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Influência da técnica anestésica nas alterações hemodinâmicas no transplante renal: estudo retrospectivo

Influencia de la técnica anestésica en las alteraciones hemodinámicas en el transplante renal: estudio retrospectivo

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Sucesso no transplante renal (Tx) depende do tipo de doador, da duração da isquemia fria e de parâmetros hemodinâmicos na reperfusão. O objetivo desta pesquisa foi analisar a técnica anestésica, a incidência de alterações cardiovasculares e a ocorrência de diurese no período perioperatório dos Tx realizados na UNICAMP. MÉTODO: Avaliou-se retrospectivamente Tx de adultos realizados entre janeiro de 2005 e abril de 2006. Consideraram-se dados demográficos, exames laboratoriais pré-operatórios, técnicas e agentes anestésicos, hidratação, parâmetros hemodinâmicos, emprego de aminas vasoativas, presença de diurese e complicações intra-operatórias, com análise comparativa entre os subgrupos formados conforme a técnica anestésica empregada. Foram usados na análise estatística o teste t de Student (paramétricos), Mann-Whitney (não paramétricos), teste do Qui-quadrado e Exato de Fisher para comparação de proporções e análise multivariada. RESULTADOS: Estudaram-se 92 pacientes, 59 com anestesia geral (AG) e 33 anestesia geral associada à peridural (AG + Peri), 42 receberam rim de doadores vivos e 50 de falecidos. Não houve diferença (p > 0,05) na maioria dos parâmetros pré-operatórios estudados, exceção feita à origem do enxerto (82% AG + Peri receberam rins de doador falecido). A alteração cardiovascular mais frequente foi hipotensão arterial (30% AG e 48% AG + Peri, p < 0,05). Regime de hidratação não diferiu entre os grupos (86,7 ± 30,2 mL.kg-1 AG e 94,8 ± 21,8 mL.kg-1 AG+Peri, p = 0,38). Enxerto de doador falecido correlacionou-se a maior instabilidade hemodinâmica e pior prognóstico para função imediata do enxerto, p < 0,01 e 0,01, respectivamente. Volume de hidratação de 80 mL.kg-1 associou-se à diurese (OR = 2,94, IC95% 1,00-8,32). CONCLUSÕES: A técnica anestésica empregada foi anestesia geral, associada ou não à peridural. Alteração hemodinâmica mais comum foi hipotensão arterial. Mostraram-se benéficos em relação à diurese ser receptor de doador vivo e receber hidratação de 80 mL.kg-1 de solução fisiológica a 0,9%.

CIRURGIA, Urológica; COMPLICAÇÕES; COMPLICAÇÕES; COMPLICAÇÕES


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: El éxito en el transplante renal (Tx) depende del tipo de donador, de la duración de la isquemia fría y de los parámetros hemodinámicos en la reperfusión. El objetivo de esta investigación fue analizar la técnica anestésica, la incidencia de alteraciones cardiovasculares y el aparecimiento de diuresis en el período perioperatorio de los Tx realizados en la UNICAMP. MÉTODO: Se evaluó retrospectivamente Tx de adultos realizados entre enero de 2005 y abril de 2006. Se tuvieron en cuenta los datos demográficos, los exámenes laboratoriales preoperatorios, técnicas y agentes anestésicos, hidratación, parámetros hemodinámicos, el uso de aminas vasoactivas, la presencia de diuresis y complicaciones intraoperatorias, con análisis comparativo entre los subgrupos formados conforme a la técnica anestésica empleada. Se usaron en el análisis estadístico el test t de Student (paramétricos), Mann-Whitney (no paramétricos), test del Cui-cuadrado y Exacto de Fisher para la comparación de proporciones y análisis multivariada. RESULTADOS: Se estudiaron 92 pacientes, 59 con anestesia general (AG) y 33 anestesia general asociada a la epidural (AG + Peri), 42 recibieron riñones de donantes vivos y 50 de fallecidos. No hubo diferencia (p < 0,05) en la mayoría de los parámetros preoperatorios estudiados, con excepción del origen del injerto (82% AG + Peri recibieron riñones de donante fallecido). La alteración cardiovascular más frecuente fue la hipotensión arterial (30% AG y 48% AG + Peri, p < 0,05). El régimen de hidratación no fue diferente entre los grupos (86,7 ± 30,2 mL.kg-1 AG y 94,8 ± 21,8 mL.kg-1 AG+Peri, p = 0,38). El injerto del donante fallecido se correlacionó con una mayor inestabilidad hemodinámica y con un peor pronóstico para la función inmediata del injerto, p < 0,01 y 0,01 respectivamente. Un volumen de hidratación de 80 mL.kg-1 se asoció a la diuresis (OR = 2,94, IC95% 1,00-8,32). CONCLUSIONES: La técnica anestésica empleada fue anestesia general, asociada o no a la epidural. La alteración hemodinámica más común fue la hipotensión arterial. Se mostraron benéficos con relación a la diuresis por ser de un receptor de donante vivo y recibir una hidratación de 80 mL.kg-1 de solución fisiológica a 0,9%.


