RESUMO
Objetivo:
Analisar o desenvolvimento infantil em diferentes grupos sociais.
Método:
Estudo transversal com crianças menores de 3 anos cadastradas em unidades básicas de saúde de um município do estado de São Paulo, Brasil. O desenvolvimento infantil foi verificado com a Ficha de Acompanhamento do Desenvolvimento, do Ministério da Saúde. Utilizou-se do Índice de Reprodução Social para classificar famílias em grupos sociais e do modelo teórico hierárquico predefinido para análise de regressão logística univariada e múltipla.
Resultados:
A amostra foi composta por 348 crianças. 29% das crianças apresentavam ausência de algum marco do desenvolvimento esperado para a idade. No modelo final, grupo social e faixa etária associaram-se ao desenvolvimento infantil. Apresentaram maior chance de ausência de algum marco do desenvolvimento crianças dos grupos menos inseridos socialmente e com idade maior ou igual a 12 meses.
Conclusão:
A proporção de crianças com ausência de algum marco do desenvolvimento é elevada e associou-se à menor inserção social. Enfatiza-se a importância da vigilância do desenvolvimento pela equipe de Enfermagem da atenção primária para a identificação dos grupos mais vulneráveis e a intervenção precoce que minimize os efeitos negativos que se agravam com a idade.
DESCRITORES
Desenvolvimento Infantil; Saúde da Criança; Disparidades nos Níveis de Saúde; Determinantes Sociais da Saúde; Enfermagem de Atenção Primária
RESUMEN
Objetivo:
Analizar el desarrollo infantil en distintos grupos sociales.
Método:
Estudio transversal realizado con niños menores de 3 años registrados en unidades básicas de salud de un municipio del Estado de São Paulo, Brasil. El desarrollo infantil fue verificado con la Ficha de Acompañamiento del Desarrollo, del Ministerio de Salud. Se utilizó el Índice de Reproducción Social para clasificar a las familias en grupos sociales y del modelo teórico jerárquico predefinido para análisis de regresión logística univariada y múltiple.
Resultados:
La muestra estuvo compuesta de 348 niños. El 29% de los niños presentaban ausencia de algún marco del desarrollo esperado para la edad. En el modelo final, grupo social y rango de edad se asociaron con el desarrollo infantil. Presentaron mayor probabilidad de ausencia de algún marco del desarrollo niños de los grupos menos incluidos socialmente y con edad mayor o igual a 12 meses.
Conclusión:
La proporción de niños con ausencia de algún marco del desarrollo es elevada y se asoció con la menor inserción social. Se subraya la importancia de la vigilancia del desarrollo por el equipo de Enfermería de la atención primaria para la identificación de los grupos más vulnerables y la intervención precoz que minimice los efectos negativos que se agravan con la edad.
DESCRIPTORES
Desarrollo Infantil; Salud del Niño; Disparidades en el Estado de Salud; Determinantes Sociales de la Salud; Enfermería de Atención Primaria
ABSTRACT
Objective:
To analyze child development in different social groups.
Method:
A cross-sectional study with children under 3 years old enrolled in basic health units of a municipality in the state of São Paulo, Brazil. Child development was verified by the Ministry of Health's Development Monitoring Form. The Social Class Index was used to classify families into social groups and the predefined hierarchical theoretical model for univariate and multiple logistic regression analysis.
Results:
The sample consisted of 348 children, in which 29% of the children presented the absence of some developmental milestone expected for their age, while social group and age group were associated with child development in the final model. Children from the least socially inserted groups aged 12 months or older were more likely to be missing some developmental milestone.
Conclusion:
The proportion of children with the absence of some developmental milestones is high and associated with lower social inclusion. The importance of developmental surveillance by the primary care nursing team is emphasized in order to identify the most vulnerable groups and to implement early interventions which can minimize the negative effects which worsen with age.
