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BIOLOGIA FLORAL DE Leucaena leucocephala (LEGUMINOSAE, MIMOSOIDEAE)

FLORAL BIOLOGY OF Leucaena leucocephala (LEGUMINOSAE, MIMOSOIDEAE)

RESUMO

A Leucaena leucocephala é uma espécie originária do México, Guatemala, El Salvador e Honduras, sendo posteriormente dispersa nas regiões de baixada do litoral do Pacífico e costas do Caribe, pelos indios pré-colombianos. Por se tratar de uma espécie exótica, o desconhecimento de sua biologia, em nossas condições, motivou o estudo dos insetos associados à floração e à frutificação através do isolamento de inflorescências. As observações fenológicas foram efetuadas em 20 inflorescências, previamente marcadas, em quatro matrizes, utilizando-se lupas manuais, em períodos regulares de observação. Foram realizadas capturas de insetos, em dois ramos floridos por matriz, utilizando-se rede entomológica, no período de 6 às 18 horas. A maior incidência de abertura de flores ocorreu durante a madrugada, permanecendo a disposição dos polinizadores durante um dia. Verificou-se que o decréscimo na freqüência de insetos indica uma correlação com o acréscimo da temperatura e aumento da velocidade do vento. As espécies Apis mellifera e Trigona spinipes foram os insetos de maior freqüência, ocorrendo maior transporte da pólen em A. mellifera. A média de frutos produzidos na polinização aberta, com influência dos polinizadores, foi superior às inflorescências isoladas, sem ação dos polinizadores.

Palavras Chave:
Leucaena leucocephala, inseto; polinização

ABSTRACT

Leucaena leucocephala is a Central American (Mexico, Guatemala, El Salvador and Honduras) species. It was disseminated to the coastal Pacific lowlands and the Caribbean by the pre-Colombian Indians. Because it is an exotic species and there is little information about its floral biology, a study concerning the associated insects was carried out. Insects associated to floweing and fructification were studied using the isolation of inflorescences. Phenotogical observations were performed in 20 inflorescences, preiously chosen, in four thees, in regular periods of observations. Insects were captured in two flowering branches per tree, with and entomological net between 6:00 AM. to 6:00 P.M. The largest incidence of open flowers happened during the night. These flowers stayed available to insects for one day. The decrease on the insect frequency was correlated to an increase of temperature and the increase on the wind speed. The most frequent insects were Apis melifera and Trigona spenipes. A. melifera carried more pollen tham the other species. The average of fruits produced by open pollination via insects, was higher than that produced without the action of the insects.

Key words:
Leucaena leucocephala, insect; pollination

INTRODUÇÃO

A Leucaena leucocephala, bem como todas as formas de vida que são submetidas a um processo de introdução, passam por um período de adaptação no novo local de existência, sob todos os aspectos a elas relacionados. Neste contexto, um dos fatores que mais se questiona é a adaptação das espécies vegetais de polinização entomófila às espécies polinizadoras locais. Esta espécie florestal, segundo VIETMEYER (1984), ocorre naturalmente no Hawai, Guatemala, Honduras, El Salvador e México, entre as latitudes de 10° e 30°N e longitudes 80° e 110° L. Ainda, segundo o autor, são árvores que alcançam de 5 à 20 metros de altura, com as mais diferentes utilizações, como por exemplo, madeira para fins energéticos, carvão, forragem para o gado, cobertura antierosiva para o solo, fixação de nitrogénio, etc. O seu cultivo, hoje, dado ao seu múltiplo uso, estende-se quase que totalmente nas regiões tropicais em todo o mundo, destacando-se, além das áreas de ocorrências naturais, o Brasil, Austrália, Índia, Estados Unidos, Filipinas,Taiwan, dentre outros.

A inflorescência de L. leucocephala é do tipo pincel, de cor amarelada, que, segundo FAEGRI e van der PUL (1971), beneficia a ação de abelhas, borboletas e pássaras, que por predominância do primeiro, denomina-se síndrome para melitofilia.

No Brasil, o principal polinizador é a Apis mellifera L. , de origem européia, e da entomofauna nativa destacam-se os gêneros Megachiline, Bombus, Xylocapa dentre outros (AMARAL, 1960AMARAL, E. Utilidade das abelhas na polinização. São Paulo Agrícola, São Paulo, 2 (18): 22-23. 1960). Kaslowisk (1972), citado por MORA et al. (1981)MORA, A.L., PINTO JR, J.E., FONSECA, S.M. e KAGEYAMA, P.Y. Aspéctos da produção de sementes de espécies florestais . Série Técnica. IPEF. Piracicaba. 2 (6) 60p. 1981., destaca como principais polinizadores os insetos das ordens Coleoptera, Lepidoptera, Díptera e Hymenoptera.