BACKGROUND AND OBJECTIVES: The success of renal transplantation (Tx) depends on the type of donor, length of cold ischemia, and hemodynamic parameters on reperfusion. The objective of this study was to analyze the anesthetic technique, the incidence of cardiovascular changes, and the presence of postoperative diuresis of Tx performed at UNICAMP. METHODS: Renal transplantation of adults performed from January 2005 and April 2006 were evaluated retrospectively. Demographic data, preoperative laboratorial exams, anesthetic techniques and agents, hydration, hemodynamic parameters, use of vasoactive amines, presence of a diuresis, and intraoperative complications were evaluated, and comparative analysis between the subgroups, formed according to the anesthetic technique, was undertaken. The Student t test (parametric), Mann-Whitney test (non-parametric), Chi-square test and Fisher Exact test for comparison of proportions and multivariate analysis were used. RESULTS: Ninety-two patients were evaluated; 59 underwent general anesthesia (GA) and 33 underwent general anesthesia associated with epidural block (GA + Epi); 42 patients received live-donor transplants and 50 from dead donors. Most preoperative parameters analyzed did not show statistically significant differences (p > 0.05), except for the origin of the graft (82% of GA + Epi received dead donor kidneys). Hypotension (30% GA and 48% GA + Epi, p < 0.05) was the most frequent cardiovascular change. The hydration regimen did not differ between both groups (86.7± 30.2 mL.kg-1 GA and 94.8 ± 21.8 mL.kg-1 GA+Epi, p = 0.38). Dead donor grafts were more commonly associated with hemodynamic instability and worse prognosis for the immediate function of the graft, p < 0.01 and 0.01, respectively. Hydration of 80 mL.kg-1 was associated with the presence of diuresis (OR = 2.94, CI 95% 1.00-8.32). CONCLUSIONS: General anesthesia associated or not with epidural block was the anesthetic technique used. Hypotension was the most common hemodynamic change. Live-donor graft and volume of hydration of 80 mL.kg-1 of NS favored diuresis.

COMPLICATIONS; COMPLICATIONS; COMPLICATIONS; SURGERY, Urologic


ARTIGO CIENTÍFICO

Influência da técnica anestésica nas alterações hemodinâmicas no transplante renal. Estudo retrospectivo* * Recebido do Hospital de Clínicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), SP

Influencia de la técnica anestésica en las alteraciones hemodinámicas en el transplante renal. Estudio retrospectivo

Eunice Sizue Hirata, TSAI; Maria Fernanda BaghinII; Rosa Inês Costa Pereira, TSAI; Gentil Alves FilhoIII; Artur Udelsmann, TSAIV

IProfessora Doutora do Departamento de Anestesiologia da FCM/UNICAMP

IIME3 do CET/SBA do Departamento de Anestesiologia da FCM/UNICAMP

IIIProfessor Doutor da Disciplina de Nefrologia do Departamento de Clínica Médica da FCM/UNICAMP

IVProfessor Livre-Docente pela UNICAMP; Professor Associado do Departamento de Anestesiologia da FCM/UNICAMP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Eunice Sizue Hirata Rua Dona Presciliana Soares, 195/71 13025-080 Campinas, SP E-mail: eshirata@hotmail.com

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Sucesso no transplante renal (Tx) depende do tipo de doador, da duração da isquemia fria e de parâmetros hemodinâmicos na reperfusão. O objetivo desta pesquisa foi analisar a técnica anestésica, a incidência de alterações cardiovasculares e a ocorrência de diurese no período perioperatório dos Tx realizados na UNICAMP.

