Acessibilidade / Reportar erro

Deslignificação do pseudocaule da bananeira pelo caldo de cultivo enzimático de Pleurotus sajor-caju

Delignification of banana pseudostem by the enzymatic culture broth of Pleurotus sajor-caju

RESUMO

Os materiais lignocelulósicos provenientes da biomassa vegetal, constituídos de celulose, hemicelulose e lignina, precisam ser decompostos para utilização na indústria, pois possuem formação fibrilar compacta de difícil degradação. Sua decomposição pode ser realizada por meio de ácidos, bases, ou enzimas lignocelulolíticas. O objetivo deste trabalho foi avaliar a possibilidade de deslignificação do pseudocaule de bananeira por meio da ação de enzimas produzidas por Pleurotus sajor-caju.

A deslignificação do pseudocaule da bananeira foi avaliada utilizando tratamento ácido e enzimático, utilizando enzimas produzidas no caldo de cultivo bruto de Pleurotus sajor-caju.O cultivo foi realizado em frascos Erlenmeyer contendo solução Manachini com 10 g L-1 de farelo de pseudocaule como substrato. Os frascos foram inoculados com P. sajor-caju e após 14 dias de incubação a suspensão foi filtrada a vácuo, para obtenção do caldo de cultivo enzimático.

No primeiro tratamento (PAE -pseudocaule com tratamento ácido e enzimático), os resultados termogravimétricos indicaram uma perda de massa de 59% relativa à celulose e hemicelulose e a liberação de 8,23 g L-1 de açúcares redutores. No segundo tratamento (PAEI – pseudocaule com tratamento ácido e enzima inativada), os resultados termogravimétricos indicaram perda de massa de 54,5% de celulose e hemicelulose e liberação de 5,18 g L-1 de açúcares redutores. No terceiro tratamento (PE – pseudocaule sem tratamento ácido e com tratamento enzimático), a ação do caldo de cultivo enzimático de P. sajor-caju promoveu perda de massa de 56,6% de celulose e hemicelulose e 6,12 g L-1 de açúcares liberados. Em comparação com a amostra FP (farelo de pseudocaule, sem tratamento ácido ou enzimático) verificou-se uma redução de 25,85% e 43,4% no teor de lignina das amostras PAE e PE, respectivamente.

Os resultados apontam para o potencial do caldo de cultivo enzimático de P. sajor-caju na deslignificação do pseudocaule de bananeira.

Palavras-chave
Pleurotus sajor-caju; pseudocaule de bananeira; enzimas ligninolíticas; deslignificação

ABSTRACT

The lignocellulosic materials from plant biomass are composed of cellulose, hemicellulose and lignin and must be decomposed for use in the industry, since they have compact fibrillar formation of difficult degradation.

The decomposition can be carried out using acids, bases, or lignocellulolytic enzymes. In this work, delignification of the banana pseudostem was accessed using acid and enzymatic treatment with enzymes produced by the fungus Pleurotus sajor-caju. The culture was carried out in Erlenmeyer flasks containing Manachini solution with 10 g L-1 of pseudostem bran as substrate. The flasks were inoculated with P. sajor-caju and after 14 days of incubation the suspension was vacuum filtered to obtain the enzyme culture broth.

In the first treatment (PAE -pseudostem with acid and enzymatic treatment), thermogravimetric

results indicated a mass loss of 59% relative to cellulose and hemicellulose and the release of 8.23 g L-1 of reducing sugars. In the second treatment (PAEI -pseudostem with acid treatment and inactivated enzyme), the thermogravimetric results indicated loss of mass of 54.5% of cellulose and hemicellulose and the release of 5.18 g L-1 of reducing sugars. In the third treatment (PE pseudostem without acid treatment and with enzymatic treatment), the action of the enzymatic broth of P. sajor-caju promoted loss of mass of 56.6% of cellulose and hemicellulose and 6.12 g L-1 reducing sugars. Compared with the FP sample (pseudostem bran without acid or enzymatic treatment), there was a 25.85% and 43.4% reduction in the lignin content in PAE and PE samples, respectively.

The results point to the potential of the enzymatic broth of P. sajor-caju in the delignification of the banana pseudostem.

Keywords
Pleurotus sajor-caju; banana pseudostem; ligninolytic enzymes; delignification

1. INTRODUÇÃO

A biomassa vegetal é composta de material lignocelulósico, constituído de moléculas de aminoácidos, ácidos graxos, e polímeros como celulose, hemicelulose, quitina, amido, lignina e proteínas [11 FERREIRA, V.F., ROCHA, D.R., SILVA, F.C., “Potencialidades e oportunidades na química da sacarose e outros açúcares”, Química Nova, v.32, n. 3, pp. 623-638, Apr. 2009.]. Para a produção de biocombustível, esta biomassa representa a fonte renovável mais abundante encontrada na natureza e tem sido considerada uma importante matéria-prima alternativa ao uso de combustíveis de origem fóssil não renovável. São exemplos desta biomassa a palha de milho e de arroz, bagaço de cana-de-açúcar, produtos agrícolas e florestais, e resíduos da indústria de celulose [22 KIM, S., DALE, B.E., “Global potential bioethanol production from wasted crops and crop residues”, Biomass and Bioenergy, v. 26, n. 4, pp. 361-375, Apr. 2004.]. De acordo com Souza et al. [33 SOUZA, E.L., LIEBL, G.F., MARAGONI, C., et al., “Bioethanol from fresh and dried banana plant pseudostem”, Chemical Engineering Transactions, v. 38, pp. 271-276, 2014.], considerando a vocação brasileira para o agronegócio, a geração de resíduos se apresenta como ótima oportunidade de reuso. Quando decomposto, o material lignocelulósico pode ser aplicado em diversas áreas, como na indústria de papel e celulose, na produção de álcoois, solventes, plásticos e adesivos [44 POTHIRAJ, C., KANMANI, P., BALAJI, P., “Bioconversion of lignocellulose material”, Mycobiology, v. 34, n. 4, pp. 159-165, Dez. 2006.]. Também pode ser utilizado na alimentação animal e para a produção de uma variedade de combustíveis, produtos químicos e produtos energéticos [11 FERREIRA, V.F., ROCHA, D.R., SILVA, F.C., “Potencialidades e oportunidades na química da sacarose e outros açúcares”, Química Nova, v.32, n. 3, pp. 623-638, Apr. 2009.].

