Resumos
A cultura da videira tem potencial para produção contínua logo após pequeno período de descanso entre safras, porém os riscos climáticos podem limitar essa prática. O objetivo foi avaliar o potencial climático para o cultivo de duas safras anuais e a estimativa da severidade de míldio, em função de diferentes épocas de poda, e da exigência em graus-dia de diferentes genótipos de uvas (Vitis spp.), no estado do Paraná. Foram avaliados os riscos de geada, o balanço hídrico climatológico normal e a severidade potencial de ocorrência de míldio utilizando dados de 21 estações meteorológicas do Instituto Agronômico do Paraná. A ocorrência de geadas limita a época de cultivo da videira nas regiões centro, sul e leste. O excesso hídrico é observado em todo o estado. Genótipos que necessitam 1.800°C dia entre a poda e a colheita somente podem ser utilizados em sistema de dupla safra anual nas regiões mais quentes do estado. Não é possível a obtenção de duas safras anuais quando se utilizam genótipos de videiras que exigem mais de 2.000°C dia. Nas regiões mais frias, somente genótipos que necessitam 1.000 a 1.200°C dia podem ser utilizados. Em função do potencial de severidade do míldio, indica-se o cultivo de uvas rústicas ou americanas para as regiões centro, sul e leste, enquanto nas regiões sudoeste, oeste, norte e noroeste indica-se o cultivo das uvas finas ou europeias, porém sem descartar a necessidade de controle da doença nas fases fenológicas mais suscetíveis.
risco climático; Vitis; graus-dia; míldio
Grapes have the potential for continuous production after a short rest period between seasons, but climate risks may limit this practice. The objective of this study was to evaluate the climatic potential for two harvests of grapes per year and to estimate the severity of downy mildew, according to different pruning times and thermal requirements (degree-days) for grape genotypes (Vitis spp.), in the State of Parana, Brazil. Frost risk, normal climatological water balance and potential severity of downy mildew were evaluated using data from 21 meteorological stations of the Instituto Agronômico do Paraná. The occurrence of frost limits the growing season of grapevines in the central, south and east regions of the state. The water excess is observed throughout the state. Genotypes with requirements from 1,800°C day between pruning and harvesting can only be cultivated in double annual crop in the warmer areas of the State. It is not possible to obtain two harvests per year when using grapevine genotypes that require more than 2,000°C day. In colder areas, only genotypes with requirements between 1,000 and 1,200°C day may be used. Due to the potential severity of downy mildew in the State, American grapes are indicated for the center, south and east areas, while European grapes are indicated for the southwest, west, north and northwest areas. The grape cultivation in those areas does not discard the need of disease chemical control during the most susceptible phenological phases.
climatic risk; Vitis; degree-days; downy mildew
Potencial climático para a produção de uvas em sistema de dupla poda anual no estado do Paraná
Climatic potential for grape production under double annual pruning system in the State of Parana, Brazil
Wilian da Silva RicceI, * * Autor correspondente: wilianricce@gmail.com ; Paulo Henrique CaramoriI; Sérgio Ruffo RobertoII
IInstituto Agronômico do Paraná (IAPAR), Área de Ecofisiologia - Agrometeorologia, Rod. Celso Garcia Cid, km 375, 86047-902 Londrina (PR), Brasil
IIUniversidade Estadual de Londrina (UEL), Centro de Ciências Agrárias, Departamento de Agronomia, CP 6001, 86051-990 Londrina (PR), Brasil
RESUMO
A cultura da videira tem potencial para produção contínua logo após pequeno período de descanso entre safras, porém os riscos climáticos podem limitar essa prática. O objetivo foi avaliar o potencial climático para o cultivo de duas safras anuais e a estimativa da severidade de míldio, em função de diferentes épocas de poda, e da exigência em graus-dia de diferentes genótipos de uvas (Vitis spp.), no estado do Paraná. Foram avaliados os riscos de geada, o balanço hídrico climatológico normal e a severidade potencial de ocorrência de míldio utilizando dados de 21 estações meteorológicas do Instituto Agronômico do Paraná. A ocorrência de geadas limita a época de cultivo da videira nas regiões centro, sul e leste. O excesso hídrico é observado em todo o estado. Genótipos que necessitam 1.800°C dia entre a poda e a colheita somente podem ser utilizados em sistema de dupla safra anual nas regiões mais quentes do estado. Não é possível a obtenção de duas safras anuais quando se utilizam genótipos de videiras que exigem mais de 2.000°C dia. Nas regiões mais frias, somente genótipos que necessitam 1.000 a 1.200°C dia podem ser utilizados. Em função do potencial de severidade do míldio, indica-se o cultivo de uvas rústicas ou americanas para as regiões centro, sul e leste, enquanto nas regiões sudoeste, oeste, norte e noroeste indica-se o cultivo das uvas finas ou europeias, porém sem descartar a necessidade de controle da doença nas fases fenológicas mais suscetíveis.
