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Utilização de N-acetil-cisteína no Perioperatório de Transplante de Fígado: Uma Revisão de Escopo

RESUMO

Objetivo:

Encontrar evidências sobre a utilização de N-acetil-cisteína (NAC) no perioperatório de transplante de fígado, uma vez que a NAC, por ser o precursor acetilado da L-cisteína e da glutationa reduzida, colabora no abastecimento hepático de glutationa ajudando o fígado a se recuperar da lesão de isquemia e reperfusão.

Metodologia:

Trata-se de uma revisão de escopo nas bases de dados PubMed, BVS e Web of Science. Foram utilizados os descritores “Liver transplantation”, “N-acetyl-cysteine” e “Reperfusion Ischemia”, com o operador booleano “AND”, e selecionados artigos de relevância para o tema. Inicialmente, foram selecionados 60 artigos, todos publicados nos últimos 24 anos, em português e/ou inglês. Após análise, oito artigos corresponderam ao objetivo proposto.

Resultados:

Os grupos que receberam NAC durante o TxF apresentaram hipotensão pós-reperfusão, menores valores de pH intraoperatório, concentrações plasmáticas mais elevadas de IL-4 e aumento significativo dos níveis de IL-10 cinco minutos antes da reperfusão. Observou-se ainda a inibição da α-glutationa S-transferase (α-GST) após a reperfusão, ao contrário do grupo controle, que apresentou aumento significativo dessa enzima. Além disso, os níveis de sVCAM-1 e sICAM-1 foram significativamente mais baixos no grupo NAC 24 horas após a reperfusão em comparação com o grupo placebo. O valor máximo de AST durante as primeiras 72 horas de pós-operatório foi semelhante em ambos os grupos, embora o pico de ALT tenha sido menor no grupo NAC do que no grupo placebo. Em enxertos que receberam o NAC na solução de perfusão, as taxas de sobrevivência aos 3 e 12 meses foram de 93% e 90%, respectivamente, e no grupo controle foram de 82% e 70%, respectivamente. A incidência de complicações pós-operatórias foi de 23% no grupo com o NAC e de 51% no grupo controle. A incidência de DPE foi menor para o grupo NAC, que apresentou 15% versus 32% do grupo controle. Em relação à administração do NAC durante o intraoperatório do TxF, a taxa de sobrevivência dos pacientes em um ano foi de 78,4% no grupo NAC em comparação com 80,9% no grupo placebo.

Conclusão:

A administração intraoperatória de NAC durante a fase anepática esteve associada a um efeito protetor contra a lesão de reperfusão, contudo em outros estudos foram observadas limitações na proteção contra lesões hepáticas, nos biomarcadores de estresse oxidativo, na inflamação e no funcionamento das enzimas hepáticas.

Descritores
N-acetil-cisteína; Transplante de Fígado; Isquemia de Reperfusão

ABSTRACT

Objective:

To find evidence on the use of N-acetyl-cysteine (NAC) in the perioperative period of liver transplantation, since NAC, as it is the acetylated precursor of L-cysteine and reduced glutathione, contributes to the hepatic supply of glutathione, helping the liver to recover from ischemia and reperfusion injury.

Methodology:

This is a scoping review of the PubMed, VHL and Web of Science databases. The descriptors “Liver transplantation”, “N-acetyl-cysteine” and “Reperfusion Ischemia” were used, with the Boolean operator “AND”, and articles relevant to the topic were selected. Initially, 60 articles were selected, all published in the last 24 years, in Portuguese and/or English. After analysis, eight articles corresponded to the proposed objective.

Results:

The groups that received NAC during TxF showed post-reperfusion hypotension, lower intraoperative pH values, higher plasma concentrations of IL-4 and a significant increase in IL-10 levels five minutes before reperfusion. Inhibition of α-glutathione S-transferase (α-GST) was also observed after reperfusion, unlike the control group, which showed a significant increase in this enzyme. Furthermore, sVCAM-1 and sICAM-1 levels were significantly lower in the NAC group 24 hours after reperfusion compared with the placebo group. The maximum AST value during the first 72 postoperative hours was similar in both groups, although the peak ALT was lower in the NAC group than in the placebo group. In grafts that received NAC in the perfusion solution, survival rates at 3 and 12 months were 93% and 90%, respectively, and in the control group were 82% and 70%, respectively. The incidence of postoperative complications was 23% in the NAC group and 51% in the control group. The incidence of EPD was lower for the NAC group, which was 15% versus 32% in the control group. Regarding the administration of NAC during the intraoperative TxF, the one-year patient survival rate was 78.4% in the NAC group compared to 80.9% in the placebo group.

Conclusion:

Intraoperative administration of NAC during the anhepatic phase was associated with a protective effect against reperfusion injury, however in other studies limitations were observed in protection against liver injury, in biomarkers of oxidative stress, in inflammation and in the functioning of liver enzymes.

