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Um modelo descritivo do sistema financeiro do Brasil

ARTIGOS

Um modelo descritivo do sistema financeiro do Brasil* * O autor agradece ao Prof. Duncan Foley da Universidade Stanford os comentários críticos a uma versão inicial do trabalho. Os demais erros são de responsabilidade do autor.

Alkimar R. Moura

Professor do Departamento de Planejamento e Análise Econômica Aplicados à Administração da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

1. INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é o de apresentar um modelo do sistema monetário e financeiro do Brasil, de acordo com a abordagem de equilíbrio geral proposta e desenvolvida por J. Tobín e seus associados.1 1 Veja, entre outros, os seguintes ensaios: Tobin, J. A general equilibrium approach to monetary theory. Journal of Money, Credit and Banking, v. 1, Fev. 1969; Tobin, J. & Hester, D. Financial markets and economic activity. Cowles Foundation, Monograph 21, New York; Wiley, 1967; Tobin, J. & Brainard, W. Pitfalls in financial model building. The American Economic Review, v. 58, 1968. O modelo é puramente descritivo. Além disso, deixa de incorporar alterações recentes na legislação sobre o mercado financeiro que, provavelmente, alterarão algumas das conclusões do estudo. Seu objetivo, no entanto é o de apenas captar as principais características institucionais de um sistema monetário que vem, há anos, operando dentro de um conjunto de regulamentações e interferências governamentais, que são típicas de muitos países subdesenvolvidos. Em verdade, o caso brasileiro, sem embargo de recentes alterações em sentido contrário, é um exemplo bastante rico de como II atuação governamental pode influenciai o mercado de ativos monetários e fínanceíros. Algumas dessas regulamentações consistiam e ainda consistem na fixação de taxas nominais de juros para a maioria das instituições financeiras, no controle da composição das carteiras de alguns intermediários, na fixação de tetos para as taxa reais de juros incidentes sobre ativos flnanceíros sujeitos à correção monetária, na rígida compartimentalização do mercado em segmentos estanques, e assim por diante.

Estas restrições influenciam diretamente o retorno esperado em ativos fínanceíros e, indiretamente;o retorno em ativos reais. Além disso, podem também afetar a capacidade de a política monetária influenciar o nível de demanda agregada na economia. Esta última questão, embora muito importante do ponto de vista de política econômica, não será abordada nesse trabalho. Apesar disto, não se pretende que o mesmo seja um exercício totalmente inócuo. Um modelo descritivo pode revelar características institucionais, que deverão ser levadas em conta em qualquer análise macroeconômica das relações entre variáveis reais, monetárias e financeiras.

O presente estudo divide-se em três partes. Na primeira, procura-se captar as principais cãracterísticas do sistema financeiro, na suposição de que inexistam controles sobre as taxas de juros nas operações ativas e passivas. A segunda parte incorpora ao modelo as mais importantes restrições que afetavam as taxas de juros antes das recentes medidas de eliminação de algumas delas. Fínalmente, a terceira parte procura extrair algumas conclusões a respeito da efícácia da política monetária, na presença de regulamen tações institucionais.

Como se referiu acima, esse trabalho deve ser encarado como uma investigação preliminar, visando aplicar ao caso brasileiro um instrumental teórico bastante útil para a análise dos fenômenos monetários. Espera-se que estudos posteriores possam contribuir para testar empiricamente o modelo, pois, somente assim é que se revelará a validade do mesmo para responder às 'questões de política econômica.

2. UMA DESCRIÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL

Sabe-se que desde as leis de reforma bancária e de mercado de capitais, as políticas monetária e financeira no Brasil têm procurado substituir a técnica inflacionária pela técnica financeira, como meio de mobilização de poupanças para financiar o processo de crescimento econômico. A superestrutura financeira do país foi completamente modificada com a criação de novas instituições, ativos, mercados, etc. Apesar de sua atual complexidade, as principais características do sistema podem ser descritas pela tabela 1, onde se indicam os ativos e obrigações detidos pelos quatro setores econômicos aqui considerados (governo, bancos comerciais, intermediários financeiros não-bancários e setor público não-bancário, incluindo, nesses últimos as empresas não-financeiras e o setor familiar).

