Open-access Biossegurança em serviço de embelezamento: conhecimento e práticas em uma capital do nordeste brasileiro

Bioseguridad en los centros de embellecimento: conocimientos y prácticas en una capital del nordeste brasileño

Resumo

OBJETIVO  Avaliar o conhecimento e as práticas de biossegurança adotadas por profissionais do segmento da beleza.

MÉTODOS  Pesquisa descritiva do tipo survey. Foram entrevistados 238 profissionais de serviços de embelezamento entre agosto de 2014 e 2015. As variáveis foram apresentadas por meio de frequências absolutas e relativas, bem como média e desvio padrão.

RESULTADOS  62,6% dos profissionais tiveram contato com sangue de clientes sem uso de luvas; instrumentais para o atendimento e 32,8% dos entrevistados não utilizaram equipamentos de proteção individual durante suas atividades laborais.

CONCLUSÕES  As doenças mais citadas quanto ao risco de contágio e de transmissão na prática laboral foram as hepatites virais, HIV e fungos. Quanto aos procedimentos de biossegurança adotados, o autoclave é o equipamento menos usado na esterilização dos instrumentos.

Palavras-chave Centros de embelezamento e estética; Exposição a agentes biológicos; Prevenção de doenças.

Resumen

OBJETIVO  Evaluar el conocimiento y las prácticas de bioseguridad adoptadas por profesionales del segmento del embellecimiento.

MÉTODOS  Evaluar el conocimiento y las prácticas de bioseguridad adoptadas por profesionales del segmento del embellecimiento.

RESULTADOS:  62,6% de los profesionales tuvieron contacto con sangre de clientes sin el uso de guantes; el 74,4% higienizaban las manos entre los atendimientos, el 16,8% reutilizaban materiales desechables. Ningún profesional informó la cantidad adecuada de instrumentos y el 32,8% de los entrevistados no utilizaban equipos de protección individual durante sus actividades laborales.

CONCLUSIONES  Las enfermedades más citadas con respecto al riesgo de contagio y de transmisión en la práctica laboral fueron las hepatitis virales, el VIH y los hongos. Acerca de los procedimientos de bioseguridad adoptados, el autoclave fue el aparato menos utilizado en la esterilización de los instrumentos.

Palabras clave: Centros de belleza y estética; Exposición a agentes biológicos; Prevención de enfermedades.

Abstract

OBJECTIVE  To evaluate the knowledge and biosafety practices adopted by professionals of the beauty segment.

METHODS  Descriptive study, of survey type. 238 professionals of the beauty segment were interviewed between August 2014 and 2015. The variables were expressed by means of absolute and relative frequencies, as well as average and standard deviation.

RESULTS  62.6% of the interviwed professionals reported having had contact with blood from customers when they were not wearing gloves; 74.4% said they washed their hands before and after each service, and only 16.8% of the respondents reported reusing nonsterilizable materials. None of them was able to inform the correct number of sets of tools needed , and 32.8% of the respondents did not use Personal Protective Equipment during their work activities.

CONCLUSIONS  The most frequently reported diseases associated with the risk of infection and transmission in the work activities were viral hepatitis, HIV and fungi. Regarding the biosafety procedures adopted, autoclave is the least used method for sterilizing devices. Keywords: Beauty and aesthetics centers. Exposure to biological agents. Prevention of diseases.

Keywords: Beauty and aesthetics centers; Exposure to biological agents; Prevention of diseases

Introdução

Os cuidados com a beleza e o culto ao corpo sempre estiveram presentes na existência humana1. Nas últimas décadas, o mercado da beleza e estética, por meio da adoção de padrões de imagem e estilo, vem apresentando um amplo impacto social atingindo diferentes camadas sociais de homens e mulheres, com idades variadas2.