Palavras-chave: risco climático, Vitis, graus-dia, míldio.
ABSTRACT
Grapes have the potential for continuous production after a short rest period between seasons, but climate risks may limit this practice. The objective of this study was to evaluate the climatic potential for two harvests of grapes per year and to estimate the severity of downy mildew, according to different pruning times and thermal requirements (degree-days) for grape genotypes (Vitis spp.), in the State of Parana, Brazil. Frost risk, normal climatological water balance and potential severity of downy mildew were evaluated using data from 21 meteorological stations of the Instituto Agronômico do Paraná. The occurrence of frost limits the growing season of grapevines in the central, south and east regions of the state. The water excess is observed throughout the state. Genotypes with requirements from 1,800°C day between pruning and harvesting can only be cultivated in double annual crop in the warmer areas of the State. It is not possible to obtain two harvests per year when using grapevine genotypes that require more than 2,000°C day. In colder areas, only genotypes with requirements between 1,000 and 1,200°C day may be used. Due to the potential severity of downy mildew in the State, American grapes are indicated for the center, south and east areas, while European grapes are indicated for the southwest, west, north and northwest areas. The grape cultivation in those areas does not discard the need of disease chemical control during the most susceptible phenological phases.
Key words: climatic risk, Vitis, degree-days, downy mildew.
1. INTRODUÇÃO
Nas regiões tropicais do Brasil há a possibilidade de obtenção de duas ou mais safras de uvas por ano, enquanto que nas regiões de clima temperado somente é possível uma colheita ao ano, em razão da ocorrência mais prolongada de baixas temperaturas durante o período outono-inverno. Pela execução de uma poda de verão ou verde, é possível obter uma colheita tardia no mesmo ciclo vegetativo (FOCHESATO et al., 2007). No Paraná, a primeira poda é realizada no fim do repouso hibernal, entre julho e início de agosto, com a colheita da uva ocorrendo entre dezembro e janeiro. A segunda safra é realizada logo após a colheita proveniente da poda de inverno, obtendo-se uma segunda produção que é colhida de maio a junho, sendo essa prática adotada somente para a produção de uvas finas de mesa como Itália, Rubi, Benitaka e Brasil (KISHINO et al., 2007).
O acúmulo de temperatura em graus-dia é um índice muito empregado para a determinação do ciclo da videira. Alguns autores citam valores de graus-dia para algumas variedades de uva: Itália e Rubi necessitam em torno de 1.990 graus-dia (BOLIANI e PEREIRA, 1996); Benitaka e Brasil necessitam, respectivamente, de 2.370 e 2.100 graus-dia (NAGATA et al., 2000); Niagara Rosada exige 1.550 graus-dia (PEDRO JÚNIOR et al., 1994); e Vênus necessita de 1.040 graus-dia (CAMARGO e MANDELLI, 1993).