BERTI FILHO (1981)BERTI FILHO, E. Insetos Associados a plantações de espécies do gênero Eucalyptus nos Estados Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Piracicaba, ESALQ/USP, 176p. 1981 (Tese de Livre Docência)., ao fazer o levantamento da entomofauna da região de flores e frutos de Eucalyptus spp. no Brasil, determinou um total de 34 espécies atuantes nestas partes.

Os estudos referentes aos insetos visitadores de flores com carga de pólen de Eucalyptus saligna rei izados por MAÊDA (1988), demonstraram que das 118 espécies de insetos capturadas, somente 26 continham grãos de pólen da espécie florestal na região do abdomen, sendo que a A. mellifera representou 36,01% da entomofauna com 83,09% da carga de pólen transportada.

Realizou-se um estudo do comportamento floral de L. leucocephala, na região de Piracicaba, SP, onde verificou-se a fenología da ântese floral, levantamento de insetos polinizadores, suas eficiências e o tipo de polinização predominante.

MATERIAIS E MÉTODOS

O povoamento de L. leucocephala, utilizado no experimento, estava localizado às margens da estrada Piracicaba-Tietê, SP, situada a 47° 39' W e 22° 44' S, plantado com objetivos paisagísticos.

As observações fenológicas foram efetuadas em 20 inflorescências, previamente marcadas, em quatro matrizes, A1-4, utilizando-se lupas manuais, em períodos regulares de observação.

Os insetos foram capturados, em ramos floridos de dez matrizes, utilizando-se rede entomológica, em duas passagens sucessivas sobre as inflorescências em direções opostas, no período de 6 às 18 horas, durante o dia, assim divididos: P1 - de 6 às 7, P2 - de 7 às 8, P3 - de 8 às 9, P4 - de 9 às 10, P5 - de 10 às 11 e P6 - de 11 às 12 horas. O restante das horas do dia não foi considerado, em função da inexistência de insetos após 12 horas, no interior da população. Os insetos capturados, foram acondicionados em frascos de vidro de 15 mililitros, em álcool 70% e, posteriormente, tiveram suas cargas de pólen quantificadas em câmara de "Neubauer".

Todos os resultados dos levantamentos e quantificações foram correlacionados com as temperaturas, velocidades do vento, segundo escala de Beaufort, e umidades relativa do ar, tomados com auxílio de termômetros de máxima e mínima e psicrômetros, instalados no interior da população. Os ramos com inflorescências para isolamento foram submetidos à poda da gema apical e das folhas, redução de 50% da área foliar em sentido perpendicular ao eixo principal, para diminuição do material a ser isolado e proteção das inflorescéncias. No isolamento, foram utilizados sacos de papel tipo "kraft" com visor plástico, algodão e fio metálico. Os resultados do isolamento foram analisados através do teste não paramétrico do qui-quadrado (χ2), em função de total ausência de normalidade nos dados obtidos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observação fenológica da ântese

A L. leucocephala é uma espécie monoica e a sua estrutura floral é do tipo pincel, hermafrodita, estames e estigmas, com cálice e corola reduzidos, como pode-se observar nos diferentes estágios florais. O pólen é pegajoso, o que propicia aderência ao abdomen dos insetos, em contato direto.

A maior incidência de abertura de flores ocorreu durante a madrugada, permanecendo a disposição dos polinizadores durante um dia, pois no dia seguinte, nova carga de inflorescência se abre (Quadro 1). No entanto, supõe-se que ocorreu protoginia nas flores, uma vez que o gineceu, quando observado em laboratório, apresentou mucilagem antes da antese floral, ocorrendo desta forma a fecundação cruzada entre indivíduos.

O final do processo de maturação floral é evidenciado pela mudança na coloração das inflorescências, que de brancas passam a marrom claro, devido, principalmente, à senescência das anteras. Durante as observações notou-se que algumas inflorescências não apresentavam maturação uniforme do conjunto, com presença de flores em diferentes estágios, o que sugere uma estratégia para ocorrência de maior diversidade genética, uma vez que a própria protoginia proporciona a alogamia na espécie. Ainda, observou-se que, com certa frequência, em algumas inflorescências em que não desenvolveu nenhum fruto, originaram novas inflorescências ou folhas e inflorescências. Essas observações sugerem outros estudos para melhor compreensão da espécie.

Levantamento dos polinizadores

No Quadro 2 estão apresentados os valores da freqüência de insetos por árvore, temperatura (°C) dos períodos de captura, umidade relativa do ar (UR em %) e velocidade do vento, fraco (f) e moderado (m), segundo a tabela de Beaufort. Verificou-se que o decréscimo na freqüência de insetos indica uma correlação com o acréscimo da temperatura e aumento da velocidade do vento. O desaparecimento total de insetos foi registrado a urna temperatura superior a 32°C e UR inferior a 41,5% (Figura 1), com vento passando de fraco a moderado.