Descriptors
N-acetyl-cysteine; Liver Transplant; Reperfusion Ischemia

INTRODUÇÃO

No transplante de fígado (TxF), o enxerto hepático é submetido a períodos de isquemia fria e quente, e com o restabelecimento do fluxo sanguíneo, ocorre a lesão de isquemia e reperfusão (I/R), sofrendo uma agressão adicional que agrava a lesão já causada pela isquemia. A lesão I/R prejudica a função hepática pós-operatória, a recuperação do paciente e o resultado clínico. Isso acontece a partir da interação de vários mecanismos que envolvem o edema das células endoteliais e de Kupffer, vasoconstrição devido ao aumento da endotelina-1 e diminuição do óxido nítrico, regulação positiva da expressão de moléculas de adesão devido à indução humoral de mediadores inflamatórios e infiltração de neutrófilos, além da agregação plaquetária dentro dos sinusoides. A liberação de radicais livres de oxigênio pelas células de Kupffer na fase inicial da lesão de I/R vai resultar em lesão celular devido ao estresse oxidativo. A fase tardia da lesão de I/R está relacionada com a produção de radicais livres por meio do acúmulo de neutrófilos, e é nesse momento que a maioria das lesões hepáticas acontecem11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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,22 Aliakbarian M, Nikeghbalian S, Ghaffaripour S, Bahreini A, Shafiee M, Rashidi M, et al. Effects of N-Acetylcysteine Addition to University of Wisconsin Solution on the Rate of Ischemia-Reperfusion Injury in Adult Orthotopic Liver Transplant. Exp Clin Transplant Off J Middle East Soc Organ Transplant. 2017 Aug; 15(4): 432-6. https://doi.org/10.6002/ect.2014.0263
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A lesão de I/R do enxerto hepático representa um processo inevitável que pode resultar em disfunção precoce do enxerto (DPE), não função primária ou até mesmo falência do enxerto durante a fase aguda após o TxF. Apesar dos esforços para mitigar os efeitos da lesão de I/R no enxerto, como a rápida obtenção do órgão, redução do tempo de transporte, aplicação de perfusão contínua por máquina e o pré-condicionamento isquêmico remoto ou in situ, a incidência de DPE continua variando entre 2% e 23%. A situação é ainda pior quando se utilizam enxertos marginais de doadores com critérios alargados. O uso de enxertos com um elevado grau de esteatose, envelhecidos, de tamanho reduzido, de doadores após morte cardíaca ou indivíduos HBsAb-positivos expandiu significativamente o conjunto de doadores. No entanto, essas condições são fatores de risco independentes para DPE ou perda do enxerto11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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,33 Fonseca-Neto OCL da, Miranda LEC, Sabat BD, Amorim AG, Adeodato L, Melo PSV de, et al. O doador marginal: experiência de um centro de transplante de fígado. ABCD Arq Bras Cir Dig São Paulo. 2008 Mar; 21:1-5. https://doi.org/10.1590/S0102-67202008000100001
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As vias enzimáticas intracelulares, mediadas pela superóxido dismutase e pela glutationa peroxidase, desempenham um papel crucial na modulação do estresse oxidativo. A glutationa (GSH), encontrada em altas concentrações no fígado, é composta por glicina, ácido glutâmico e cisteína. Atua como um antioxidante, neutralizando os radicais livres de oxigênio. A síntese da GSH depende da disponibilidade da cisteína, a qual tem como precursor a N-acetil-cisteína (NAC)22 Aliakbarian M, Nikeghbalian S, Ghaffaripour S, Bahreini A, Shafiee M, Rashidi M, et al. Effects of N-Acetylcysteine Addition to University of Wisconsin Solution on the Rate of Ischemia-Reperfusion Injury in Adult Orthotopic Liver Transplant. Exp Clin Transplant Off J Middle East Soc Organ Transplant. 2017 Aug; 15(4): 432-6. https://doi.org/10.6002/ect.2014.0263
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O fígado, em condições normais de temperatura, perfusão e oxigenação, é o principal produtor da GSH. Contudo, em virtude do tempo de permanência do doador na unidade de terapia intensiva (UTI) e do período de isquemia, a potencial depleção intra-hepática de GSH pode fazer com que o fígado seja menos capaz de superar o estresse oxidativo da reperfusão. Com isso, o antioxidante NAC, por ser o precursor acetilado da L-cisteína e da GSH reduzida, colabora no abastecimento hepático de GSH ajudando o fígado a se recuperar da lesão de I/R44 D’Amico F, Vitale A, Piovan D, Bertacco A, Ramirez Morales R, Chiara Frigo A, et al. Use of N-acetylcysteine during liver procurement: a prospective randomized controlled study. Liver Transpl. 2013;19(2):135-44. https://doi.org/10.1002/lt.23527
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, 55 Weigand MA, Plachky J, Thies JC, Spies-Martin D, Otto G, Martin E, et al. N-cetylcysteine attenuates the increase in α-glutathione s-transferase and circulating icam-1 and vcam-1 after reperfusion in humans undergoing liver transplantation1. Transplantation. 2001 Aug 27; 72(4): 694. https://doi.org/10.1097/00007890-200108270-00023
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, 66 Gómez-Gavara C, Moya-Herraiz Á, Hervás D, Pérez-Rojas J, LaHoz A, López-Andújar R. The potential role of ffficacy and safety evaluation of N-Acetylcysteine administration during liver procurement. The NAC-400 Single Center Randomized Controlled Trial. Transplantation. 2021 Oct 105 (10): 2245. https://doi.org/10.1097/TP.0000000000003487
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Por meio do tamponamento da GSH, a NAC promove efeitos antioxidantes, protegendo os hepatócitos do estresse oxidativo; potencializa as propriedades vasodilatadoras do óxido nítrico; inibe a ativação de trombócitos, neutrófilos e monócitos, componentes principais da lesão de I/R; além de mitigar o aumento das moléculas de adesão circulantes, como a molécula de adesão intercelular-1 (ICAM-1) e a molécula de adesão celular-vascular-1 (VCAM-1), presentes no processo inflamatório55 Weigand MA, Plachky J, Thies JC, Spies-Martin D, Otto G, Martin E, et al. N-cetylcysteine attenuates the increase in α-glutathione s-transferase and circulating icam-1 and vcam-1 after reperfusion in humans undergoing liver transplantation1. Transplantation. 2001 Aug 27; 72(4): 694. https://doi.org/10.1097/00007890-200108270-00023
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,77 Kakaei F, Fasihi M, Hashemzadeh S, Zarrintan S, Beheshtirouy S, Asvadi-Kermani T, et al. Effect of N-acetylcysteine on liver and kidney function tests after surgical bypass in obstructive jaundice: a randomized controlled trial. Asian J Surg. 2020 Jan 1; 43(1): 322-9. https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2019.05.009
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,88 Santiago FM, Bueno P, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Serradilla M, et al. Effect of N-acetylcysteine administration on intraoperative plasma levels of Interleukin-4 and Interleukin-10 in liver transplant recipients. Transplant Proc. 2008 Nov 1; 40(9): 2978-80. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2008.08.103
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,99 Khan AW, Fuller BJ, Shah SR, Davidson BR, Rolles K. A prospective randomized trial of N-acetyl cysteine administration during cold preservation of the donor liver for transplantation: Original Article. Ann Hepatol. 2005 Apr 1; 4(2): 121-6. https://doi.org/10.1016/S1665-2681(19)32075-7
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Portanto, o objetivo desta revisão de escopo foi encontrar na literatura evidências sobre a utilização da NAC no perioperatório de TxF.

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão de escopo construída a partir da estrutura metodológica do Joanna Briggs Institute (JBI) e do Checklist PRISMA para Revisões de Escopo (PRISMA-ScR), que estabelecem as seguintes etapas: 1) definir e alinhar os objetivos e a questão de pesquisa; 2) desenvolver e alinhar os critérios de inclusão com os objetivos e questões; 3) descrever a abordagem planejada para busca, seleção, extração de dados e apresentação de evidências; 4) busca de evidências; 5) seleção das evidências; 6) extrair as evidências; 7) análise das evidências; 8) apresentação das evidências; e 9) resumir as evidências sobre o propósito da revisão, tirar conclusões e observar quaisquer implicações das descobertas1010 JBI Manual for Evidence Synthesis - JBI Global Wiki. [cited Apr. 2, 2024]. Available in: https://jbi-global-wiki.refined.site/space/MANUAL.
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,1111 Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O’Brien KK, Colquhoun H, Levac D, et al. PRISMA Extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018 Oct 2; 169(7): 467-73. https://doi.org/10.7326/M18-0850
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Em vista disso, foi formulada a pergunta norteadora de acordo com a estratégia PCC, que representa População, Conceito e Contexto. Dessa maneira, a seguinte questão de pesquisa foi desenvolvida: Quais os resultados obtidos com a utilização de N-acetil-cisteína no perioperatório de pacientes submetidos ao TxF?

