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Imagem Cardiovascular em Cardiopatias Congênitas: Por que não Alavancar Novas Modalidades de Imagem?

Cardiopatias Congênitas/cirurgia; Técnicas e Procedimentos de Diagnóstico; Imagem por Ressonância Magnética/métodos; Cateterismo Cardíaco

“Não existe revelação mais nítida da alma de uma sociedade do que a forma como ela trata as suas crianças.”

Nelson Mandela (8 maio 1995)

Mundialmente, estamos vivendo uma era sobrecarregada por doenças cardíacas congênitas (DCC).11. Penny DJ. Global perspectives on pediatric cardiac critical care. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(8):S388–93. Ao tirar uma fotografia instantânea no ano de 2018, vemos que houve 2.944.932 nascidos vivos no Brasil (Tabnet, DATASUS). Considerando a incidência das DCC, cerca de 9 a cada 1.000 nascidos vivos (índice que tem permanecido estável em todos os países e populações), seria de se esperar cerca de 26.000 novos pacientes com alguma forma de DCC em nosso país. Por outro lado, a taxa de sobrevivência mundial para as DCC durante as últimas 3 décadas tem sido próxima a 98%.22. Zheleva B, Atwood JB. The invisible child: childhood heart disease in global health. Lancet [Internet]. 2017;389(10064):16–8. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)32185-7
http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)...
Dito isso, as DCC continuam um problema de saúde pública em todo o mundo.

Durante os últimos quatro séculos, a especialidade da cardiologia pediátrica tem crescido imensamente, alcançando diversos marcos no cenário clínico e cirúrgico, devido, principalmente, aos incríveis avanços nas ferramentas diagnósticas de imagem cardiovascular. Isso permite o diagnóstico não invasivo em todas as idades, desde a vida fetal até a idade adulta. A modalidade relativamente nova de imagem por ressonância magnética cardíaca (RMC) fornece informações clinicamente úteis em várias situações de pacientes com DCC. As diretrizes atuais para diagnóstico e tratamento incluem ecocardiograma, RMC e cateterismo cardíaco para a maioria dos pacientes com DCC.33. Stout KK, Daniels CJ, Aboulhosn JA, Bozkurt B, Broberg CS, Colman JM, et al. 2018 AHA/ACC Guideline for the Management of Adults With Congenital Heart Disease: Executive Summary. Circulation. 2018;139(14)è637-e697.

