RESUMO
Sitiantes tradicionais apropriam-se da terra e gerem seus territórios por meio de saberes adaptados aos ecossistemas locais, adotando práticas comunais e regras consuetudinárias vinculadas a valores comuns ao modo de vida tradicional. A reprodução material e cultural desses grupos está calcada em uma forte condição de autonomia territorial em diversas escalas, em uma complexa rede de reciprocidade e ainda na disponibilidade de terra. Dessa perspectiva, por meio de um estudo de caso, o trabalho analisa o processo de transformação da territorialidade de um grupo frente à emergência da sociedade contemporânea. Foram constatadas diversas estratégias adaptativas nos contextos econômico, político, ecológico, demográfico e religioso. E no delineamento dessas, os valores assumem um papel decisivo. Observou-se que a estratégia econômica é a primeira a ser acionada, com perdas significativas para o acervo tecnológico tradicional, incluindo o saber sobre o uso e o manejo da biodiversidade.
Palavras chaves: Cultura caipira; Unidades de conservação; Adaptação cultural; Conflito territorial
RESUMEN
Granjeros tradicionales se apropian de la tierra y administran sus territorios a través del conocimiento adaptado a los ecosistemas locales, adoptando prácticas comunales y las normas consuetudinarias vinculadas a valores comunes a la forma de vida tradicional. La reproducción material y cultural de estos grupos se basa en una fuerte condición para la autonomía territorial en varias escalas, a una compleja red de reciprocidad y también a la disponibilidad de tierras. Desde esta perspectiva, a través de un estudio de caso, este trabajo analiza el proceso de transformación de la territorialidad de un grupo frente a la emergencia de la sociedad contemporánea. Fueron constatadas varias estrategias de adaptación en el contexto económico, político, ecológico, demográfico y religioso. En el desarrollo de estas, los valores asumen un papel decisivo. Se observó que la estrategia económica es el primero en ser lanzado, con pérdidas significativas para los acervos tecnológicos tradicionales, incluido el conocimiento sobre el uso y manejo de la biodiversidad.
Palabras clave: Cultura caipira; Unidades de conservación; Adaptación cultural; Conflicto territorial
ABSTRACT
Traditional farmers appropriate land and manage their territories through knowledge adapted to local ecosystems, adopting communal practices and customary rules linked to values common to the traditional way of life. The material and cultural reproduction of these groups is based on a strong condition of territorial autonomy on various scales, in a complex network of reciprocity and on the availability of land. From this perspective, through a case study, this work analyzes the process of transformation of the territoriality of a group facing the emergence of contemporary society. Several adaptive strategies were found in economic, political, ecological, demographic and religious contexts. Values play a decisive role in the definition of all these. It was observed that the economic strategy is the first to be triggered, with significant losses to the traditional technological stock, including knowledge about the use and management of biodiversity.
Keywords: Caipira culture; Conservation units; Cultural adaptation; Territorial conflict
INTRODUÇÃO
Lavradores ou sitiantes tradicionais desempenharam importante papel junto às cidades no Brasil (QUEIROZ,1973a; RIBEIRO,1995). Com uma economia instituída fundamentalmente para a exploração agrícola em larga escala, voltada à exportação de alguns poucos gêneros, no Brasil Colônia as cidades contavam prioritariamente para o abastecimento de alimentos com os excedentes produzidos pelo pequeno lavrador (PRADO JÚNIOR, 1976). Desse modo, coexistiam no país dois tipos de economia que apoiavam dois estilos de vida diferentes: a economia das grandes propriedades, voltada para a produção monocultora, destinada ao mercado internacional, e aquela complementar da economia e da urbanização do país (QUEIROZ; FUKUI, 1968), caracterizada pela economia doméstica ou de excedente, conforme Martins (1997).
Do mesmo modo que nos demais estados do Brasil, em São Paulo, por muito tempo, os sitiantes tradicionais, no caso, vinculados à cultura caipira , cumpriram a função de abastecimento das cidades (QUEIROZ,1973b), estabelecendo com elas uma relação de comercialização do excedente da produção agrícola que compunha sua estratégia de reprodução social. O estilo de vida do sitiante tradicional formou-se em função da cidade, numa relação de equilíbrio de complementaridade, o sitiante com sua economia doméstica semifechada fornecia a ela os víveres, trocando-os por aquilo que não produzia (QUEIROZ; FUKUI, 1968; QUEIROZ, 1973b).
Após as políticas estabelecidas nos governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubtschek, observa-se uma nítida transição nos cenários políticos e econômicos do Brasil, passando de um país agrário-exportador para um país urbano-industrial (SILVA, 2006). Desse modo, entre as décadas de 1930 e 1960, especialmente São Paulo, passou por grandes transformações, intensificando-se o processo de urbanização e consolidando-se a Região Metropolitana.
O processo de urbanização e industrialização reflete uma nova lógica de desenvolvimento que, por sua vez, estabelece mudanças profundas nos valores sociais e nos relacionamentos vigentes na sociedade brasileira, ocorrem modificações estruturais na sociedade e na economia do país (LOPES, 2008; MARTINS,1975; MONBEIG, 2004; SANTOS,1993; SILVA, 2006), demarcando a emergência da sociedade contemporânea urbano-industrial.
Shanin (2008) lembra que durante o século XIX muito se debateu sobre as comunidades rurais, incluindo a direção em que estas estavam se movendo em decorrência das principais mudanças desencadeadas pelo desenvolvimento do capitalismo. Algumas projeções daquele debate se realizaram como, por exemplo, a previsão de que, em alguns países, grande parte das comunidades rurais precisariam realizar trabalhos alternativos, possivelmente num contexto de "involução rural", que se refere a uma situação em que a pobreza não se resolve sozinha, tendendo a se tornar cada vez mais profunda, expulsando as pessoas do campo.
Além dos saberes sobre o uso e o manejo dos ecossistemas naturais em que habitam, lavradores com modo de vida tradicional são, na atualidade, reconhecidos como guardiões de variedades localmente desenvolvidas, constituindo os seus sistemas de produção importantes acervos de animais e plantas adaptados e melhorados (CLEMENT et al.,2007; MMA, 2006; PELWING et al., 2008; TOLEDO; SANTILLI; MAGALHÃES, 2008), portanto exercem um papel de destaque na proteção da biodiversidade, incluindo agrobiodiversidade.
Propõe-se neste trabalho construir um raciocínio que possa contribuir para a reflexão dos aspectos relacionados às transformações na relação sociedade-natureza das comunidades tradicionais no estado de São Paulo frente à emergência da sociedade contemporânea urbano-industrial. Considerando a persistência histórica da área de estudo enquanto um típico sítio ou bairro rural tradicional, a pesquisa foi orientada pelas seguintes questões: quais transformações ocorreram na territorialidade caipira num processo histórico de pressões e dinâmicas exógenas? Quais as especificidades desse bairro para ter-se mantido mais conservado que os outros poucos bairros remanescentes até os dias atuais?
MATERIAL E MÉTODO
PERSPECTIVA TEÓRICO-METODOLÓGICA
O presente estudo define-se por uma abordagem territorial. Enquanto produto da relação sociedade-natureza, o território, na perspectiva adotada, é múltiplo, diverso e complexo (HAESBAERT, 2007); envolve sempre e ao mesmo tempo,
uma dimensão simbólica, cultural, através de uma identidade territorial atribuída pelos grupos sociais, como forma de 'controle simbólico' sobre o espaço onde vivem (sendo também, portanto, uma forma de apropriação), e uma dimensão mais concreta, de caráter político-disciplinar: a apropriação e ordenação do espaço como forma de domínio e disciplinarização dos indivíduos (HAESBAERT,1997, p. 42).
A todo território corresponde uma territorialidade que "além de incorporar uma dimensão mais estritamente política, diz respeito também às relações econômicas e culturais" (HAESBAERT, 2007).
Território e territorialidade são, assim, multidimensionais, inerentes à vida na natureza e na sociedade (SAQUET, 2009). "A territorialidade efetiva-se em distintas escalas espaciais, varia no tempo através das relações de poder, das redes de circulação e comunicação, da dominação, das identidades, entre outras relações sociais realizadas entre sujeitos e entre estes com seu lugar de vida, tanto econômica como política e culturalmente" (SAQUET, 2009).
Do ponto de vista analítico, nesta pesquisa, com base em Haesbaert e Limonad (2007), destacam-se como aspectos relevantes para a compreensão do territórios e da territorialidade, 1) a composição na interação entre a dimensão material e imaterial, vinculadas, respectivamente, à esfera político-econômica e à esfera da cultura; 2) a temporalidade, tendo em vista que os territórios são uma construção histórica, passando por transformações ao longo da história e que as territorialidades também se conformam ao longo do tempo; 3) a identidade, que ao mesmo tempo molda e é moldada pelo território; 4) o grau de fechamento e/ou controle de acesso das fronteiras; 5) a continuidade e descontinuidade do território, ou seja, seu maior ou menor grau de fragmentação; 6) a maior ou menor instabilidade territorial, seja pela facilidade em recompor os desenhos fronteiriços, seja pela facilidade em diminuir e aumentar o seu grau de acessibilidade ligada à maior ou menor fragmentação territorial; à duração de uma territorialidade no tempo e ainda à maior ou menor superposição a que um território está submetido.