MÉTODO: Avaliou-se retrospectivamente Tx de adultos realizados entre janeiro de 2005 e abril de 2006. Consideraram-se dados demográficos, exames laboratoriais pré-operatórios, técnicas e agentes anestésicos, hidratação, parâmetros hemodinâmicos, emprego de aminas vasoativas, presença de diurese e complicações intra-operatórias, com análise comparativa entre os subgrupos formados conforme a técnica anestésica empregada. Foram usados na análise estatística o teste t de Student (paramétricos), Mann-Whitney (não paramétricos), teste do Qui-quadrado e Exato de Fisher para comparação de proporções e análise multivariada.

RESULTADOS: Estudaram-se 92 pacientes, 59 com anestesia geral (AG) e 33 anestesia geral associada à peridural (AG + Peri), 42 receberam rim de doadores vivos e 50 de falecidos. Não houve diferença (p > 0,05) na maioria dos parâmetros pré-operatórios estudados, exceção feita à origem do enxerto (82% AG + Peri receberam rins de doador falecido). A alteração cardiovascular mais frequente foi hipotensão arterial (30% AG e 48% AG + Peri, p < 0,05). Regime de hidratação não diferiu entre os grupos (86,7 ± 30,2 mL.kg-1 AG e 94,8 ± 21,8 mL.kg-1 AG+Peri, p = 0,38). Enxerto de doador falecido correlacionou-se a maior instabilidade hemodinâmica e pior prognóstico para função imediata do enxerto, p < 0,01 e 0,01, respectivamente. Volume de hidratação de 80 mL.kg-1 associou-se à diurese (OR = 2,94, IC95% 1,00-8,32).

CONCLUSÕES: A técnica anestésica empregada foi anestesia geral, associada ou não à peridural. Alteração hemodinâmica mais comum foi hipotensão arterial. Mostraram-se benéficos em relação à diurese ser receptor de doador vivo e receber hidratação de 80 mL.kg-1 de solução fisiológica a 0,9%.

Unitermos: CIRURGIA, Urológica: transplante renal; COMPLICAÇÕES: hemodinâmicas, função imediata do enxerto, diurese.

RESUMEN

JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: El éxito en el transplante renal (Tx) depende del tipo de donador, de la duración de la isquemia fría y de los parámetros hemodinámicos en la reperfusión. El objetivo de esta investigación fue analizar la técnica anestésica, la incidencia de alteraciones cardiovasculares y el aparecimiento de diuresis en el período perioperatorio de los Tx realizados en la UNICAMP.

MÉTODO: Se evaluó retrospectivamente Tx de adultos realizados entre enero de 2005 y abril de 2006. Se tuvieron en cuenta los datos demográficos, los exámenes laboratoriales preoperatorios, técnicas y agentes anestésicos, hidratación, parámetros hemodinámicos, el uso de aminas vasoactivas, la presencia de diuresis y complicaciones intraoperatorias, con análisis comparativo entre los subgrupos formados conforme a la técnica anestésica empleada. Se usaron en el análisis estadístico el test t de Student (paramétricos), Mann-Whitney (no paramétricos), test del Cui-cuadrado y Exacto de Fisher para la comparación de proporciones y análisis multivariada.

RESULTADOS: Se estudiaron 92 pacientes, 59 con anestesia general (AG) y 33 anestesia general asociada a la epidural (AG + Peri), 42 recibieron riñones de donantes vivos y 50 de fallecidos. No hubo diferencia (p < 0,05) en la mayoría de los parámetros preoperatorios estudiados, con excepción del origen del injerto (82% AG + Peri recibieron riñones de donante fallecido). La alteración cardiovascular más frecuente fue la hipotensión arterial (30% AG y 48% AG + Peri, p < 0,05). El régimen de hidratación no fue diferente entre los grupos (86,7 ± 30,2 mL.kg-1 AG y 94,8 ± 21,8 mL.kg-1 AG+Peri, p = 0,38). El injerto del donante fallecido se correlacionó con una mayor inestabilidad hemodinámica y con un peor pronóstico para la función inmediata del injerto, p < 0,01 y 0,01 respectivamente. Un volumen de hidratación de 80 mL.kg-1 se asoció a la diuresis (OR = 2,94, IC95% 1,00-8,32).

