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Cartas ao Editor

Senhor Editor,

Escrevo-lhe esta carta com o prazer de quem lê com satisfação o nosso honroso "Arquivos Brasileiros de Cardiologia", que faz revigorar a nossa cardiologia dia a dia.

Gostaria de comentar alguns pontos do artigo de Ferrín e col, publicado em 1997; 69: 19-23. Pessoalmente, acho muito difícil caracterizar o tipo funcional baseado na classificação na NYHA, para neonatos e lactentes, sendo esta baseada no esforço desenvolvido pelo paciente.

Portanto, acho difícil diferenciar grupos II e III, por exemplo. Penso ser complicado colocar porcentagens em cima destes dados de avaliação.

Sendo o quadro clínico desses pacientes, com cardiopatia de hiperfluxo, evolutivos e extremamente malignos no que tange ao desenvolvimento de hipertensão pulmonar (HP), desde o período neonatal até que completem o 1º ano de vida, com certeza muitos pacientes do grupo insuficiência cardíaca congestiva enviesaram para o grupo HP no decorrer de 1079 dias à espera de cirurgia.

Sabemos que num período de um ano esses pacientes, se não operados, apresentam HP, mas não necessariamente hiper-resistência vascular pulmonar, fixa ou somente reativa. Como considerar um exame clínico, radiografia de tórax e eletrocardiograma como de HP fixa em uma criança de dois ou três meses, ou mesmo de um ano de vida? O cateterismo comparativo entre os dois grupos, com medidas de resistência vascular pulmonar e a relação Qp/Qs seria mais fidedigno para a avaliação do comprometimento vascular pulmonar. Apenas 31 pacientes foram submetidos ao cateterismo, como foram avaliados os outros pacientes, sendo este exame considerado padrão-ouro.

Por último, como explicar uma indicação mais precoce para o grupo sem síndrome, se houve mais mortes no grupo de portadores de síndrome de Down?

Pedro Abujamra - São Paulo, SP

Senhor Editor,

As considerações do Dr. Pedro Abujamra, referentes ao trabalho desenvolvido no INCOR-FMUSP: "Defeito total do septo atrioventricular na comparação anatomofuncional de portadores ou não da síndrome de Down", são pertinentes e expressam a dificuldade da execução de trabalhos semelhantes.

Inicialmente, sobressalta o obstáculo na adequada caracterização em lactentes da classe funcional (CF), segundo NYHA, o que nos obrigou a agrupar as classes III e IV da classificação original para situações de cansaço e dispnéia mesmo em repouso, o que por sua vez, facilitou a divisão da CF I (assintomática ou pouco sintomática com esforços) e da CF II (cansaço nítido observado apenas com esforços na amamentação).

Dessa maneira, constatamos diferenças significativas quanto a esta CF em relação aos dois grupos estudados. No grupo I, com síndrome de Down, predominou a CF II. No grupo II, sem síndrome de Down, houve predomínio das classes funcionais III e IV.

No contexto do grau da hipertensão pulmonar (HP), seja no âmbito de reações arteriolares fixas ou reacionais, caracterizando a doença vascular pulmonar ou não, observamos que no grupo não Down (II), não houve predomínio do quadro arteriolar reacional, haja vista que foi mais encontrada a manifestação de insuficiência cardíaca congestiva (ICC), estatisticamente significante na diferenciação com o grupo portador da síndrome de Down .

Vale salientar que a doença vascular pulmonar não foi encontrada em nenhum dos pacientes com a síndrome de Down, avaliada pela necropsia ou no período pós-operatório imediato, dentre aqueles que sobreviveram.

Parece-nos, por isso, e de maneira confiável, que a diferenciação do grau de HP pode ser feita sob bases clínicas, desde que os elementos propedêuticos, somados aos dos exames laboratoriais usuais (radiografia de tórax e eletrocardiograma) sejam analisados em conjunto. Desse modo, foi possível a separação dos casos com ICC (quadro congestivo importante) e os com HP reacional (quadro congestivo pouco expressivo).

No período médio de observação que não ultrapassou a sete meses (204 dias) no grupo Down e a 11,5 meses (345 dias) no não Down, verificamos que a instabilidade clínica (sinais mais intensos de ICC) predominou no grupo não Down, o que ocorreu em 84% dos casos em relação a 60% do outro grupo, dados significantes.

Os elementos hemodinâmicos são sem dúvida importantes para a avaliação do grau de HP a tal ponto que houve correlação dos mesmos com os achados clínicos, em nosso material, haja vista que pressões maiores foram encontradas no grupo com a síndrome de Down.

Concordamos que estudo hemodinâmico mais acurado, com cálculos de fluxos e de resistência, devesse ser realizado para respaldar melhor essas observações clínicas.

Mesmo assim, julgamos que os elementos clínicos nunca devem ser invalidados ou desmerecidos, em face da precisão dos mesmos, esta demonstrada pelos vários aspectos de correlação. Além disso, deve ser considerado que nenhum paciente operado apresentava doença vascular pulmonar, afastada através da avaliação e análise clínicas.

Defendemos a indicação mais precoce dessa cardiopatia, com e sem síndrome de Down, em face da evolução desfavorável, principalmente apresentada pelo grupo II, cuja instabilidade clínica alcançou a 84% dos pacientes.

A mortalidade cirúrgica de 16% do grupo com a síndrome de Down não guardou relação com o grau de alteração vascular pulmonar, mas com nítida predisposição a processos infecciosos que desestabilizaram-no em período pós-operatório imediato.

Em suma, agradecemos as observações pertinentes do Dr. Pedro Abujamra em assunto complicado e que merece ainda a continuação de investigações, principalmente em relação a aspectos evolutivos, a se poder melhor esclarecer a fisiopatologia da árvore arterial pulmonar, no defeito do septo atrioventricular.

Prof. Dr. Edmar Atik

Cardiologia Pediátrica, INCOR-FMUSP

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jan 2001
  • Data do Fascículo
    Dez 1997
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