Para uma melhor interpretação dos aspectos culturais, adota-se a perspectiva de Claval (1999), segundo a qual a cultura é composta pelos conhecimentos, técnicas e saber-fazer ambientais, pelos conhecimentos, técnicas e saber-fazer sociais, e pela esfera de valores que tem por função integrar os dois outros componentes, definindo as opções ambientais e sociais, aceitas ou rejeitadas.
A partir do estudo de caso, buscou-se aprofundar a reflexão sobre como se processam os conflitos territoriais decorrentes de diferentes racionalidades e modo de vida: o rural tradicional e o contemporâneo, urbano-industrial, bem como desvendar as singularidades de um bairro rural tradicional caipira.
De acordo com Lüdke e André (1986), o caso pode ser similar a outros, mas é ao mesmo tempo distinto, pois tem um interesse próprio. Segundo os autores, o interesse sobre ele se dá por aquilo que ele tem de único, de particular; o objeto estudado deve ser tratado como uma representação singular da realidade, que é multidimensional e historicamente situada.
Para Santos, é por meio do estudo de caso que se apreende na análise a complexidade das variáveis, lembrando que quanto "mais pequeno o lugar examinado, tanto maior o número de níveis e de determinações externas que incidem sobre ele. Daí a complexidade do estudo do mais pequeno." (SANTOS,1985, p. 3).
A entrevista semiestruturada (TRIVIÑOS, 1995) foi adotada como instrumento de coleta de dados em campo e a análise do material foi realizada utilizando-se o método de análise textual discursiva (MORAES, 2003).
ÁREA DE ESTUDO
Localizado no domínio Mata Atlântica, município de Ibiúna - SP, aproximadamente 120 km da cidade de São Paulo, o bairro dos Paulo, é um raro testemunho, no estado de São Paulo, da organização social rural do Brasil Colônia. No passado integrava um conjunto formado por vários outros bairros, os quais interagiram por séculos, formando um grande território caipira, marcado pela endogamia não apenas de parentesco, mas também territorial, cujos habitantes se autodenominam nativos (SANTIAGO, 2013). Esses enquadravam-se na categoria de "sitiantes independentes", proprietários de direito ou de fato, em regime de trabalho autônomo, familiar, vivendo em simbiose com a cidade (QUEIROZ, 1973a). Muitos bairros, incluindo o dos Paulo, foram, em 1978, afetados pela criação da Reserva Estadual do 2º Perímetro de São Roque, mais tarde transformada no atual Parque Estadual do Jurupará, abrangendo uma área equivalente a 23.950,47 ha.
Entre os poucos bairros rurais tradicionais remanescentes do então chamado sertão de Ibiúna, o bairro dos Paulo é o que mantém as características organizacionais mais conservadas; sua ocupação atual vincula-se a um processo histórico (e cíclico) de uso e transmissão da terra, dentro de uma mesma família. Os moradores formam uma família extensa, procedente de uma família nuclear composta de pai, mãe e cinco filhos (quatro homens e uma mulher), totalizando oito famílias.
Com o objetivo de aprofundar a compreensão sobre a lógica da relação sociedade-natureza no modo de vida tradicional, Santiago (2013), em sua pesquisa no bairro dos Paulo, revelou as características marcantes do grupo até 1960. Segundo a autora, o Bairro instituiu-se sob uma lógica territorial que associava, em iguais proporções, funcionalidade e identidade. O patrimônio territorial definia-se pela terra (passando de uma geração a outra) e pelo saber-fazer, um saber autônomo incluindo o conhecimento sobre o uso e o manejo dos recursos naturais e os valores e regras de convívio social, como a reciprocidade, o respeito à autonomia de cada família, as hierarquias de comando estabelecidas e as normas de uso e transmissão da terra. Como todo grupo de modo de vida tradicional, adotavam como categorias culturais nucleantes, conforme o entendimento de Woortmann (1990), terra-trabalho-família.
O desprendimento material e o igualitarismo social eram aspectos marcantes entre nativos. O saber-fazer local e as fortes relações de reciprocidade conferiam ao grupo um alto grau de autonomia, marcada pela grande capacidade de autogestão, pela quase completa independência em relação à cidade e pelo uso restrito do dinheiro (SANTIAGO, 2013).
A reciprocidade constituía-se de relações de ajuda mútua dentro do Bairro e entre bairros, e de relações especialmente comerciais entre os bairros e a cidade. Manifestava-se também na relação homem-natureza, fundamentada na tríade Deus-homem-terra, de maneira que o sobrenatural exercia papel central na definição de regras/saberes sobre o uso e a exploração dos recursos naturais.
No passado, Ibiúna e Juquitiba, municípios limítrofes, integraram o então chamado sertão de Itapecerica, amplamente estudado na década de 1960 (FUKUI, 1972; QUEIROZ, 1973a; QUEIROZ, 1973b; QUEIROZ; FUKUI, 1968) e considerado, na ocasião, como a área de ocorrência caipira mais conservada do Estado (PETRONE,1995; QUEIROZ, 1973b).
TRANSFORMAÇÕES NA TERRITORIALIDADE CAIPIRA
Apesar das profundas transformações socioeconômicas pelas quais vinha passando o estado de São Paulo, mesmo após a década de 1950, alguns lavradores caipiras conseguiram manter a venda dos excedentes da lavoura na cidade de São Paulo. Com grande parte dos caipiras abandonando suas atividades (PETRONE 1995; QUEIROZ,1973b; SEABRA,1971), muito provavelmente, ao longo dos anos, iam abrindo-se brechas no comércio que favoreciam a permanência daqueles que viviam nas áreas ainda mantidas sob menor impacto do desenvolvimento urbano e industrial e, consequentemente, com maiores dificuldades para buscar alternativas econômicas que lhes favorecessem tanto quanto a lavoura no passado. Esse foi o caso dos sitiantes tradicionais caipiras do sertão de Ibiúna, que conseguiram manter o comércio dos excedentes da lavoura até 1960, prática realizada na cidade de São Paulo, nos mercados de Santo Amaro e Pinheiros, retraindo-se ao longo do tempo para localidades mais próximas: Itapecerica da Serra, Ibiúna e Juquitiba.
Contudo, a partir de meados da década de 1950, alguns eventos locais estabeleceram um marco nas alterações socioeconômicas que passam a se materializar no bairro dos Paulo, são eles: a abertura de estradas pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), uma delas com travessia dentro do Bairro, devido à implantação de duas usinas hidrelétricas, possibilitando maior circulação interna e facilidade de acesso externo ao Sertão, e a abertura da Rodovia Régis Bittencourt (BR 116), em 1957, nas proximidades da área de estudo.
Também em meados de 1950, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) iniciou a caracterização das posses do "2º Perímetro de São Roque" (abrangendo a totalidade do Parque Estadual do Jurupará e outras poucas glebas), cujo objetivo era demarcar as terras ocupadas, identificar os ocupantes e a legitimidade das posses para posterior titulação; trabalho que durou vários anos e que interessa particularmente à pesquisa por seus desdobramentos.
Foi, portanto, no final da década de 1950 que se reuniram os fatores que deram início, no local, ao processo de transformação na territorialidade das famílias caipiras. Nesse processo, é possível distinguir nitidamente três grandes marcos, são eles: a extração e comércio de produto lenhoso da floresta, a criação da Reserva Estadual e após a do Parque Estadual.
A EXPLORAÇÃO FLORESTAL
Em 1960, com a perda gradativa do comércio dos excedentes na cidade de São Paulo e a abertura das estradas, inicia-se no sertão de Ibiúna a substituição da agricultura pelo extrativismo florestal visando o comércio de toras e carvão .
Até o final da década de 1950, aquele era um território que só havia conhecido as marcas dos seus moradores, os caminhos de tropa, cujo intenso movimento se fazia com a passagem dos moradores, em geral a pé (descalços), baldeando nas costas a colheita da roça distante da moradia, puxando seus poucos ou muitos burros, que transportavam os produtos agrícolas ou os adquiridos na cidade, quando de lá chegavam, ou, ainda, nos dias de festa, transitando de um bairro a outro. "Depois que a CBA abriu a estrada entrô um maderero aí, um tal de Paulo Forete, lá de Itapecerica, e o outro Dito Costa, os primero maderero que entraram aqui nessa época." (Depoente 1, abr./2009).
A exploração florestal não era uma atividade ilegal e se generalizou por todos os bairros. Nos Paulo, substituiu quase que totalmente o excedente, mas, de início, não afetou drasticamente a vida dos moradores. As roças de subsistência continuavam a ser feitas, todavia mais restritas, aproveitando-se parte das áreas onde se efetuavam as derrubadas de mata.