CONCLUSIONES: La técnica anestésica empleada fue anestesia general, asociada o no a la epidural. La alteración hemodinámica más común fue la hipotensión arterial. Se mostraron benéficos con relación a la diuresis por ser de un receptor de donante vivo y recibir una hidratación de 80 mL.kg-1 de solución fisiológica a 0,9%.

INTRODUÇÃO

Transplantes renais (Tx) são realizados desde 1906; no entanto, apenas após 1960, com o desenvolvimento de novos imunossupressores 1, em especial os inibidores de calcineurinas, o reconhecimento do conceito de morte encefálica e a seleção adequada do binômio doador-receptor 2, os Tx se tornaram o tratamento de escolha para os pacientes com insuficiência renal crônica terminal 3.

O Tx está associado a melhor qualidade de vida, melhor relação custo/benefício e, possivelmente, maior sobrevida dos pacientes 3. Nas crianças, o transplante realizado precocemente promove melhor crescimento e desenvolvimento 4.

Os primeiros transplantes foram realizados com anestesia espinal, tendo em vista as poucas opções de fármacos disponíveis à época para a realização de anestesia geral. Com o advento de bloqueadores neuromusculares com baixa excreção renal 5 e anestésicos voláteis com baixa percentagem de biotransformação 6, a anestesia geral tornou-se a melhor opção para esses pacientes. Dentre as vantagens da anestesia geral pode-se citar imobilidade absoluta no momento das anastomoses vasculares e controle adequado da ventilação e da perfusão em pacientes com estado geral normalmente comprometido pela uremia 7. Já o êxito no transplante renal depende de outros fatores: tipo de doador, duração da isquemia fria e possibilidade de manutenção de parâmetros hemodinâmicos adequados no momento da reperfusão. Tem sido observado que o bom desempenho cardiovascular relacionado à administração de grandes volumes de soluções cristalóides está associado à função precoce do enxerto 8 e à menor incidência de necrose tubular aguda 9.

O objetivo foi estudar, de modo retrospectivo, a técnica e os agentes anestésicos utilizados na anestesia para Tx realizados no Hospital de Clínicas da UNICAMP, em indivíduos adultos, com foco principalmente nas alterações hemodinâmicas e na diurese.

MÉTODO

Foram estudados todos os transplantes renais, de doadores vivos e de falecidos, realizados no período de janeiro de 2005 a abril de 2006, no Hospital de Clínicas da UNICAMP.

Das fichas de avaliação pré-operatória foram obtidos a idade, o sexo, o peso, a altura, a classificação de estado físico segundo a Sociedade Americana de Anestesiologistas (ASA), os valores de hemoglobina, de hematócrito, de potássio, da uréia e da creatinina plasmáticos. Os demais parâmetros foram extraídos da ficha de anestesia, inclusive aqueles relacionados à monitorização intraoperatória. Quando necessário, foram utilizados dados do prontuário médico.

Foram considerados, além dos parâmetros hemodinâmicos, os agentes anestésicos utilizados, a hidratação e as complicações apresentadas durante a anestesia. Foi considerada hipotensão arterial ou hipertensão arterial, variações da pressão arterial sistólica ou pressão arterial média inferiores ou superiores a 30% em relação à inicial, mantida por período igual ou superior a 15 minutos e/ou administração de fármacos vasoativos com a finalidade de aumentar ou diminuir a pressão arterial, respectivamente. Foi considerada bradicardia a frequência cardíaca inferior a 50 batimentos por minuto, e taquicardia a frequência superior a 120 batimentos por minuto. A pressão venosa central (PVC) foi considerada normal para valores entre 2 e 12 cmH2O.

As variáveis categóricas foram descritas por meio de sua distribuição percentual e as contínuas pela média e desvio-padrão. A análise estatística foi realizada utilizando-se o teste Exato de Fisher e o de Qui-quadrado (χ2) para comparação de variáveis categóricas, o teste t de Student e de Mann-Whitney para comparação de médias. O tamanho da amostra foi determinado pelo número de sujeitos encontrados no período de estudo, sendo o poder do teste avaliado após a coleta de dados, considerando-se um erro tipo I de 5%. Para estudar a magnitude do risco dos fatores estudados e sua inter-relação, realizou-se regressão logística múltipla; considerando-se a diurese como variável dependente. O nível de significância foi de 5% e o software utilizado para análise foi o SAS versão 8,2.