Muitos autores utilizaram a temperatura do ar no cálculo de índices para as classificações de regiões para a viticultura. WINKLER (1962) estabeleceu o índice térmico de acordo com as diferentes categorias de exigência em graus-dia. TONIETTO e CARBONNEAU (2004), utilizando o índice heliotérmico de Huglin, indicam que em regiões com classificação muito quente pode-se obter mais de uma colheita por ano. Alguns autores indicam a dupla poda anual como possibilidade de deslocamento das épocas de produção para períodos mais favoráveis à colheita de uvas com maior qualidade para a fabricação de vinhos finos (AMORIM et al., 2005; FAVERO et al., 2008; JUBILEU et al., 2010; MOTA et al., 2010; SATO et al., 2011).
No Paraná, as condições de temperatura e umidade do ar durante o ciclo de produção da videira favorecem a ocorrência de doenças fúngicas, com destaque para o míldio (Plasmopara viticola). Essa doença tem afetado a longevidade, a produtividade e a qualidade dos frutos e pode acarretar perdas de até 100% na produção, além de aumentar os custos, devido à necessidade de intenso controle químico (TESSMANN et al., 2007). Um modelo para estimar a eficiência de infecção para P. viticola em videiras em função da temperatura do ar e da duração do molhamento foliar foi desenvolvido por LALANCETTE et al. (1988). O uso de modelos permite a identificação de regiões com maior potencial de risco para a cultura. HAMADA et al. (2008) destacam que o modelo de LALANCETTE et al. (1988) foi eficiente para comparar regiões, em São Paulo, e gerar mapas que podem ser utilizados para fins de planejamento.
Assim, tendo em vista a possibilidade de dupla safra anual buscando melhor rentabilidade ou qualidade no produto final, o objetivo deste trabalho foi avaliar o potencial climático para o cultivo de duas safras anuais e a estimativa da severidade de míldio em função de diferentes épocas de poda e da exigência em graus-dia de diferentes genótipos de uvas (Vitis spp.), no estado do Paraná.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Para análise da viabilidade de dois ciclos anuais da cultura da videira foram utilizados dados de temperatura e precipitação do período 1976 a 2010 de 21 estações meteorológicas convencionais do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) localizadas em diversas regiões do estado. Para o cálculo da severidade potencial de míldio foram utilizadas séries de dados horários de temperatura e umidade relativa do ar do período 2000 a 2010 de 37 estações automáticas do Instituto Tecnológico Simepar.
Para estimativa do risco de geadas foram utilizadas as séries históricas de temperaturas mínimas inferiores a 1°C observadas no interior de abrigo meteorológico. Foram calculadas as probabilidades de ocorrência em setembro utilizando-se a distribuição de valores extremos pelo método dos momentos, seguindo procedimento descrito por ASSIS et al. (1996). Frequência de geadas decendiais inferiores a 20% foram consideradas de baixo risco. Com isso foi determinado o período de cultivo sem risco de geadas para a videira no Paraná.
As épocas de poda de inverno consideradas foram: 5/7, 15/7, 25/7, 5/8, 15/8 e 25/8. As datas em que o risco de geada no decêndio seguinte fosse inferior a 20% foram definidas como aptas para a poda.
Foram considerados 11 ciclos produtivos, baseados nas seguintes classes de exigência em graus-dia entre a poda e a colheita, para os diferentes genótipos de videira (Tabela 1): 1.000, 1.100, 1.200, 1.300, 1.400, 1.500, 1.600, 1.700, 1.800, 1.900 e 2.000°C dia (BOLIANI e PEREIRA, 1996; CAMARGO e MANDELLI, 1993; CHAVARRÍA et al., 2009; EMBRAPA, 2003a,b; 2005a; MURAKAMI et al., 2002; NAGATA et al., 2000; PEDRO JÚNIOR et al., 1994; RIBEIRO et al., 2010; ROBERTO et al., 2004; 2005; ROBINSON, 2006; SANTOS et al., 2007; SATO et al., 2008).