Com o tempo, as lavouras foram abandonadas pela maioria dos moradores, ocorrendo também uma acentuada queda da indústria doméstica; o extrativismo, especialmente o carvão, passou a ser a atividade principal.
O carvão representava o trabalho difícil e o dinheiro "fácil", de rápido retorno financeiro, fosse pelo tempo de extração do produto, comparado à lavoura, fosse pela grande demanda de mercado, também comparada a ela naquela ocasião. A princípio, era um bom negócio, não era mais necessário ir à cidade vender o produto, ausentar-se do sítio, o próprio interessado vinha ao Sertão buscá-lo.
As relações sociais dentro do Bairro e entre bairros alteraram-se, tendo como primeiro indicador a extinção dos mutirões, o que representou uma significativa desestruturação da organização social anterior, pois era por meio deles que se estabeleciam, em grande parte, as relações terra-trabalho-família numa escala que ultrapassava o núcleo familiar, era principalmente através do mutirão que se davam as relações de reciprocidade. Ou seja, a nova atividade reduz e simplifica a rede de solidariedade.
As famílias aparentadas dos Paulo, destituídas de terra e que viviam no Bairro em sistema de ajuda, partiram, permanecendo apenas os parentes diretos: pai, mãe e filhos, alguns solteiros e outros que começavam a constituir família. Essa saída ocorreu em virtude da queda da comercialização do excedente da lavoura e dos animais, e pela substituição por uma atividade econômica que, além de não comportar mais a ajuda permanente dos parentes, caso ocorresse seria paga em dinheiro e não mais em produtos da lavoura como ocorria, já que o comércio de toras e carvão substituiu a função econômica do excedente da lavoura, extinguindo um importante mecanismo de reciprocidade e manutenção da igualdade social. Outro aspecto relevante é que o pagamento efetuado certamente não seria suficiente para manter os familiares com a mesma fartura alimentar de antes.
Como esclarece Woortmann (1990) o sítio tradicional é um território de reciprocidade, um território de parentesco, portanto um lugar de troca, por isso não se assalaria. Não que a circulação do dinheiro não existisse anteriormente entre nativos, pois havia itens de primeira necessidade que não eram produzidos no sítio, mas se dava na forma de pequenos empréstimos, pagos mais tarde em serviço pelo tomador, ou seja, não era uma relação de trabalho, e sim uma troca de favores entre iguais, difícil de se configurar com a nova situação.
O talento para o comércio e a capacidade de estabelecer relações com o exterior, se já era um fator importante na época da lavoura, no negócio do carvão, era crucial. De tal modo, que essa característica passou a receber um peso diferenciado no grupo, estabelecendo-se, desde então, como um fator de prestígio social e de disputa entre os irmãos mais velhos da nova geração pela sucessão no comando da terra.
Foram as habilidades do segundo filho que permitiram no Bairro a retirada do atravessador na venda do carvão, elemento que explorava o povo do Sertão, também identificado nos estudos realizados em Juquitiba (QUEIROZ; FUKUI, 1968), estipulando o preço a ser pago e vendendo os mantimentos àqueles que já não produziam mais; reavendo, assim, uma parte significativa do dinheiro que havia pago aos carvoeiros. Contudo a venda direta não beneficiou igualmente todas as famílias do Bairro.
A quase ausência de memória, de detalhes sobre as relações sociais, sobre o fazer de cada dia, diferente da época dos antigos (frequentemente associada à união do povo, às festas, à riqueza e à fartura de alimentos), reflete um tempo de "vazio de vida". Com o carvão, festividade e trabalho já não se confundiam mais, como no passado, na época do mixirão. Os níveis de autonomia territorial e de reciprocidade tornaram-se restritos nos âmbitos do Bairro, do Sertão e da cidade, impondo à grande maioria dos moradores um alto grau de isolamento e empobrecimento material e social, diferentemente do que ocorria no tempo da lavoura.
Dessa perspectiva, corroborando com o exposto por Souza (2009), ao se pensar a autonomia coletiva em várias escalas, verifica-se que nada está mais distante da ideia de fechamento ou isolamento. As trocas e interações entre territórios de mesmo nível ou de nível escalares distintos são um fator de enriquecimento material e cultural, uma decorrência dos princípios de solidariedade e de ajuda mútua, conforme o autor.
Com a exploração florestal alterou-se o ritmo de vida do caipira. Antes comandado inteiramente pelos ciclos da natureza e em função da agricultura, passou a ser dominado pelo trabalho árduo que se dava por técnicas simples de derrubada das árvores, com machado e serra manual, bem como pelo fabrico do carvão, atividade não apenas fatigante, mas extremamente insalubre.
Contudo, é importante destacar que não se pode ver a exploração florestal apenas como uma imposição do mercado, mas também, e principalmente, como uma forma de resistência dos caipiras à manutenção da sua autonomia. Ao romperem com a lavoura, deixam de ser explorados dentro de um sistema econômico do qual não mais tinham governo sobre suas relações, subordinando-se aos preços e exigências dos comerciantes de São Paulo e demais cidades. As técnicas e os produtos do caipira, no contexto contemporâneo, passaram a ser desvalorizados ; a antiga produção de excedentes da maneira como se configurava fugia à nova lógica econômica estabelecida.
O carvão rompe, ao menos de início, com o desequilíbrio das relações comerciais com a cidade; além do que a nova atividade era rentável o bastante para que os sitiantes não se colocassem como reféns das técnicas agropecuárias modernas e do consequente consumo de todo o aparato que a agricultura brasileira já estava submetida.
Foi por meio do extrativismo, da produção de carvão que o sitiante caipira, de imediato, encontrou uma forma de sobreviver às profundas mudanças que dificultavam, cada vez mais, a venda de seus excedentes; de continuar mantendo a sua relação comercial com a cidade e, como pensou a princípio, de garantir sua autonomia. Enfim, a produção de carvão foi a maneira pela qual o caipira pode resistir às significativas transformações que a realidade social e econômica do país impôs a ele e à cidade com a qual, durante mais de um século, interagiu em situação de igualdade.
Por mais que o carvão tenha modificado o cotidiano das famílias no Bairro, a tríade terra-trabalho-família permaneceu enquanto valor, como lógica de vida. O território mantinha as mesmas funções, os mesmos significados: era a terra dos antepassados o meio de reprodução física e social da família. Ainda era a natureza, as habilidades tradicionais e o saber autônomo do sitiante que proviam o necessário à sobrevivência, era ele que estabelecia e fazia cumprir as regras no território ancestral, sob seu governo.
DISCRIMINATÓRIA DAS TERRAS E UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Paralelamente às transformações advindas da atividade carvoeira e madeireira, o impasse quanto à caracterização das posses e titulação das terras se manteve, adentrando a década de 1970. Nesse processo, além da já citada Companhia Brasileira de Alumínio, adquiriram terras na área empresas do ramo da indústria moveleira, veranistas e também agricultores japoneses, ocorrendo, com o passar do tempo, a dissolução de alguns bairros rurais tradicionais e o esvaziamento daqueles que permaneceram, tornando os bairros remanescentes dispersos no Sertão.
Em 1973 o Instituto Florestal (IF,1973) recomendou a instituição de Parque ou Reserva Estadual na área. Todavia, a declaração de uma Reserva ocorreu apenas em 1978 e jamais foi efetivamente implantada, a atuação do Estado restringiu-se a fiscalização esporádica pela então Polícia Florestal.
Somente quinze anos depois, em 1992, com a criação do Parque Estadual, a área passou a ser administrada. A decretação da nova categoria de unidade de conservação (uc), em substituição à antiga, estabeleceu a total restrição legal para o uso e a ocupação das terras.
O bairro dos Paulo e outros atingidos passaram, assim, a integrar uma área destinada à conservação da natureza um "território de exclusão" na expressão de Haesbaert (2006). O poder de comando dos nativos sobre seus territórios, foi drasticamente diminuído pela autoridade do Estado que se sobrepôs, ou melhor, se contrapôs, um contexto em que se reconhece claramente um processo de desterritorialização. Todavia, será possível verificar mais adiante, a desterritorialização nunca é completa ou desvinculada de processos de (re)territorialização (re)territorialização (HAESBAERT, 2004).
CONFLITOS E ESTRATÉGIAS TERRITORIAIS DECORRENTES DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Produtos da modernidade contemporânea, as reservas naturais são tipos específicos de territórios, cujo valor ao mesmo tempo simbólico e concreto e seu papel conservacionista parecem a princípio contradizer o espírito mutável da sociedade moderna (HAESBAERT; LIMONAD, 2007).