DESCRIPTORS
Child Development; Child Health; Health Status Disparities; Social Determinants of Health; Primary Care Nursing
INTRODUÇÃO
Globalmente, houve um progresso substancial na sobrevivência infantil, com redução superior a 40% na mortalidade de crianças menores de 5 anos no período de 1990 a 2016(11. United Nations Children's Fund. Levels and trends in child mortality. Report 2017: estimates developed by the United Nations Inter-agency Group for Child Mortality Estimation [Internet]. New York: UNICEF; 2017 [cited 2018 Aug 03]. Available from: http://childmortality.org/files_v21/download/IGME%20report%202017%20child%20mortality%20final.pdf
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). No Brasil, tais avanços decorreram de transformações políticas, económicas e demográficas que contribuíram para a melhoria das condições sociais, como nível de pobreza, urbanização, saneamento, escolaridade de mulheres e fecundidade, atreladas à reorganização do sistema de saúde, com aumento do acesso aos serviços, expansão da cobertura dos serviços de saúde da atenção básica e implementação de ações voltadas à promoção da saúde materno-infantil(22. Victora CG, Aquino EML, Leal MC, Monteiro CA, Barros FC, Szwarcwald CL. Maternal and child health in Brazil: progress and challenges. Lancet. 2011;377(9779):1863-76. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60138-4
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-33. França EB, Lansky S, Rego MAS, Malta DC, França JS, Teixeira R, et al. Principais causas da mortalidade na infância no Brasil, em 1990 e 2015: estimativas do estudo de Carga Global de Doença. Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2017 [citado 2018 ago. 11];20: Supl. 1:46-60. Disponível em: http://www.sdelo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S1415-790X2017000500046&lng=en
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). Nesse cenário, entre os novos desafios destaca-se o cuidado da criança para a promoção do crescimento e desenvolvimento saudável, condições que se não consideradas afetam a saúde e o desempenho futuro, com repercussões irreparáveis à sociedade(44. Chan M, Lake A, Hansen K. The early years: silent emergency or unique opportunity? Lancet. 2017;389(10064):11-3. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60138-4
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).
Na atenção primária à saúde, o acompanhamento do desenvolvimento com um roteiro de observação constitui ação essencial para a detecção precoce de crianças com ausência de marcos do desenvolvimento esperado para a idade, proposta que no Brasil, apesar de timidamente, iniciou-se na década de 1980(55. Brasil. Ministério da Saúde. Saúde da criança: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil [Internet]. Brasília: MS; 2002 [citado 2018 ago. 03]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/crescimento_desenvolvimento.pdf
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). Contudo, a despeito das políticas e investimentos em programas e pesquisas, mais de 40% das crianças de países de baixa e média renda correm o risco de não alcançar seu potencial de desenvolvimento em decorrência da pobreza e condições precárias de nutrição, saúde e estímulo ambiental(66. Black MM, Walker SP, Fernald LCH, Andersen CT, DiGirolamo AM, Lu C, et al. Early childhood development coming of age: science through the life course. Lancet. 2017; 6736(16):31389-7. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(16)31389-7
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).
No Brasil, estudos apontam prevalências de 20% a 53% de atraso no desenvolvimento infantil (DI)(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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8. Silva ACD, Engstron E, Miranda C. Fatores associados ao desenvolvimento neuropsicomotor em crianças de 6-18 meses de vida inseridas em creches públicas do Município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11]; 31(9):1881-93. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0102-311X2015000901881&lng=en
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9. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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10. Coelho R, Ferreira JP, Sukiennik R, Halpern R. Child development in primary care: a surveillance proposal. J. Pediatr. (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(5):505-11. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000600505&lng=en
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-1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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), com maior risco entre as crianças pertencentes às famílias mais pobres(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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8. Silva ACD, Engstron E, Miranda C. Fatores associados ao desenvolvimento neuropsicomotor em crianças de 6-18 meses de vida inseridas em creches públicas do Município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11]; 31(9):1881-93. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0102-311X2015000901881&lng=en
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-99. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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,1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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), com mais de três irmãos(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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), nascidas com baixo peso(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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,1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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), de mães que tiveram menos de seis consultas de pré-natal(99. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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), que não foram amamentadas ou receberam leite materno por menos de 3 meses(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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), com mais idade(88. Silva ACD, Engstron E, Miranda C. Fatores associados ao desenvolvimento neuropsicomotor em crianças de 6-18 meses de vida inseridas em creches públicas do Município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11]; 31(9):1881-93. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0102-311X2015000901881&lng=en
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), com risco nutricional(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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) e com ausência do pai(1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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).