A busca bibliográfica foi realizada de forma sistematizada nas seguintes bases de dados: PubMed, Web of Science e Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), sendo nesta última encontrados artigos científicos da Medline e da Lilacs. Foram utilizados os seguintes descritores, validados pelos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): “Liver transplantation”, “N-acetyl-cysteine” e “Reperfusion Ischemia”. Os descritores foram permutados pelo operador booleano “AND” e houve restrição de lapso temporal, sendo selecionados artigos dos últimos 24 anos. A utilização dos descritores em inglês se deve ao funcionamento das bases de dados e pela maioria dos artigos indexados estarem disponíveis na língua inglesa, fazendo com que a busca com os descritores em português limite os resultados a apenas artigos que disponibilizam a versão em português e inglês.

Na PubMed, BVS e Web of Science utilizaram-se os descritores, e as buscas ficaram ampliadas a todos os campos, sendo encontrados 17, 20 e 23 artigos, respectivamente. Ao final, foram totalizados 60 artigos. Devido à limitação de tempo, outras fontes manuais não foram utilizadas.

Para a seleção sistematizada dos artigos, foi utilizada a ferramenta Rayyan – Intelligent Systematic Review, considerando-se a estratégia de busca do PRISMA Statement 2020 de acordo com o CARE Guidelines do Equator Network para Revisões Sistemáticas (Fig. 1)1212 Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ. 2021 Mar 29; 372 :n71. https://doi.org/10.1136/bmj.n71
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Figura 1
Triagem dos artigos com o fluxograma PRISMA Statement 2020 para revisões sistemáticas.

Na triagem dos artigos foram utilizados os critérios de screening (inclusão e exclusão), sendo excluídos os artigos duplicados e os que não se enquadravam no foco da pesquisa sobre a utilização de NAC no perioperatório de TxF. Com isso, a prioridade da busca foi considerar apenas artigos científicos que descrevessem o mecanismo da lesão hepática por I/R, o mecanismo de atuação do N-acetil-cisteína na lesão de I/R, os resultados positivos e negativos a partir do uso do NAC durante o TxF e as limitações nas evidências quanto aos benefícios do uso do NAC no perioperatório de TxF.

Ao final, os artigos que se enquadraram na temática foram analisados e incluídos em uma tabela de extração de dados com informações que contribuíram para responder a questão e os objetivos da pesquisa. Os resultados foram descritos na Tabela 1.

Tabela 1
Artigos incluídos na revisão de escopo.

RESULTADOS

A Fig. 1 descreve as etapas da triagem dos artigos que foram selecionados a partir de critérios rigorosos de inclusão e exclusão. Primeiramente, foi feita a identificação dos artigos nas bases de dados por uma autora. Estes foram adicionados ao software Rayyan e foi realizada a eliminação dos artigos duplicados. Concluída essa etapa, os artigos foram rastreados por dois outros autores a partir da leitura de títulos e resumos, sendo excluídos aqueles que não se adequaram ao desenho metodológico da pesquisa, tais como carta e editorial. Em seguida, os mesmos dois autores realizaram um novo rastreamento com base nos títulos e resumos, sendo excluídos os estudos que não abordavam especificamente a temática da utilização de N-acetil-cisteína no perioperatório de TxF. Por fim, foram avaliados em texto completo por dois pesquisadores, individualmente, segundo os critérios de elegibilidade. Caso houvesse divergência entre os avaliadores, o texto era discutido de acordo com os critérios e procurava-se um consenso. Ao final, foram incluídos oito estudos para a síntese qualitativa.