A atividade dos profissionais da beleza oferece o risco de exposição a patógenos veiculados pelo sangue, de forma acidental, como os vírus de hepatite B (HBV), C (HCV) e o vírus da Imunodeficiência Humana (HIV)3, além de infecções bacterianas e fúngicas4. O desconhecimento e a baixa adesão dos profissionais às medidas de biossegurança, a exemplo de Equipamentos de Proteção Individuais (EPI), adequadas técnicas de reprocessamento dos instrumentos, descarte de materiais de uso único e higienização das mãos5, são fato inequívoco.

Dados evidenciam a falta de conhecimento dos profissionais do embelezamento, quanto às medidas de biossegurança relacionadas ao risco de contaminação e transmissão de doenças infecciosas durante suas atividades ocupacionais6-7. Na Itália e Turquia, as hepatites B e C foram consideradas como infecção de risco ocupacional aos barbeiros, cabeleireiros e manicures/pedicures2). No Brasil, uma pesquisa em São Paulo identificou que manicures não conheciam as formas de transmissão do vírus HBV (72%) e HCV (85%)8.

No Brasil, a partir da década de 1990, tem aumentado a oferta de procedimentos deste segmento9, desse os tradicionais, como a manipulação de tecidos nas mãos e pés, por meio da remoção do eponíquio (cutículas) com alicates, pelos serviços de manicures e pedicures7, entre outros mais invasivos, como os de tatuagem e colocação de body piercing10. Apesar do aumento da adesão popular às praticas de embelezamento, existem poucos registros de infecções neste ramo de atividade, pela ausência de notificação, e estudos relacionados à adesão e conhecimento de grupo de profissionais do embelezamento quanto às recomendações de biossegurança ainda são escassos2,11.

Considerando que os profissionais e usuários desses serviços são um grupo com elevado fator de risco, pela grande exposição à infecção por microorganismos, destaca-se a necessidade de uma atenção especial em conhecer a adesão e o preparo sobre as recomendações de biossegurança. Neste sentido, a presente pesquisa foi desenvolvida a partir da seguinte questão: qual é o conhecimento e a adesão de procedimentos de biossegurança dos profissionais dos serviços de embelezamento em uma capital do nordeste brasileiro? Para responder a este questionamento, objetivou-se avaliar o conhecimento e as práticas de biossegurança adotadas por profissionais do segmento da beleza, do município de São Luís (MA).

Metodologia

Tratou-se de um estudo de abordagem descritiva, do tipo survey, cujo objetivo consistiu em levantar opiniões, atitudes e a descrição de características do grupo estudado. A pesquisa de campo foi conduzida no período entre agosto de 2014 a agosto de 2015, em serviços de embelezamento da capital maranhense. A população de estudo foi constituída por manicures/pedicures, tatuadores e piercers.

Não é conhecida a quantidade exata de profissionais do ramo de embelezamento existente no município, uma vez que há inúmeros estabelecimentos não registrados nos órgãos competentes, embora este seja um requisito obrigatório para o funcionamento dos mesmos. A base para o cálculo amostral constituiu-se de uma relação contendo o nome e o endereço dos estabelecimentos de prestação desses serviços fornecida pela Superintendência de Vigilância Epidemiológica e Sanitária (SVES) do município, no ano de 2013. Tendo em vista a população de 824 estabelecimentos, o tamanho amostral foi estimado em 263 considerando-se intervalo de confiança de 95%, desvio-padrão de 0,5 e erro tipo I de 5%. Os estabelecimentos foram sorteados de forma aleatória simples, sendo utilizado o programa Excel 2007®. A amostragem inicial expressou que havia duplicidade em alguns registros, como em sete dos estabelecimentos sorteados, reduzindo a amostra a 256.