A temperatura base inferior considerada foi de 10°C e o somatório de graus-dia (GD) desde a poda até a colheita foi calculado com as seguintes equações (VILLA NOVA et al., 1972):
em que: GD=graus-dia; TM=temperatura máxima diária (°C); Tm = temperatura mínima diária (°C); e Tb=temperatura base inferior (°C).
Para o início do segundo ciclo de produção foi estipulado um intervalo de 30 dias de descanso da videira entre a colheita e a segunda data de poda. Para a determinação das datas finais para a colheita da segunda safra foi considerado o mesmo intervalo de descanso da videira de 30 dias entre a colheita e a data da poda de inverno da primeira safra.
O balanço hídrico climatológico normal visando determinar os períodos com excedente hídrico para as estações meteorológicas do IAPAR foi calculado segundo THORNTHWAITE e MATHER (1955). Tomou-se o valor de 100mm para a capacidade de água disponível (CAD) no solo. Para auxiliar no cálculo, foi utilizada a planilha desenvolvida por ROLIM et al. (1998).
O potencial de severidade de míldio foi calculado com base no modelo de eficiência da infestação (EI) de míldio para a videira proposto por LALANCETTE et al. (1988) e na metodologia adaptada por HAMADA et al. (2008), expresso por:
em que:
m=1,2; W=duração do molhamento foliar (h); e T=temperatura média do ar (°C).
Para o cálculo da EI foi considerada a presença de um hospedeiro suscetível e um patógeno virulento inoculado, de tal forma que a ocorrência da doença dependesse das variáveis climáticas. A simulação foi mensal de janeiro a dezembro.
Como as estações meteorológicas automáticas não possuem sensor de medição da duração do período de molhamento foliar, adotou-se o número de horas com umidade relativa superior a 90% como estimativa dessa variável, de acordo com GENTA et al. (2010), que em uvas de mesa observaram alta correlação positiva entre a duração do molhamento foliar diário e o número de horas diárias com umidade relativa do ar maior que 90%. ORLANDINI et al. (2008) utilizaram em seu modelo a umidade relativa do ar maior que 90% no período noturno. A estimativa da eficiência de infestação, definida como o número de lesões produzidas por zoósporos por planta, é um modelo criado em função da temperatura e do período de molhamento foliar. A severidade da doença, medida como o número de lesões por cm2, foi calculada multiplicando-se a eficiência de infestação por uma constante (11,2) obtida experimentalmente por LALANCETTE et al. (1988).
Com base nos dados obtidos, nas diferentes épocas de poda e na exigência em graus-dia dos genótipos foram determinadas as regiões e os genótipos com possibilidades de cultivo em dupla poda anual no estado do Paraná. Foram ajustadas equações de regressão linear múltiplas, as quais foram empregadas no mapeamento dos riscos de geada, do somatório de graus-dia e da severidade potencial de míldio em função de latitude, longitude e altitude, com resolução espacial de 90m, utilizando a base do SRTM - Shuttle Radar Topography Mission (MIRANDA, 2005).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O risco de geadas é o principal fator que limita o cultivo da videira durante todo o ano nas regiões frias do Paraná. Na região sul, o período de ocorrências de geadas vai de 21 de maio a 31 de agosto. Conforme diminuem a latitude e a altitude, o período de ocorrência de geadas também é menor. No sudoeste e centro do estado, o período de risco vai de 11 a 31 de julho. Nas regiões sudoeste, oeste, noroeste, norte, Vale do Ribeira e litoral, o risco de geada avaliado por decêndio é inferior a 20% (Figura 1).
Na Figura 2 são apresentados os valores máximos do somatório de graus-dia para cada região, com a possibilidade de duas safras anuais. Verifica-se que não é possível a obtenção de duas safras anuais quando se cultivam genótipos de videira que exigem 2.000°C dia entre a poda e a colheita, mesmo nas regiões mais quentes do estado. Nas quatro primeiras épocas de poda é possível o cultivo de genótipos com exigência máxima de 1.900°C dia no noroeste e de 1.800°C dia no norte e oeste, caso das principais uvas finas de mesa cultivadas nessa região, como a Itália e suas mutações. No extremo sul do estado e em alguns pontos mais altos na região leste não seria possível, de acordo com a estimativa, o cultivo de duas safras anuais, nem mesmo com genótipos que apresentem apenas 1.000°C dia de exigência.
