INTERAÇÕES VIRTUAIS DE FAMÍLIAS DE CRIANÇA COM CÂNCER: ESPAÇO POTENCIAL DE ATUAÇÃO DE ENFERMEIRA(O)S

RESUMO

Objetivo:

analisar a ressignificação de enfermeiras sobre necessidades de familiares de crianças com câncer, em comunidades de Facebook ^® institucional.

Método:

pesquisa participativa desenvolvida com as dinâmicas Mapa Falante e Corpo Saber do Método Criativo Sensível, na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, realizada entre 2019 e 2020. Participaram nove enfermeiras(os) especialistas em pediatria e oncologia em grupos de três a quatro pessoas. Aplicou-se a análise temática no tratamento dos dados.

Resultados:

comunidades virtuais dinâmicas favorecem familiares de crianças com câncer na busca de apoio, solidariedade e informações. Naquele espaço, compartilham experiências de adoecimento, êxitos, perdas e luto. A comunidade é marcada por desafios; a enfermeira pode atuar mediando informações, desde que preparada para interagir com responsabilidade ética e conhecimento científico.

Conclusão:

Na ressignificação essas comunidades são reconhecidas como espaços de diálogo, ampliando o lócus de ação e empoderamento de enfermeiras educadoras e defensoras do melhor interesse dessas crianças.

DESCRITORES:
Mídias Sociais; Criança; Empoderamento para a Saúde; Enfermeiras e Enfermeiros; Família

ABSTRACT

Objective:

to analyze nurses’ resignification of the needs of family members of children with cancer in institutional Facebook^® communities.

Method:

participatory research developed with the Speak Map and Body-Knowledge dynamics of the Sensitive Creative Method in Rio de Janeiro, Brazil, conducted between 2019 and 2020. Nine specialist nurses in pediatrics and oncology participated in groups of three to four people. Thematic analysis was applied in the treatment of the data.

Results:

dynamic virtual communities favor family members of children with cancer in the search for support, solidarity, and information. In that space, they share experiences of illness, success, losses, and mourning. Challenges mark the community; the nurse can act as mediating information since prepared to interact with ethical responsibility and scientific knowledge.

Conclusion:

In the resignification, these communities are recognized as spaces for dialogue, expanding the locus of action and empowerment of nurse educators and advocates of the best interests of these children.

DESCRIPTORS:
Social Media; Child; Health Empowerment; Nurses; Family

RESUMEN

Objetivo:

analizar la resignificación de las enfermeras sobre las necesidades de los familiares de niños con cáncer, en comunidades institucionales de Facebook^®.

Método:

investigación participativa desarrollada con las dinámicas Mapa que Habla y Cuerpo Saber del Método Creativo Sensible, en la ciudad de Río de Janeiro, Brasil, realizada entre 2019 y 2020. Nueve enfermeras especializadas en pediatría y oncología participaron en grupos de tres a cuatro personas. En el tratamiento de los datos se aplicó el análisis temático.

Resultados:

las comunidades virtuales dinámicas favorecen a los familiares de niños con cáncer en la búsqueda de ayuda, solidaridad e información. En ese espacio, comparten experiencias de enfermedad, éxitos, pérdidas y duelo. La comunidad está marcada por los desafíos; la enfermera puede actuar mediando la información, ya que está preparada para interactuar con responsabilidad ética y conocimiento científico.

Conclusión:

En la resignificación, estas comunidades son reconocidas como espacios de diálogo, ampliando el locus de acción y empoderamiento de las enfermeras educadoras y defensoras del mejor interés de estos niños.