Ao início das coletas percebeu-se que muitos estabelecimentos não mantinham seus cadastros atualizados: alguns tinham mudado de endereço, de nome comercial e de proprietário. Assim, foi necessário que se padronizasse um plano alternativo a fim de que a amostragem não fosse comprometida. Estipulou-se que, uma vez não encontrado o estabelecimento listado, a coleta de dados seria realizada no estabelecimento seguinte localizado na mesma rua, desde que este não fizesse parte da amostragem inicial. Ainda assim, houve perdas, pois em alguns casos não existiam estabelecimentos que pudessem substituir os não encontrados de modo a manter a fidelidade da amostragem inicial. Tal fato, somado às recusas em receber as equipes de pesquisadores, resultou em 238 estabelecimentos visitados, dos quais 226 eram salões de beleza e 12 estúdios de tatuagem e colocação de piercing. De acordo com critérios administrativos e de planejamento da Secretaria Municipal de Saúde (Semus), o município de São Luís está dividido em sete Distritos Sanitários (DS), por isto a amostragem aleatória fez com que os estabelecimentos ficassem distribuídos da seguinte forma: DS Centro (39), DS Bequimão (104), DS Cohab (67), DS Coroadinho (8) e DS Tirirical (20).

Em cada estabelecimento entrevistou-se apenas um profissional, escolhido aleatoriamente entre os que estavam disponíveis, ou indicado pelo administrador do estabelecimento. As visitas aos salões de beleza e aos estúdios de tatuagem e colocação de body piercing foram realizadas por dois pesquisadores devidamente treinados. Durante as entrevistas preencheram-se os questionários contendo itens acerca da forma com que os profissionais desempenhavam sua atividade laboral e os procedimentos de biossegurança autorreferidos adotados. O questionário possuía 51 questões, dentre elas questões subjetivas e objetivas, dividido em 6 partes: dados sociodemográficos, aspectos profissionais e exposição a material biológico, imunização, atividade sexual, antecedentes pessoais. Todas as perguntas foram feitas oralmente pelo pesquisador em um local reservado, de modo a não constranger os participantes da pesquisa.

As variáveis qualitativas foram apresentadas por meio de frequências absolutas e relativas e as variáveis quantitativas através de média e desvio padrão. Os dados foram codificados, usando-se o programa SPSS versão 18.0 e digitados em duplicata. Em conformidade com a Resolução 466/12, este estudo foi aprovado junto ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Ceuma (467.184# 2013). Todos os participantes antes de serem incluídos na pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Resultados

Características sociodemográficas dos profissionais do embelezamento

Na Tabela 1 tem-se a caracterização dos entrevistados quanto à profissão que exercem no serviço de embelezamento, além de idade, cor, renda familiar, tempo de profissão, sexo, grau de instrução e estado civil, em dados absolutos e relativos.

Tabela 1:
Perfil sociodemográfico dos profissionais do embelezamento, São Luís - MA,

Frequência de respostas sobre o conhecimento dos profissionais quanto à transmissão e prevenção de doenças de risco ocupacional

Dos sujeitos, 86,1% referiram que poderiam adquirir alguma doença de seus clientes, e 70,6% também reconheciam que poderiam ser uma fonte potencial de infecção aos seus clientes. Dos participantes, 92% e 69,7%, respectivamente, já tinham ouvido falar antes sobre o HIV/aids e as hepatites virais, e 91,6% referiram saber como prevenir estas enfermidades.

As doenças mais citadas quanto ao risco de contágio e de transmissão, durante a atividade profissional, foram hepatites virais, HIV/aids e infecções por fungos; e as menos citadas foram outros tipos de doença, infecções por bactérias, doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e diabetes (Figura 1).

Figura 1
Distribuição das doenças infecciosas citadas pelos profissionais do embelezamento quanto à transmissão e contágio no município de São Luís-MA, 2015

Quanto às formas de prevenção destes agravos, as mais frequentes foram as relacionadas à utilização de preservativos (31,31%), material esterilizado (20,89%) e luvas descartáveis (15,15%) (Figura 2).