A despeito das evidências de que crianças dos grupos económicos menos favorecidos são as que apresentam mais frequentemente atraso no desenvolvimento(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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8. Silva ACD, Engstron E, Miranda C. Fatores associados ao desenvolvimento neuropsicomotor em crianças de 6-18 meses de vida inseridas em creches públicas do Município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11]; 31(9):1881-93. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0102-311X2015000901881&lng=en
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-99. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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,1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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), há dificuldade em explicar a relação entre desigualdade social e problemas no DI, os quais são tratados como resultado de fatores isolados, sem considerar as condições de reprodução social, ou seja, a forma como os diferentes grupos sociais (GS) se vinculam aos processos de trabalho e vida(1212. Soares CB, Yonekura T. The measurement of social class in epidemiology: a systematic review. JBI Database System Rev Implement Rep. 2010;7:S254-70.-1313. Fujimori E, Borges ALV, Sato APS, Trapé CA, Yonekura T. Epidemiologia e saúde coletiva. In: Soares CB, Campos CMS, organizadoras. Fundamentos de saúde coletiva e o cuidado de enfermagem. Barueri: Manole; 2013. p. 173-216.). Considerando que são poucos os estudos que investigam a desigualdade social em saúde nessa vertente teórica, o objetivo deste estudo foi analisar o DI em diferentes GS, conduzido pela hipótese de que as crianças pertencentes a famílias de menor inserção social teriam maior chance de apresentar problemas de desenvolvimento.
MÉTODO
Desenho do estudo
Estudo transversal, descritivo-analítico, de abordagem quantitativa, parte de investigação mais ampla que avaliou o efeito do aconselhamento nutricional sobre práticas alimentares, crescimento e desenvolvimento de crianças menores de 3 anos de idade cadastradas em unidades básicas de saúde (UBS).
População
O estudo foi desenvolvido de fevereiro a abril de 2013, no município de Itupeva, SP, Brasil, em 12 UBS que atendiam um total de 3.904 crianças menores de 3 anos. O cálculo amostral que considerou proporção de 50% de crianças com prática alimentar inadequada, nível de confiança de 95% e margem de erro de 5% indicou a necessidade de 350 crianças. A amostra foi representativa e proporcional ao total de crianças cadastradas em cada UBS.
Critérios de seleção
Considerando os objetivos do projeto maior, os critérios de inclusão foram: criança ser cadastrada na UBS, ter menos de 3 anos e estar acompanhada da mãe biológica para informações sobre a gravidez, parto e puerpério; e de exclusão: gemelares e crianças com síndromes metabólicas, problemas genéticos e/ou neurológicos e anemia falciforme. Das 399 mães abordadas, 358 compuseram a amostra (35 recusas, uma não cadastrada e cinco excluídas). Para este estudo, a amostra foi de 348 crianças, pois 10 entrevistas tiveram alguma perda quanto aos dados socioeconômicos, necessários para compor a equação de classificação dos GS.