Constituída por frações de celulose (35 – 50%), hemicelulose (20 – 35%) e lignina (10 – 25%), a biomassa tem como fator desafiante sua formação matricial compacta, de difícil acesso para bioconversão [55 SCHWARZE, F.W.M.R., “Wood decay under the microscope”, Fungal Biology Reviews, v. 21, n. 4, pp. 133-170, Nov. 2007.]. A parede celular das fibras vegetais possui regiões cristalinas devido à celulose, e regiões amorfas formadas principalmente por hemiceluloses e lignina. A fibra vegetal tem uma estrutura de camadas complexas, constituída por uma parede primária fina, que circunda uma parede secundária. A camada intermediária da parede secundária consiste de uma série de microfibrilas helicoidalmente formadas por longas cadeias de celulose e organizadas no sentido da fibra. Tais microfibrilas são resultantes do empacotamento de 30 a 100 cadeias de celulose estendidas [66 PIETAK, A., KORTE, S., TAN, E., et al., “Atomic force microscopy characterization of the surface wettability of natural fibres”, Applied Surface Science, v. 253, n. 7, pp. 3627–3635, Jan. 2007.,77 REN, J. L., SYN, R.C., PENG, F., “Carboxymethylation of hemicelluloses isolated from sugarcane bagasse”, Polymer Degradation and Stability, v. 93, n. 4, pp. 786–793, Jan. 2008.]. As microfibrilas de celulose são enroladas helicoidalmente em ângulos diferentes em várias camadas da parede celular, revestidas por hemicelulose e imersas em uma fração de lignina [55 SCHWARZE, F.W.M.R., “Wood decay under the microscope”, Fungal Biology Reviews, v. 21, n. 4, pp. 133-170, Nov. 2007.].

Para disponibilizar os açúcares presentes na biomassa lignocelulósica, que poderão, por exemplo, ser utilizados em um processo de fermentação, é necessária uma separação preliminar de seus componentes, um pré-tratamento que separa a matriz de lignina, reduz a cristalinidade da celulose e hidrolisa a hemicelulose. Este tratamento pode ser realizado por hidrólise ácida, alcalina ou enzimática [88 OGEDA, T.L., PETRI, D.F.S., “Hidrólise enzimática de biomassa”, Química Nova, v. 33, n. 7, pp. 1549-1558, Jul. 2010.].

A hidrólise da hemicelulose ocorre em condições mais brandas e a estratégia tem sido a utilização de ácido sulfúrico diluído. A celulose, apresenta maior resistência ao ataque hidrolítico e a hidrólise química requer condições de alta severidade, portanto, o uso da hidrólise enzimática é o mais indicado, por utilizar condições mais brandas. A lignina, responsável pela resistência mecânica de vegetais, além de proteger os tecidos contra o ataque de microrganismos [99 SALIBA, E.O.S., RODRIGUEZ, N.M., MORAES, S.A.L., et al., “Ligninas – métodos de obtenção e caracterização química”, Ciência Rural, v.31, n.5, pp. 917-928, Sep./Oct. 2001.], atua como uma importante barreira ao processo de hidrólise enzimática. Por esta razão, a biomassa precisa ser submetida a um pré–tratamento que decomponha a lignina e possibilite a exposição da celulose e hemicelulose à reação enzimática ou à fermentação dos açúcares. Desta forma, de acordo com Santos, Borschiver e Couto [1010 SANTOS, M.D., BORSCHIVER, S., COUTO, M., “Iniciativas para o uso da biomassa lignocelulósica em biorrefinarias: a plataforma sucroquímica no mundo e no Brasil”, Revista Economia & Energia, v 82, n.15, pp. 14-32, Jul./Sep. 2011.] a hidrólise enzimática requer o emprego de pré-tratamentos físicos (moagem, aquecimento, irradiação) ou químicos (ácido sulfúrico, ácido fosfórico, álcalis), para atingir rendimentos viáveis.

Os pré-tratamentos enzimáticos normalmente empregam enzimas que podem ser classificadas como oxidativas, como por exemplo a manganês peroxidase e a lacase, que atuam na deslignificação do material; e hidrolíticas, como a celulase e a xilanase que atuam sobre as fontes de carbono (celulose e hemicelulose) disponibilizando-as para o crescimento de microrganismos. Somente as celulases não catalisam reações com boa eficiência, no entanto, em aplicações sobre materiais pré-tratados quimicamente e com redução da cristalinidade da fração de celulose, o rendimento sobe de 20 para até 90% [88 OGEDA, T.L., PETRI, D.F.S., “Hidrólise enzimática de biomassa”, Química Nova, v. 33, n. 7, pp. 1549-1558, Jul. 2010.]. Em relação à lacase (Benzenodiol: oxigênio oxiredutase, EC 1.10.3.2), esta parece ser a enzima ligninolítica mais promissora para aplicação industrial nos processos de deslignificação quando comparada às demais enzimas ligninolíticas, principalmente quando associada a mediadores redox [1111 DU, X, LI, J., GELLERSTEDT, G., RENCORET, J., et al., “Understanding pulp delignification by laccase–mediator systems through isolation and characterization of lignin–carbohydrate complexes”, Biomacromolecules, v. 14, n. 9, pp. 3073–3080, Jul. 2013.].