Em um ensaio clínico duplo-cego randomizado, foram utilizados 115 doadores, os quais foram divididos em um grupo com 49 doadores que receberam 2 gramas de NAC à solução de preservação padrão, enquanto o grupo controle com 66 doadores recebeu apenas a solução padrão na perfusão. Os dois grupos de receptores foram comparáveis em termos de idade, sexo, peso do paciente, pontuação do Modelo para Doença Hepática em Estágio Final (MELD) e peso do enxerto. Não houve diferença significativa no sangramento intraoperatório entre o grupo com NAC e o grupo controle, sendo em média 1810,15 mL e 2104,08 mL, respectivamente. A permanência hospitalar foi de cerca de 12 dias em ambos os grupos. A dosagem média de noradrenalina antes da reperfusão nos grupos controle e experimental foi de 14,52 mcg e 16,08 mcg, respectivamente. Além disso, a dosagem média de noradrenalina após a reperfusão foi de aproximadamente 12,05 mcg e 18,44 mcg nos grupos controle e experimental. A duração do uso de noradrenalina foi de 78,92 minutos para o grupo controle e de 97,33 minutos para o grupo experimental. A hipotensão após reperfusão portal foi significativamente mais comum no grupo experimental em comparação ao grupo controle, sendo 4 casos no grupo controle e 12 episódios no grupo experimental. No entanto, não foi encontrada diferença na duração da hipotensão pós-reperfusão entre os grupos. O retransplante devido à disfunção primária foi realizado em dois casos no grupo com NAC, enquanto nenhum paciente no grupo controle necessitou de retransplante. Ambos os fígados não funcionantes eram enxertos marginais com tempo de isquemia fria prolongado com cerca de 12 horas. A mortalidade hospitalar foi comparável entre os grupos, com dois casos no grupo controle e três no grupo com NAC22 Aliakbarian M, Nikeghbalian S, Ghaffaripour S, Bahreini A, Shafiee M, Rashidi M, et al. Effects of N-Acetylcysteine Addition to University of Wisconsin Solution on the Rate of Ischemia-Reperfusion Injury in Adult Orthotopic Liver Transplant. Exp Clin Transplant Off J Middle East Soc Organ Transplant. 2017 Aug; 15(4): 432-6. https://doi.org/10.6002/ect.2014.0263
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Em um ensaio clínico realizado com 50 receptores de TxF, os pacientes foram randomizados para o grupo tratado com NAC ou placebo, sendo cada grupo composto por 25 pacientes. As concentrações plasmáticas intraoperatórias de IL-4 foram muito maiores entre os receptores de TxF tratados com NAC do que aquelas do grupo placebo. As diferenças foram significativas 5 minutos antes da reperfusão e 5 minutos após a reperfusão. Os níveis plasmáticos de IL-10 foram semelhantes em ambos os grupos, embora tenha havido um aumento significativo 5 minutos antes da reperfusão no grupo tratado com NAC88 Santiago FM, Bueno P, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Serradilla M, et al. Effect of N-acetylcysteine administration on intraoperative plasma levels of Interleukin-4 and Interleukin-10 in liver transplant recipients. Transplant Proc. 2008 Nov 1; 40(9): 2978-80. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2008.08.103
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Em outro estudo clínico, foram incluídos 22 receptores, os quais foram divididos em dois grupos: um grupo recebeu enxertos de doadores tratados com NAC, enquanto o grupo controle recebeu enxertos de doadores que não receberam qualquer intervenção durante a cirurgia de captação de órgãos. A infusão intravenosa de NAC foi iniciada cerca de 15 minutos antes da parada cardíaca e através da veia porta na solução de perfusão in situ e perfusão ex situ antes de ensacar. Nos exames laboratoriais dos receptores pós-TxF, os níveis de transaminases séricas durante os primeiros sete dias foram semelhantes nos dois grupos. Pacientes selecionados para receber enxertos marginais, caracterizados por idade do doador superior a 50 anos ou presença de esteatose macrovesicular, totalizaram sete no grupo NAC e cinco no grupo controle. Os exames laboratoriais desse grupo de pacientes pós-transplante revelaram níveis elevados de transaminases. A biópsia pós-reperfusão de uma hora não mostrou diferença estatística com base no número de focos de necrose/lóbulo de hepatócitos99 Khan AW, Fuller BJ, Shah SR, Davidson BR, Rolles K. A prospective randomized trial of N-acetyl cysteine administration during cold preservation of the donor liver for transplantation: Original Article. Ann Hepatol. 2005 Apr 1; 4(2): 121-6. https://doi.org/10.1016/S1665-2681(19)32075-7
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Em outra pesquisa, 140 pacientes foram divididos em um grupo que recebeu o enxerto com o NAC acrescentado na solução de perfusão e em outro grupo controle que não recebeu o NAC na perfusão. As taxas de sobrevivência do enxerto aos 3 e 12 meses foram de 93% e 90%, respectivamente, no grupo com o NAC e 82% e 70%, respectivamente, no grupo controle. A incidência de complicações pós-operatórias foi de 23% no grupo com o NAC e 51% no grupo controle. A incidência de disfunção primária do fígado foi menor para o grupo NAC, que apresentou 15% versus 32% do grupo controle44 D’Amico F, Vitale A, Piovan D, Bertacco A, Ramirez Morales R, Chiara Frigo A, et al. Use of N-acetylcysteine during liver procurement: a prospective randomized controlled study. Liver Transpl. 2013;19(2):135-44. https://doi.org/10.1002/lt.23527
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Em um estudo realizado com 20 pacientes submetidos ao TxF que foram randomizados em um grupo que recebeu o NAC e outro grupo controle que recebeu placebo imediatamente antes e durante a reperfusão do fígado, a reperfusão do enxerto levou um aumento significativo na α-GST. Esse aumento, no entanto, foi significativamente inibido pela NAC durante a reperfusão. Tanto a molécula de adesão celular vascular 1 solúvel (sVCAM-1) como a molécula de adesão intercelular 1 solúvel (sICAM-1) no grupo placebo mostraram um aumento 24 horas após a reperfusão do fígado do doador. Em contraste marcante, os níveis de sVCAM-1 e sICAM-1 foram significativamente mais baixos no grupo NAC 24 horas após a reperfusão em comparação com o grupo placebo. O valor máximo de aspartato aminotransferase (AST) sérica durante as primeiras 72 horas de pós-operatório foi semelhante no grupo placebo e no grupo NAC, embora o pico de alanina aminotransferase (ALT) tenha sido menor no grupo NAC (494U/L) do que no grupo placebo (739U/L)55 Weigand MA, Plachky J, Thies JC, Spies-Martin D, Otto G, Martin E, et al. N-cetylcysteine attenuates the increase in α-glutathione s-transferase and circulating icam-1 and vcam-1 after reperfusion in humans undergoing liver transplantation1. Transplantation. 2001 Aug 27; 72(4): 694. https://doi.org/10.1097/00007890-200108270-00023
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Em relação aos valores de pH intraoperatórios, em um estudo realizado com 50 receptores de TxF com um grupo tratado com NAC e o outro grupo com placebo, os valores de pH foram mais baixos entre os pacientes tratados com NAC do que aqueles no grupo placebo. As diferenças foram significativas aos 5 e 20 minutos após a reperfusão, sendo observada uma diminuição do pH intraoperatório previamente em 5 minutos antes da reperfusão no grupo tratado com NAC1313 Santiago FM, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Villar JM, Garrote D, et al. Intraoperative pH values after N-acetylcysteine administration during liver transplantation. Transplant Proc. 2010 Oct 1; 42(8): 3164-6. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2010.05.130
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Em um estudo, 93 pacientes realizaram o TxF, sendo 46 receptores no grupo que recebeu o NAC a partir do intraoperatório e 47 no grupo que recebeu placebo. A taxa de sobrevivência dos pacientes em um ano foi de 78,4% no grupo NAC em comparação com 80,9% no grupo placebo. A frequência de síndrome pós-reperfusão grave foi de 26 pacientes do grupo NAC e 25 no grupo controle, além de não serem detectados efeitos significativos da NAC na recuperação pós-operatória da função hepática. Os níveis séricos pós-operatórios de ALT, AST, INR e bilirrubina total foram semelhantes em ambos os grupos durante os primeiros três meses do período de estudo. Nos primeiros 14 dias, 18 pacientes do grupo NAC apresentaram lesão renal aguda (LRA), enquanto 16 do grupo placebo desenvolveram a LRA. O nível de GSH apresentou aumento no grupo NAC, enquanto no grupo placebo os níveis permaneceram próximos ao nível basal. Em seguida, o GSH retornou aos valores basais para o grupo NAC. O subgrupo de indivíduos que receberam NAC e que exibiram um aumento nos níveis de GSH acima de 5 μM não mostrou diferença significativa na sobrevida do aloenxerto em um ano em comparação com aqueles que apresentaram aumento menor de 5 μM no GSH. Além disso, não foram demonstrados quaisquer efeitos benéficos do aumento de GSH nos testes de função hepática na primeira semana pós-TxF no grupo NAC1414 Hilmi IA, Peng Z, Planinsic RM, Damian D, Dai F, Tyurina YY, et al. N-acetylcysteine does not prevent hepatorenal ischaemia–reperfusion injury in patients undergoing orthotopic liver transplantation. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jul 1; 25(7): 2328-33. https://doi.org/10.1093/ndt/gfq077
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Em um estudo unicêntrico, 214 enxertos hepáticos para o TxF foram randomizados para receber o NAC ou para o protocolo padrão sem NAC, sendo esse o grupo controle. A DPE foi definida como a presença de uma ou mais das seguintes análises laboratoriais pós-operatórias que refletem lesão e função hepática: bilirrubina ≥ 10 mg/dL no dia 7, INR ≥ 1,6 no dia 7 e ALT ou AST ≥ 2.000 UI/L nos primeiros 7 dias, de acordo com os critérios de Olthoff1515 Olthoff KM, Kulik L, Samstein B, Kaminski M, Abecassis M, Emond J, et al. Validation of a current definition of early allograft dysfunction in liver transplant recipients and analysis of risk factors. Liver Transpl. 2010 Jul; 16(8): 943–9. https://doi.org/10.1002/lt.22091
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. No grupo controle, 37,4% dos pacientes tiveram DPE em comparação com 31% no grupo de tratamento com NAC. Quando o tempo de isquemia fria excedeu seis horas, observou-se um aumento significativo nos níveis máximos de ALT no pós-operatório no grupo controle. Entretanto, a administração de NAC resultou em uma redução nos níveis de ALT nesse mesmo intervalo de tempo de isquemia fria. A incidência global de complicações pós-operatórias foi de 57,4% e 34,5% dos pacientes nos grupos controle e tratamento, respectivamente. As taxas de sobrevivência do enxerto aos 12 e 36 meses foram de 89% e 87%, respectivamente, no grupo de estudo e 85% e 84%, respectivamente, no grupo controle. Além disso, a relação GSH/glutationa dissulfeto (GSSG) tendeu a ser maior no grupo de tratamento. Os níveis de ácido oftálmico – também conhecido como oftalmato, um análogo tripeptídeo da glutationa que está relacionado com o aumento nas condições de estresse oxidativo – foram maiores no grupo controle66 Gómez-Gavara C, Moya-Herraiz Á, Hervás D, Pérez-Rojas J, LaHoz A, López-Andújar R. The potential role of ffficacy and safety evaluation of N-Acetylcysteine administration during liver procurement. The NAC-400 Single Center Randomized Controlled Trial. Transplantation. 2021 Oct 105 (10): 2245. https://doi.org/10.1097/TP.0000000000003487
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DISCUSSÃO