Coleta de dados
Os dados foram coletados por 11 enfermeiras e uma estudante de enfermagem, treinadas e supervisionadas. O treinamento foi realizado em 2 dias, e as supervisões eram realizadas semanalmente por uma doutoranda e uma pós-doutoranda em enfermagem. As mães foram abordadas nas UBS, convidadas a participar, e se aceitassem eram entrevistadas com instrumento pré-testado. O DI foi verificado com a Ficha de Acompanhamento do Desenvolvimento proposto pelo Ministério da Saúde(55. Brasil. Ministério da Saúde. Saúde da criança: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil [Internet]. Brasília: MS; 2002 [citado 2018 ago. 03]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/crescimento_desenvolvimento.pdf
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), que se refere a um roteiro de observação para identificação de crianças com “presença de todos os marcos do desenvolvimento infantil esperados para a idade” ou “ausência de algum marco do desenvolvimento infantil (AMDI) esperado para a idade”. A Ficha é organizada em 11 faixas etárias correspondentes aos períodos recomendados para consultas de crianças de 0 a 6 anos de idade. Os marcos foram observados pelas entrevistadoras na sala de consulta, com a presença da mãe. A entrevistadora solicitava e/ou observava a criança executar o marco proposto para a faixa etária, e, quando necessário, a mãe era consultada quanto à aquisição de determinado marco. As crianças foram agrupadas em presença de todos os marcos esperados para a idade, ou AMDI, quando a criança não apresentava nenhum marco do desenvolvimento.
Análise e tratamento dos dados
Os dados foram inseridos em dupla digitação no programa EpiInfo 6.04 e exportados para o software Stata 14.1. Para analisar a associação de AMDI e preditores, realizou-se análise univariada, seguida de regressão logística múltipla, que incluiu variáveis com associação p<0,20 na análise univariada e variáveis de controle, com procedimento stepwise forward selection aplicado a modelo teórico definido a priori, que respeita uma hierarquia que se considera existir entre as variáveis (Figura 1). Nesse modelo conceitual, as variáveis socioeconômicas mais distais exercem efeito sobre as variáveis do nível intermediário, que compreendem as variáveis ambientais, reprodutivas e de atenção à saúde, as quais, em conjunto com as variáveis precedentes, afetam as variáveis individuais do terceiro nível, tais como: aspectos nutricionais (peso ao nascer, medidas antropométricas atuais e alimentação) e histórico de morbidade(1313. Fujimori E, Borges ALV, Sato APS, Trapé CA, Yonekura T. Epidemiologia e saúde coletiva. In: Soares CB, Campos CMS, organizadoras. Fundamentos de saúde coletiva e o cuidado de enfermagem. Barueri: Manole; 2013. p. 173-216.). No presente estudo, adaptou-se esse modelo para três dimensões hierárquicas(1414. Victora CG, Huttly SR, Fuchs SC, Olinto MT. The role of conceptual frameworks in epidemiological analysis: a hierarchical approach. Int J Epidemiol. 1997;26(1):224-7.) e diferentes variáveis: Dimensão dos Processos Estruturais da Sociedade (Bloco social); Dimensão dos Processos do Ambiente Imediato da Criança (Bloco materno/paterno e de atenção pré-natal e parto); e Dimensão dos Processos Individuais da Criança (Bloco infantil).
A variável GS foi construída a partir do Índice de Reprodução Social, que classifica as famílias em quatro GS, de acordo com equações que combinam variáveis relativas às formas de trabalhar (qualificação da ocupação, condição de atividade, curso preparatório para o trabalho e registro em carteira) e formas de viver (propriedade da residência, pagamento de Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU, número de cômodos para dormir, acesso à rede pública de esgoto, acesso à água e eletricidade e culto religioso como atividade de lazer)(1616. Trapé CA. Operacionalização do conceito de classes sociais em epidemiologia crítica: uma proposta de aproximação a partir da categoria de reprodução social [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 2011. DOI: http://dx.doi.org/10.11606/T.7.2011.tde-13022012-145501
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).