Fungos do gênero Pleurotus secretam enzimas ligninolíticas (lacase, manganês peroxidase, lignina peroxidase e peroxidase versátil) e celulolíticas (endo-glucanase, celobiohidrolase, e beta-glicosidase) capazes de degradar o material lignocelulósico [1212 MANAVALAN, T., MANAVALAN, A., HEESE, K., “Characterization of lignocellulolytic enzymes from white-rot fungi”, Current Microbiology, v. 70, n. 4, pp. 485-498, Apr. 2015.]. Seu desenvolvimento ocorre em substratos com composição média de 50 – 60% de celulose, 10 – 30% de hemicelulose e 20 – 30% de lignina, pH entre 6,0 e 7,0 e teor de umidade entre 70 e 75% [1313 URBEN, A.F., Produção de cogumelos por meio de tecnologia chinesa modificada, Brasília, EMBRAPA -Recursos Genéticos e Biotecnologia, 2004.]. Alexandrino et al. [1414 ALEXANDRINO, A.M., FARIA, H.G., SOUZA, C.G.M., et al., “Aproveitamento do resíduo de laranja para a produção de enzimas lignocelulolíticas por Pleurotus ostreatus”, Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.27, n.2, pp. 364-368, Apr./Jun. 2007.] avaliaram a produção de enzimas lignocelulolíticas por Pleurotus ostreatus e observaram que lacase e manganês-peroxidase foram as principais enzimas oxidativas encontradas nos filtrados das culturas. Baixos níveis de celulase e xilanase foram detectados.

Por outro lado, o Brasil ocupa o quinto lugar na produção mundial de bananas e, para cada tonelada de bananas colhida, em torno de quatro toneladas de resíduos lignocelulósicos são gerados, dentre os quais, 75% são de pseudocaule [33 SOUZA, E.L., LIEBL, G.F., MARAGONI, C., et al., “Bioethanol from fresh and dried banana plant pseudostem”, Chemical Engineering Transactions, v. 38, pp. 271-276, 2014.]. Na bananicultura, após a colheita dos cachos, que abriga os frutos, o pseudocaule é cortado permanecendo no campo. Parte desse resíduo é decomposto, auxiliando na adubação do solo, porém, há uma parte que não se decompõe rapidamente e é utilizado como substrato pelos microrganismos. A intensa atividade microbiana realizada onde há excesso de resíduo prejudica a decomposição do solo gerando deficiência de nitrogênio [1515 ZHANG, P., WHISTLER, R.L., BEMILLER, J.N., et al., “Banana starch: production, physicochemical properties, and digestibility – a review”, Carbohydrate Polymers, v. 59, n. 4, pp. 443–458, Mar. 2005.]. Desta forma, a retirada deste resíduo do solo e seu reaproveitamento podem contribuir para eliminar um problema ambiental, agregando valor ao resíduo.

Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a deslignificação da biomassa lignocelulósica presente no pseudocaule de bananeira, submetida ao tratamento ácido e/ou ao tratamento enzimático com o caldo de cultivo de P. sajor-caju CCB 019.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Obtenção do caldo enzimático bruto de P. sajor-caju

Cultivo de P. sajor-caju Frascos Erlenmeyer de 200 mL contendo 100 mL de solução Manachini [1616 MANACHINI, M.G., FORTINA, C., PARINI, C., “Purification and properties of an endopolygalacturonase produced by Rhizopus stolonifer”, Biotechnology Letters, v. 9, n. 3, pp. 219-224, Mar. 1987.] (KH2PO4, 2 g L-1; (NH4)2SO4, 1 g L-1; MgSO4.7H2O, 0,1 g L-1; Na2HPO4, 0,9 g L-1; extrato de levedura, 1 g L-1) adicionada de 0,024 g L-1 de Cu(SO4) anidro e 10 g L-1 de farelo de pseudocaule - FP (item 2.2) foram esterilizados em autoclave a 121º C e 1 atm, por 10 min. Os frascos foram inoculados com 2 discos de ágar contendo o micélio de Pleurotus sajor-caju, obtido da Coleção de Culturas de Basidiomicetos do Instituto de Botânica (São Paulo/SP) sob o código CCB 019 e incubados a 30° C, com frequência de agitação de 120 min-1 em agitador recíproco CERTOMAT®, por 14 dias. Ao final do cultivo, a suspensão de células foi filtrada a vácuo em papel filtro Wathmann nº1. O caldo de cultivo livre de células contendo as enzimas lignocelulolíticas (caldo enzimático bruto), foi avaliado quanto à atividade de lacase, principal enzima envolvida na degradação da lignina.

Determinação da atividade de lacase no caldo de cultivo de P. sajor-caju

A atividade de lacase foi determinada pelo monitoramento em espectrofotômetro do aumento da absorbância (420 nm) produzido pela oxidação do composto ABTS (2,2-azino-bis-[3-ethyltiazoline-6-sulfonate]) conforme segue: à 0,8 mL de uma solução do substrato ABTS (0,03% v/v), foram acrescentados 0,1 mL de solução tampão acetato de sódio 0,1 M (pH 5,0) e 0,1 mL do caldo enzimático bruto [1717 BUSWELL, J.A., CHANG, S.T., “Biomass and extracellular hydrolytic enzyme production by six mushroom species grown on soybean waste”, Biotechnology Letters, v. 16, n. 12, pp. 1317-1322, Dec. 1994.]. Uma unidade de atividade de enzima foi definida como a quantidade de enzima necessária para oxidar 1 μmol do substrato ABTS por minuto utilizando o coeficiente de absortividade ε = 36.000 M-1 cm-1.

2.2 Preparo e tratamento do pseudocaule da bananeira

O pseudocaule da bananeira pertencente à espécie Musa cavendishii, cujos frutos já haviam sido colhidos, foi fatiado em pedaços de 30 cm de comprimento. O material foi prensado em uma prensa Hidro Industrial - HB350 para remoção do excesso de umidade. Após este procedimento, o material foi seco em estufa (Holtech HW500) com circulação de ar forçada (velocidade média de 0,05 m s-1), na temperatura de 60º C, sendo posteriormente triturado em moinho de facas com ajuste de peneiras para obtenção de partículas menores do que 30 mesh [33 SOUZA, E.L., LIEBL, G.F., MARAGONI, C., et al., “Bioethanol from fresh and dried banana plant pseudostem”, Chemical Engineering Transactions, v. 38, pp. 271-276, 2014.], aqui chamado de farelo de pseudocaule (FP).