DESCRIPTORES:
Medios de Comunicación Sociales; Niño; Empoderamiento para la Salud; Enfermeras y Enfermeros; Familia

HIGHLIGHTS

1. Manejo de ambiente virtual requer competência ético-científica e digital

2. Comunidades institucionais são potenciais espaços de diálogo virtual

3. Comunidades virtuais ampliam o agir e o empoderamento de enfermeira(o)s

4. Facebook® favorece o enfermeira(o) atuar em defesa de crianças com câncer

HIGHLIGHTS

1. Manejo de ambiente virtual requer competência ético-científica e digital

2. Comunidades institucionais são potenciais espaços de diálogo virtual

3. Comunidades virtuais ampliam o agir e o empoderamento de enfermeira(o)s

4. Facebook® favorece o enfermeira(o) atuar em defesa de crianças com câncer

INTRODUÇÃO

O câncer é um dos tópicos mais buscados na internet, uma vez que 80% dos pacientes com essa morbidade se conectam na rede mundial de computadores. Nas mídias sociais, as pessoas compartilham experiências sobre o enfrentamento da doença da criança, criam vínculos, recebem apoio e se envolvem em discussões relacionadas à saúde^1-5. Na mídia social, os usuários criam comunidades para compartilhar informações, mensagens pessoais e os mais variados conteúdos⁶. As agregações sociais dessas comunidades virtuais mantêm discussões públicas por tempo e sentimento humano suficientes para formar redes de relacionamentos pessoais no ciberespaço⁷. Elas oferecem a oportunidade de aprender e melhorar a comunicação em saúde, o que pode levar a uma maior procura por atendimento de saúde, entre outros aspectos⁸.

A forma de organização dessas comunidades favorece a interação, mas, pode haver problemas de natureza ética que criam dificuldades em seu uso cotidiano^6,9,10. Por exemplo, na Itália e Reino Unido, profissionais de enfermagem, que usaram o Facebook ^®, o fizeram tanto para divulgar informações pessoais como profissionais. Entretanto, algumas postagens mostraram comportamentos inadequados à postura de um profissional de saúde, tais como o consumo de fumo e álcool, nudez e conteúdo sexual, infringindo o Código de Ética profissional daqueles países¹¹.

Particularmente, o câncer infantil, como um tópico sensível ao ser abordado em ambiente virtual, exige que o profissional tenha prudência, ética e compromisso com a qualidade da informação veiculada. Estudos que tratam dessa problemática em comunidade virtual apontam esse cenário como promissor nas relações de familiares de crianças com câncer e profissionais de saúde^1,3.

A rede social se constitui numa possibilidade de empoderamento, na medida em que permite que usuários adquiram conhecimentos quando se encontram com outras pessoas e com profissionais de saúde¹². O empoderamento, na perspectiva de Chinn ¹³, significa crescimento da força pessoal, o poder e a capacidade de cumprir a própria vontade e amor por si mesmo e respeito uns pelos outros. Ele vem da solidariedade real com e entre aqueles que buscam a intenção, o processo e o resultado da interação em comunidade. Porém, a participação de enfermeiros e enfermeiras em comunidades virtuais é pouco explorada na literatura científica¹⁰; e quando encontradas, elas se circunscrevem às Resoluções e diretrizes orientadoras do comportamento profissional em mídias sociais^14-16.

Assim, para ampliar o empoderamento de enfermeiros, precisa-se saber sobre o quê e como dialogar em espaços de comunidade virtual de familiares de crianças com câncer, um tópico sensível de ser abordado em mídias sociais. Ante o exposto, o objetivo é analisar a ressignificação de enfermeira(o) sobre necessidades de familiares de crianças com câncer em comunidades de Facebook ^® institucional.

MÉTODO

Pesquisa qualitativa implementada com o Método Criativo e Sensível (MCS) de pesquisa baseada em arte, que tem como eixo estruturante as dinâmicas de criatividade e sensibilidade (DCS) no desenvolvimento do trabalho grupal para resgatar situações existenciais concretas, tecidas nas histórias socioculturais de participantes de pesquisa. Nesse método, acessa-se a experiência humana na abordagem de tópicos sensíveis, de maneira ética e responsável ¹⁷. Elegeram-se as DCS Mapa Falante e Corpo Saber, para, respectivamente, mapear a experiência humana como um tópico sensível no tempo e no espaço e o reflexo dessa experiência sobre o corpo biológico e social, buscando-se responder às questões geradoras de debate (QGD) e gerar produções artísticas¹⁷.

