. Acho que as orientações são um momento de aprofundar conteúdos e também de praticar a reflexividade; e também o momento de ensinar o que Eakin nomeia “habilidades pragmáticas de sobrevivência”, terceiro aspecto por ela elencado no seu texto.

Assim, uma formação eficaz em pesquisa científica precisa enfrentar o problema da sobrevivência [...] ajudar os pesquisadores qualitativos a encontrar formas de ‘se encaixar’ nas estruturas e processos profundamente enraizados do ambiente educacional e científico dominante sem sacrificar sua própria força metodológica [...] adaptar a metodologia para subverter, contornar ou abrandar as expectativas dos ‘guardiões’ antiqualitativos [...] sem violar a integridade filosófica e o potencial interpretativo de um projeto”

(Eakin, 2021, p. 297)

Acredito ser esta uma dimensão muito importante, senão decisiva. Quando estruturamos um projeto para submeter a editais, aí se revela um momento em que podemos discutir como dialogar com a audiência positivista que seguidamente argui nossos projetos desde uma perspectiva interna ao seu paradigma. Discutimos no LAPQS desde o conteúdo do que vai ser apresentado, como a forma, ou seja, o modo de escrita que convença esse grupo, em geral dominante nos comitês de avaliação, e temos obtido sucesso em várias ocasiões, ainda que não em todas. Noutras palavras, procuramos inserir essa dimensão de “sobrevivência” ou “conforto epistemológico” nas discussões coletivas de orientação. Também fazemos isso ao preparar os projetos para serem avaliados nos Comitês de ética em Pesquisa que, grosso modo, embora não seja o seu papel, indagam sobre aspectos metodológicos.

A última dimensão destacada por Eakin é a ligação com uma comunidade de praticantes. Nesse sentido, mediante a criação do LAPQS, conseguimos protagonizar, juntamente com outros colegas, a criação de duas Redes de Pesquisa: A Rede Quali-BC (Rede de Pesquisa Qualitativa Brasil-Canadá) abrangendo universidades brasileiras em todas as regiões do país em parceria com o CQ da University of Toronto, e a Rede Naus (Rede Ibero Americana de Pesquisa Qualitativa em Alimentação e Sociedade), esta última já horizontalizada contando com centenas de participantes e nucleada em três universidades brasileiras, uma em Portugal e outra na Espanha. Desconheço redes de pesquisa qualitativa brasileiras, mas acho que seria um avanço extraordinário criá-las.

Gastaldo, ao final do seu capítulo no nosso livro, cita um provérbio africano com o qual finalizo esta exposição: “[...] ‘é preciso uma aldeia para criar uma criança – e uma aldeia de acadêmicos e pesquisadores para criar [orientar] uma professora de pesquisa qualitativa” (Bosi; Gastaldo, 2021, p. 102).

  • 1
    Laboratório de Avaliação e Pesquisa Qualitativa em Saúde. Disponível em: https://lapqs.ufc.br. Acesso em: 16 ago. 2024
  • FINANCIAMENTO
    O presente trabalho foi realizado sem o apoio de fontes financiadoras.
  • COMO REFERENCIAR
    PEÑARANDA CORREA, Fernando; BOSI, Maria Lúcia Magalhães. Desafios na orientação de pesquisadores qualitativos críticos no Brasil e na Colômbia. Movimento, v. 30, p. e30048, jan./dez. 2024. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.143341

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Editado por

  • RESPONSABILIDADE EDITORIAL
    Alex Branco Fraga*, Elisandro Schultz Wittizorecki*, Mauro Myskiw*, Raquel da Silveira*
    *Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, Porto Alegre, RS, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2024
  • Aceito
    17 Out 2024
  • Publicado
    10 Nov 2024
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Universidade Federal do Rio Grande do Sul Rua Felizardo, 750 Jardim Botânico, CEP: 90690-200, RS - Porto Alegre, (51) 3308 5814 - Porto Alegre - RS - Brazil
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