Atendendo exclusivamente às necessidades da sociedade urbano-industrial, as áreas naturais protegidas ao longo de sua história têm-se sobreposto a muitos territórios ancestrais e, reconhecidamente, gerado grandes conflitos e perdas às comunidades tradicionais indígenas e não indígenas. Nesse contexto, é mais um caso entre tantos que tiveram como importante vetor de transformação as políticas públicas de conservação da natureza.
Após a criação da Reserva, a exploração de madeira e carvão foi totalmente repreendida, tendo resistido por algum tempo como atividade ilegal. Com exceção de que não se podia mais explorar o carvão, os moradores não sabiam ao certo para que fim ela tinha sido instituída. Acreditava-se que as terras continuariam pertencendo à família e que um dia seriam parcialmente liberadas.
As restrições legais significam menor disponibilidade de terra e acesso aos recursos naturais, razão pela qual a disputa territorial já iniciada anteriormente entre os irmãos mais velhos se intensificou e passou a envolver todos os irmãos. A família havia crescido e também a demanda por mais terras para a lavoura, aos cinco irmãos com seus respectivos cônjuges somavam-se ainda 24 netos.
Os conflitos são tabus em um grupo que compartilha fortes valores de união, por sinal, imprescindíveis à manutenção do modo de vida tradicional. Assim, os depoimentos sobre as divergências em família pela permanência na terra e pela sucessão na liderança nem sempre foram objetivos e coincidentes, tendo sido necessário um esforço adicional na coleta, análise e interpretação dos dados.
A terra era e é de uso comunal, cada família nuclear tem um trecho bem definido sob seu comando que inclui as áreas de roça e moradia. As normas de uso, ocupação e transmissão da terra são consuetudinárias, a cada geração é eleito um entre os filhos para assumir o papel de cabeça, com maiores direitos e deveres e com poder de comando, de governo. Tais condições refletem um processo particular entre lavradores tradicionais de partilha de bens e escolha do sucessor que consolidam relações desiguais entre os indivíduos no interior do grupo e posições diferenciadas entre os gêneros (CARNEIRO, 2001), cujo objetivo maior é manter a integridade do patrimônio territorial ancestral, garantir a reprodução material e sociocultural da família (CARNEIRO, 2001; MOURA, 1986; WOORTMANN, 1995).
Nesse sistema de herança, uma parte da propriedade ancestral é concedida aos membros da nova geração, todavia mantendo intactas as terras da família por meio de algumas estratégias (WOLF, 1976), como, por exemplo, a saída de alguns membros (MOURA,1986; SHANIN, 2008; WOORTMANN, 1995).
Assim, o processo de transmissão da terra pode gerar grandes tensões, por isso, quando necessária, a saída dos "expulsos" habitualmente se faz de forma menos traumática, inculcando-lhes a saída desde cedo, e dando estrutura material para o momento do abandono das terras (MOURA 1978; WOORTMANN, 1995). Em geral, o processo é facilitado também por uma ideologia que se manifesta vetando a exteriorização dos conflitos, conforme expõe Moura (1978).
O critério de "expulsão" dos herdeiros pode estar relacionado a um talento específico que assegure condições para um bom desempenho na cidade (GODOI,1999; SHANIN, 2008), à condição feminina: a mulher não herda terras (CARNEIRO, 2001; MOURA, 1978; WOORTMANN,1995), e ainda ao caráter de grande autonomia e empreendedorismo, que garanta a capacidade de explorar novas terras e implantar um novo núcleo (CANDIDO, 2003).
Entretanto, no bairro dos Paulo havia terras o bastante para todos os filhos. Numa partilha igualitária, caberiam aproximadamente 75 ha. para cada um, o bastante para todos viverem bem, segundo as referências locais: "Cinco alqueire [12 ha.] de terreno, planejado com plantio dá pra um familiar vivê a vida tudo e fica feliz, cinco alqueire de propriedade de terra de plantio memo ela fornece pra familiar grande." (Depoente 2, jun./2007).
Ou seja, a área era suficientemente grande para garantir terras à lavoura, com suas respectivas áreas de pousio de solo, e uma reserva comum de floresta antiga . Desse modo, o processo de "expulsão", certamente não estava previsto naquela geração, nem mesmo em relação à filha, cuja tradição local previa que a mulher, ao contrair matrimônio, deveria acompanhar o marido para o seu bairro de origem. Ao que parece, o sucessor herdaria o poder de comando e privilégios em relação ao uso da terra, sem que houvesse a necessidade da saída dos demais irmãos.
Foram identificadas práticas que distinguem o tratamento do pai para com os filhos: primogênito, mulher e homens mais novos, evidenciando que as antigas regras de herança beneficiavam preferencialmente o primogênito. À filha e aos filhos mais jovens, ocorreram favorecimentos e doações que sugerem uma possível compensação material pela perda de privilégios de uso da terra, a exemplo da ocorrência descrita por Moura (1978) em seu estudo no sul de Minas Gerais, com a diferença de que as doações, naquele caso, ocorriam para os que deixariam a terra.
Em relação à filha, provavelmente a que seria menos favorecida, foi concedido o pagamento em dinheiro pelo trabalho na roça e, antes do matrimônio, foram cedidas áreas para cultivos, bem como concedidas fornadas de carvão, cuja produção, em ambos os casos, realizada com a ajuda do trabalho paterno, foi vendida e revertida exclusivamente em seu benefício.
Os filhos, com exceção do mais velho, quando contraíram matrimônio receberam como presente um ano de moradia na casa paterna com todas as despesas necessárias pagas e ainda o dinheiro da venda dos produtos resultantes do trabalho do casal na lavoura durante este mesmo ano, possibilitando a formação de um pequeno patrimônio financeiro para que, em seguida, os cônjuges começassem a vida em suas próprias casas. Todos os filhos mais novos, incluindo a filha, receberam local para cultivo próprio e para a construção da moradia nas terras que integram o Bairro; contudo, o mais velho, ao se casar, foi morar na casona como se diz na família, a mais antiga e a maior do Bairro. Também era ele que encabeçava junto com o pai o trabalho na lavoura.
Enquanto um bairro rural típico, portanto um testemunho da maneira pela qual se organizaram as unidades de povoamento histórico da colonização brasileira (QUEIROZ, 1973b), é presumível que recebesse mesmo uma forte influência da legislação fundiária do Brasil Colônia, herdada de Portugal, que previa o direito de primogenitura, especialmente se for considerado o contexto local de importante contribuição portuguesa, conforme constatou Santiago (2013).
Entretanto, as grandes transformações, que se iniciaram com a exploração florestal, exigiam estratégias e habilidades próprias, especialmente uma capacidade grande de envolvimento e enfrentamento com os novos sujeitos, que se impunham no cotidiano do caipira; um temperamento mais empreendedor, agressivo que, com certa facilidade, pudesse vislumbrar e colocar em prática alternativas para dar continuidade ao patrimônio familiar, à comunidade dos Paulo, não apenas na perspectiva da sobrevivência, mas de fortes, de remediados como sempre foram.
[...] meu pai morreu com quase 80 ano e nunca levô uma murta, porque eu que assinava no lugar dele, vinha quarqué coisa em cima dele eu que assinava. [...] Vô falá uma coisa certa, tem um filho que o pai gosta mais, meu pai, pra falá bem a verdade, era eu. Sabe por quê? Vô fala, a gente num tem estudo e raciocina, formá uma comunidade onde a gente tá. Então eu brincava com ele, aqui a gente pode fazê tudo, pode levantá uma farmácia, um mercado forte, um plantio forte [...] (Depoente 2, jun./2007).
Observa-se assim que a partir da intervenção do Estado foi intensificado um processo de empobrecimento material e de disputa territorial, que acarretou transformações estruturais significativas e estratégias traumáticas de adaptação, envolvendo o crescente embate entre os filhos mais velhos, a "submissão" de alguns e a saída de outros: o ultimogênito (hábil comerciante também) e alguns netos. O genro e os netos que permaneceram passaram a trabalhar fora do Bairro.
Em meados da década de 1980, a família adota a religião Pentecostal Assembleia de Deus. À exceção do segundo filho, que só se converteu após muitos anos, todos os moradores, inclusive o pai, abandonaram o catolicismo.
A dispersão e redução do número de bairros rurais tradicionais, a indisponibilidade de terras e a quebra da solidariedade entre os bairros, foram fatores que estabeleceram mudanças nas regras de matrimônio. Alguns homens e mulheres casaram-se com gente de fora, deixando obrigatoriamente as terras no segundo caso. Entre os poucos que permaneceram, reduziu-se drasticamente o número de filhos para um ou dois.
Com a criação do Parque, as regras eram claras, todos teriam de sair. A assídua presença do Estado e ao mesmo tempo a explícita falta de capacidade de fiscalização foram elementos que deram margem ao aparecimento de um novo sujeito: o "palmiteiro". Segundo os moradores, a exploração ilegal do palmito foi a primeira e mais importante mudança ocorrida com a criação da UC.