Para as regiões leste, centro e sul do estado não se recomenda a poda de inverno no mês de julho, pois o risco de geadas é alto nesse período. Somente as podas no mês de agosto, para variedades com exigência entre 1.000°C e 1.200°C dia, permitiriam nessas regiões uma dupla safra anual. Dentre as uvas que apresentam essa exigência, destacam-se a Niagara Rosada e a Niagara Branca. Entretanto, por apresentarem baixo vigor, essas uvas americanas não são normalmente conduzidas em sistema de dupla safra anual, que as debilitaria com o tempo, provocando baixa fertilidade de gemas e brotação deficiente (KISHINO et al., 2007).
Para uvas finas para vinificação, a dupla safra anual pode não ser interessante para obtenção de vinhos de qualidade, mas abre a possibilidade de deslocamento da produção para a época mais favorável. JUBILEU et al. (2010) concluíram que as uvas Cabernet Sauvignon e Alicante, cultivadas para a produção fora de época no norte do Paraná, apresentam ciclo tardio e elevada produtividade, e que a maturação dos cachos ocorre em condições climáticas favoráveis, resultando em matéria-prima adequada para a elaboração de vinhos tintos. SATO et al. (2011) também concluíram que na produção fora de época das videiras Alicante e Syrah, os cachos apresentam ótimo aspecto fitossanitário, apresentando potencial para serem utilizados como matéria-prima na elaboração de vinhos finos. MOTA et al. (2010) destacam que a alteração do ciclo de produção para colheita nos meses mais secos do ano contribui para o avanço da maturação das bagas e a melhoria da qualidade do mosto, expressa principalmente pelo teor de açúcar, acidez e compostos fenólicos para as uvas viníferas.
A cultivar Syrah apresentou adequada adaptação quando o ciclo foi transferido para os meses de janeiro a julho, permitindo a colheita no período seco no município de Três Corações, região cafeeira do sul de Minas Gerais (AMORIM et al., 2005). FAVERO et al. (2008) concluíram que em vinhedo não irrigado em Três Corações, MG, a videira Syrah responde à dupla poda expressando, no ciclo de inverno, índices de desenvolvimento, produção e qualidade suficientes para viabilizar a cultura na região, sendo que a baixa precipitação e a amplitude térmica característica do período de colheita do inverno favoreceram a qualidade da uva.
Quanto ao balanço hídrico, o excesso hídrico normal é menor nas regiões norte e noroeste do Paraná, quando comparado ao das outras regiões do estado. Nessas regiões - norte e noroeste - , os menores excessos foram verificados nos meses de março, abril e agosto, períodos que em anos mais secos podem apresentar deficiências. Nas outras regiões - sudoeste, centro, sul e litoral - , também foram observados menores excedentes nessas mesmas épocas, porém os excedentes foram maiores do que nas regiões norte e noroeste, nas quais raramente se observa deficiência hídrica (Figura 3).
A precipitação mínima anual no estado do Paraná é de 1.300mm e a ocorrência de excesso de chuva pode ser prejudicial à cultura pela maior probabilidade de ocorrência de doenças. Na Serra Gaúcha também ocorre tendência histórica ao excesso de chuvas no período de maturação, o que pode prejudicar a qualidade da uva, em função da ocorrência de podridões ou pela necessidade de colheitas antecipadas (TONIETTO e FALCADE, 2003).
A região norte do Paraná não apresenta restrições térmicas para cultivo das variedades destinadas à produção de uvas finas (Vitis vinifera L.), sendo que a principal limitação é a ocorrência de precipitações intensas ao longo do ano, o que propicia condições favoráveis para o desenvolvimento de doenças fúngicas como o míldio (EMBRAPA, 2005b). O fungo requer umidade elevada, entre 95% e 100%, e pelo menos quatro horas de escuridão para a formação dos esporângios no tecido colonizado. A temperatura ótima é de 18°C a 22°C, sendo que temperaturas diurnas acima de 30°C reduzem sua viabilidade (TESSMANN et al., 2007).