Quanto aos participantes da pesquisa, delimitou-se como critérios de inclusão, enfermeira(o)s especialistas em pediatria e ou oncologia, que atuavam nos cuidados de crianças hospitalizadas há mais de um ano; desenvolviam pesquisas e participavam de eventos e atualizações; e possuíam habilidades com ferramentas digitais. Como critérios de exclusão: ser profissional recém-graduado, estar em programa de residência; aposentada(o)s sem atuação na clínica, ensino ou pesquisa e sem acesso à internet. Os participantes foram recrutados em quatro cafés científicos, realizados com intervalo médio de três meses, ao longo de um ano, e ainda concomitante à implementação do trabalho de campo (nos meses de junho a dezembro de 2019). Essa estratégia buscou a sensibilização do tema mídia social entre os potenciais voluntários, preparando-os para serem engajados no ambiente da pesquisa. Trata-se de uma iniciativa de ciência pública que promove o engajamento de pessoas em discussões sobre questões de saúde relevantes¹⁸.

Para o interesse do estudo, apresentaram-se os seguintes temas: uso de rede social no diálogo de cuidados de enfermagem Resolução Cofen n.º 554, que estabelece os critérios de uso e comportamento de profissionais de enfermagem em mídias sociais¹⁴, necessidades de saúde e demandas de cuidados da criança com leucemia. Enfermeira(o)s participantes do Café Científico atuaram como pessoas-índices na cadeia de referência da técnica bola de neve localizando informantes-chaves, de sua rede de relações pessoais consoante com o perfil da pesquisa¹⁹. Da amostragem final de 50 pessoas, nove se voluntariaram para participar das DCS, distribuídas em três grupos com três a quatro participantes cada um. Sete em nove elaboraram um diário de campo virtual (DCV) que subsidiou o desenvolvimento da DCS mapa falante e corpo saber. O trabalho de campo da pesquisa foi implementado entre os anos de 2019 e 2020.

Adotou-se o cenário híbrido de produção de dados, combinando-se o espaço de comunidade virtual em 16 páginas do Facebook ^® (com perfil institucional de organizações governamentais e não governamentais) e um blog privado com a presencial nos encontros grupais. As enfermeiras foram orientadas pela primeira autora a durante uma semana a extrair, no mínimo, cinco postagens que refletissem dúvidas, questionamentos e comentários de familiares, para compor o diário de campo virtual.

No cenário presencial, aconteceram três encontros em uma sala privativa, que favoreceu a livre expressão dos participantes. Na DCS Mapa Falante, durante 65 minutos, o primeiro grupo (três pessoas) respondeu à QGD - “Partindo do Facebook ^®, quais lugares, pessoas e tecnologias podem ser ligados às necessidades de saúde de crianças com leucemia?” - na forma de uma produção artística coletiva. Quatro meses depois aconteceu a segunda DCS corpo-saber em dois encontros, para responder à QGD - Como abordar necessidades de saúde, relacionadas ao acesso à tecnologia, ao vínculo, às boas condições de vida e à autonomia na rede virtual para atender às demandas de cuidados de crianças com leucemia? O primeiro encontro durou 88 minutos, e contou-se com a participação de uma pessoa da DCS Mapa Falante e três novos participantes. No segundo encontro (dois meses depois), participaram três pessoas novas no grupo com um tempo de duração de 104 minutos. Todos os encontros foram gravados em ambiente digital e transcritos na íntegra.

Para o tratamento do material empírico, elegeu-se a análise temática, uma técnica de análise usada para elicitar nuances das narrativas das experiências humanas. Buscou-se identificar, analisar, organizar, descrever e relatar temas encontrados em um conjunto de dados ²⁰. Para a familiarização com o material empírico, os enunciados foram transferidos para um quadro analítico (QA), os quais foram exaustivamente lidos para apreender termos e expressões-chave representativas do assunto principal do enunciado. Na geração dos códigos iniciais, adotaram-se quatro procedimentos: a) elaboração de glossário de termos recorrentes; b) formulação de perguntas analíticas contendo palavras do glossário e termos/expressões-chave; c) respostas às perguntas sob a forma de unidade de análise; d) constituição de código com aproximação de significados em novo quadro analítico.