É evidente que não é o roubo de palmitos em si a questão central, mas o que ele significou: mais um elemento de conflito territorial, mais uma ameaça à autoridade dos moradores tradicionais sobre os seus territórios. "Aqui só se via palmito, agora pra acha um pé dá trabalho. Quando não era o Parque todos respeitava a divisa, depois muita gente fala: o Parque é do Estado então não tem dono." (Depoente 3, jun./2007).
No Bairro, mediante embate, a extração de palmito foi condicionada à autorização do segundo filho, o dito "pedágio". Essa era uma atividade clandestina, ilegal e colocava os moradores numa condição de marginalidade, mas, ao mesmo tempo e contraditoriamente, de dignidade, pois o que estava em jogo era uma questão de honra: defender as divisas do território ancestral e estabelecer as regras de acesso aos recursos que integram o patrimônio familiar. Em relação ao Estado, também uma forma de desafiar sua autoridade e de demonstrar sua incapacidade de fiscalização.
O envolvimento com a extração do palmito representou ainda a possibilidade de poder ultrapassar a miséria em que muitos nativos se encontravam, apesar de um retorno financeiro pouco compensador. No caso do segundo filho, foi um meio de demarcar sua autoridade dentro do Bairro, e de manter, ou aumentar, a diferenciação econômica em relação aos demais, agregando um ganho além da pequena venda que já possuía e da lavoura de subsistência que mantinha.
Mais uma vez, a habilidade em empreender, em negociar e em lidar com povo da cidade fez toda a diferença, mas desta vez foi necessária enquanto condição para lidar com uma situação de forte disputa territorial entre nativos, "palmiteiros" e Estado, uma circunstância, concordando com Sahlins (1970), de extrema reciprocidade negativa, cuja noção envolve um alto grau de astúcia, roubo e violência.
A criação do Parque desencadeou outros eventos que intensificaram as disputas internas. Muitos ocupantes que compraram terras dos nativos foram embargados, gerando o desemprego e a saída de muitos descendentes para outras localidades. Alguns poucos conseguiram se estabelecer mais próximo, trabalhando e morando na vila residencial das usinas da CBA, dentro dos limites do Parque.
O Estado admitiu três pais de família. Esse fato acirrou o conflito interno, não só porque se tornaram funcionários do Parque, e enquanto tal representavam uma autoridade que se sobrepunha à estabelecida no Bairro, mas também porque eram famílias que estavam sendo "expulsas". O emprego efetivo dava-lhes a estabilidade material necessária para continuar vivendo e convivendo na morada ancestral e, se quisessem, de repudiar o poder instituído - o que não aconteceu.
Todas essas mudanças remexeram com os valores do antigo sitiante caipira. A transformação da economia, a tentativa de manter, a todo custo, a autonomia e a sobrevivência de cada família ante a nova realidade, o esvaziamento dos bairros vizinhos, a chegada dos de fora, a ameaça de perda da terra, a restrição de acesso aos recursos naturais, tudo isso foi quebrando lentamente as formas de solidariedade, de reciprocidade positiva, antes presentes na sua rotina diária de vida, entrelaçando as relações terra-trabalho-família, em diferentes escalas. A igualdade foi cedendo lugar a uma diferenciação econômica que, com os mecanismos de manutenção do igualitarismo pouco ativos (em especial o mutirão), estabeleceu desigualdades antes pouco relevantes.
Queiroz (1973b), com base nas pesquisas realizadas no sertão de Itapecerica, no auge da atividade carvoeira, explicou que não são os indivíduos de fora que formam a hierarquia social, mas, sim, aqueles pertencentes ao próprio grupo de vizinhança. Porém a posição de preeminência no interior do bairro, só é possível quando não funcionam mais os mecanismos que protegem o igualitarismo e nem está mais em domínio o sistema de liderança tradicional, em que o fator econômico não encontrava muita expressão.
Num primeiro momento parece difícil avaliar se em consequência dos ganhos da produção florestal houve um comprometimento dos valores tradicionais no que se refere ao "enriquecimento" enquanto um fim em si mesmo, e deste modo uma dissolução do sistema tradicional de liderança, como identificado no sertão de Itapecerica, em que a transformação da economia pode gerar, dentro dos próprios bairros, indivíduos que exerceram opressão sobre os demais. Ou se, ao contrário, foram acionados mecanismos tradicionais extremos de manutenção da integridade do patrimônio. O mais provável é que todos esses elementos tenham sido operados, em um contexto de uma avalanche de transformações que incidia sobre os sitiantes e que exigia o equacionamento de um problema: a manutenção da integridade do patrimônio familiar ancestral e a reprodução dos Paulo na condição de fortes.
É certo que o conflito acionou formas de solidariedade e de resistência na terra entre a maior parte dos familiares/vizinhos, que se sentiram constrangidos a deixá-la ou a abandonar a lavoura. Explicitando os valores de união da família como um todo, o que se diz sobre o irmão que assumiu o comando, numa "justificativa" espontânea, é que "ele é o único diferente da família".
Uma coisa que eu num gosto é confusão, gosto de vivê tudo em paz. [...] A coisa mais ruim que tem é ocê vê um bairro tudo desunido, com briga pra tudo quanto é lado. Deus mi livre. (Depoente 4, ago./2009).
Com as novas estratégias de sobrevivência e de adaptação, os conflitos se abrandaram, com exceção do ultimogênito, todos os filhos permaneceram na terra, somando-se a lavoura, com tamanhos proporcionais ao direito de cada um (e dentro dos limites estabelecidos pelo Estado), a criação de animais, os salários e o comércio (incluindo o palmito, por alguns anos), a vida econômica do Bairro como um todo se estabilizou, ultrapassando o período de quase miserabilidade. Nenhum dos filhos se empregou em terra de alheio, somente o genro e os netos.
Assim, as novas soluções encontradas para cada família tenderam a acomodar uma situação de compartilhamento do território. O relativo equilíbrio econômico, ou melhor dizendo, a superação das dificuldades de sobrevivência, significou o restabelecimento da autonomia de cada família, apesar do conflito legal em relação ao Parque.
As tentativas de domínio e expulsão e os limites que cada família estabeleceu a estas, ainda que outros fatores possam ter influenciado, foram predominantemente impulsionados por regras e valores tradicionais. Não se pode dizer que a acomodação da situação de conflito tenha-se dado sem um consenso, a partir do qual foram estabelecidas novas regras para o compartilhamento e continuidade do território: o território dos Paulo.
[...] pra sê um bom vizinho, num sê um vizinho encrenquero, ficá só arrumando confusão, então ele tem que chegá ali, tem que combiná entre o vizinho a coisa que vai fazê, ele num vai levantá contra o vizinho. (Depoente 5, maio/2009)".
É por causa desse consenso que os moradores do Bairro, agentes do Estado, atuando inclusive na fiscalização do Parque, não se sobrepuseram à autoridade posta.
Como discute Souza (2009), se um grupo delibera, em condições de plena liberdade, sobre o estabelecimento de regras, como a de uso do solo e de fruição de recursos, o poder é compartilhado em condições de forte igualdade no tocante às chances de influenciar o estabelecimento do nomos. Em tais circunstâncias, os indivíduos são influenciados uns pelos outros na base da persuasão, mas não dominam uns aos outros, cada participante ver-se-á obrigado moralmente a respeitar as regras cuja construção participou livremente, mesmo que suas posições não tenham sido vitoriosas. Cada participante está submetido a um poder que emana legitimamente da coletividade, todavia, tal submissão jamais deve ocorrer de modo a asfixiar a liberdade individual.
Nesse contexto, é importante notar que no Bairro havia uma maioria e não uma minoria sendo "expulsa", que reagiu e admitiu como regra apenas o que era coerente com os princípios e condutas tradicionalmente aceitos pelo grupo, mesmo havendo outras referências de mundo e plenamente cientes do direito igualitário entre todos os herdeiros, segundo o Código Civil.
Estipuladas as novas regras, colocou-se em prática mais um valor caro ao território tradicional: a autonomia do grupo, ou seja, sua capacidade de autogoverno (DEMATTEIS, 2007; SOUZA, 2009).
Com a morte do primogênito e a viuvez do segundo irmão mais velho, que se casa com uma mulher de fora e estabelece moradia na cidade, deve iniciar-se outro ciclo na sucessão que parece se delinear entre os filhos desses dois irmãos, já que permanece a indefinição quanto à situação das comunidades tradicionais na área do Parque.
RELIGIÃO: ESTRATÉGIA DE MANUTENÇÃO DE VALORES TRADICIONAIS E EQUILÍBRIO DE PODER
No bairro dos Paulo, a prática religiosa caracterizava-se pelo catolicismo rústico, uma adaptação do catolicismo romano à realidade rural do Brasil Colônia, constituído por um esquema básico formado por ritos, crenças e culto aos santos, em que os principais "agentes religiosos" são o festeiro e o capelão, por meio dos quais mantém a sua independência da hierarquia católica oficial (QUEIROZ, 1973a).