RESULTADO

Foram submetidos ao transplante renal, no período considerado, 98 pacientes. Dois pacientes foram excluídos do estudo por informações incompletas e quatro por terem menos de 14 anos. Em quatro pacientes houve necessidade de consulta ao prontuário médico para completar as informações. Dos 92 pacientes estudados, 59 receberam anestesia geral (AG) e 33 anestesia geral associada à peridural (AG+Peri). Quanto à origem do enxerto, 42 receberam rim de doadores vivos relacionados e 50 de doadores falecidos. Os pacientes foram subdivididos em dois grupos, segundo a técnica anestésica empregada. As características dos pacientes segundo idade, sexo, peso e altura, além de exames pré-operatórios mostraram-se semelhantes nos dois grupos (p > 0,05), exceto em relação à origem do enxerto, pela predominância de implante de rins de doadores falecidos (82%) no grupo AG+Peri (p < 0.01) (Tabela I). Os grupos AG e AG+Peri também foram comparáveis quanto à presença de doenças associadas, sendo as mais frequentes a hipertensão arterial (p = 0,36), a acidose metabólica (p = 0,13) e a anemia (p = 0,24).

A monitorização intraoperatória consistiu em: cardioscopia, oximetria de pulso, pressão venosa central, pressão arterial sistólica pelo método de palpação de pulso ou pressão arterial média por punção da artéria radial e cateterização vesical.

A técnica anestésica empregada foi anestesia geral balanceada, venosa e inalatória, com ventilação controlada mecânica em sistema com reabsorção de CO2 nos dois grupos e associada à peridural única, no grupo AG+Peri. O agente inalatório utilizado foi o isoflurano 0,5 a 1,0%, vaporizado em uma mistura de oxigênio e óxido nitroso a 50%. Os anestésicos venosos mais empregados foram o fentanil, sufentanil, propofol e atracúrio. O consumo médio e seu respectivo desvio-padrão, nas duas técnicas anestésicas podem ser vistos na tabela II, sem diferença significativa entre os grupos.

A hidratação foi mantida com solução fisiológica a 0,9% em infusão média de 86,7 ± 30,2 mL.kg-1 no grupo AG e 94,8 ± 21,8 mL.kg-1 no grupo AG+Peri (p = 0,38). A transfusão de hemoderivados foi realizada quando os valores de hemoglobina eram inferiores a 8 g.dL-1 e não diferiu nos grupos estudados.

Todos os pacientes receberam furosemida, 0,5 a 1,0 mg.kg-1 durante a realização das anastomoses vasculares e todos, exceto três, receberam doses habituais de atropina e neostigmina e foram extubados ao final da operação. A analgesia pós-operatória, no grupo submetido à anestesia peridural, foi realizada com a associação de bupivacaína a 0,25% (32,5 a 50 mg) e morfina 0,03 mg.kg-1. Nos 59 pacientes do grupo da anestesia geral, a analgesia foi realizada com morfina subcutânea, 0,1 mg.kg-1 , associada à infiltração da ferida cirúrgica com 100 mg de bupivacaína a 0,5%. Todos os pacientes foram encaminhados à unidade de terapia intensiva (UTI) no pós-operatório imediato.

Quanto às alterações cardiovasculares encontradas no período perioperatório, objeto desse estudo, verificou-se que a hipotensão arterial ocorreu em 34 pacientes, 17 (29%) do grupo AG e 17 (51%) do grupo AG+Peri (p = 0,03) e PVC > 12 cmH2O ocorreu em 60 pacientes, 42 (71%) do grupo AG e 18 (54%) do grupo AG+Peri, (p = 0,11). Sessenta e sete pacientes apresentavam diurese no final da operação, 44 (74,57%) do grupo AG e 23 (69,69%) do grupo AG + Peri, conforme Tabela III. O emprego de fármaco vasoativo ocorreu de forma idêntica à hipotensão arterial. Nenhum paciente apresentou hipertensão arterial, dois revelaram taquicardia e um bradicardia.