2.3 Avaliação do efeito do pré-tratamento ácido e/ou do caldo enzimático bruto sobre a deslignificação do pseudocaule de bananeira

Três ensaios foram realizados para avaliar a influência do pré-tratamento ácido e/ou do tratamento enzimático sobre a deslignificação do pseudocaule:

Sem tratamento ácido + tratamento enzimático (PE): à 100 ml de uma suspenção de FP (70 g L-1) foram adicionados 100 mL do caldo de cultivo enzimático bruto.

Tratamento ácido + tratamento enzimático (PAE): uma suspensão de FP (70 g L-1) foi adicionada de 2% (m/m) de ácido sulfúrico (H2SO4). A suspensão foi autoclavada por 15 minutos, à 120ºC, para atuação do ácido sobre o material lignocelulósico. Após a autoclavagem, o pH foi ajustado para 6,5 utilizando solução tampão Mcllvaine e NaOH 1M [33 SOUZA, E.L., LIEBL, G.F., MARAGONI, C., et al., “Bioethanol from fresh and dried banana plant pseudostem”, Chemical Engineering Transactions, v. 38, pp. 271-276, 2014.]. À 100 ml da suspenção de FP (70 g L-1) submetida ao pré-tratamento ácido foram adicionados 100 mL do caldo de cultivo enzimático bruto.

Tratamento ácido + caldo enzimático inativado (PAEI): à 100 ml da suspenção de FP (70 g L-1) submetida ao pré-tratamento ácido foram adicionados 100 mL do caldo enzimático autoclavado (120ºC, por 15 min) para inativação das enzimas.

As misturas obtidas nos três ensaios foram incubadas a 25ºC sob agitação de 110 min-1, por 12 h [1818 CORREA, T., DALONSO, N., SOUZA, O., et al., “Deslignificação do pseudocaule de bananeira por enzimas fúngicas”, In: Anais do XX Simpósio Nacional de Bioprocessos e XI Simpósio de Hidrólise Enzimática de Biomassa, Fortaleza, Set. 2015.]. Após o tempo de incubação, as suspensões foram filtradas a vácuo em papel filtro Wathmann nº 1. Os sólidos retidos no filtro foram secos em estufa a 105º C até massa constante para posterior análise morfológica e termogravimétrica para avaliação dos teores de hemicelulose, lignina e celulose. O filtrado foi avaliado quanto ao teor de açúcares redutores.

2.4 Avaliações morfológicas do pseudocaule por Microscopia de Varredura Eletrônica – MEV

As análises foram realizadas em um microscópio eletrônico de varredura modelo JSM 6701F. As amostras foram previamente metalizadas com ouro utilizando-se um metalizador de amostras (Baltec - SCD 050) a fim de tornarem-se condutoras e as micrografias da superfície foram obtidas empregando voltagem de 15 kV e ampliações de 100, 500 e 1000 vezes.

2.5 Análise Termogravimétrica – TGA

A degradação térmica do farelo de pseudocaule (FP) e do pseudocaule submetido aos diferentes tratamentos (PAE, PAEI e PE) foi avaliada em um analisador térmico (TA Instruments - TA50Q), em atmosfera inerte (gás de arraste N2), com rampa de aquecimento de 10°C/min e faixa de aquecimento da temperatura ambiente até 900 °C. Foram empregados 10 mg de amostra em cada experimento. As condições operacionais foram baseadas no trabalho de Carrier et al. [1919 CARRIER, M., LOPPINET-SERANI, A., DENUX, D., et al., “Thermogravimetric analysis as a new method to determine the lignocellulosic composition of biomass”, Biomass and Bioenergy, v. 35, n. 1, pp. 298-307, Jan, 2011.].

2.6 Determinação da concentração de açúcares redutores

A determinação de açúcares redutores em glucose foi realizada utilizando o reagente DNS (ácido dinitrosalicílico) de acordo com Miller [2020 MILLER, G.L., “Use of dinitrosalicylic acid reagent for determination of reducing sugar”, Analytical Chemistry, v. 31, n. 3, pp. 426-428, Mar. 1959.].

2.7 Análise estatística

Os resultados de açúcares redutores foram comparados pela análise de variância (ANOVA) por meio do Teste de Tukey (p<0,05) para avaliar a diferença entre os diferentes tratamentos do pseudocaule.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Análise morfológica do pseudocaule de bananeira por microscopia eletrônica de varredura (MEV)

A Figura 1 apresenta as fotomicrografias comparativas do farelo de pseudocaule (FP) e do pseudocaule submetido aos diferentes tratamentos (PAE, PAEI e PE). Verifica-se que após os tratamentos, há uma considerável alteração na estrutura da fibra. A fibra do FP possui superfície irregular, mais saliente e recoberta por material amorfo (Figura 1-a1). A fibra de PAE (pseudocaule com tratamento ácido e enzimático) tornou-se menos rugosa, e uma estrutura interna, mais linear pode ser visualizada. Pode-se perceber que houve uma redução das saliências e rugosidades, sugerindo que a fibra está mais disponível após tratamento ácido. Sugere-se que PAE tenha promovido a degradação da lignina, expondo as fibras cristalinas da celulose (Figura 1-b1). O mesmo comportamento de remoção do material amorfo da superfície da fibra também pode ser observado nas Figuras 1-c1 e 1-d1, embora em menor extensão.

Figura 1
Microscopia de varredura eletrônica do pseudocaule da bananeira (a) FP (farelo de pseudocaule) (b) PAE (pseudocaule com tratamento ácido e enzimático) (c) PAEI (pseudocaule com tratamento ácido e enzima inativada) (d) PE (pseudocaule sem tratamento ácido e com tratamento enzimático). Os números 1, 2 e 3 indicam ampliações de 100, 500 e 1000 vezes, respectivamente.