A partir do entendimento de que as religiões são representações simbólicas das estruturas sociais em que são geradas, uma análise efetuada por Berlinck (1972) sugere que o catolicismo rústico surgiu em função da estrutura social brasileira, tendo como um de seus elementos de origem a agricultura de subsistência , atuando como mecanismo de integração comunitária e mediador das relações entre agricultor e natureza. Como explica o autor, por meio de práticas religiosas adicionadas ao catolicismo romano, o caboclo criou uma nova dimensão à visão do sagrado e deu expressão objetiva, perceptível aos seus sentidos, às relações entre si e o ambiente, mediadas pela agricultura.
Nesse sentido, Müller (1956) demonstra como os caipiras (no caso, caboclos paulistas), adaptaram o calendário litúrgico herdado do Hemisfério Norte às condições climáticas locais, estabelecendo modificações correlativas às datas e às épocas de real valor ritual.
Na religião rústica brasileira, moralidade e espiritualidade não representam um valor em si mesmas, o valor está na utilidade destas em asseverar uma existência mais tranquila e agradável ao grupo de vizinhança; o culto aos santos, a festa, a novena, as orações objetivam assegurar a boa vontade dos seres sobrenaturais (QUEIROZ, 1973a).
O calendário festivo-religioso era extenso e a festa do patrono local era da mais alta importância, o culto tinha a função de agradar o santo, caso contrário ele poderia vingar-se (QUEIROZ, 1973a). Ao catolicismo trazido de Portugal fundiram-se ainda elementos trazidos por indígenas e negros, apresentando variações nas diferentes localidades do Brasil (QUEIROZ, 1973a), um aspecto que configurou no território caipira um mundo sobrenatural próprio, povoado por seres encantados.
A partir da exploração florestal, as práticas e crenças religiosas gradativamente perderam sentido frente às mudanças. Muitas famílias do Sertão passaram por necessidade, os laços de reciprocidade entre homens tiveram de ser refeitos em outras bases, assim como a relação Deus-homem-terra. A floresta foi perturbada pelos nativos, alguns animais passaram a desaparecer e, segundo as antigas crenças, as práticas vigentes eram dignas de castigo. Assim, ao final da década de 1960 e início da de 1970, em outros bairros, a religião católica foi substituída pela Pentecostal Assembleia de Deus. O que ainda demora a acontecer no bairro dos Paulo. Apesar dos conflitos, por muitos anos a família conseguiu manter-se unida, com condições de sobrevivência e no exercício da religião católica.
Mas, do mesmo modo que nos demais bairros, a Assembleia de Deus entra no bairro dos Paulo no momento em que a pobreza assume grandes proporções para a maioria das famílias, quando as relações externas se afrouxam muito ou se rompem, quando a reciprocidade dentro do Bairro, do ponto de vista material e não material, torna-se muito limitada. Um momento em que os valores envolvidos na relação sociedade-natureza na cultura caipira são postos à prova, seja pelo conflito de terra dentro da família, seja pelas práticas em relação ao uso da natureza, centradas na exploração florestal intensiva e considerada ilegal após a criação da Reserva Florestal.
A Igreja Católica, na figura do padre, sempre esteve distante, uma condição típica do catolicismo rústico brasileiro (LOPES, 2008; MUSSOLINI,1970; QUEIROZ, 1973a), mas as frequentes ocasiões de festejos de dias de santos nos bairros, de batizado e de casamento; as romarias; a ampla possibilidade de ajuda mútua; o domínio dos ensinamentos da Bíblia e rituais católicos pelo próprio grupo, uma vez que o pai era Capelão, favoreciam, em época de riqueza, a "presença" da Igreja entre eles e, desse modo, a harmonia e a união do grupo.
Entretanto, com todas as dificuldades postas, a capacidade de o grupo exercer os ensinamentos da religião foi abalada. As transformações socioeconômicas não mais possibilitavam condições para os ritos religiosos, para cumprir com o amplo calendário de festas e cultos aos santos (entre eles, o culto a São Benedito, padroeiro do Bairro), bem como para as peregrinações aos grandes centros religiosos.
Tratava-se de um momento em que, diferentemente do passado, a presença do padre, enquanto enviado de Deus, autoridade maior, representante legítimo da Igreja, fazia toda a diferença para aconselhar, encorajar, mediar os conflitos e perdoar os pecados. Um momento em que o rito da missa se fazia mais necessário do que nunca. Além disso, amalgamados à religião católica estavam os seres encantados, entre outros o Curupira, o Pé Grande (pai do mato), o Saci Pererê, o cipó encantado, cuja função era especialmente o controle das transgressões. Naquele momento, esses entes representavam a ameaça de punição, explicitavam as contradições entre as condutas vigentes e os antigos costumes e crenças.
Como lembra Sahlins (1970), é por meio do divino, da religião, que os homens realizam para si próprios a autoridade moral da sociedade, estabelecem a disciplina, além deles mesmos, à qual se submetem, recompensando sua submissão. É nos rituais do culto religioso, nos quais o poder da sociedade é materializado na coletividade, que se afirma a autoridade da sociedade constituída. A religião pode integrar a sociedade, prover a coesão, promover a solidariedade e manter sua continuidade; na incerteza econômica, pode assumir a função de diminuir as contradições e conflitos de interesse nas relações sociais existentes (SAHLINS, 1970).
Desse modo, diante das transformações impostas pela sociedade urbano-industrial, diante do declínio da agricultura tradicional e de todas as contradições e conflitos vivenciados, o catolicismo rústico perde significado, sua racionalidade deixa de ter sentido quando um grupo enfrenta uma estrutura normativa e valorativa complexa, em que há regras de comportamento e concepções afetivas do desejável que se contrapõe (BERLINCK, 1972). "Nessas condições, há que se buscar em outras fontes orientações éticas e explicações para um mundo grandemente complexo e contraditório" (BERLINCK, 1972, p.148).
A Assembleia de Deus atendia plenamente não só às necessidades de reintegração social e de ajustamento e equilíbrio interno do grupo diante da nova realidade, mas também às de resguardar valores e princípios tradicionais caros. Entre as principais características e funções das igrejas presbiterianas estão: a ajuda mútua em situações de crise; a administração de tensões por meio da coesão grupal, cerimônias expressivas e de sentido de participação; o ascetismo para o progresso pessoal; o acesso ao poder através da eleição de representantes da igreja; a terapêutica e a de canal de comunicação e fonte de informação (BERLINCK, 1972).
Pode-se afirmar que a mudança de religião reforçou a autonomia do grupo, descentralizou o poder, restabeleceu os laços de reciprocidade além bairro e os fortaleceu entre os parentes/vizinhos dentro do Bairro, possibilitando a recuperação da vida social e a superação de momentos difíceis de crise material e social.
Na nova religião, o pastor é uma autoridade e, assim como o capelão, é alguém de dentro da própria comunidade. O culto é realizado rotineiramente, a rigidez na obediência aos mandamentos de Deus e a vigilância no seu cumprimento são muito maiores do que no catolicismo, atendendo às necessidades daquele momento de crise. O pastor é o representante da divindade superior que, como um pai, usa toda sua autoridade para devolver a ordem, a integração, a obrigação da solidariedade. A nova religião dá o devido respaldo para que o grupo reassuma o comando e restabeleça a ordem por si só, como sempre foi, o que inclui o cumprimento dos ritos religiosos que não mais carecem de qualquer recurso material para se realizarem.
A liderança religiosa dentro do bairro há muitos anos é exercida pelo filho do irmão mais velho, como se fosse devolvido algo de direito a sua família: "O mais velho tinha o direito de responsabilidade, mas o outro era o mais esperto." (Depoente 5, out./2009).
A noção de irmandade, entre os crentes da mesma religião, amplia a rede de sociabilidade e, assim, a obrigação da ajuda recíproca. Nesse contexto, a parentela se amplia, não é mais formada apenas pelos descendentes dos Paulo, ou pelos nativos do sertão, mas por todos os irmãos da Igreja. Tem-se agora a parentela da Igreja. Os cultos são realizados três vezes por semana, reunindo todas as famílias do Bairro. O segundo domingo do mês é o dia da Santa Ceia (dia da comunhão), neste evento os irmãos de uma igreja visitam outras das proximidades. Há, ainda, o Congresso, que ocorre no Bairro uma vez por ano, para o qual muitas igrejas de várias localidades distantes são convidadas e, por último, as festas de final de ano que também reúnem diversas igrejas.
Logo, o patrimônio cultural religioso, nesse caso, não deve ser entendido em sua essência por manifestações como festas, romarias etc., mas, sim, pela concretização de práticas que expressam a manutenção de valores tradicionais: a união, a autonomia e a reciprocidade.
Na parte da religião é só isso que muda: usava comê essas coisa [chouriço], agora num pode mais, a bebida num pode mais, fumá num pode mais, é só isso que é implicado. Mais, o resto, a base da religião é só isso, dizê que implica tudo, num é isso. Na parte de amá um o outro é mais do que era ainda. (Depoente 5, ago./2009).