A pesquisa de temas decorreu da aproximação de códigos de linguagem comuns associados às características definidoras, porém, em separado dos códigos singulares. Em seguida, os temas foram incluídos em um novo quadro analítico com as características definidoras dos códigos, para, novamente, por convergência de significados formar temas e subtemas do conhecimento emergente da análise.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) com os Pareceres n.º 4.447.916/2018 e n.º 4.447.916/2020. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e a desidentificação dos participantes foi garantida por meio de código para cada DCS (mapa falante [MF] e corpo saber [CS]), acompanhado do número correspondente ao encontro (1ºCS e 2º CS).

RESULTADOS

As oito enfermeiras e um enfermeiro apresentavam idades entre 28 e 57 anos, oito eram de raça/etnia branca e uma parda e tempo de formação profissional variando de dois a 32 anos. A experiência profissional na área da infância variou de dois a 23 anos de atuação em serviço público e privado da rede de saúde na cidade do Rio de Janeiro. Além de especialistas, três haviam concluído o mestrado e estavam cursando o doutorado, três concluíram o mestrado, e três estavam com o curso em andamento.

Um total de 198 interações (postagens e comentários) e 11 imagens recoletadas no diário de campo virtual no Facebook ^® Institucional foram utilizadas como referência para a produção do mapa falante produzido coletivamente. As postagens do Facebook ^® abordavam as necessidades dos usuários, em geral, familiares de crianças com câncer em busca de informações.

Necessidades de familiares de crianças com câncer em comunidade virtual e potencialidades para a atuação da(o) enfermeira(o)

Na comunidade virtual, as pessoas têm necessidades de acesso à informação e apoio no enfrentamento da doença, na resolução de dúvidas em tempo real com e entre os membros que pertencem àquele lugar. O sentido de pertencimento é pragmático, pois a confiança e o vínculo se mantêm pelo tempo que houver retorno aos mecanismos de interação que a tecnologia proporciona. Informações precisas com respostas rápidas às demandas no atendimento das necessidades ampliam os laços de pertencimento e vínculos.

O Facebook^®é um lugar onde as pessoas buscam informação, apoio, tiram dúvidas. Buscam pessoas que têm a informação... encontram outras pessoas e profissionais de saúde que as ajudem com uma necessidade, no enfrentamento da doença, no convívio, no dia a dia com outras pessoas, com a instituição [...]. O Facebook ^® foi a ferramenta virtual para conseguir informação. (Encontro MF).

O acesso fácil à Internet, à ampla disponibilidade de rede em locais diferentes e sem custo, como nos transportes públicos, facilita a manutenção ativa da comunidade. Além de ser um espaço veiculador de informação, a comunidade virtual cria uma zona de conforto mantendo a pessoa no anonimato; uma necessidade comum entre as pessoas que convivem em comunidade virtual.

Hoje a internet é um espaço público em Wi-Fi. É um espaço onde as pessoas não precisam colocar o rosto [ficam anônimos] e sentem-se mais à vontade para perguntar. [...]. Então, a rede social tem um papel muito importante na divulgação de informações, que as pessoas antes tinham mais dificuldades de buscar. (Primeiro encontro CS).

Os momentos de alegria e conquistas representam necessidades de compartilhamento de experiências exitosas no acesso a tratamentos e serviços. Na comunidade virtual, as pessoas dividem histórias sobre o que viveram ou são solidárias com quem está experienciando o câncer infantil, celebram o início e cada etapa do tratamento. Nas comunidades, sentem necessidade de manter-se confiantes e seguros para compartilhar experiências que viveram presencialmente, com destaque para obter êxito nos tratamentos, no acesso a exames (de sangue, imagem, tomografia, ressonância, etc.) e serviços de transportes para tratamento fora do domicílio.

Hoje, nas redes sociais, eles festejam que ‘a medula pegou, alegria compartilhada’; ‘Dia zero do tratamento’ para quando começam uma nova etapa. Crianças e famílias compartilhando, ‘Hoje foi dia de exame!’, ‘dia de andar de ambulância!’ [tratamento fora do domicílio]; muitos exames de sangue, de imagem. (Primeiro encontro CS)

No encontro de subjetividades, manifesta-se a preocupação com os problemas alheios, respeitam-se mutuamente, abraçam-se virtualmente e apreciam as realizações de cada um, o que fortalece o grupo como uma unidade e aumenta o vínculo.