A tabela acima baseia-se nas seguintes hipóteses simplificadoras: o patrimônio líquido dos bancos comerciais e demais instituições financeiras é desprezível, podendo ser ignorado para fins de análise; o governo não detém nenhum estoque de bens. Além disso, considera-se uma economia fechada, sem transações em bens, serviços ou títulos com o setor externo. Esta última hipótese implica uma superestimação ou subestimação do valor da riqueza nacional, dependendo das posições do balanço de pagamentos, estoque de reservas e estoque de dívida externa. Reconhece-se que esta pressuposição encerra elevada dose de irrealismo, principalmente no caso brasileiro, onde se observa uma tendência crescente de abertura da economia ao comércio exterior, tanto de mercadorias e serviços, quanto de ativos e passivos financeiros. Apesar disso, como primeira aproximação, a hipótese de economia fechada será mantida.

O funcionamento de um sistema com as características enunciadas na tabela 1 irá determinar o preço de equilíbrio dos ativos e obrigações transacionadas em mercado, ou identicamente, as taxas de juros. No caso acima, o modelo compõe-se de um vetor de taxas reais de juros f = f(r1... rn), com os seguintes componentes:

rm: taxa real de juros incidente sobre papel-moeda;

rb: taxa real de juros incidente sobre obrigações do te souro;

rd: taxa real de juros incidente sobre depósitos à vista;

r1: taxa real de juros incidente sobre empréstimos bancários;

r¡: taxa real de juros incidente sobre títulos com correção monetária, emitidos pelas instituições não-bancárias;

r1: taxa de juros real incidente sobre empréstimos con cedidos pelas instituições não-bancárias;

rn: taxa real de juros incidente sobre títulos sem correção monetária emitidos p/ instituições não-bancárias;

r1: taxa real de juros incidente sobre empréstimos sem correção monetária concedidos pelas instituições não-cancárias;

d: taxa real de redesconto cobrada pelo Banco Central;

rk: taxa real de juros sobre o estoque de capital físico retido pelo público.

Além dessas taxas de juros, há que se definir o restante das variáveis e parâmetros que compõem o modelo. A notação seguinte tem este objetivo:

W: total da riqueza do setor privado, medida em termos de preços das mercadorias;

Y: renda total, medida, também, em termos da mesma unidade acima;

P: índice de preços de bens de consumo e de capital, produzidos no período corrente;

K: vetor cujos componentes são os estoques de capital físico em poder do público;

q: preço de mercado do estoque existente de bens de capital;

H: base monetária, líquida de empréstimos concedidos pelo Banco Central a .bancos comerciais (redesconto e outros tipos de assistência financeira);

D: estoque de depósitos à vista emitidos pelos bancos comerciais e pelo componente banco comercial das autoridades monetárias (no caso, Banco do Brasil);

L: estoque de empréstimos concedidos pelos bancos comerciais e Banco do Brasil ao setor privado;

P: taxa de reserva mínima, fixada pelo Banco Central, como percentagem dos depósitos à vista;

: fração da reserva compulsória, que os bancos podem legalmente manter em Obrigações do Tesouro;

B: estoque existente de obrigações do Tesouro;

Bp: estoque de obrigações do tesouro em poder do público não-bancário;

IS: estoque de títulos com correção monetária emitidos pelas instituições não-bancárias;

IL: estoque de empréstimos com correção monetária concedidos pelas instituições não-bancárias;

NS: estoque de títulos sem correção monetária emitidos pelas instituições não-bancárias;

NL: estoque de empréstimos sem correção monetária concedidos pelas instituições não-bancárias;

Ep: taxa esperada de inflação;

(r'): vetor de taxas nominais de juros, cada uma delas correspondente a uma taxa real como definidas anteriormente.