Todavia não se pode deixar para trás certas crenças que, apesar de proibidas na nova ordem religiosa, suscitam fatos do passado, histórias vivenciadas na família e que remetem a crenças e valores relacionados à identidade caipira, ao homem do mato, como aquelas do Saci, do Caipora e do Pé Grande. "Essa história que ele tá contando é verdade, memo [sobre o Saci]. (Depoente 7., abr./2009). A caipora é bicho agressivo, agora ninguém fala mais nada, depois que a religião evangélica avançô, foi escondendo [...]". "Depois que o evangélico avançô, aí dexô dessas coisa, mais, que tem, tem. Só que a pessoa num pode acreditá." (Depoente 8, out./2009).
Para Teixeira (2006), é óbvio que há um grau de sincretismo religioso no pentecostalismo, mas este difere qualitativamente do sincretismo presente no catolicismo popular, pois não há ambiguidades, sagrado e profano mantêm-se separados, por exemplo, o pai de santo que se converte não deixa de acreditar nas práticas antigas, mas elas passam a ser demoníacas e proibidas.
Todavia, a resistência cultural/territorial observada entre os caipiras assinala a ambiguidade. A nova crença parece não se sobrepor ao respeito à autoridade ancestral e a certas práticas do catolicismo rústico. A comunidade mantém a antiga capela, espaço sagrado onde se cultuava o santo padroeiro: São Benedito, nome do fundador do Bairro e também do primeiro ancestral português a chegar ao Sertão, por volta do final do século XVI e princípio do século XVII. Do mesmo modo, os plantios só ocorrem até 25 de novembro, dia de Santa Catarina.
A PERSISTÊNCIA DOS PAULO NO SERTÃO
Todas as mudanças que ocorreram no sertão de Ibiúna nas últimas seis décadas, atingiram os diversos bairros e suas famílias de diferentes formas, fazendo com que cada qual, com sua história, suas possibilidades, buscasse se adaptar da melhor forma possível.
As famílias que permaneceram nos limites do Parque, mais ou menos bem-sucedidas no processo de adaptação, distinguem-se pela resistência territorial e pelo forte vínculo identitário com o lugar de vida dos seus antepassados por cerca de quatro séculos: o sertão de Ibiúna.
Todavia, a situação de integridade do bairro dos Paulo, no que se refere à manutenção do patrimônio histórico-cultural, material e imaterial e à permanência das famílias na terra ancestral é muito particular comparada aos demais bairros rurais tradicionais remanescentes. Todo o arranjo de soluções encontradas, que acabou por diferi-lo, parece relacionar-se a uma situação anterior de grande estabilidade socioeconômica, aos moldes do padrão cultural caipira, que perdurou por gerações consecutivas.
Peculiaridades locais em conjunto, não comuns aos demais bairros, muito provavelmente respondem pelo caráter diferenciado da personalidade da família e sua forte resistência frente a tantas transformações. Além de lavradores e comerciantes bem-sucedidos, detentores de muitas terras, os Paulo eram respeitados e influentes no Sertão: o cabeça do Bairro - o pai, era letrado (seguramente também deveriam ser seus ancestrais), o que lhe dava acesso a saberes relacionados ao mundo da burocracia e à religião; era capelão; inspetor de quarteirão , e sua esposa era uma das raras parteiras do Sertão, com conhecimentos específicos sobre remédios do mato, dieta alimentar e ainda sobre a saúde e os cuidados com os bebês, muito requisitada em outros bairros.
Essas qualidades reunidas conferiram à família grande prestígio social e certamente fortaleceram a identidade territorial e os valores de união e de autonomia na família. A denominação do bairro reúne mais uma evidência. "Paulo" assinala a família que ocupa o bairro: os "Paulo Domingues", diferenciando-os de outros nativos parentes, como os "Anselmo Domingues", os "José Domingues", além daqueles cujos sobrenomes simplesmente se combinavam, por exemplo, Domingues da Silva.
Esse mesmo padrão nominal foi encontrado no bairro das Laranjeiras, no município de Juquitiba, nas proximidades da área de estudo, fazendo-se alusão ao nome do pai. Assim, os filhos de Roque de Moraes eram designados de "João Roque e Antonio Roque" (FUKUI,1972, p.172). Trata-se de um tecnonímico que indica a filiação, os direitos e deveres dos filhos para com o pai, unificando o grupo de irmãos, como explica Woortmann (1995). Tal diferenciação nominal designa os sitiantes fortes, ou seja, as famílias bem-sucedidas (WOORTMANN, 1995), o que faz todo sentido aos Paulo.
Assim, concordamos com Hermann (1970) quando esta autora afirma: a resistência imposta por cada grupo às forças transformadoras parece estar condicionada ao grau de integração do grupo à cultura, ao grau de prestígio e domínio que esse padrão lhe conferiu; ao grau de segregação que o grupo pode ter em relação às forças renovadoras; ao período de tempo em que o grupo se submeteu à ação do padrão tradicional.
Analisando os elementos que configuram a estrutura e a dinâmica social do grupo, no curso das transformações, verificou-se, conforme descrito anteriormente, que foram desenvolvidas diversas estratégias de resistência/adaptação: econômicas - a exploração florestal e, posteriormente, a venda da mão de obra; política - a disputa pela liderança; ecológica - a saída de diversos membros do grupo; demográfica - a redução do número de filhos; religiosa - a passagem para o pentecostalismo.
Nesse processo, identifica-se o que também constatou Hermann (1970). As forças histórico-sociais que acarretam mudanças não atuam igualmente sobre as diferentes estruturas, o grau de resistência de cada uma parece estar condicionado aos valores sociais e morais presos a elas ou ao grau de espiritualização das mesmas. Do mesmo modo se comportam os diversos fenômenos que condicionam as estruturas. Assim, conclui a autora, por possuírem menos valores associados, a estrutura econômica altera-se mais facilmente que a da família; as técnicas e as formas de exploração do solo, que compõem a estrutura econômica, modificam-se mais facilmente que os regimes econômicos e as classes sociais.
Desse modo, a transformação de uma estrutura (ou de um elemento que a compõe) visa resguardar aquela que envolve valores mais caros. Tal perspectiva corrobora com o posicionamento de Claval (1999), são os valores que integram e definem (aceitam ou rejeitam) as práticas ambientais e sociais.
Pode-se dizer que, entre os sitiantes estudados, as transformações ocorridas visaram assegurar ao máximo dentro do bairro, logo no âmbito da família extensa, a tríade terra-trabalho-família e outros valores e princípios vinculados a cada um dos componentes desta tríade, ou seja, vinculados à identidade do grupo.
O vínculo ancestral com a terra, nos âmbitos do Sertão e do Bairro, configurou uma territorialidade e uma identidade que se define, em diferentes escalas, pelo parentesco, pelo pertencimento ao lugar e por um modo de ser: nativo, pessoa do mato, que vive no mato (SANTIAGO, 2013); mas também lavrador, sitiante tradicional, do bairro dos Paulo: "Nóis nos sitiamo na roça [...], de dez anos pra cima eu ficava meses nessa mata, ali ó. Nesse tempo [em julho] nóis [a família] tava limpando, preparando pra plantá no final do ano." (Depoente 5, jul./2009).
A identidade territorial é uma identidade social fortemente mediada por um território ou por territórios inseridos em outras escalas, e como toda identidade social, ela promove uma determinada classificação dos indivíduos enquanto grupo (HAESBAERT,1997). Portanto a categoria nativo designa o lavrador (o sitiante) do sertão de Ibiúna que produzindo em família vive na floresta e da floresta , de forma que a tríade terra-trabalho-família se estabelece como valor maior. Por sua vez, a classificação Paulo designa uma família de sitiantes bem-sucedidos, nativos fortes, do bairro dos Paulo e de prestígio no Sertão.
Verificou-se ainda que não são apenas as estruturas e os elementos que a compõe que resistem diferentemente às transformações, também os membros do grupo são afetados diferentemente. Em favor da manutenção do patrimônio territorial familiar, alguns se sacrificaram para que outros mais aptos pudessem dar continuidade ao legado da família: deixando o Bairro, vendendo a força de trabalho, reduzindo a lavoura de subsistência (uns mais, outros menos) e reduzindo ou abandonando completamente a produção de excedente da lavoura. Nesse contexto, observa-se a predominância da dimensão simbólica, identitária do território em relação à dimensão material.
Na completa impossibilidade de manter, no âmbito da família nuclear, terra-trabalho-família de forma indissociável, o trabalho em última instância atuou como um mecanismo de obtenção do recurso financeiro, antes auferido pela venda do excedente da lavoura, para manter o equilíbrio da economia do bairro como um todo e com ele garantir a permanência do maior número possível de herdeiros, sem comprometer a integridade da terra ancestral.