Os dados apresentados no Quadro 1 e 2, além de indicar a correlação entre a pesença de insetos com a temperatura, umidade relativa do ar e a velocidade do vento, indicam a existência de hábito comportamental dos insetos correlacionado com a existência de preferência para visitação em determinadas árvores A6, A9 e A10, o que em termos de estrutura genética de populações, possibilita questionar a ocorrência de fluxo genético constante entre indivíduos. Em relação à presença de insetos, observa-se que o desaparecimento após às 10 horas, não está correlacionado com a maior temperatura do dia, que ocorre em torno de 11 horas, permitindo correlacionar este fato, provavelmente com a maior disponibilidade de elementos atrativos aos insetos. Nos outros períodos verificou-se a ausência total de insetos (Figura 1).

Através dos dados de coleta de insetos e contagem de pólem por periodo, para as espécies A. mellifera e Trigona spinipes (Quadro 3), pode-se notar a maior freqüência de visita no período de 6 às 9 horas, P1-3, ocorrendo maior transporte de pólen para a espécie A. mellifera.

Determinação da Polinização

Os resultados obtidos através do isolamento ou não de inflorescência estão demonstrados no Quadro 4. A média de frutos produzidos na testemunha, isto é, polinização aberta, com influência dos polinizadores foi de 7,10 frutos e nas inflorescências isoladas, sem ação dos polinizadores foi de 1,56 frutos. A diferença entre os dois tratamentos na fecundidade,testada através do teste de Qui-quadrado (χ2 = 20,7) foi altamente significativa a 1% de probabilidade (Quadro 5), comprovando-se assim, a eficácia da ação dos insetos polinizadores e demais ações ambientais na produção de sementes da essência estudada.

Quadro 1
Estágio fenológico da antese floral da L leucocephala em três dias consecutivos, por árvore e número de inflorescência marcadas
Quadro 2
Freqüencia de insetos por árvore, período do dia, umidade relativa do ar e velocidade do vento, em população de L. leucocephala

Figura 1
Temperatura e umidade relativa do ar por período de captura de insetos, no povoamento de L. leucocephala.

Quadro 3
Porcentagem e número de pólen transportado por espécie de polinizador em função do período de visita em flores de L. leucocephala
Quadro 4
Número de inflorescências isoladas, abortadas e frutos produzidos em L. leucocephala em função do isolamento e polinização livre
Quadro 5
Freqüência observada e esperada de inflorescência com flores fecundadas e abortadas em L. leucocephala em função de isolamento

Entretanto, a produção de frutas e sementes nos tratamentos de isolamento pode ter-se originado da autofecundação na própria flor, improvável devido a protogenia, ou entre flores do mesmo ramo, o que é mais provável em função do isolamento de 1 a 6 inflorescências por repetição. Não se descarta também a possibildade de ocorrência de autofecundação entre flores da mesma inflorescência, a medida que verificou-se a existência de flores em diferentes estágios de desenvolvimento, ocorrendo simultaneamente nestas inflorescências.

CONCLUSÃO

A ântese floral da L. leucocephala, nas condições de estudo, ocorre individualmente no período de um dia, porém, os órgãos florais são visitados pelos polinizadores no período de 6 às 12 horas, dependendo da temperatura, umidade relativa do ar e da velocidade do vento, ou devido ao esgotamento de pólen e néctar nas flores, haja vista que a senescência do androceu ocorre seis horas após a ântese floral.

O tratamento de isolamento de ramos florais, com ausência de polinizadores e com produção de sementes, reforça as possibilidades da espécie autofecundarse, em função da sua estrutura floral.

Dentre as espécies de insetos visitadores de flores de L. leucocephala, a espécie A. mellifera seguida por T. spinipes pode ser citada como as mais importantes na polinização, em função da carga de pólen transportada e das suas frequências na visitação de flores.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

  • AMARAL, E. Utilidade das abelhas na polinização. São Paulo Agrícola, São Paulo, 2 (18): 22-23. 1960
  • BERTI FILHO, E. Insetos Associados a plantações de espécies do gênero Eucalyptus nos Estados Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Piracicaba, ESALQ/USP, 176p. 1981 (Tese de Livre Docência).
  • GOMES, F.P. Curso de estatística experimental Livraria Nobel. São Paulo. 1976. 430p.
  • MAÊDA, J.M. A polinização entomófila em Pomar de Sementes Clonal de Eucalyptus grandis Hill ex Maiden na região de Botucatu-SP. Piracicaba, ESALQ/USP. 98p. 1989 (Dissertação de Mestrado).
  • MORA, A.L., PINTO JR, J.E., FONSECA, S.M. e KAGEYAMA, P.Y. Aspéctos da produção de sementes de espécies florestais . Série Técnica. IPEF. Piracicaba. 2 (6) 60p. 1981.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    1997
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