A seguir, são indicadas as equações que descrevem o mercado dos vários ativos monetários, financeiros e reais:

a) capital:

A equação (1) abaixo indica o montante de capital físico que o público (empresas e indivíduo) deseja reter, em condições de equilíbrio:

b) base monetária

A equação (2) acima indica como se distribui o estoque da base monetária entre os bancos e o público. O primeiro termo do lado esquerdo refere-se à demanda do público por papel-moeda; o segundo mostra o montante de reservas obrigatórias que os bancos mantêm em dinheiro; o terceiro especifica a demanda dos bancos por reservas voluntárias excedentes em dinheiro e, finalmente, o último termo do lado esquerdo capta a demanda de depósitos à vista mantidos pelo público junto ao Banco do Brasil. Com efeito, uma das peculiariedades do sistema monetário brasileiro, já apontada por vários estudiosos2 2 Entre outros, Affonso Celso Pastore tem repetidamente indicado a necessidade de se observar o duplo papel do Banco do Brasil como autoridade monetária e banco comercial no cálculo da base monetária. A propósito, consulte: Pastore, A.C. A oferta de moeda no Brasil 1961/1972. Pesquisa e Planejamento Econômico, IPEA, v. 3, dez. 1973; e ainda do mesmo autor: Observações sobre a politica monetária no programa brasileiro de estabilização. São Paulo, USP, 1973. Tese de livre-docência, não publicada. é o fato de que o conjunto das autoridades monetárias compreende o Banco Central e um banco comercial - o Banco do Brasil - que atua também como agente financeiro do Tesouro. Desta maneira, o conceito de base monetária há que ser ampliado, a fim de incorporar os depósitos à vista mantidos pelo público nas autoridades monetárias. Para simplificar, fez-se a hipótese de que o valor destes depósitos é uma proporção fixa (a) do total de depósitos á vista;

c) títulos governamentais:

A equação acima expressa a condição de equilíbrio entre a oferta e demanda pelo estoque existente de títulos governamentais. Esta última apresenta três componentes: uma demanda por parte do público não-bancário; uma originária dos bancos, como alternativa às reservas compulsórias em dinheiro, representada acima pelo segundo membro da equação; e finalmente o último componente refere-se à aquisição voluntária de Obrigações do Tesouro pelos bancos comerciais;

d) Empréstimos e depósitos bancários:

As equações (4) e (5) representam, respectivamente, as condições de equilíbrio nos mercados por empréstimos e depósitos à vista nos bancos comerciais;

e) títulos e empréstimos com correção monetária:

A equação (6) estabelece a condição de equilíbrio para títulos com correção monetária, emitidos pelas instituições financeiras não-bancárias, incluindo-se aqui os bancos comerciais, enquanto responsáveis pela criação de depósitos a prazo com correção monetária. Por outro lado, a equação (7) mostra a condição de equilíbrio no mercado para empréstimos com correção monetária, concedidos pelos intermediários não-bancários;

f) títulos e empréstimos privados sem correção monetária

As equações acima descrevem as condições de equilíbrio nos mercados de ativos e passivos financeiros não-sujeitos à correção monetária, emitidos pelas instituições não-bancárias;

g) taxas de retomo:

As equações a seguir mostram as relações entre as taxas nominais e as taxas reais de retomo, para os vários ativos e passivos que compõem o modelo:

h) restrição de riqueza:

A equação (20), a última do sistema, representa a restrição de riqueza do setor privado, não sendo, por isso mesmo, uma equação independente. Ela apenas esclarece que o estoque total de riqueza se distribui por três formas: capital físico, papel-moeda e títulos do governo em poder do público não-bancário.

A equação antes apresentada completa o modelo. Este compreende, ao todo, 19 equações independentes e 19 variáveis endógenas. As últimas são as seguintes:

q, W, rk, rm, rb, rd, r'd, r1, r'i, r'1, ri, rn ,r'n, ri1, r'i1, rn1, r'n1 ed.