Kozak et al.,44. Kozak MF, Afiune JY, Crosse-Wortmann. Uso atual de ressonancia magnética cardíaca pediatrica no Brasil.Arq Bras Cardiol. 2021; 116(2):305-312. tiraram uma “fotografia instantânea” da situação brasileira em relação ao uso da RMC em populações pediátricas, entrevistando cardiologistas da maioria dos estados, incluindo centros com diferentes níveis de atenção e volumes cirúrgicos. A “imagem” foi clara: a RMC não está sendo plenamente utilizada! Aproximadamente metade dos cardiologistas (52%) raramente utilizam a RMC para crianças. Ao ampliarmos esta imagem, duas camadas principais são reveladas. A primeira camada envolve o processo de mudança de práticas e da incorporação de novas tecnologias. O uso predominante da RMC ainda depende do uso para cardiomiopatias, tetralogia de Fallot pós-reparo e anomalias do arco aórtico, segundo esses dados. No entanto, a era atual da RMC em cardiologia vai além da avaliação anatômica, permitindo acesso a dados hemodinâmicos e outros dados funcionais que impactam no atendimento aos pacientes, na tomada de decisão cirúrgica e até mesmo nos fatores de risco prognóstico. A segunda camada, não surpreendentemente, é o custo da RMC, que deve ser analisado no contexto dos custos de saúde para populações com DCC. À medida que os países se desenvolvem economicamente, a carga das condições relacionadas à pobreza diminui e é substituída por necessidades de cuidados crônicos e frequentemente complexos, como as DCC. A taxa de sobrevivência e a qualidade de vida desses pacientes, desde a infância até a idade adulta, dependem da excelência do atendimento médico. Devido à sua complexidade, as lesões cardíacas cirurgicamente reparadas requerem vigilância ao longo da vida.55. Morhy SS, Barberato SH, Lianza AC, Soares AM, Leal GN, Rivera IR, et al. Posicionamento sobre Indicações da Ecocardiografia em Cardiologia Fetal, Pediátrica e Cardiopatias Congênitas do Adulto – 2020. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(5):987-1005. Portanto, todos esses pontos devem ser levados em consideração no planejamento de cuidados ideais para pacientes com DCC. É caro e requer investimento ao longo da vida. No entanto, o investimento não é a solução única; há uma tríade que precisa ser abordada simultaneamente, “pessoas, processo e tecnologia”. Kozak et al.,44. Kozak MF, Afiune JY, Crosse-Wortmann. Uso atual de ressonancia magnética cardíaca pediatrica no Brasil.Arq Bras Cardiol. 2021; 116(2):305-312. demonstrou que existem três limitações principais: 1) custo (65%), 2) necessidade de sedação (60%) e 3) número insuficiente de profissionais qualificados (55%). A estas limitações interpõe-se ações para atender à tríade: o investimento em novas tecnologias na área da saúde, a necessidade de desenvolvimento profissional, e um processo para tornar a tecnologia eficaz e impactar a qualidade do atendimento. O treinamento de cardiologistas pediátricos no mundo de hoje requer uma sub-especialidade em diagnóstico por imagem, que tem avançado demasiadamente lenta, principalmente no que diz respeito ao treinamento de RMC.66. Helbing WA, Mertens L, Sieverding L. Recommendations from the Association for European Paediatric Cardiology for training in congenital cardiovascular magnetic resonance imaging. Cardiol Young. 2006;16(4):410–2. O aumento do número e da qualidade de profissionais aptos a executar e interpretar os resultados gerará um novo ciclo, incluindo o uso correto da RMC em pacientes com DCC, especialmente na população pediátrica.

Estes dados têm o poder de desencadear múltiplas ações no cuidado aos pacientes com DCC, a saber, alocação de recursos, capacitação profissional e mudanças nas práticas. Todas essas ações aliadas a fortes práticas de cuidado nos moverão na mesma direção, promovendo uma assistência à saúde de qualidade.

Referências

  • 1
    Penny DJ. Global perspectives on pediatric cardiac critical care. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(8):S388–93.
  • 2
    Zheleva B, Atwood JB. The invisible child: childhood heart disease in global health. Lancet [Internet]. 2017;389(10064):16–8. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)32185-7
    » http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)32185-7
  • 3
    Stout KK, Daniels CJ, Aboulhosn JA, Bozkurt B, Broberg CS, Colman JM, et al. 2018 AHA/ACC Guideline for the Management of Adults With Congenital Heart Disease: Executive Summary. Circulation. 2018;139(14)è637-e697.
  • 4
    Kozak MF, Afiune JY, Crosse-Wortmann. Uso atual de ressonancia magnética cardíaca pediatrica no Brasil.Arq Bras Cardiol. 2021; 116(2):305-312.
  • 5
    Morhy SS, Barberato SH, Lianza AC, Soares AM, Leal GN, Rivera IR, et al. Posicionamento sobre Indicações da Ecocardiografia em Cardiologia Fetal, Pediátrica e Cardiopatias Congênitas do Adulto – 2020. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(5):987-1005.
  • 6
    Helbing WA, Mertens L, Sieverding L. Recommendations from the Association for European Paediatric Cardiology for training in congenital cardiovascular magnetic resonance imaging. Cardiol Young. 2006;16(4):410–2.
  • Minieditorial referente ao artigo: Uso Atual de Ressonância Magnética Cardíaca Pediátrica no Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Fev 2021
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