Todos desejam melhora para quem está passando por esse processo de adoecimento do câncer. Um lugar onde podiam compartilhar experiências que lhes ajudavam a se fortalecer: eu passei’, ‘meu filho passou, foi curado’ ... Compartilham lugares: ‘por esse lugar, fui atendida e apoio’. (Encontro MF)

... Tem o abraço virtual; mensagens de apoio: ‘Desejo melhoras... fique bom... dá tudo certo.’ ‘Estamos na torcida... orando por você!’ (primeiro encontro CS)

Há manifestações de gratidão e reconhecimento pelos profissionais de saúde que contribuíram para o êxito do cuidado, do tratamento e da recuperação da criança. Ao compartilhar a experiência da morte de entes queridos na comunidade, buscam despertar sentimentos de empatia e solidariedade no processamento do luto e do pesar. Portanto, é um espaço que serve como contraponto na abordagem da morte em rede virtual.

Elas desejam o melhor para os médicos, a equipe, que tenham saúde para cuidar dos filhos delas e de outros que virão. Desejam o melhor para a instituição por todo apoio e todo o tratamento recebido.[...]. Têm um vínculo com a instituição; agradecem a instituição e aos profissionais que cuidam das crianças. Elas expressam como se sentiam; que a criança evoluiu para a cura; que o... “irmão morreu! Doença maldita!” (Encontro MF).

As comunidades virtuais do Facebook ^® são espaços privilegiados de divulgação de informações que atendem às demandas e necessidades de familiares de crianças com câncer, desde que sejam ocupados por profissionais que assumam papéis de comunicador em saúde, adotando uma linguagem compreendida pelos leigos.

Tecnologia de informação como uma ferramenta essencial, é nosso papel, enquanto profissional de saúde, especialista, divulgar informações coerentes, que podem ser assimiladas pelo leigo, ... sem gerar grandes problemas [expectativas], trazendo questões que a gente consiga que essas pessoas cheguem mais [cedo] às unidades de referência. (Primeiro encontro CS).

O profissional de saúde pode ser uma fonte segura de acesso a informações confiáveis na rede de internet. A(o) enfermeira(o) como parte desse conjunto é dotada (o) de credibilidade para interagir em comunidades virtuais com familiares e divulgar conteúdos sobre saúde.

[O usuário] não sabe de onde vem a informação no primeiro site que aparece [como resultado de sua busca]... Acredito que para dizer onde é confiável pesquisar, precisa de orientação do profissional de saúde. Como as mães usam mais o Facebook ^® , o profissional de saúde deveria usar essa rede social... para divulgar [informações]. Por que a gente como enfermeiros não pode divulgar informações [sobre saúde]? (Segundo encontro CS).

É necessário ter cautela, refletir e pensar antes de interagir, respondendo às demandas dos usuários das comunidades. Portanto, é preciso conhecer as necessidades das pessoas que frequentam aquela comunidade como forma de superar dificuldades na abordagem de questões sensíveis relacionadas a sinais e sintomas de câncer infantil e luto.

É primordial ter cuidado com o que será dito na rede social... aquela incerteza que a pessoa tem dos sinais e sintomas. Os enfermeiros sentem dificuldade de se identificar como profissionais na rede social; traz a informação antes de perceber a necessidade da pessoa e se ela entendeu aquela mensagem que está passando. (Primeiro encontro CS)

O que me inquieta é como abordar essa família nesse momento de luto dela? [...]. Eu acho que a mídia social... não é para isso. Você vai ter que usar a mídia como um intermediador para se aproximar de uma conversa com ela. O fato de a mídia social não ser suficiente ... é impessoal. (Segundo encontro CS).

Há muitos desafios para que se possa interagir em comunidade virtual, tais como, falta de tempo, incompatibilidade de horário e sobrecarga de demandas. A valorização da própria experiência como profissional de saúde no cuidado da criança com câncer ajuda a interagir nesses ambientes, respeitando os limites que são das comunidades virtuais e da(o)s própria(o)s enfermeira(o)s.