A preservação de órgãos é um dos fatores mais importantes na redução de complicações de transplantes e no aumento da sobrevida do enxerto e do paciente. O tempo de isquemia fria pode aumentar o risco de não funcionamento primário ou função retardada do enxerto, ao passo que a utilização de um líquido conservante adequado durante o transporte pode diminuir o risco de lesão hepática. Contudo, as alterações metabólicas ocorridas durante o TxF podem causar graves complicações ao enxerto hepático devido à lesão de I/R. A N-acetil-cisteína, por sua vez, é um potencial combatente ao estresse oxidativo gerado ao decorrer do transplante, devido à atuação sobre a GSH e as outras vias metabólicas envolvidas durante o processo22 Aliakbarian M, Nikeghbalian S, Ghaffaripour S, Bahreini A, Shafiee M, Rashidi M, et al. Effects of N-Acetylcysteine Addition to University of Wisconsin Solution on the Rate of Ischemia-Reperfusion Injury in Adult Orthotopic Liver Transplant. Exp Clin Transplant Off J Middle East Soc Organ Transplant. 2017 Aug; 15(4): 432-6. https://doi.org/10.6002/ect.2014.0263
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,1616 Liu ZX, Kaplowitz N. Immune-mediated drug-induced liver disease. Clin Liver Dis. 2002 Aug; 6(3): 755-74. https://doi.org/10.1016/S1089-3261(02)00025-9
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Mecanismo da lesão hepática por isquemia e reperfusão