A origem do enxerto esteve correlacionada à maior instabilidade hemodinâmica e pior prognóstico para função imediata do enxerto. O estudo das associações entre as variáveis: técnica anestésica, hipotensão arterial, PVC e presença de diurese segundo tipo de doador, demonstrou que os pacientes que receberam rim de cadáver apresentaram com maior frequência hipotensão arterial (p < 0,01) e PVC mais baixa que os pacientes que receberam rim de doador vivo. A diurese foi mais frequente entre pacientes que receberam rim de doador vivo relacionado (p = 0,01) (Tabela IV).

A regressão logística múltipla, considerando as variáveis estudadas e a ocorrência de diurese apontou como fatores significativos a origem do enxerto e o volume de hidratação recebido (Figura 1). O poder do teste foi avaliado nas tabelas III e IV, sendo de aproximadamente 60% e 80% respectivamente, exceto para PVC > 12, que apresentou um poder de 37% na associação com o tipo de técnica anestésica e de 55% com o tipo de doador. A diurese apresentou o poder mais baixo (10%) na associação com a técnica anestésica.


Outras complicações frequentes durante o período perioperatório foram acidose metabólica, anemia e hiperpotassemia. Não houve diferença significativa entre os grupos estudados. Os pacientes que apresentaram acidose metabólica receberam infusão de bicarbonato de sódio. A hiperpotassemia foi corrigida com a administração de solução polarizada e ou cloreto de cálcio. Dez pacientes receberam transfusão de concentrado de hemáceas no intraoperatório. Três pacientes foram encaminhados intubados à UTI: dois por broncoespasmo e um por instabilidade hemodinâmica. Outras complicações menos frequentes foram distúrbios de coagulação e rash cutâneo.

DISCUSSÃO

A anestesia geral venosa e inalatória com ventilação controlada mecânica é a técnica mais empregada no Tx 7,10. Existe também consenso quanto aos agentes anestésicos utilizados: o tiopental sódico e mais recentemente o propofol associado ao fentanil. A intubação é facilitada pela administração de atracúrio e a manutenção feita com isoflurano associada ou não ao óxido nitroso10. Quanto à dor pós-operatória, tem sido tratada mais comumente com analgesia controlada pelo paciente (PCA) com opioide 11, fentanil ou morfina, apesar da possibilidade de acúmulo de metabólitos ativos com a morfina 12.

A presente casuística é concorde com a literatura com relação à técnica e agentes anestésicos empregados. Todos os pacientes receberam anestesia geral balanceada. A indução foi realizada com propofol em 97,83% dos pacientes e atracúrio em 96,74%. A manutenção foi feita com isoflurano, vaporizado em uma mistura de O2 e NO2 a 1:1 em 100% dos casos estudados e o opioide empregado foi o fentanil (53,26%) e o sufentanil (46,74%), sem diferença entre os grupos. O consumo de anestésicos foi igual nos dois grupos estudados, apesar da associação da peridural em 35,87% dos pacientes.

Mesmo que os trabalhos da literatura apontem a anestesia geral como técnica de escolha para o Tx, existem vários estudos mostrando que a anestesia regional pode ser empregada com êxito nessas operações. Segundo Akpek e col. 13 e Hadimiaglee col. 14, a anestesia peridural contínua e o bloqueio combinado raquiperidural são tão eficazes quanto a anestesia geral nos quesitos estabilidade cardiovascular e complicações, com a vantagem de proporcionar boa analgesia pós-operatória.

Ocorre, no entanto, que os pacientes urêmicos são particularmente susceptíveis a algumas complicações decorrentes da punção espinal. Trabalhos publicados relatam inclusive lesão neurológica por hematoma peridural 15. Causas para tanto não faltam: efeito residual da heparina, utilizada na diálise, plaquetopenia e disfunção plaquetária são comuns na insuficiência renal crônica terminal. Mesmo a normalidade de exames como o RNI e o R não exclui a alteração mais comumente encontrada, que é a disfunção plaquetária 16. Apesar da pequena casuística, não foram observadas complicações dessa natureza.