Optou-se, neste estudo, por trabalhar com três GS (GS1, GS2, GS3+4), pelo baixo número de famílias classificadas como GS3 e proximidade das características entre os GS3 e GS4. O GS1 foi constituído por famílias mais inseridas socialmente (78% de chefes de família com qualificação profissional, 72% com curso preparatório; 70% com pagamento de IPTU, 88% com água encanada, 96% com eletricidade e 83% com rede de esgoto; 41% com casa própria e 38% alugada, 75% em casa com ≥2 dormitórios; 74% com frequência a culto religioso). O GS2 incluiu famílias com inserção social intermediária (45% de chefes com semiqualificação profissional, 22% com curso preparatório; 32% pagante de IPTU, 90% com água encanada, 96% com eletricidade e 93% com rede de esgoto; 56% com casa alugada, 51% em casa com 1-2 cômodos; 61% com frequência a culto religioso). O GS3+4 foi constituído por famílias menos inseridas socialmente (61% de chefes sem qualificação profissional, 29% com curso preparatório; 28% pagante de IPTU, 60% com água encanada, 77% com eletricidade e 42% com rede de esgoto; 53% com casa alugada e 28% invadida/doada, 80% em casa com 1-2 cômodos; 58% com frequência a culto religioso).
Em relação à variável “Programa de Transferência de Renda”, que também compõe o Bloco social, foram consideradas as famílias inseridas no Programa Bolsa Família(1717. Moraes VD, Machado CV O Programa Bolsa Família e as condicionalidades de saúde: desafios da coordenação intergovernamental e intersetorial. Saúde Debate [Internet]. 2017 [citado 2018 ago. 11];41(n.esp.3):129-43. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042017000700129&lng=en
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).
Na primeira etapa da regressão logística, analisou-se o efeito das variáveis do Bloco social, ou seja, o efeito das políticas sociais e económicas sobre as condições de trabalho e vida da população (GS e Programas de Transferência de Renda). Variáveis com associação significativa continuaram no modelo (p<0,20). Na segunda etapa, incluíram-se as variáveis relativas ao ambiente imediato da criança. Permaneceram, na terceira etapa, variáveis desse nível com p<0,20, acrescidas das variáveis pertencentes à dimensão dos processos individuais da criança. Mantiveram-se, no modelo final múltiplo, variáveis com nível de 5% de significância (p<0,05). A força de associação entre as variáveis dependentes e independentes foi avaliada pelo odds ratio (OR), na análise univariada (OR bruta) e múltipla (OR ajustada) e respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%).
Aspectos éticos
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo sob o Parecer n.° 193.468/13 e autorizado pela Diretoria de Saúde do município, de acordo com as determinações da Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a ética em pesquisa envolvendo seres humanos no Brasil.
RESULTADOS
Do total de 348 crianças que participaram do estudo, constatou-se que 29% (n=101) apresentavam AMDI esperado para a idade. A Tabela 1 mostra que a grande maioria dessas crianças (88,1%) pertencia a famílias do GS2 (42,6%) e GS3+4 (45,5%).
Distribuição das crianças segundo variáveis da Dimensão dos Processos Estruturais da Sociedade (Bloco social) e AMDI -Itupeva, SP, Brasil, 2013.
Na Tabela 2, verifica-se que nenhuma variável da Dimensão dos Processos do Ambiente Imediato da Criança (Bloco materno/paterno e de atenção pré-natal e parto) associou-se estatisticamente com AMDI (p<0,05).
Distribuição das crianças segundo variáveis da Dimensão dos Processos do Ambiente Imediato da Criança (Bloco materno/paterno e de atenção pré-natal e parto) e AMDI - Itupeva, SP, Brasil, 2013.
Em relação às variáveis da Dimensão dos Processos Individuais da Criança (Bloco infantil), as associações estatisticamente significativas (p<0,05) apontaram que, das crianças com AMDI, a maior proporção tinha 12 meses ou mais, havia nascido com peso adequado, não havia sido internada no último ano e não tinha sido amamentada (Tabela 3).
Distribuição das crianças segundo variáveis da Dimensão dos Processos Individuais da Criança (Bloco infantil) e AMDI -Itupeva, SP, Brasil, 2013.