3.2 Análises termogravimétricas

Com base no reportado por Seye e colaboradores [2121 SEYE, O., CORTEZ, L.A.B., GÓMEZ, E.O., “Estudo cinético da biomassa a partir de resultados termogravimétricos”, In: Anais do 3º Encontro de Energia no Meio Rural, Campinas, 2003.] este trabalho propôs analisar a eficiência do processo de conversão do material lignocelulósico utilizando o método termogravimétrico (TGA) para conhecer o comportamento térmico e os parâmetros cinéticos da biomassa durante o processo de termoconversão. O TGA também pode ser utilizado para estimar o percentual de lignina presente na biomassa.

A Figura 2 apresenta a análise termogravimétrica (TGA) e a derivada termogravimétrica (DTG) das fibras do farelo de pseudocaule (FP), do pseudocaule com tratamento ácido e enzimático (PAE), do pseudocaule com tratamento ácido e enzima inativada (PAEI) e do pseudocaule sem tratamento ácido e com tratamento enzimático (PE). O maior pico de degradação dos ensaios foi considerado uma estimativa da degradação de hemicelulose e celulose conjuntamente, pois o pico está situado entre a temperatura inicial de degradação da hemicelulose (220ºC), e a temperatura final de degradação da celulose (400°C) [2222 YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al., “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.].

Figura 2
Curvas de degradação térmica (TGA e DTG) do pseudocaule da bananeira. FP (farelo de pseudocaule); PAE (pseudocaule com tratamento ácido e enzimático); PAEI (pseudocaule com tratamento ácido e enzima inativada); PE (pseudocaule sem tratamento ácido e com tratamento enzimático).

Foi possível observar que cada componente da biomassa vegetal apresenta características diferentes durante a decomposição térmica. Segundo Font e Williams [2323 FONT, R, WILLIAMS, P.T., “Pyrolysis of biomass with constant heating rate: influence of the operating conditions”, Thermochimica Acta, v. 250, n. 1, pp.109-123, Feb. 1995.], devido à complexidade dos materiais lignocelulósicos, vários modelos de reações têm sido propostos: reações em série, reações consecutivas e a associação dos dois processos. Contudo, segundo Akita (1959) citado por Güell e Guzman [2424 GÜELL, A.J., GUZMAN, J.A., “General heat and mass transfer analysis of wood carbonization”, Latin American Applied Research, v.23, pp. 221-230, 1993.], o modelo de decomposição térmica com duas ou três zonas de reações de primeira ordem, com diferentes parâmetros cinéticos, tem sido um dos mais considerados. A estratégia analítica é fundamentada no fato de que as três famílias de polímeros que compõem a biomassa, têm distintas taxas de temperaturas de decomposição. A hemicelulose é menos resistente à degradação térmica, seguida pela celulose e lignina. A hemicelulose e celulose decompõem-se na faixa de temperatura inferior a 330ºC, dependendo da natureza dos heteropolímeros presentes na biomassa e das condições experimentais. Segundo Seye et al. [2121 SEYE, O., CORTEZ, L.A.B., GÓMEZ, E.O., “Estudo cinético da biomassa a partir de resultados termogravimétricos”, In: Anais do 3º Encontro de Energia no Meio Rural, Campinas, 2003.] a lignina inicia a sua decomposição a temperaturas acima de 300ºC. Yang [2222 YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al., “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.] indica que a lignina é decomposta lentamente entre 160 – 900ºC.

Observando a Figura 2, pode-se perceber que o pico de PAEI, com perda de massa de 54,5 %, é muito similar àquele obtido com FP, de 53,2%. Isto indica que, apenas o tratamento ácido, na ausência das enzimas presentes no caldo enzimático, não promoveu degradação efetiva da lignina. O pico de PAE apresenta uma perda de massa de 60%, indicando que os tratamentos ácidos e enzimáticos promoveram a deslignificação da fibra, aumentando, consequentemente, os percentuais de celulose e hemicelulose. O comportamento de PE, com perda de massa de 58,4%, apresenta um perfil muito semelhante ao PAE. A atividade de lacase presente no caldo de cultivo utilizado no tratamento do pseudocaule (PAE e PE) foi de 85 U L-1.

Ainda, pode-se visualizar na Figura 2(a) que na faixa entre 420-900°C, que corresponde à degradação da lignina [2222 YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al., “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.], as amostras submetidas ao tratamento enzimático (PAE e PE) apresentaram menor perda de massa, indicando um menor percentual de lignina nas amostras.

Com base na temperatura de degradação dos biopolímeros, foram estimadas as perdas de massas relativas à umidade, hemicelulose+celulose e lignina. As massas foram transformadas em percentuais, iniciando em 100% numa temperatura de 34ºC (comum para todos os ensaios) (Tabela 1). Os eventos foram divididos nos seguintes intervalos de temperatura: 34-120°C (umidade) [2525 SELLIN, N., OLIVEIRA, B.G., MARANGONI, C., et al., “Use of banana culture waste to produce briquettes”, Chemical Engineering Transactions, v. 32, pp. 349-354, 2013.], 220-315°C (hemicelulose), 315-400°C (celulose) e 420-900 °C (lignina) [2222 YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al., “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.].

Tabela 1
Massas (%) referentes à temperatura na análise termogravimétrica para os diferentes tratamentos do pseudo-caule.

Para determinar os percentuais referentes às massas de celulose + hemicelulose, lignina, resíduo sólido e umidade, os valores de massa correspondentes às temperaturas finais foram subtraídos do valor inicial de cada evento termogravimétrico (Tabela 2).

Tabela 2
Massa (%) resultante de cada evento termogravimétrico para os diferentes tratamentos do pseudocaule.

Observando os dados da Tabela 2 é possível inferir que os somatórios das massas percentuais estimadas para celulose + hemicelulose e lignina corroboram com o observado na literatura [2222 YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al., “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.]. Os valores percentuais de hemicelulose+celulose também são equivalentes aos observados na Figura 2. Vale ressaltar que as perdas de massa referentes à celulose e hemicelulose estão sobrepostas durante os eventos termogravimétricos, o que impossibilita obter teores individuais destes polímeros por TGA.