Na rede... o seu horário nunca bate com o da pessoa. Você vai dormir às três horas, às seis horas da manhã, aquela mãe está acordada e te manda uma dúvida. Teria que ter alguém o tempo inteiro para responder às demandas que vão surgindo. É mais uma tarefa, além das muitas outras. A gente vai interagir com quantas crianças e quantas famílias? [...]Já imaginou se a gente interagir com todo mundo? Isso demanda tempo, tem que levar a sério e não é informal. (Segundo encontro CS).

Comunicar em saúde exige que a(o) enfermeira(o) seja membro daquela comunidade, adotando um comportamento responsável e ético. O empoderamento é construído na relação de respeito, mutualidade e reciprocidade na formação de laços afetivos e vínculos. Não é algo que se aprende em livros, mas requer habilidade de leitura e interpretação da realidade para determinar o modo e a extensão do engajamento.

Eu vejo como um grande desafio, porque existem outras questões éticas dentro desse universo. Qual tipo de condição você pode dar sugestões, orientações corretas? Você precisa se sentir apoiado pela instituição onde trabalha [...].Vejo a rede social como uma grande ferramenta, mas eu mesma não me sentiria à vontade e tranquila para além de: ‘Procure o hospital especializado’. (Primeiro encontro CS)

Não está escrito nos livros [como usar rede social], é do profissional, de leitura e interpretação de como vai usá-la. (Segundo encontro CS).

Para desenvolver uma comunidade, as pessoas precisam dispor de tempo para que, em conjunto, possam refletir e discutir acerca do processo grupal, compartilhar informações científicas e interagir com as pessoas que pertencem a este grupo.

DISCUSSÃO

O espírito democrático de comunidades virtuais do Facebook ^® favorece o acolhimento de pessoas desconhecidas que se encontram com diferentes necessidades de acesso à informação e de apoio no enfrentamento da doença. O conjunto de necessidades ressignificadas pela(o) enfermeira(o)s pode ser assim sumarizado: acesso à informação; apoio no enfrentamento da doença (abraço e acolhimento virtual); resolução das dúvidas em tempo real e com senso de pertencimento; preservação do anonimato; manter a confiança e segurança; pensar antes de interagir para agir com cautela e conhecimento científico. Portanto, cria-se uma zona de conforto ao ver suas demandas atendidas com pragmatismo e imediatez. A(o) enfermeira(o) possui credibilidade para compartilhar informações, desde que compreenda esse lugar como um espaço onde os usuários possuem necessidades e demandas de informações. Nesse sentido, ressignificar a comunidade virtual como espaço de empoderamento de enfermeira(o) emerge do engajamento ativo com outras pessoas cujos valores são compartilhados na comunidade¹³.

É um lugar de relações sociais, mas, certos comportamentos aumentam a vulnerabilidade não só de quem divulga, mas de toda uma classe profissional. Nesse sentido, um achado relevante desse estudo é que atuar em comunidade virtual exige profissionalismo, conhecimento e respeito à dignidade própria e de todas as pessoas que frequentam uma comunidade virtual. Trata-se de um espaço marcado por desafios, onde a enfermeira pode atuar mediando informações desde que preparada para interagir com responsabilidade ética e conhecimento científico.

Essas comunidades disponibilizam ilimitadas informações online sobre qualquer assunto a todos que tenham acesso e competência para utilizá-las^21,22. No Brasil, em 2019, a busca de informações sobre saúde nas mídias digitais foi o segundo tópico mais procurado^22,23. Pesquisas recentes documentam que os pacientes e seus cuidadores usam as mídias sociais como uma forma de compartilhar experiências de doença e se envolver em discussões sobre saúde e câncer^1,2.

Na comunidade virtual são criadas oportunidades de interação entre seus frequentadores, por vezes, anonimamente, porque se identificam com seu conteúdo e propósitos. Os vínculos são constituídos no encontro de subjetividades, de apoio psicológico, de empoderamento e motivação mútua em momentos difíceis. Contudo, falta de tempo, incompatibilidade de horário e sobrecarga de demandas podem ser desafiadoras para o enfermeiro desempenhar o papel de comunicador em saúde.