A estimativa mensal da severidade do míldio (lesões cm - 2) apresentou maiores variações nas regiões mais quentes do estado, enquanto que nas regiões mais frias os valores foram sempre mais altos (Figura 4). Nas regiões sudoeste, oeste, noroeste e norte, os menores valores de severidade foram observados entre outubro e março, enquanto que, entre maio e setembro, a severidade foi alta em praticamente todo o estado. Esses resultados estão de acordo com GENTA et al. (2010), que concluíram que o míldio causa dano maior no segundo ciclo produtivo - em que a poda é realizada em janeiro e a colheita em maio (safra fora de época) - do que no primeiro - em que a poda é realizada no fim do inverno e a colheita em dezembro (safra regular).
Vale destacar que a doença pode ocorrer em todas as partes verdes da planta e o período de maior suscetibilidade da videira ao míldio vai desde o início da brotação dos ramos (duas folhas separadas) até o início da compactação do cacho (TESSMANN et al., 2007). Dessa forma, embora por esse modelo seja possível prever maior ocorrência de míldio em diferentes épocas do ano, na prática a doença é importante, somente, quando as videiras apresentam tecidos vegetais tenros, suscetíveis à infecção. Conforme se verifica na Figura 4, em maio e junho o potencial de severidade do míldio é alto. Entretanto, no sistema de dupla poda anual, a colheita do segundo ciclo ocorre nesse período, não havendo tecidos tenros e, portanto, a doença passa a não ter muita importância nessa etapa fenológica da videira.
Em São Paulo, HAMADA et al. (2008) observaram que a região noroeste do estado apresentou menor severidade de míldio, enquanto que na região sudeste ela foi maior em todos os meses avaliados. Os autores relatam que a metodologia adotada para o cálculo da severidade de míldio permitiu quantificar a gravidade da doença, demonstrando a variabilidade entre as regiões do estado e entre os meses do ano.
A aplicação desse modelo para o estado do Paraná permite estabelecer a viabilidade da realização da dupla safra anual de videiras para cada região, em função da época de poda e da exigência em graus-dia, além de identificar regiões com maior probabilidade de ocorrência de míldio, visando adotar estratégias de cultivo e medidas de controle específicas em cada caso. Nas regiões centro, sul e leste pode-se, preferencialmente, optar pelo cultivo de variedades rústicas, como Isabel, Niagaras, Concord, Bordô, BRS Carmem, BRS Rubea, que apresentam maior resistência ao míldio quando comparadas às uvas finas (Vitis vinifera). Nas regiões sudoeste, oeste, norte e noroeste, o potencial de severidade é inferior quando comparado ao da região sul, o que permite o cultivo de uvas finas de mesa. Porém não é possível descartar a necessidade de controle químico da doença, principalmente nos estádios em que a videira apresenta tecidos tenros ou quando o potencial de severidade do míldio é alto.
4. CONCLUSÃO
O Paraná apresenta condições para duas safras de uva em um mesmo ano. Nas regiões mais quentes, no norte e noroeste do estado, podem-se cultivar genótipos com maior necessidade térmica, enquanto na região mais fria, no sul e centro-sul, somente genótipos com baixa necessidade térmica permitem a dupla safra anual. A ocorrência de geadas limita a época de cultivo em regiões mais frias do Paraná. O modelo utilizado para a determinação da severidade potencial do míldio no estado demonstra que existem variabilidades espacial e temporal da doença, com possibilidades de desenvolvimento durante todo o ano.
Recebido: 19/jun./2013
Aceito: 19/set./2013
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
08 Nov 2013 -
Data do Fascículo
2013
Histórico
-
Recebido
19 Jun 2013 -
Aceito
19 Set 2013