Em comparação com a amostra FP verifica-se uma redução de 25,85% e 43,4% no teor de lignina das amostras PAE e PE, respectivamente. O tratamento ácido promoveu alguma modificação química que acarretou na solubilização de alguns componentes inorgânicos da amostra, o que reflete numa maior concentração de resíduos sólidos finais (21,57%) da amostra que não recebeu esse tratamento (PE).

Os menores valores estimados referentes à lignina foram obtidos para as amostras PAE (17,61%) e PE (13,44%), indicando que o tratamento com as enzimas lignocelulolíticas provenientes do caldo de cultivo de P. sajor-caju promoveu a degradação da lignina, após incubação com o pseudocaule, com (PAE) ou sem a presença do tratamento ácido (PE). O maior percentual de lignina foi observado na amostra PAEI (25,33%), o que sugere a incapacidade de degradação da lignina após inativação da enzima, valor este próximo ao percentual de lignina da amostra FP (23,74%), sem tratamento ácido ou enzimático.

Correa et al. [1818 CORREA, T., DALONSO, N., SOUZA, O., et al., “Deslignificação do pseudocaule de bananeira por enzimas fúngicas”, In: Anais do XX Simpósio Nacional de Bioprocessos e XI Simpósio de Hidrólise Enzimática de Biomassa, Fortaleza, Set. 2015.] encontraram percentuais de lignina no pseudocaule submetido aos tratamentos ácido seguido do enzimático e somente ao tratamento ácido de 1,90±0,13% e 11,74±1,23%, respectivamente. Gonçalves Filho et al. [2626 GONÇALVES FILHO, L.C., FISCHER, G.A.A., et al., “Hydrolysis of banana tree pseudostem and second-generation ethanol production by Saccharomyces cerevisae”, Journal of Environmental Science and Engineering, v.2, n. 1A, pp. 65-69, Jan. 2013.] encontraram, em base seca, 8,07% ± 2,11% para o teor de lignina do pseudocaule da bananeira Musa cavendischii. Os percentuais de lignina encontrados por estes autores utilizando o método químico convencional [2727 SILVA, D.J., Análise de Alimentos (Métodos Químicos e Biológicos), 3 ed., Viçosa, Universidade Federal de Viçosa, 1981.] são inferiores aos encontrados pela análise termogravimétrica, indicando que algum outro composto presente na biomassa possa estar somado aos percentuais de lignina.

Quanto à presença de açúcares redutores, a maior concentração de açúcares redutores (8,23± 0,43 g L-1) encontrada na amostra PAE, é consequência da aplicação do tratamento ácido seguido do ataque pelo caldo enzimático. De acordo com Hamelinck, Van Hooijdonk e Faaij [2828 HAMELINCK, C.N., VAN HOOIJDONK, G., FAAIJ, A.P.C., “Ethanol from lignocellulosic biomass: techno-economic performance in short, middle and long-term”, Biomass and Bioenergy, v. 28, n. 4, pp. 384-410, Apr. 2005.] a presença do ácido promove o aumento da porosidade do material por meio da solubilização da fração de hemicelulose, deixando a celulose mais acessível. O ácido sulfúrico aquecido à alta temperatura (120oC) também pode ter possibilitado a redução da cristalinidade da celulose por meio da quebra de grupos mais curtos de moléculas que liberam glicose. As enzimas lignocelulolíticas produzidas por P. sajor caju, como a lacase, podem ter degradado a lignina cimentante [88 OGEDA, T.L., PETRI, D.F.S., “Hidrólise enzimática de biomassa”, Química Nova, v. 33, n. 7, pp. 1549-1558, Jul. 2010.]. No tratamento do pseudocaule apenas com o caldo enzimático (PE), a quantidade de açúcares redutores foi de 6,12± 0,47 g L-1. Este valor não apresentou diferença estatisticamente significativa daquele encontrado utilizando apenas o tratamento ácido (PAEI), de 5,18±0,76 g L-1. Na ausência do tratamento ácido (PE), houve uma redução no teor de açúcar redutor liberado de 25,65% em comparação ao ensaio no qual o tratamento ácido foi combinado ao enzimático (PAE). Desta forma, conclui-se que as enzimas produzidas por P. sajor-caju, entre elas a lacase (85 U L-1) são capazes de degradar conjuntamente frações de celulose, hemicelulose e lignina na suspensão de pseudoucaule

Em relação à lacase, Milstein et al. [2929 MILSTEIN, O., HÜTTERMANN, A., MAJCHERCZYK, A., et al., “Transformation of ligninrelated compounds with laccase in organic-solvents”, Journal of Biotechnology, v. 30, n. 1, pp. 37-48, Jul. 1993.] demonstraram que a lignina dissolvida em uma mistura dioxano/água foi prontamente convertida por uma lacase de Trametes versicolor imobilizada. A lignina transformada mostrou um aumento dos grupos fenólicos e uma significativa modificação dos carbonos tanto dos grupos alifáticos como aromáticos da molécula. Além disso, Balakshin et al. [3030 BALAKSHIN, M., CAPANEMA, E., CHEN, C.L., et al., “Biobleaching of pulp with dioxygen in the laccase-mediator system -reaction mechanisms for degradation of residual lignin”, Journal of Molecular Catalysis B-Enzymatic, v. 13, n. 1-3, pp. 1-16, Apr. 2001.] avaliaram o branqueamento da polpa kraft de pinho utilizando um sistema mediado por lacase de Coriolus versicolor. O tratamento resultou em fortes alterações na estrutura da lignina isolada do efluente do processo e mostrou que a clivagem oxidativa de cadeias laterais da lignina desempenha um papel importante na deslignificação. Em um estudo conduzido por Khan et al. [3131 KHAN, N.A., HUSSAIN, S., AHMAD, N., et al., “Improving the feeding value of straws with Pleurotus ostreatus”, Animal Production Science, v. 55, n. 2, pp. 241–245, Jan. 2015.] foi avaliada a eficácia do fungo Pleurotus ostreatus na degradação da lignina das palhas de milho, arroz e trigo. A incubação com Pleurotus ostreatus diminuiu o teor de lignina dos substratos de 135 para 63 g/kg de matéria seca com aumento concomitante nos teores de cinzas e de proteína bruta. A degradação da lignina ainda foi fortemente associada com a degradação de hemicelulose presente nas diversas palhas. Castoldi et al. [3232 CASTOLDI, R., BRACHT, A., MORAIS, G.R., et al., “Biological pretreatment of Eucalyptus grandis sawdust with white-rot fungi: Study of degradation patterns and saccharification kinetics”, Chemical Engineering Journal, v. 258, pp. 240–246, Dec. 2014.] também observaram a degradação de material lignocelulósico por fungos do gênero Pleurotus. Os autores utilizaram Pleurotus ostreatus e Pleurotus pulmonarius para o pré-tratamento biológico da serragem de eucalipto para posterior ataque enzimático pela celulase do fungo Trichoderma reesei. A análise por microscopia eletrônica de varredura e espectroscopia no infravermelho mostrou que ambos os fungos promoveram extensas modificações no teor de lignina da fibra e análises utilizando infravermelho revelaram grande diminuição no teor de lignina da fibra sem aparentes perdas de celulose. O tratamento com P. ostreatus e P. pulmonarius também gerou uma fração facilmente hidrolisável de 16,7 e 15,4% do total de celulose, respectivamente, em comparação com 2,8% do material sem pré-tratamento. Os resultados também foram comparados quanto à liberação de açúcares redutores obtidos pela ação da celulase nas fibras. A ação de P. ostreatus após 48h de tratamento aumentou a liberação de açúcares de 2,5 para 48 μmol mL-1, um aumento de 1820%. Alterações morfológicas nas fibras, também foram observadas em microscópio, e análises utilizando infravermelho revelaram grande diminuição no teor de lignina da fibra sem aparentes perdas de celulose.