Existem 12 variáveis exógenas: Y, H, B, K, R, P, Ep, r'm, d', ρ, , e α;

das quais 4 podem ser consideradas como instrumentos de política monetária: a base monetária (H); a taxa de reserva mínima incidente sobre os depósitos à vista dos bancos (ρ); a proporção de reserva mínima mantida sob a forma de títulos governamentais (); a taxa nominal de redesconto (d') e (α), um parâmetro de comportamento do público, a indicar como indivíduos e firmas distribuem seus depósitos à vista entre o sistema bancário comercial e o Banco do Brasil.

O simples fato de que o número de equações independentes iguala o número de variáveis endógenas não é condição necessária, nem suficiente, para a existência de uma solução de equilíbrio para o modelo anteriormente descrito. No entanto, o objetivo principal desse trabalho não é o de discutir questões relativas à existência, unicidade e estabilidade da solução de equilíbrio para o sistema financeiro. Na verdade, o fim a que se propõe esse trabalho é mais modesto, isto é, o de descrever a estrutura de um sistema, através do qual a política monetária procura influenciar os níveis de gastos, produção, renda e emprego na economia brasileira.

Uma limitação da política monetária já se revela claramente, mesmo em um modelo tão simples quanto o já descrito. Observa-se que as autoridades monetárias não exercem um controle completo sobre os fatores que afetam a base monetária. Como se viu anteriormente, a definição da base também inclui os depósitos à vista do público junto ao Banco do Brasil. Esse montante não é fixo, como se supôs no modelo, mas variável, dependendo de como o público distribui seus depósitos à vista. Desta maneira, existe a possibilidade de que os responsáveis pela política monetária não sejam capazes de controlar o total da base, em virtude de que decisões do público podem perfeitamente neutralizar as ações governamentais. Neste caso, o comportamento de variáveis como meios de pagamento e crédito bancário pode tornar-se errático. Este talvez seja um dos fatores que ajudam a explicar a dificuldade que todos os ministros da Fazenda encontram em controlar a expansão monetária no Brasil, apesar das intenções declaradas nos programas oficiais e sem embargo das medidas de aperfeiçoamento recente dos mecanismos de controle monetário.3 3 Não se pretende afirmar que a única causa das flutuações da oferta de dinheiro se deva ao fato de que tem sido difícil controlar os empréstimos do Banco do Brasil ao setor privado. Reconhece-se que, numa economia aberta, as autoridades monetárias certamente encontrarão dificuldades para controlar o estoque de meios de pagamentos, se, ao mesmo tempo, o governo procura manter uma taxa de câmbio ou, pelo menos, uma taxa não totalmente flexível, como o sistema brasileiro de desvalorização periódica. Além disso, se as autoridades monetárias também desejam controlar o nível da taxa de juros, no sistema financeiro interno, dificilmente conseguirão atingir esse objetivo numa economia que está cada vez mais, exposta aos fluxos financeiros internacionais.

3. REGULAMENTAÇÃO GOVERNAMENTAL E CONTROLE MONETÁRIO

Neste item, discutiremos a nível bastante genérico as principais restrições institucionais que afetavam o sistema financeiro. Existiam, até há poucos meses atrás, dois tipos de regulamentação que influenciavam os retornos dos ativos e passivos financeiros, dependendo do fato destes últimos sujeitarem-se ou não à correção monetária a posteriori: limites máximos para taxas nominais de juros e limites máximos para taxas reais de juros.

3.1 Limites para taxas nominais de juros

Até recentemente, prevaleciam limites máximos, fixados pelo Banco Central, para taxas nominais de juros incidentes sobre ativos e obrigações financeiras, emitidos e de responsabilidade de bancos comerciais e instituições financeiras não-bancárias. Algumas destas restrições foram eliminadas, quando das medidas de liberação da taxa de juros. Outras, entretanto, ainda persistem, como, por exemplo, a proibição de se pagar juros sobre os depósitos à vista, o que parece ser um contrasenso, em vista da eliminação dos tetos para as operações ativas dos bancos comerciais.