Figura 2
Distribuição das formas de prevenção das doenças infecciosas citadas pelos profissionais do embelezamento no município de São Luís-MA, 2015

Percentual de adesão dos procedimentos de biossegurança adotados nos serviços de embelezamento

Com relação à adoção de medidas de biossegurança, 62,6% dos inquiridos declararam que já tinham entrado em contato com sangue de clientes sem o uso de luvas. Destes, 43,4% aplicaram algum tipo de medicamento e 20,1% fizeram uso de álcool como medidas preventivas. Quanto à higienização das mãos (HM) entre o atendimento de um cliente e outro, 74,4% afirmaram adotar este procedimento.

Chama atenção que 32,8% dos entrevistados relataram não utilizar nenhum tipo de EPI durante as suas atividades laborais, 5% nem mesmo tinham conhecimento de quais tipos de EPI seriam necessários à sua prática profissional. Com relação aos processos de limpeza, desinfecção e esterilização dos instrumentais, 21,8% declararam não ter conhecimento acerca das diferenças entre estas práticas, a forma de realizá-las e os equipamentos necessários para tais.

Os resultados relacionados com o conhecimento e práticas de biossegurança realizadas pelos participantes desta pesquisa são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2:
Procedimentos de biossegurança realizados pelos profissionais de embelezamento, São Luís - MA, 2015

Discussão

O risco de infecção e transmissão silenciosa de importantes agravos por meio de tratamentos de beleza oferecidos por manicures/pedicures, tatuadores e colocadores de body-piercing, representa grave problema de saúde pública para esses profissionais e seus clientes, caso as boas práticas de biossegurança não sejam adotadas9.

Neste estudo, encontrou-se baixa adesão relacionada aos procedimentos de biossegurança, acompanhada de pouca percepção do risco de contaminação no ambiente de trabalho, por meio da manipulação de material biológico, potencialmente, transmissor de agentes infecciosos, como os das hepatites B e C, e do vírus da Imunodeficiência Humana. Estes dados convergem para uma pesquisa internacional realizada em uma cidade do Paquistão sobre conhecimentos e práticas de barbeiros e esteticistas quanto à prevenção de hepatites virais12, e em um distrito de Gana sobre a consciência dos barbeiros e os fatores associados ao risco para a transmissão do HBV e HCV13.

Um estudo realizado com profissionais da beleza na capital Goiânia e região metropolitana, Estado de Goiás, também constatou um nível insatisfatório/insuficiente de conhecimento quanto aos aspectos relacionados à adesão das recomendações de biossegurança6, resultado que foi semelhante ao encontrado com profissionais manicures/pedicures na cidade de Maringá (PR)3, assim, como em um estudo na cidade de Itaúna (MG)11.

No que tange à caracterização dos profissionais, 94,5% dos participantes eram do sexo feminino, jovens com idade média de 34,13 anos, reafirmando o predomínio de profissionais dos serviços de embelezamento com este perfil11. Contudo, ressaltamos que os tatuadores e piercers eram na sua totalidade do sexo masculino, fato comum para outras categorias normalmente ocupadas por homens2.

Mais da metade dos entrevistados tinha ensino médio completo e trabalhava neste segmento cerca de até 10 anos, resultado que se encontra em consonância com outros achados6-7, porém estas características não representam a garantia do cumprimento das boas práticas de biossegurança no ambiente ocupacional8-9,14-15. Dos entrevistados 42,4% referiram trabalhar na profissão por período superior a 10 anos; portanto, iniciaram suas funções antes do reconhecimento legal da profissão de manicure, que ocorreu em 2012, pela lei 12.59216. A atuação profissional sem amparo legal ao longo dos anos e o fato de não existir órgãos de classe que autorizem e regularizem a atuação destes profissionais, aliado a que o desenvolvimento das atividades não requer formação específica ou qualquer tipo de qualificação, desestimulam a busca por capacitação e geram prática informal e descumprimento de normas de biossegurança.