4. CONCLUSÕES

Os resultados mostraram que a fibra vegetal do pseudocaule da bananeira pode ser deslignificada pelo caldo enzimático de Pleurotus sajor-caju. A deslignificação ocorreu na presença do caldo enzimático, mesmo quando não houve o tratamento ácido.

As análises termogravimétricas indicaram as perdas de massa resultantes da degradação dos constituintes das amostras de pseudocaule (celulose, hemicelulose e lignina,) submetido aos diferentes tratamentos sendo possível a identificação de um pico correspondente às perdas de massa da celulose e da hemicelulose sobrepostas, e um pico correspondente à degradação da lignina. Um menor percentual de perda de massa após 400º C, em comparação a amostra FP (farelo de pseudocaule, sem tratamento ácido ou enzimático) indicou que houve redução da lignina nas amostras tratadas. No tratamento em que o caldo de cultivo foi autoclavado para inativação das enzimas presentes (PAEI), os resultados foram muito similares àqueles encontrados para a amostra FP.

Os tratamentos também promoveram alterações na estrutura da fibra do pseudocaule. Quando o pseudocaule foi submetido a tratamento ácido e enzimático (PAE) e somente ao tratamento ácido (PAEI), tornaram-se visíveis fibras com estrutura linear similar à celulose e a eliminação de rugosidades presentes na camada superficial da fibra. Quando o caldo de cultivo enzimático foi aplicado sem o tratamento ácido (PE), foi possível visualizar a eliminação das rugosidades e uma estrutura fibrilar irregular. Pode-se sugerir que a camada superficial removida pelo tratamento era a lignina.

A liberação de açúcares redutores após os tratamentos também indica que houve degradação da lignina. A maior concentração de açúcares redutores foi encontrada no pseudocaule submetido aos tratamentos ácido e enzimático. Os menores teores de açúcares redutores foram encontrados quando os tratamentos ácido e enzimático foram aplicados individualmente, não apresentando diferenças estatisticamente significativas entre si.