Em termos do modelo, a incorporação destas restrições implica em que quatro taxas nominais de juros, antes consideradas como variáveis endógenas, tornam-se instrumentos de política monetária. São elas: r'd, ri, r'n, rn1. Na suposição de que aqueles tetos fossem efetivamente obedecidos, quatro equações terão que ser eliminadas do modelo, para indicar que as variações de preços nesses mercados não são suficientes para garantir que uma posição de equilíbrio seja eventualmente alcançada. Assim, as equações (4), (5), (8) e (9) têm que ser substituídas pelas seguintes desigualdades, que indicam a existência de uma demanda excedente positiva em cada um daqueles mercados:

f4p (f, Y/W) W + f4b > 0

(4-A)

f5p(f, Y/W) W + f5b > 0 (5-A) f8p(f, Y/W) W + f8b > 0 (8-A) f9p(f, Y/W) W + f9b > 0 (9-A)

3.2 Limites para taxas reais de juros

Sabe-se que existiam e ainda existem limites máximos para taxa de juros de ativos financeiros sujeitos à correção monetária. Considerando-se que o mecanismo de correção monetária tem como objetivo proteger o valor real das poupanças financeiras contra oscilações no nível geral de preços (na suposição de que o índice de preços usado represente de fato as pressões inflacionárias existentes na economia), a presença de limites máximos para a taxa de juros daqueles ativos e passivos equivale, de fato, à imposição de tetos para as taxas reais de juros.

A incorporação destas restrições ao modelo faz-se exatamente como no item anterior, isto é, transformando-se as taxas reais de juros em variáveis cujo valor depende, não do mercado, mas de decisões de política governamental. Assim, o número de variáveis exógenas do sistema fica acrescido das seguintes taxas reais de juros: rb, r¡e . Se aqueles limites são observados, os mercados dos respectivos ativos estarão em desequilíbrio. Novamente, isto exige que as equações (3), (6) e (7) do modelo original sejam substituídas pelas seguintes desigualdades:

f3p(f, Y/W) W + p D + f3b (f) D (1 - ρ) > (3-A) f6p(f, Y/W) W + f6i (f) > 0 (6-A) f7p(f, Y/W) W + f7i (f) > 0 (7-A)

Realizadas as substituições, o sistema resultante contém agora 19 equações e desigualdades, mais a restrição de riqueza. Existem 12 equações independentes, que determinam o valor para as 12 variáveis endógenas que se seguem: q, W, rk, rm, r'b, rd, r1, r'i1, , rn, rn1 ed. De outro lado, temos agora 19 variáveis exógenas: Y, H, B, K, R, P, d', Ep, r'n, r'd, r'1, r'm, r'n1, rb, ri, ri1, ρ, , α; 11 das quais constituem instrumentos de política monetária, passíveis, portanto, de serem manipuladas a fim de se influenciar a acumulação de ativos financeiros e reais. Na verdade, as restrições incidentes sobre as taxas de juros corresponderam a um aumento considerável no número de variáveis sujeitas à intervenção oficial. Em conseqüência disto é provável que tenha havido um decréscimo substancial na atuação das forças de mercado, como orientadoras das decisões individuais de consumo, poupança, investimento e acumulação.

4. CONCLUSÃO

Este trabalho procurou oferecer uma descrição sumária do sistema financeiro nacional, utilizando-se de uma abordagem de equilíbrio geral. Ao nível de abstração em que o modelo foi desenvolvido, ele não se revela particularmente útil para a solução de problemas empíricos mais interessantes. A idéia básica foi a de captar as principais restrições institucionais que afetavam (e algumas ainda persistem) o funcionamento do sistema financeiro. Observou-se que as taxas de retorno em ativos e passivos financeiros não se movem livremente, a fim de conduzir o mercado ao equilíbrio. É claro que os intermediários procurarão, em nome da rentabilidade de suas operações, contornar os impedimentos legais que limitam os preços dos ativos de obrigações financeiras. Conhecidos artifícios serão postos em prática, tais como a exigência de reciprocidade em operações de empréstimos, a cobrança de taxas de serviços, a vinculação de empréstimos a operações de vendas de outros títulos emitidos pela intermediários, e assim por diante. À medida que estes artifícios conseguirem aumentar a taxa efetiva de juros, reintroduz-se no sistema um certo grau de flexibilidade em relação ao movimento das forças de mercado. Se isto não. ocorrer, oferta e demanda ajustar-se-ão somente através de variações na quantidade dos diversos ativos financeiros que compõem a carteira agregada das unidades econômicas. Mais comumente, talvez, outros métodos, como o racionamento de crédito, serão utilizados para distribuir o estoque existente de poupanças financeiras entre os vários empregos alternativos.