Além destas complicações, os bloqueios espinais induzem hipotensão arterial e diminuição da pressão venosa central (PVC), por diminuição do retorno venoso ao coração. Também causam bradicardia que, dependendo da intensidade, pode levar à diminuição do débito cardíaco e da pressão arterial. Em determinadas circunstâncias, pode levar a bradiarritmias graves como o bloqueio átrio ventricular 17. Todos esses efeitos são considerados deletérios, pois caminham em sentido oposto às recomendações de Carlie e col. 8 e Luciani e col. 9. Esses autores mostraram a importância da hidratação máxima e de parâmetros hemodinâmicos adequados, no momento da reperfusão, para a obtenção de diurese precoce e profilaxia de necrose tubular aguda no pós-operatório imediato 18. A hipotensão arterial é uma complicação relativamente frequente em urêmicos. São várias as justificativas para essa ocorrência: pacientes muito desidratados por diálise recente, doses excessivas de agentes anestésicos e ou tratamento de longa duração com inibidores da enzima conversora 19. No presente estudo, a incidência de hipotensão arterial foi significativamente mais elevada entre pacientes receptores de rim de doador falecido. Dois fatores poderiam explicar essa complicação nesse grupo específico de pacientes: preparo inadequado dado à urgência relativa desse tipo de intervenção cirúrgica e o predomínio de Tx de doador falecido realizado sob anestesia geral associada à peridural (81,82%). O bloqueio simpático poderia explicar também a utilização significativamente maior de vasopressores, observada no grupo da associação anestesia geral e peridural. Embora a dopamina seja o vasopressor mais indicado no tratamento da hipotensão arterial, e foi o mais utilizado nessa casuística, seu uso deve ser visto com parcimônia, pois, além de ser desprovida de efeito benéfico no rim, a dopamina está associada a complicações como taquiarritmias 20.

A diurese precoce é importante nos Tx, como fator de bom prognóstico. Ela está relacionada à maior sobrevida do enxerto e menor mortalidade 21. Diurese precoce é uma observação comum entre doadores vivos e foi constatada nessa casuística. No caso de doadores falecidos, a diurese é menos frequente porque os rins ficam isquêmicos por períodos variáveis e são armazenados em soluções eletrolíticas a baixas temperaturas, até o momento de serem implantados 22. Algumas medidas como a administração de grandes volumes de líquidos e manitol têm sido preconizadas com a finalidade de se obter diurese ao final da operação 23, desestimulando-se o uso sistemático de dopamina e de altas doses de furosemida 24.

Outra medida que encontra amparo na literatura é a manutenção da PVC elevada no momento da reperfusão do enxerto. Valores variando de 10 até 15 cm de H2O são descritos como adequados 25. Na atual casuística, procurou-se manter a PVC acima de 12 cm de água, à custa de hidratação com solução fisiológica a 0,9% em volumes elevados, 86,7 a 94,8 mL.kg-1. Estes volumes podem estar associados a complicações e a recomendação é o acompanhamento clínico por meio de ações simples como medida da pressão arterial e da PVC e controle de aparecimento de edemas 24. A necessidade de adequada manutenção do volume intravascular pode ser comprovada pela análise multivariada dos parâmetros com diferença estatística significativa na análise bivariada. Elegendo-se um regime de hidratação intermediário entre os valores recomendados na literatura (70 a 90 mL.kg-1), pode-se observar aumento na probabilidade de ocorrência de diurese precoce 26,27. Este resultado, porém, deve ser interpretado com cautela, uma vez que a diurese apresentou um baixo poder estatístico, evidenciado pelos grandes intervalos de confiança.

A técnica anestésica utilizada na anestesia para transplante renal, no período considerado, foi geral venosa e inalatória, associada em 33 (35,86%) pacientes à anestesia peridural simples.

A alteração hemodinâmica mais frequente nessa casuística foi hipotensão arterial, maior entre os pacientes que receberam rim de cadáver, independentemente da técnica anestésica empregada.

Dois fatores podem ser considerados de bom prognóstico em relação à função renal imediata do enxerto: ser receptor de doador vivo relacionado e receber hidratação de pelo menos 80 mL.kg-1 de solução eletrolítica.

Apresentado em 30 de janeiro de 2008

Aceito para publicação em 3 de dezembro de 2008

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  • Endereço para correspondência:
    Dra. Eunice Sizue Hirata
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    Recebido do Hospital de Clínicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), SP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Aceito
      03 Dez 2008
    • Recebido
      30 Jan 2008
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