A Tabela 4 apresenta a análise univariada e múltipla da AMDI e as variáveis associadas no modelo final de regressão logística múltipla. As variáveis com p<0,20 na análise univariada foram GS, faixa etária, peso ao nascer, internação nos últimos 12 meses e amamentação. No modelo final, permaneceram associadas ao desfecho apenas as variáveis: GS e faixa etária, com maiores chances para ausência de algum marco do DI, crianças do GS2 (OR:2,37;1,05-5,35) e GS3+4 (OR:2,64; IC:1,18-5,91); e crianças com idade maior ou igual a 12 meses (OR:4,17;2,45-7,08).
Análise univariada e múltipla final da AMDI de acordo com as variáveis associadas no modelo final de regressão logística múltipla - Itupeva, SP, Brasil, 2013.
DISCUSSÃO
Além da elevada prevalência de crianças com AMDI, os resultados mostraram que os GS mantiveram efeito independente sobre o DI. As crianças dos GS menos inseridos socialmente apresentavam chance duas vezes maior de AMDI, comparadas às crianças do GS mais inserido socialmente, o que confirma a hipótese do estudo.
Assim, os resultados evidenciaram que a forma de inserção das famílias no trabalho, que determina o consumo e acesso à moradia, saneamento, alimentação, educação e assistência à saúde, também determina a forma como se dá o desenvolvimento da criança. A dificuldade de inserção no mercado de trabalho ou desigualdade de remuneração entre a camada da população considerada ‘qualificada’ em relação ao trabalhador ‘semi’ ou ‘desqualificado’, atrelada a condições precárias de habitação, falta de acesso à cultura e lazer e políticas igualitárias de saúde, geram um ciclo de pobreza e doença(1212. Soares CB, Yonekura T. The measurement of social class in epidemiology: a systematic review. JBI Database System Rev Implement Rep. 2010;7:S254-70.-1313. Fujimori E, Borges ALV, Sato APS, Trapé CA, Yonekura T. Epidemiologia e saúde coletiva. In: Soares CB, Campos CMS, organizadoras. Fundamentos de saúde coletiva e o cuidado de enfermagem. Barueri: Manole; 2013. p. 173-216.).
Outros estudos já estabeleceram a relação entre problemas no DI e condições socioeconômicas das famílias, embora com uso de métodos e instrumentos diversos para avaliar a condição social(1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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19. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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-2020. Noble KG, Engelhardt LE, Brito NH, Mack LJ, Nail EJ, Angal J, et al. Socioeconomic disparities in neurocognitive development in the first two years of life. Dev Psychobiol. 2015;57(5):535-51. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/dev.21303
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). Em Pelotas (RS), identificou-se que os mais pobres apresentavam chance 1,5 vezes maior de terem suspeita de atraso no desenvolvimento(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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). Resultados ainda mais surpreendentes foram encontrados em Canoas (RS), com as crianças pertencentes a famílias que recebiam de zero a um salário mínimo e apresentaram chance 9,3 vezes maior de suspeita de atraso no desenvolvimento(2121. Pilz EML, Schermann LB. Determinantes biológicos e ambientais no desenvolvimento neuropsicomotor em uma amostra de crianças de Canoas/RS. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2007 [citado 2018 ago. 11];12(1):181-90. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232007000100021&lng=en
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). Outros estudos, também realizados no sul do país, identificaram que crianças com atraso no DI faziam parte de famílias de mais baixa renda(99. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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,1111. Araujo LB, Melo TR, Israel VL. Low birth weight, family income and paternal absence as risk factors in neuropsychomotor development. J Hum Growth Dev [Internet]. 2017 [cited 2018 Aug 11];27(3):272-80. Available from: http://www.revistas.usp.br/jhgd/article/view/124072
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).