Lembra, quando oceis entraram no começo aqui? [...] eu falava: eu dependo de consegui dum emprego pra nóis convive aqui, que eu não queria sai daqui dentro da herança que meu pai dexô, não importa que eu fique só no lugar da minha casa, mas que eu seja herdeira do lugar que eu fui nascida e criada. [...] se nóis consegui um trabalho aqui, nóis pode vive aqui pro resto da nossa vida e cuidando da herança que nosso pai dexô [...]. (Depoente 5, ago./2007).
[...] é um vizinho servindo o outro, num há má querência. [...] num tem discussão. Tem que se tudo unido entre a família. (Depoente 6, ago./2009)
Em todas as circunstâncias, apesar dos conflitos, contradições e adaptações inerentes às transformações, ficou evidenciada a persistência de regras ancestrais de conduta e princípios caros relacionados à organização familiar/comunal, como o respeito à autonomia de cada família, à reciprocidade, às hierarquias de comando e ao código de uso e transmissão da terra.
Dessa perspectiva, é possível ainda compreender a passagem dos moradores de uma religião para a outra. Quando a economia se alterou, perdendo grande parte do significado do catolicismo rústico, e os conflitos se precipitaram ameaçando a união e o equilíbrio de poderes dentro da família, a integridade da terra ancestral e a autoridade e a autonomia de cada pai de família em seu trecho, acionou-se como recurso a estratégia religiosa.
No que se refere à capacidade de resistência e adaptação em cada bairro, faz sentido considerar ainda a hipótese formulada por Queiroz: sitiantes que se encontram submetidos a vários centros de atração talvez estejam mais aptos a se adaptar à transformação social, adotando novos modos de agir ou procurando soluções para conservar seu antigo meio de vida, já que têm a possibilidade de ampliar o conhecimento para outras realidades e enriquecer suas perspectivas (QUEIROZ, 1973b).
A partir desse entendimento, a ampla mobilidade e as consequentes interações sociais que definiram o caráter da territorialidade e o exercício da autonomia do grupo, em diferentes escalas, são elementos que muito provavelmente favoreceram o desenvolvimento das diversas estratégias de adaptação e resistência identificadas. Na realidade, pode-se dizer que é o conhecimento e o grau de informação que o grupo como um todo detém que influi na sua capacidade de adaptação às transformações, favorecendo não apenas a construção de novas potencialidades e competências para enfrentar os problemas que se apresentam, mas também facilitando a articulação com outros territórios, um aspecto pelo qual o grupo estudado se distinguiu de forma marcante no passado.
Contudo, deve-se sublinhar as significativas transformações territoriais ocorridas. Em síntese, enquanto inspetores de quarteirão, os sitiantes tinham o controle territorial legitimado pelo Estado e ampliado em uma escala que ultrapassava o bairro. Como lavradores e comerciantes, detinham o controle das relações exteriores, sua economia (doméstica) inseria-se na economia dominante de forma equilibrada, assumiam um papel de destaque no abastecimento da cidade. Seus saberes sociais e ambientais possibilitavam a obtenção de recursos para uma vida digna, do ponto de vista material e social. O território era autônomo e interativo - sob diversas perspectivas e em diferentes escalas.
Com as transformações advindas da sociedade contemporânea, o território torna-se menos interativo, fecha-se, fragmenta-se (no âmbito do Sertão) e fragiliza-se paulatinamente ao longo das décadas e a cada nova restrição imposta ao modo de vida tradicional. Torna-se socialmente instável à medida que os sitiantes caipiras perdem, perante o Estado, a autoridade e o controle, ou seja, o poder de regrar e comandar, de acessar os recursos naturais nos limites do seu território; à medida que os demais bairros se dissolvem, despovoando o Sertão; que suas relações comerciais com a cidade se rompem; que suas práticas são abandonadas e que seus saberes se perdem a cada nova geração.
A reprodução do modo de vida tradicional foi sendo comprometida à medida que novas leis que regram a sociedade passaram a ser aplicadas indistintamente. Os pais perderam autonomia para ensinar os filhos a grande gama de conhecimentos necessária para se tornar um sitiante nativo: não se distingui o aprender-fazer do trabalho infantil; o ofício de parteira tornou-se impraticável frente às restrições, assim como a formação de aprendizas.
As mudanças impulsionaram a decadência da indústria doméstica (que incluía a produção de gamelas, colheres e garfos de pau, monjolos, pilões, ferramentas, esteiras, diversos tipos de cestarias para os mais variados fins, construções em pau a pique, remédios etc.); perdem-se no tempo saberes próprios do acervo cultural caipira associado à biodiversidade, não apenas as técnicas de fabrico, mas também todas as técnicas de manejo, os saberes sobre as propriedades e aplicabilidade dos mais variados recursos da floresta, e até mesmo uma mestria própria sobre a taxonomia vegetal e animal, bem como particularidades sobre a ecologia das espécies. Com a redução da lavoura, perdem-se ainda sistemas agrícolas e variedades crioulas cultivadas e melhoradas naquele território caipira, uma herança dos antepassados.
Em tal contexto, com o passar das décadas e as mudanças sociopolíticas e econômicas do país, evidencia-se a clara transformação da territorialidade dos sitiantes tradicionais. Apesar das diversas formas de resistência e adaptação desenvolvidas, o Estado e suas políticas numa postura autoritária, coerciva e discriminatória impôs a comunidade uma territorialidade passiva, seguindo o raciocínio de Dematteis; Governa (2005) , inibindo suas estratégias de desenvolvimento autônomo.
Contudo, a forte identidade territorial/social vinculada ao modo de vida tradicional e o conhecimento ainda detido na memória especialmente dos mais velhos são aspectos relevantes para se considerar políticas/ações adequadas de desenvolvimento territorial e de valorização cultural, na perspectiva de reverter a perda de saberes sociais e ambientais importantes para autonomia e bem-estar das comunidades. Nesse sentido, cabe notar as possíveis contribuições do modelo SloT - Sistemas Locais Territoriais, apresentado por Dematteis; Governa (2005).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nas singularidades de um bairro rural tradicional foi possível obter elementos empíricos para aprofundar a compreensão sobre como se processaram, em um contexto histórico, os conflitos sociais decorrentes de dois tipos de racionalidade e modo de vida: um rural tradicional e outro contemporâneo, urbano-industrial que se impõe ao primeiro como força transformadora.
A emergência da sociedade contemporânea e seu modelo de desenvolvimento responderam pela progressiva perda de autonomia e enfraquecimento das relações de reciprocidade típicas dos sitiantes tradicionais, afetando de diferentes formas, ao longo das décadas, a configuração da territorialidade que lhes era peculiar, envolvendo níveis articulados de território.
Autonomia e reciprocidade, elementos interdependentes, exercidos em diferentes âmbitos territoriais: da família nuclear, do bairro rural (família extensa), do sertão (entre os diversos bairros rurais) e da cidade, restringem-se ao longo das décadas empobrecendo a vida material e social do sitiante caipira e, por consequência, o seu saber-fazer nos aspectos social e ambiental definidos pela cultura.
Foi possível observar que a identidade territorial/social dos grupos, seus valores e o grau de informação e conhecimento que detém, são elementos que influem decisivamente na habilidade em se reajustar às novas condições, postergando o processo de transformação cultural.
Assim, a capacidade de resistência/adaptação em sitiantes de cultura caipira vincula-se a uma identidade territorial/familiar, construída em bases sólidas de valores e princípios definidores do modo de vida tradicional (especialmente fundamentados na tríade terra-família-trabalho), de forte vínculo histórico com o lugar e de um longo período de estabilidade econômica e prestígio social. Da mesma maneira, quanto maior o nível de informação e conhecimento, maior será a habilidade do grupo para se articular nos diferentes âmbitos territoriais, ou seja, para estabelecer e administrar relações em diversas escalas e, consequentemente, para resistir aos vetores de pressão e se adaptar às transformações.
Por sua vez, os valores são decisivos na definição das estratégias de adaptação e resistência, buscam resguardar a integridade do patrimônio territorial ancestral. Entre as diversas estratégias, a primeira a ser acionada é a econômica, modificando-se mais rapidamente em tal estrutura o uso do solo e as técnicas, como consequência cai em desuso o saber-fazer diretamente vinculado a esta estrutura.
A economia é, desse modo, o elemento mais frágil, porém o de maior significado no que se refere ao conhecimento sobre o uso e o manejo da biodiversidade, tornando-se premente o aprofundamento da reflexão e do debate técnico e científico sobre perspectivas econômicas que favoreçam, na atual conjuntura, o restabelecimento do acervo tecnológico tradicional caipira e o desenvolvimento territorial segundo padrões que se coadunem com os valores tradicionais.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Ago 2018 -
Data do Fascículo
2018
Histórico
-
Recebido
13 Fev 2018 -
Aceito
21 Jun 2018 -
Publicado
15 Ago 2018