Conclui-se, pois, que as políticas financeira e monetária no Brasil têm procurado influenciar o preço de oferta do capital, não apenas através de mudanças na oferta de meios de pagamentos (que é o significado restrito de política monetária nos países desenvolvidos), mas também por meio de regulamentação sobre os preços relativos de ativos financeiros. Resta saber se esta capacidade adicional de a política monetária influenciar as variáveis do setor "real" da economia tem, de fato, contribuído para promover os objetivos de crescimento econômico com estabilidade de preços ou, se ao contrário, ela tem acentuado a instabilidade inerente ao funcionamento do setor financeiro nas economias capitalistas.

  • 1 Veja, entre outros, os seguintes ensaios: Tobin, J. A general equilibrium approach to monetary theory. Journal of Money, Credit and Banking, v. 1, Fev. 1969;
  • Tobin, J. & Hester, D. Financial markets and economic activity. Cowles Foundation, Monograph 21, New York; Wiley, 1967;
  • Tobin, J. & Brainard, W. Pitfalls in financial model building. The American Economic Review, v. 58, 1968.
  • 2 Entre outros, Affonso Celso Pastore tem repetidamente indicado a necessidade de se observar o duplo papel do Banco do Brasil como autoridade monetária e banco comercial no cálculo da base monetária. A propósito, consulte: Pastore, A.C. A oferta de moeda no Brasil 1961/1972. Pesquisa e Planejamento Econômico, IPEA, v. 3, dez. 1973;
  • e ainda do mesmo autor: Observações sobre a politica monetária no programa brasileiro de estabilização. São Paulo, USP, 1973. Tese de livre-docência, não publicada.
  • *
    O autor agradece ao Prof. Duncan Foley da Universidade Stanford os comentários críticos a uma versão inicial do trabalho. Os demais erros são de responsabilidade do autor.
  • 1
    Veja, entre outros, os seguintes ensaios: Tobin, J. A general equilibrium approach to monetary theory.
    Journal of Money, Credit and Banking, v. 1, Fev. 1969; Tobin, J. & Hester, D.
    Financial markets and economic activity. Cowles Foundation, Monograph 21, New York; Wiley, 1967; Tobin, J. & Brainard, W. Pitfalls in financial model building.
    The American Economic Review, v. 58, 1968.
  • 2
    Entre outros, Affonso Celso Pastore tem repetidamente indicado a necessidade de se observar o duplo papel do Banco do Brasil como autoridade monetária e banco comercial no cálculo da base monetária. A propósito, consulte: Pastore, A.C. A oferta de moeda no Brasil 1961/1972.
    Pesquisa e Planejamento Econômico, IPEA, v. 3, dez. 1973; e ainda do mesmo autor:
    Observações sobre a politica monetária no programa brasileiro de estabilização. São Paulo, USP, 1973. Tese de livre-docência, não publicada.
  • 3
    Não se pretende afirmar que a única causa das flutuações da oferta de dinheiro se deva ao fato de que tem sido difícil controlar os empréstimos do Banco do Brasil ao setor privado. Reconhece-se que, numa economia aberta, as autoridades monetárias certamente encontrarão dificuldades para controlar o estoque de meios de pagamentos, se, ao mesmo tempo, o governo procura manter uma taxa de câmbio ou, pelo menos, uma taxa não totalmente flexível, como o sistema brasileiro de desvalorização periódica. Além disso, se as autoridades monetárias também desejam controlar o nível da taxa de juros, no sistema financeiro interno, dificilmente conseguirão atingir esse objetivo numa economia que está cada vez mais, exposta aos fluxos financeiros internacionais.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Out 1977
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