A lesão de I/R, também conhecida como lesão de reoxigenação, é um dano tecidual que envolve processos multifatoriais que são desencadeados quando o suprimento de sangue retorna ao órgão após uma privação transitória ou uma insuficiência de oxigênio1616 Liu ZX, Kaplowitz N. Immune-mediated drug-induced liver disease. Clin Liver Dis. 2002 Aug; 6(3): 755-74. https://doi.org/10.1016/S1089-3261(02)00025-9
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, 1717 Ntamo Y, Ziqubu K, Chellan N, Nkambule BB, Nyambuya TM, Mazibuko-Mbeje SE, et al. Clinical use of N-acetyl cysteine during liver transplantation: implications of oxidative stress and inflammation as therapeutic targets. Biomed Pharmacother. 2022 Mar 1;147: 112638. https://doi.org/10.1016/j.biopha.2022.112638
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Com a falta de oxigênio, que é o aceptor final de elétrons da fosforilação oxidativa, ocorre a restrição da síntese de adenosina-trifosfato (ATP). A redução dos níveis de ATP celular durante a isquemia provoca acidificação no meio intra e extracelular devido às alterações no controle dos efluxos de íons de cálcio (Ca2 +) e da acumulação de sódio intracelular. Consequentemente, a sobrecarga de cálcio ativa as proteases dependentes de cálcio que irão desequilibrar a estrutura da membrana celular, ocasionando a morte celular por necrose, apoptose e mecanismos autofágicos. A produção aumentada de radicais de superóxido, fatores pró-inflamatórios e níveis prejudicados de óxido nítrico, oriundos do processo de morte celular, podem levar à ativação em cadeia de outras moléculas de radicais livres e colaborar na lesão hepatocelular11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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O processo de reperfusão do fígado exacerba a lesão por hipertensão portal transitória e estresse hiperdinâmico. A elevação da pressão portal causa danos diretos às células endoteliais sinusoidais do fígado e expõe a parede do vaso para a adesão de plaquetas e leucócitos circulantes. A agregação e ativação plaquetária estreita a vênula e libera grandes quantidades de citocinas, quimiocinas e moléculas vasoativas. O desequilíbrio dos fatores de vasoconstrição e vasodilatação agrava ainda mais a disfunção da microcirculação. A diminuição na microcirculação piora o estresse hiperdinâmico, resultando em congestão dos sinusoides e colapso do espaço de Disse entre as células endoteliais e os hepatócitos, prolongando assim a hipóxia1717 Ntamo Y, Ziqubu K, Chellan N, Nkambule BB, Nyambuya TM, Mazibuko-Mbeje SE, et al. Clinical use of N-acetyl cysteine during liver transplantation: implications of oxidative stress and inflammation as therapeutic targets. Biomed Pharmacother. 2022 Mar 1;147: 112638. https://doi.org/10.1016/j.biopha.2022.112638
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,11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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Após a reperfusão do enxerto hepático, a restauração dos níveis de oxigênio ativa o sistema hipoxantina-xantina oxidase, resultando em um aumento na produção de espécies reativas de oxigênio (ROS), como peróxido de hidrogênio, ânion superóxido e radicais hidroxila. Essas ROS ativam as células de Kupffer, macrófagos residentes do fígado, desencadeando um ciclo vicioso de autodestruição por meio da ativação em cadeia de outros radicais livres. Além disso, esse processo também acontece com a ativação dos macrófagos neutrófilos polimorfonucleares, juntamente com células endoteliais sinusoidais do fígado lesionadas que secretam grandes quantidades de citocinas e quimiocinas no sinusoide, exacerbando a reação inflamatória e recrutando mais células imunes inatas e adaptativas para o enxerto. Em um intervalo de duas horas após a revascularização do enxerto hepático, uma tempestade de citocina é observada e atinge o pico em 6 a 24 horas após a reperfusão. No microambiente pró-inflamatório, as citocinas envolvidas são interleucina (IL) 1β, IL2, IL6, IL15, interferon-γ (IFNγ) e fator de necrose tumoral-α (TNF-α), e as quimiocinas são CCL2, CXCL8 e CXCL1011 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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, 1818 Soares ROS, Losada DM, Jordani MC, Évora P, Castro-e-Silva O. Ischemia/reperfusion injury revisited: an overview of the latest pharmacological strategies. Int J Mol Sci. 2019 Jan; 20(20): 5034. https://doi.org/10.3390/ijms20205034
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A liberação de moléculas supressoras ao dano ativa a primeira onda de células residenciais de Kupffer e neutrófilos adesivos, ligando-se a receptores de reconhecimento de padrões em suas células superficiais. O toll-like 4 (TLR4) é o receptor de reconhecimento de padrão predominante que é expresso em quase todas as células do sistema imunológico inato, e o aumento da sua expressão não apenas aumenta a atividade pró-inflamatória dos macrófagos, mas também recruta mais neutrófilos polimorfonucleares da circulação. As evidências mostram que as espécies reativas de nitrogênio (RNS) também são mediadores importantes na I/R do fígado. No que diz respeito ao óxido nítrico (NO), as RNS mais relevantes são caracterizadas pela NO sintetase (NOS) endotelial, cuja atividade é dependente de Ca2+ e calmodulina, e por uma forma induzível sintetizada por células endoteliais, hepatócitos e células de Kupffer, cuja atividade é independente de Ca2+. A indução dessa última isoforma pode ter efeitos tóxicos ou protetores, dependendo do tipo de insulto, do nível e da duração de sua ativação1616 Liu ZX, Kaplowitz N. Immune-mediated drug-induced liver disease. Clin Liver Dis. 2002 Aug; 6(3): 755-74. https://doi.org/10.1016/S1089-3261(02)00025-9
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,11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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O processo de reconhecimento do enxerto hepático acontece com a ativação da imunidade adaptativa que torna o órgão mais suscetível à rejeição do aloenxerto. As células natural killers T (NKT), juntamente com as células T, são os principais responsáveis pela rejeição do aloenxerto, sendo as células T CD4+ os principais intervenientes. O Sistema Complemento também é ativado e promove lesão do enxerto após o TxF. A deposição do complexo de ataque à membrana composto por C5-9 nas membranas celulares contribui para a lesão do parênquima11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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A medição da lesão de I/R é feita por meio dos valores de alanina aminotransferase e aspartato aminotransferase elevados, bilirrubina total e razão normalizada internacional, além de sintomas clínicos como o surgimento de ascite e encefalopatia entre sete e dez dias após o TxF. O tempo de protrombina e a razão normalizada internacional têm sido utilizados como indicadores úteis de DPE e lesão do enxerto, mas a sua elevação é um indicador tardio e pode atrasar a identificação. A resposta inflamatória começa duas horas após a reperfusão, mas sua aplicação como ferramenta diagnóstica para DPE é limitada devido à sua baixa especificidade e à influência do regime imunossupressor. Além disso, o GSH, que é sintetizado principalmente nas células do fígado necessita da disponibilidade da cisteína para ser produzido, mas durante o estresse oxidativo causado pela revascularização do enxerto hepático, a cisteína não fica disponível e por isso tem-se a depleção do nível de GSH durante esse processo11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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Em suma, existem evidências sugerindo que durante a I/R hepática há geração e liberação de ROS e RNS que causam estresse oxidativo no fígado e promovem disfunção endotelial, danos ao DNA e respostas inflamatórias locais. As células-chave que iniciam a lesão de I/R são as células de Kupffer, pois promovem a liberação dessas espécies reativas. Xantina oxidase derivada de hepatócitos e células de Kupffer, células endoteliais sinusoidais e mitocôndrias também são fontes conhecidas de ROS. Além disso, foi relatado que cascatas inflamatórias juntamente com estresse oxidativo induzem subsequentemente uma tempestade de citocinas, levando à morte das células devido a danos em sua estrutura. Considerando que a análise histológica é o padrão-ouro para a identificação de lesões hepáticas decorrentes de I/R, é possível identificar esteatose microvesicular hepática, focos de infiltração neutrofílica parenquimatosa, colestase, balonamento de hepatócitos, necrose e apoptose. Essas alterações são comumente observadas, embora em menor grau, nas biópsias de reperfusão rotineiras, sendo geralmente mais proeminentes nas regiões centrolobulares. No entanto, a utilidade dessa análise é limitada pelo fato de que apenas uma pequena região do fígado pode ser examinada, o que dificulta a avaliação da condição de todo o órgão. Esse desafio pode ser parcialmente mitigado pela combinação de resultados de biomarcadores circulantes com achados intra-hepáticos1616 Liu ZX, Kaplowitz N. Immune-mediated drug-induced liver disease. Clin Liver Dis. 2002 Aug; 6(3): 755-74. https://doi.org/10.1016/S1089-3261(02)00025-9
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,11 Liu J, Man K. Mechanistic insight and clinical implications of ischemia/reperfusion injury post liver transplantation. Cell Mol Gastroenterol Hepatol. 2023 Jan 1;15(6):1463-74. https://doi.org/10.1016/j.jcmgh.2023.03.003
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,99 Khan AW, Fuller BJ, Shah SR, Davidson BR, Rolles K. A prospective randomized trial of N-acetyl cysteine administration during cold preservation of the donor liver for transplantation: Original Article. Ann Hepatol. 2005 Apr 1; 4(2): 121-6. https://doi.org/10.1016/S1665-2681(19)32075-7
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Mecanismo de atuação do N-acetil-cisteína na lesão de isquemia e reperfusão