Nenhuma das variáveis do segundo e terceiro bloco do modelo hierárquico manteve-se associada ao desfecho no modelo final de regressão. Vale salientar que outros estudos têm constatado associação entre DI e pré-natal(99. Veleda AA, Soares MCF, Cézar-Vaz MR. Fatores associados ao atraso no desenvolvimento em crianças, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Gaúcha Enferm (Online) [Internet]. 2011 [citado 2018 ago. 11];32(1):79-85. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472011000100010&lng=en
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,1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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-1919. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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), que se justifica, pois a atenção pré-natal de qualidade associa-se à redução das taxas de nascimento prematuro e de baixo peso e aumenta a adesão à amamentação, o que contribui para a promoção do DI(1919. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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,2222. Balbi B, Carvalhaes MABL, Parada CMGL. Tendência temporal do nascimento pré-termo e de seus determinantes em uma década. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2016 [citado 2018 ago. 11];21(1):233-41. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232016000100233&lng=pt
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). A não observação de tal associação no presente estudo pode estar relacionada à adesão de quase a totalidade das mulheres ao pré-natal, com realização de seis ou mais consultas.
Em relação ao nível hierárquico seguinte, a única variável que manteve associação independente no modelo múltiplo final foi a faixa etária, pois a chance de apresentar AMDI aumentou com a idade da criança. Resultado semelhante foi encontrado em avaliação de 150 crianças de 24 a 60 meses, a qual constatou maior proporção de alterações com o aumento da idade(2323. Pinto CAP, Isotani SM, Sabatés AL, Perissinoto J. Denver II: comportamentos propostos comparados aos de crianças paulistanas. Rev CEFAC [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11];17(4):1262-9. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-18462015000401262&lng=en
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). Estudo realizado com 438 crianças de 4 e 5 anos, frequentadoras de creche pública de Feira de Santana (BA), encontrou prevalência mais elevada de desempenho considerado “anormal” entre as crianças de 5 anos, com chance 1,4 vezes maior(2424. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças frequentadoras de creche. Rev Paul Pediatr [Internet]. 2007 [citado 2018 ago. 11];25(4):337-42. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-05822007000400007&lng=en
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). Tal diferença poderia ser explicada pelo acúmulo de situações desfavoráveis, como a falta de estímulo em idades anteriores, e exposição a condições sociais e ambientais desfavoráveis(1919. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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).
Nesse mesmo nível hierárquico, as variáveis peso ao nascer, amamentação e internação nos últimos 12 meses associaram-se ao desfecho apenas na análise univariada, perdendo o efeito na análise ajustada, diferentemente dos resultados encontrados em outros estudos(88. Silva ACD, Engstron E, Miranda C. Fatores associados ao desenvolvimento neuropsicomotor em crianças de 6-18 meses de vida inseridas em creches públicas do Município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015 [citado 2018 ago. 11]; 31(9):1881-93. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0102-311X2015000901881&lng=en
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,1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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). O peso ao nascer tem sido identificado como fator isolado importante na determinação de alterações do DI(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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). No presente estudo, as crianças nascidas com baixo peso apresentaram chance duas vezes maior para AMDI na análise univariada, o que não se manteve no modelo final, diferentemente do observado entre crianças de 24 a 36 meses, frequentadoras de educação infantil(1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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). Poderia se cogitar que tal resultado esteja relacionado à colinearidade entre variáveis, pois essa variável tem importante aproximação com as condições sociais, de forma que a ocorrência do baixo peso foi maior nos GS menos favorecidos, ou seja, as crianças nascidas com menor peso pertenciam aos GS menos favorecidos, o que pode ter contribuído para que o efeito do baixo peso desaparecesse na análise ajustada.