Com relação às enfermidades que poderiam ser adquiridas e transmitidas por meio de ações não seguras e falta de conhecimento a respeito, os resultados sugerem que a maioria dos inquiridos é ciente sobre a importância do HIV/aids e das hepatites virais frente aos riscos biológicos associados à sua ocupação. Apesar disto, estudos anteriores realizados no Brasil, referem pouco conhecimento das manicures/pedicures sobre formas de transmissão/prevenção das hepatites virais17.

Entre as ações inseguras, um dado relevante é que uma parcela considerável dos sujeitos (62,6%) referiu não utilizar luvas de procedimento quando em contato com material biológico (sangue) dos seus clientes. Este dado demonstra a suscetibilidade de profissionais do embelezamento para adquirir doenças infectocontagiosas como hepatites B e C, HIV/aids, dermatoses bacterianas18.

Foi mencionada a não utilização da luva como EPI durante o atendimento à clientela entre as manicures/pedicures. Por outro lado, entre os tatuadores e piercers, a adesão a esta prática mostrou-se mais habitual, talvez pelo fato de que as pessoas que tinham nível superior estavam inseridas neste grupo, e que os estúdios estavam localizados em shopping centers ou áreas mais nobres da capital, portanto, em locais com um público mais instruído e exigente.

No que diz respeito à conduta dos profissionais após um acidente com exposição ao material biológico, verificamos que pequena parte destes (7,9%) praticava medida preventiva imediata, como a lavagem do local com água e sabão e álcool (20,1%). A recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e do Centro para Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (Center of Disease Control and Prevention - CDC) para tal caso é a lavagem exaustiva do local exposto com água e sabão e o uso de soluções antissépticas, como o álcool 70%, que reduz a quantidade de microrganismos, mas não remove sujidades19.

Quanto à pergunta sobre o uso de artigos descartáveis, 16,8% dos profissionais afirmaram reutilizar materiais de uso único, como palitos de madeira e/ou lixas de unhas, por exemplo, que podem entrar em contato com o sangue, outros fluídos corpóreos e fragmentos de unhas. Assim, os profissionais precisam estar cientes desse risco como um meio de transmissão de agentes infecciosos7.

Referentemente ao quantitativo de cada item do conjunto de instrumentais que os profissionais necessitam para o atendimento aos clientes, chama atenção que 35,3% responderam que apenas um instrumental era o ideal, 13,4% e 16,8% afirmaram serem suficientes dois e três instrumentos, respectivamente. Os percentuais acima são insuficientes e preocupantes, e convergem com dados coletados na Turquia, onde apenas 2,6% das manicures/pedicures usavam um conjunto de instrumentais diferente para cada cliente20. Talvez este resultado seja atribuído ao fato dos preços destes instrumentais serem considerados elevados tendo em vista a baixa renda salarial da maioria dos profissionais da beleza.

Quanto à utilização de EPI - luvas descartáveis, máscara de proteção descartável, óculos de proteção, touca descartável, e outros, como luvas emborrachadas para lavagem e enxague de material a ser esterilizado, 32,8% declararam que não aderiam ao uso destes equipamentos, e 5% relataram que não sabiam qual o significado e os tipos de EPI. Cumpre ressaltar que, apesar de 62,2% terem declarado que faziam adesão ao EPI, tais como o uso de luvas e a prática da HM, durante as entrevistas, os pesquisadores não observaram os profissionais fazendo uso destes equipamentos no momento da execução dos procedimentos. Embora os profissionais desta área estejam conscientes sobre os riscos biológicos existentes associados à profissão, sua adesão às normas de biossegurança não é condizente com o seu conhecimento, onde a percepção do risco de contaminação por doenças graves, como hepatites virais e aids, não consegue provocar transformações de práticas no ambiente profissional. O fato do sangramento ser pequeno e raro durante a retirada de cutículas, além disso a confiabilidade na saúde das clientes, para alguns autores são características da percepção de risco mínimo nessa população8. No presente estudo 21,8% dos entrevistados responderam que não havia qualquer diferença entre os procedimentos que envolvem limpeza, desinfecção e esterilização, e 24,4% afirmaram desconhecer o processo de desinfecção dos seus instrumentais. Quando questionados sobre o método para esterilização dos materiais utilizados nos atendimentos, somente 13,9% citaram realizar a esterilização em autoclave; 79,8%, em estufa; 3,4%, o uso de “forninho” (aparelho sem termômetro ou termostato); e 1,7% respondeu que não realizavam a esterilização. Foi encontrado também que 68% dos profissionais referiram usar autoclaves, tal achado foi semelhante aos resultados identificados em Itaúna11 e na cidade de Arcos2, ambas no estado de Minas Gerais, onde se destacou o calor seco, representado pela estufa com 83% dos casos, seguida pela autoclave com 11,3% e 3,8% destes, respectivamente. Esta baixa utilização por meio de autoclave possivelmente relaciona-se ao maior custo comparado às estufas ou até mesmo pelo desconhecimento deste tipo de esterilização2.