A lesão de I/R no fígado provoca a expressão da óxido nítrico sintase induzível (iNOS), que promove a liberação de grande quantidade de NO. A reação mais favorável do NO acontece com o ROS, em que resulta na formação de radicais hidroxila e peroxinitritos, os quais são oxidantes potentes. O efeito antioxidante do NAC atua freando esse estresse oxidativo criado pela lesão de I/R e, consequentemente, atenua a lesão ao enxerto hepático. Além disso, a NAC é precursora da cisteína para a síntese de GSH e atua repondo as reservas intra-hepáticas de GSH e aumentando a atividade da GSH redutase entre os receptores de TxF – que, normalmente, apresenta-se com a atividade diminuída, facilitando a lesão hepática de I/R88 Santiago FM, Bueno P, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Serradilla M, et al. Effect of N-acetylcysteine administration on intraoperative plasma levels of Interleukin-4 and Interleukin-10 in liver transplant recipients. Transplant Proc. 2008 Nov 1; 40(9): 2978-80. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2008.08.103
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,77 Kakaei F, Fasihi M, Hashemzadeh S, Zarrintan S, Beheshtirouy S, Asvadi-Kermani T, et al. Effect of N-acetylcysteine on liver and kidney function tests after surgical bypass in obstructive jaundice: a randomized controlled trial. Asian J Surg. 2020 Jan 1; 43(1): 322-9. https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2019.05.009
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Outra ação relevante da NAC é a redução das ligações dissulfeto nas proteínas, o que aumenta a expressão da coenzima Q10, com propriedades antioxidantes, e ativa a via de sinalização do fator eritróide 2 (Nrf2), um regulador crucial da resistência celular aos oxidantes. A ativação ou expressão aumentada de Nrf2 tem sido associada ao aumento da expressão de genes e enzimas que codificam antioxidantes de defesa citoprotetores em resposta à exposição ao estresse oxidativo. A importância deste mecanismo é particularmente evidente no uso eficaz de NAC contra overdose de lesão hepática induzida por acetaminofeno, popularmente conhecido por paracetamol, que causa uma depleção abrupta dos níveis de GSH no fígado1919 Ntamo Y, Ziqubu K, Chellan N, Nkambule BB, Nyambuya TM, Mazibuko-Mbeje SE, et al. Drug-induced liver injury: clinical evidence of N-acetyl cysteine protective effects. Oxid Med Cell Longev. 2021 Dec 6; 2021: e3320325. https://doi.org/10.1155/2021/3320325
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Com isso, o NAC diminui o estresse oxidativo através do aumento do nível de GSH intracelular e diminui a liberação de IL-6, IL-1β e TNF-α, além de gerar efeitos na sinalização molecular, expressão gênica e nos fatores de transcrição comuns com o intuito de acelerar mecanismos reparadores aos dados teciduais do enxerto hepático causados pela lesão de I/R.

Resultados positivos do uso de N-acetil-cisteína durante o transplante de fígado

Em um estudo que utilizou a NAC nos receptores do TxF, foram descritos níveis plasmáticos significativamente reduzidos de α-GST após 24 horas da reperfusão do enxerto hepático. A α-GST é encontrada predominantemente no fígado e, diferentemente da ALT e da AST, que têm concentrações mais elevadas nos hepatócitos periportais, está igualmente distribuída nas regiões periportal e centrolobular. Como os hepatócitos centrolobulares são mais suscetíveis a danos por hipóxia, descobriu-se que a α-GST é um indicador mais sensível de lesão hepatocelular do que ALT e AST. Esta pode ser a razão pela qual a NAC inibiu significativamente os valores máximos de α-GST no período de reperfusão imediato e não os níveis máximos de ALT ou AST, embora os níveis máximos de ALT tenham sido mais baixos no grupo NAC do que no grupo placebo. Esses pacientes exibiram concentrações reduzidas de ICAM-1 e VCAM-1 circulantes e níveis elevados de IL-4 e IL-10 plasmáticas. Essas baixas concentrações resultam na inibição da quimiotaxia de neutrófilos, redução da adesão de leucócitos via interação com a VCAM-1, diminuição da agregação plaquetária e na melhora da vasodilatação dependente do endotélio.55 Weigand MA, Plachky J, Thies JC, Spies-Martin D, Otto G, Martin E, et al. N-cetylcysteine attenuates the increase in α-glutathione s-transferase and circulating icam-1 and vcam-1 after reperfusion in humans undergoing liver transplantation1. Transplantation. 2001 Aug 27; 72(4): 694. https://doi.org/10.1097/00007890-200108270-00023
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, 2020 Hoffmann K, Büchler MW, Schemmer P. Supplementation of amino acids to prevent reperfusion injury after liver surgery and transplantation – Where do we stand today? Clin Nutr. 2011 Apr 1; 30(2): 143-7. https://doi.org/10.1016/j.clnu.2010.09.006
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Em um ensaio clínico, os valores máximos de IL-4 e IL-10 plasmáticas foram observados 20 e 60 minutos após a reperfusão, respectivamente, tanto no grupo placebo quanto no grupo que recebeu NAC. A IL-4 e IL-10 agem como anti-inflamatórios, bloqueando a síntese de IL-1, TNF-α, IL-6 e proteína inflamatória de macrófagos. Foi observado um aumento significativo de IL-4 e IL-10 entre os receptores de TxF tratados com NAC cinco minutos antes e cinco minutos após a reperfusão, com a IL-10 alcançando o pico máximo em 60 minutos após a revascularização do fígado, indicando um efeito modulador positivo da NAC na resposta anti-inflamatória mediada por essas citocinas88 Santiago FM, Bueno P, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Serradilla M, et al. Effect of N-acetylcysteine administration on intraoperative plasma levels of Interleukin-4 and Interleukin-10 in liver transplant recipients. Transplant Proc. 2008 Nov 1; 40(9): 2978-80. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2008.08.103
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Além disso, a NAC é um pró-fármaco de L-cisteína que é usada na toxicidade do paracetamol e do monóxido de carbono, na nefropatia induzida por contraste, bronquite crônica, alveolite induzida por radiação e síndrome da bile espessa neonatal. Além dos efeitos antioxidantes, a NAC inibe a adesão de leucócitos e diminui o TNF-α77 Kakaei F, Fasihi M, Hashemzadeh S, Zarrintan S, Beheshtirouy S, Asvadi-Kermani T, et al. Effect of N-acetylcysteine on liver and kidney function tests after surgical bypass in obstructive jaundice: a randomized controlled trial. Asian J Surg. 2020 Jan 1; 43(1): 322-9. https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2019.05.009
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Em uma pesquisa, foi avaliado o pH intraoperatório durante o TxF com o uso de NAC. Valores mínimos de pH em ambos os grupos de estudo, placebo e NAC, foram observados cinco minutos após a reperfusão. Houve a redução significativa detectada entre os receptores de enxertos hepáticos tratados com NAC aos 5 e aos 20 minutos após a reperfusão como uma indicação de um efeito modulador da NAC no equilíbrio ácido-base. A redução nos valores de pH entre os receptores de TxF tratados com NAC deve estar relacionada à hidrólise de NAC em cisteína e ácido acético, que podem reagir ainda mais com os ânions bicarbonato, reduzindo seus valores no grupo NAC e consequentemente aumentando o dióxido de carbono1313 Santiago FM, Olmedo C, Muffak-Granero K, Comino A, Villar JM, Garrote D, et al. Intraoperative pH values after N-acetylcysteine administration during liver transplantation. Transplant Proc. 2010 Oct 1; 42(8): 3164-6. https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2010.05.130
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Resultados negativos sobre o uso da N-acetil-cisteína durante o transplante de fígado