Pessoas com problemas de saúde podem se beneficiar com a participação em comunidades virtuais sem revelar sua identidade pessoal, protegendo-se da estigmatização. As pessoas podem obter respostas e apoio emocional, enquanto redes sociais presenciais podem não ser capazes de oferecê-las. Esse modo de organização favorece familiares que buscam apoio, solidariedade e informações. Ademais, há um senso de controle sobre o processo de busca de ajuda, o que pode atender à necessidade de autonomia dos pacientes com benefícios sobre o bem-estar subjetivo com um resultado de saúde ⁵.

Para desenvolver uma comunidade, as pessoas devem permanecer juntas durante algum tempo. Elas poderão não se encontrar frequentemente, mas precisam de um tempo regular e combinado para estar juntas, seja através de um encontro presencial, seja usando uma sala de reunião virtual com áudio e vídeo. Nem todos precisam estar presentes cada vez que seu grupo se reúne, mas todos precisam saber quando e onde o grupo se reúne¹³.

Naquele espaço, poderão compartilhar experiências com o adoecimento, êxitos, perdas e luto. Mas, nem todos os assuntos são eticamente plausíveis de serem abordados profissionalmente em comunidades virtuais, quando se refere a uma demanda individual envolvendo um tema sensível como, por exemplo, confirmação diagnóstica, encaminhamentos para serviços, ou mesmo terapia de luto.

Como limitações do estudo, destaca-se que a elaboração do diário de campo virtual foi realizada em páginas do Facebook ^® , sendo a única rede social utilizada pelos enfermeiros neste estudo. Ainda, a limitação de gênero com predomínio de mulheres e participação de um homem como voluntário de pesquisa. As dinâmicas não foram realizadas com os familiares das crianças com câncer no Facebook ^® .

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na ressignificação de enfermeiras sobre as necessidades de familiares de crianças com câncer as comunidades de Facebook ^® institucional são reconhecidas como espaços virtuais de diálogo para atender às necessidades de acolhimento, confiança, segurança e de cautela. Assim, é possível ampliar o lócus de ação e de empoderamento de enfermeiras educadoras e defensoras do melhor interesse dessas crianças. Essas comunidades representam um novo lugar de cuidado a ser apropriado por enfermeira(o)s empoderada(os) e que compartilham valores em favor do melhor interesse, também dos membros daquela comunidade. Constatou-se que há benefícios mútuos com as experiências compartilhadas, ao mesmo tempo em que se abriram janelas de oportunidades para que a(o)s enfermeira(o)s interajam com familiares de crianças com câncer.

Atuar em comunidades virtuais exige competência e habilidade para usar ferramentas digitais unidas ao conhecimento científico e à abordagem ética e responsável. Há necessidade de treinamento, capacitação e educação de enfermeira(o)s, para que se sintam seguros e confortáveis nesse novo espaço de cuidar educando em saúde. Desse modo, ampliam-se o lócus de ação e empoderamento de enfermeiras educadoras e defensoras do melhor interesse de crianças com câncer. Desenvolver uma atmosfera de respeito e confiança na comunidade é um desafio a ser superado por meio da convivência em grupo por um determinado período de tempo, nem sempre disponível para os que fazem parte do grupo, a fim de que se possa refletir e discutir com base num processo que é grupal.

AGRADECIMENTOS

Financiamento: “O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001” Pesquisa de tese de doutorado integrada ao projeto de pesquisa “Conhecimento-a-ação na transição hospital-casa de crianças com necessidades especiais de saúde”, coordenado pela Prof.ª Dr.ª Ivone Evangelista Cabral, Chamada PQ - 06/2019 - Processo nº 303149/2019-1 e Edital Universal CNPQ nº 08/2018. (Processo nº 430213/2018-2).

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Editado por

Editora associada:

Dra. Luciana Puchalski Kalinke

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  24 Mar 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  21 Abr 2022
• Aceito
  04 Out 2022