Em alguns salões de beleza localizados em áreas de maior poder aquisitivo, os proprietários por vezes não permitiam que as manicures/pedicures participassem do estudo. Existem poucos serviços de tatuagem e colocação de piercing proporcionados na cidade de São Luís, e os endereços de grande parte dos estabelecimentos fornecidos pela Vigilância Sanitária do município estavam desatualizados.

A partir destes achados, sugerimos a implantação e implementação de campanhas educativas em saúde pública com esclarecimento, principalmente, em epidemiologia de HBV, HCV e HIV, e recomendações de biossegurança para o uso de EPI e procedimentos de lavagem/desinfecção/esterilização para os profissionais e população. Para minimizar o risco de infecção ocupacional com vírus transmitidos pelo sangue, recomendamos também que as autoridades públicas produzam materiais educacionais apropriados para serviços, estabelecendo curso de reciclagem obrigatório, além de melhoria na formação da categoria da estética e beleza, com oferta de capacitações e treinamentos, e maior rigor na fiscalização sanitária e no credenciamento dos estabelecimentos e dos profissionais.

Considerando que a enfermagem e demais profissões afins têm atuação relevante na educação em saúde e formação profissional, entende-se a importância do papel desses profissionais no que tange aos serviços desenvolvidos em estabelecimentos de embelezamento, a fim de otimizar a identificação de acidentes com materiais perfurocortantes e aumentar a adesão às recomendações de biossegurança. Esta pesquisa reafirma a importância de uma maior atenção das autoridades sanitárias municipais, estaduais e nacionais, das instituições de ensino, pesquisa e extensão e sociedade civil, para a elaboração de Políticas Públicas em biossegurança voltadas para a saúde desses profissionais e da sua clientela, visto que todos devem ser atores responsáveis pelo desenvolvimento de práticas seguras nesse âmbito.

Conclusão

Este estudo sobre avaliação do conhecimento e das práticas de biossegurança adotadas por profissionais do segmento da beleza, identificou que as doenças mais citadas quanto ao risco de contágio e de transmissão na prática laboral foram as hepatites virais, HIV e fungos. Com relação às formas de prevenção, as mais frequentes foram o uso de preservativos, materiais esterilizados e luvas descartáveis. Sobre os procedimentos de biossegurança adotados, a maioria referiu fazer uso de equipamentos de proteção individual, contudo, grande parte da amostra entrevistada já entrou em contato com sangue de clientes, sem o uso dos mesmos. Um percentual elevado referiu saber a diferença entre os processos de limpeza, desinfecção e esterilização dos instrumentais, no entanto, a estufa foi o método de esterilização mais utilizado. Prevaleceu o uso de algum tipo de medicamento e de álcool após a ocorrência de sangramento nos procedimentos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    08 Dez 2016
  • Aceito
    27 Jul 2017
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