A NAC pode ter efeitos protetores limitados contra lesão de isquemia-reperfusão. Em um estudo, foi relatado que a NAC não afetou os níveis máximos de AST pós reperfusão do enxerto hepático99 Khan AW, Fuller BJ, Shah SR, Davidson BR, Rolles K. A prospective randomized trial of N-acetyl cysteine administration during cold preservation of the donor liver for transplantation: Original Article. Ann Hepatol. 2005 Apr 1; 4(2): 121-6. https://doi.org/10.1016/S1665-2681(19)32075-7
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. Em outro estudo, não se observaram alterações significativas na reperfusão da artéria hepática, internação hospitalar, necessidade de inotrópicos antes e depois do clampeamento portal no TxFe nas complicações vasculares. Foi descrito também que a NAC pode induzir a perda de aminoácidos e promover a liberação de nitrogênio ureico do enxerto hepático em pacientes submetidos a TxF2121 Taut FJH, Breitkreutz R, Zapletal CM, Thies JC, Babylon A, Martin E, et al. Influence of N-acetylcysteine on hepatic amino acid metabolism in patients undergoing orthotopic liver transplantation. Transpl Int. 2001 Sep 1; 14(5): 329-33. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11692217/
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Em um estudo, foi administrado NAC em pacientes submetidos ao TxF. No grupo que recebeu NAC, os níveis de GSH mostraram-se elevados quando a NAC estava sendo administrada, mas posteriormente, os níveis já haviam caído para a linha de base, sugerindo que o efeito da NAC nos níveis de GSH não é sustentado. No entanto, apesar do aumento nos níveis de GSH, que durou cerca de 48 horas, não houve alteração significativa na recuperação da função do enxerto mensurada pelos testes de função hepática1414 Hilmi IA, Peng Z, Planinsic RM, Damian D, Dai F, Tyurina YY, et al. N-acetylcysteine does not prevent hepatorenal ischaemia–reperfusion injury in patients undergoing orthotopic liver transplantation. Nephrol Dial Transplant. 2010 Jul 1; 25(7): 2328-33. https://doi.org/10.1093/ndt/gfq077
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Em outro estudo, foi observado que a DPE, de acordo com a classificação de Olthoff, não diferiu entre o grupo que recebeu e o grupo controle que não recebeu NAC. A NAC foi administrada na etapa de captação do enxerto. Neste estudo, a incidência de DPE foi de 34%, comparada a 23% relatada por Olthoff et al. Uma possível razão para isso é que a idade média dos doadores dessa série foi de 63 anos, e a idade média dos doadores no estudo de Olthoff et al. foi de 48 anos. Dos pacientes que apresentaram DPE, 27% tiveram eventual perda do enxerto. Em 90% dos receptores incluídos, os critérios de DPE foram devidos a ALT/AST no primeiro dia de pós-operatório. No entanto, os níveis de ALT/AST normalizaram para menos de 2.000 UI/L a partir do segundo dia em 85%1515 Olthoff KM, Kulik L, Samstein B, Kaminski M, Abecassis M, Emond J, et al. Validation of a current definition of early allograft dysfunction in liver transplant recipients and analysis of risk factors. Liver Transpl. 2010 Jul; 16(8): 943–9. https://doi.org/10.1002/lt.22091
https://doi.org/10.1002/lt.22091...
,66 Gómez-Gavara C, Moya-Herraiz Á, Hervás D, Pérez-Rojas J, LaHoz A, López-Andújar R. The potential role of ffficacy and safety evaluation of N-Acetylcysteine administration during liver procurement. The NAC-400 Single Center Randomized Controlled Trial. Transplantation. 2021 Oct 105 (10): 2245. https://doi.org/10.1097/TP.0000000000003487
https://doi.org/10.1097/TP.0000000000003...
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Limitações nas evidências quanto aos benefícios do uso da N-acetil-cisteína no perioperatório de transplante de fígado

A partir dos estudos que investigam o efeito protetor da NAC contra a lesão hepática por I/R no contexto do transplante de fígado, a evidência clínica do benefício deste medicamento ainda não é definitiva. A inconsistência nesses resultados pode ser devido ao pequeno tamanho da amostra e ao poder insuficiente para detectar pequenas diferenças. O resultado heterogêneo desses estudos também impede o agrupamento de dados para tirar conclusões mais fortes no formato de um artigo de revisão de escopo. A limitação deste estudo acontece em virtude do grande número de estudos realizados em animais que comprovam a eficácia da NAC contra a lesão de isquemia e reperfusão, enquanto o quantitativo de estudos com humanos é em menor quantidade. Contudo, nos ensaios clínicos feitos com pacientes submetidos ao TxF humano, foi demonstrado que a administração de NAC intravenosa está associada a uma menor incidência de DPE e melhora da função hepática, mas na literatura também são encontrados estudos que não conseguem mostrar algum benefício da NAC na lesão de I/R.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A lesão de I/R impulsiona os efeitos prejudiciais do estresse oxidativo e da resposta inflamatória durante o TxF. A desregulação da microcirculação hepática, da homeostase e do metabolismo causa lesão precocemente e iniciam uma cascata imunológica. Tanto a imunidade inata quanto a adaptativa prolongam a lesão do enxerto através da adesão e do recrutamento de macrófagos, neutrófilos, células dendríticas e pela ativação de interleucinas, células NKT e linfócitos T citotóxicos. A administração de N-acetil-cisteína durante a obtenção do fígado não demonstrou melhora significativa na DPE, mas quando o tempo de isquemia fria é superior a seis horas, a NAC influencia positivamente os níveis de ALT no pós-operatório. A administração intraoperatória de NAC durante a fase anepática em receptores de TxF esteve associada a um efeito protetor contra a lesão de reperfusão, contudo em outros estudos foram observadas limitações na proteção contra lesões hepáticas, nos biomarcadores de estresse oxidativo, na inflamação e no funcionamento das enzimas hepáticas.

AGRADECIMENTOS

Não aplicável.

  • FINANCIAMENTO

    Não aplicável.

DISPONIBILIDADE DE DADOS DE PESQUISA

Todos os conjuntos de dados foram gerados ou analisados no estudo em curso.

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Editado por

Editora de Seção: Ilka de Fátima Santana F Boin https://orcid.org/0000-0002-1165-2149

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    19 Mar 2024
  • Aceito
    20 Ago 2024
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