BIBLIOGRAFIA

  • 1
    FERREIRA, V.F., ROCHA, D.R., SILVA, F.C., “Potencialidades e oportunidades na química da sacarose e outros açúcares”, Química Nova, v.32, n. 3, pp. 623-638, Apr. 2009.
  • 2
    KIM, S., DALE, B.E., “Global potential bioethanol production from wasted crops and crop residues”, Biomass and Bioenergy, v. 26, n. 4, pp. 361-375, Apr. 2004.
  • 3
    SOUZA, E.L., LIEBL, G.F., MARAGONI, C., et al, “Bioethanol from fresh and dried banana plant pseudostem”, Chemical Engineering Transactions, v. 38, pp. 271-276, 2014.
  • 4
    POTHIRAJ, C., KANMANI, P., BALAJI, P., “Bioconversion of lignocellulose material”, Mycobiology, v. 34, n. 4, pp. 159-165, Dez. 2006.
  • 5
    SCHWARZE, F.W.M.R., “Wood decay under the microscope”, Fungal Biology Reviews, v. 21, n. 4, pp. 133-170, Nov. 2007.
  • 6
    PIETAK, A., KORTE, S., TAN, E., et al, “Atomic force microscopy characterization of the surface wettability of natural fibres”, Applied Surface Science, v. 253, n. 7, pp. 3627–3635, Jan. 2007.
  • 7
    REN, J. L., SYN, R.C., PENG, F., “Carboxymethylation of hemicelluloses isolated from sugarcane bagasse”, Polymer Degradation and Stability, v. 93, n. 4, pp. 786–793, Jan. 2008.
  • 8
    OGEDA, T.L., PETRI, D.F.S., “Hidrólise enzimática de biomassa”, Química Nova, v. 33, n. 7, pp. 1549-1558, Jul. 2010.
  • 9
    SALIBA, E.O.S., RODRIGUEZ, N.M., MORAES, S.A.L., et al, “Ligninas – métodos de obtenção e caracterização química”, Ciência Rural, v.31, n.5, pp. 917-928, Sep./Oct. 2001.
  • 10
    SANTOS, M.D., BORSCHIVER, S., COUTO, M., “Iniciativas para o uso da biomassa lignocelulósica em biorrefinarias: a plataforma sucroquímica no mundo e no Brasil”, Revista Economia & Energia, v 82, n.15, pp. 14-32, Jul./Sep. 2011.
  • 11
    DU, X, LI, J., GELLERSTEDT, G., RENCORET, J., et al, “Understanding pulp delignification by laccase–mediator systems through isolation and characterization of lignin–carbohydrate complexes”, Biomacromolecules, v. 14, n. 9, pp. 3073–3080, Jul. 2013.
  • 12
    MANAVALAN, T., MANAVALAN, A., HEESE, K., “Characterization of lignocellulolytic enzymes from white-rot fungi”, Current Microbiology, v. 70, n. 4, pp. 485-498, Apr. 2015.
  • 13
    URBEN, A.F., Produção de cogumelos por meio de tecnologia chinesa modificada, Brasília, EMBRAPA -Recursos Genéticos e Biotecnologia, 2004.
  • 14
    ALEXANDRINO, A.M., FARIA, H.G., SOUZA, C.G.M., et al, “Aproveitamento do resíduo de laranja para a produção de enzimas lignocelulolíticas por Pleurotus ostreatus”, Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.27, n.2, pp. 364-368, Apr./Jun. 2007.
  • 15
    ZHANG, P., WHISTLER, R.L., BEMILLER, J.N., et al, “Banana starch: production, physicochemical properties, and digestibility – a review”, Carbohydrate Polymers, v. 59, n. 4, pp. 443–458, Mar. 2005.
  • 16
    MANACHINI, M.G., FORTINA, C., PARINI, C., “Purification and properties of an endopolygalacturonase produced by Rhizopus stolonifer”, Biotechnology Letters, v. 9, n. 3, pp. 219-224, Mar. 1987.
  • 17
    BUSWELL, J.A., CHANG, S.T., “Biomass and extracellular hydrolytic enzyme production by six mushroom species grown on soybean waste”, Biotechnology Letters, v. 16, n. 12, pp. 1317-1322, Dec. 1994.
  • 18
    CORREA, T., DALONSO, N., SOUZA, O., et al, “Deslignificação do pseudocaule de bananeira por enzimas fúngicas”, In: Anais do XX Simpósio Nacional de Bioprocessos e XI Simpósio de Hidrólise Enzimática de Biomassa, Fortaleza, Set. 2015.
  • 19
    CARRIER, M., LOPPINET-SERANI, A., DENUX, D., et al, “Thermogravimetric analysis as a new method to determine the lignocellulosic composition of biomass”, Biomass and Bioenergy, v. 35, n. 1, pp. 298-307, Jan, 2011.
  • 20
    MILLER, G.L., “Use of dinitrosalicylic acid reagent for determination of reducing sugar”, Analytical Chemistry, v. 31, n. 3, pp. 426-428, Mar. 1959.
  • 21
    SEYE, O., CORTEZ, L.A.B., GÓMEZ, E.O., “Estudo cinético da biomassa a partir de resultados termogravimétricos”, In: Anais do 3º Encontro de Energia no Meio Rural, Campinas, 2003.
  • 22
    YANG, H., YAN, R., CHEN, H., et al, “Characteristics of hemicellulose, cellulose and lignin pyrolysis”, Fuel, v. 86, n. 12-13, pp. 1781-1788, Aug. 2007.
  • 23
    FONT, R, WILLIAMS, P.T., “Pyrolysis of biomass with constant heating rate: influence of the operating conditions”, Thermochimica Acta, v. 250, n. 1, pp.109-123, Feb. 1995.
  • 24
    GÜELL, A.J., GUZMAN, J.A., “General heat and mass transfer analysis of wood carbonization”, Latin American Applied Research, v.23, pp. 221-230, 1993.
  • 25
    SELLIN, N., OLIVEIRA, B.G., MARANGONI, C., et al, “Use of banana culture waste to produce briquettes”, Chemical Engineering Transactions, v. 32, pp. 349-354, 2013.
  • 26
    GONÇALVES FILHO, L.C., FISCHER, G.A.A., et al, “Hydrolysis of banana tree pseudostem and second-generation ethanol production by Saccharomyces cerevisae”, Journal of Environmental Science and Engineering, v.2, n. 1A, pp. 65-69, Jan. 2013.
  • 27
    SILVA, D.J., Análise de Alimentos (Métodos Químicos e Biológicos), 3 ed., Viçosa, Universidade Federal de Viçosa, 1981.
  • 28
    HAMELINCK, C.N., VAN HOOIJDONK, G., FAAIJ, A.P.C., “Ethanol from lignocellulosic biomass: techno-economic performance in short, middle and long-term”, Biomass and Bioenergy, v. 28, n. 4, pp. 384-410, Apr. 2005.
  • 29
    MILSTEIN, O., HÜTTERMANN, A., MAJCHERCZYK, A., et al, “Transformation of ligninrelated compounds with laccase in organic-solvents”, Journal of Biotechnology, v. 30, n. 1, pp. 37-48, Jul. 1993.
  • 30
    BALAKSHIN, M., CAPANEMA, E., CHEN, C.L., et al, “Biobleaching of pulp with dioxygen in the laccase-mediator system -reaction mechanisms for degradation of residual lignin”, Journal of Molecular Catalysis B-Enzymatic, v. 13, n. 1-3, pp. 1-16, Apr. 2001.
  • 31
    KHAN, N.A., HUSSAIN, S., AHMAD, N., et al, “Improving the feeding value of straws with Pleurotus ostreatus”, Animal Production Science, v. 55, n. 2, pp. 241–245, Jan. 2015.
  • 32
    CASTOLDI, R., BRACHT, A., MORAIS, G.R., et al, “Biological pretreatment of Eucalyptus grandis sawdust with white-rot fungi: Study of degradation patterns and saccharification kinetics”, Chemical Engineering Journal, v. 258, pp. 240–246, Dec. 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2017
  • Aceito
    09 Abr 2018
Laboratório de Hidrogênio, Coppe - Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com a Associação Brasileira do Hidrogênio, ABH2 Av. Moniz Aragão, 207, 21941-594, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel: +55 (21) 3938-8791 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revmateria@gmail.com