Também, na análise univariada, as crianças que não foram amamentadas apresentaram chance 2,5 vezes maior para AMDI, porém esse efeito desapareceu na análise ajustada. Em outro estudo, crianças que nunca mamaram apresentavam chance 88% maior de teste suspeito de atraso no desenvolvimento, resultado que se manteve na análise ajustada(77. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Risk factors for suspicion of developmental delays at 12 months of age. J Pediatr (Rio J) [Internet]. 2000 [cited 2018 Aug 11];76(6):421-8. Available from: http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-06-421/ing.asp
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). Há que se considerar evidências de que as crianças amamentadas certamente têm melhor desempenho no seu desenvolvimento cognitivo e são menos expostas a infec-ções e hospitalizações(2525. Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms and lifelong effect. Lancet. 2016;387(10017):475-90. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7
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), situações essas que, por sua vez, prejudicam o DI.
Realmente, crianças com histórico de internação hospitalar nos últimos 12 meses apresentaram chance duas vezes maior para AMDI na análise univariada, mas que também não se manteve na análise múltipla. Apesar disso, considera-se que essa condição representa ruptura com o meio social e com atividades e hábitos rotineiros da criança, o que pode provocar atraso ou interrupção no processo de DI, além de se constituir em uma situação de estresse, pelos procedimentos e desconfortos vivenciados(2626. Bortolote GS, Brêtas JRS. O ambiente estimulador ao desenvolvimento da criança hospitalizada. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2008 [citado 2018 ago. 11];42(3):422-429. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342008000300002&lng=en
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).
Em síntese, das variáveis do bloco infantil que se associaram com o desfecho na análise univariada, somente a idade se manteve no modelo ajustado final, reforçando o predomínio da força de associação das variáveis sociais. De fato, em relação ao desenvolvimento de funções cognitivas, por exemplo, o impacto dos fatores biológicos, incluindo adversidades pré-natais e perinatais, parecem exercer maior influência na idade escolar, enquanto a influência dos fatores sociais predominam nas idades mais precoces(1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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-1919. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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).
Embora não exista uniformidade quanto à metodologia para a avaliação da desigualdade social, existe certa convergência dos resultados que evidencia a importância das condições sociais e ambientais no prognóstico do DI e a complexidade dos mecanismos envolvidos(1818. Neves KR, Morais RLS, Teixeira RA, Pinto PA. Growth and development and their environmental and biological determinants. J. Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):241-50. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300241&lng=en
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19. Hadders-Algra M. Social and biological determinants of growth and development in underprivileged societies. J Pediatr (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(3):217-19. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000300217&lng=en
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-2020. Noble KG, Engelhardt LE, Brito NH, Mack LJ, Nail EJ, Angal J, et al. Socioeconomic disparities in neurocognitive development in the first two years of life. Dev Psychobiol. 2015;57(5):535-51. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/dev.21303
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). É nesse âmbito que o presente estudo avança, ao utilizar um índice de Reprodução Social, que considera as formas de trabalhar e de viver e classifica as famílias em GS, a partir das condições de trabalho, inserção na comunidade, condições de habitação e acesso à cultura e lazer.
Os resultados obtidos ratificam, pois, que, para reduzir as desigualdades no DI e na saúde de forma geral, é necessário combater a pobreza e a desigualdade social, económica, de trabalho e de lazer e cultura que molda a sociedade, condições essenciais para uma vida saudável em ambientes saudáveis e fundamentais para a melhoria da qualidade das experiências nos primeiros anos de vida(2727. Marmot M, Allen JJ. Social determinants of health equity. Am J Pub Health. 2014;104 Suppl 4:S517-9. DOI: http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2014.302200
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-2828. Richter LM, Daelmans B, Lombardi J, Heymann J, Boo FL, Behrman JR, et al. Investing in the foundation of sustainable development: pathways to scale up for early childhood development. Lancet. 2017;389(10064):103-118. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(16)31698-1
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).
No presente estudo, a classificação de crianças com AMDI e a sua prevalência devem ser interpretadas com cautela, pois não se utilizou um teste de avaliação, mas, sim, um instrumento para acompanhamento do DI na atenção primária, o que pode representar uma limitação do estudo. No entanto, a alta prevalência de crianças com AMDI representa alerta importante para a prevenção de potenciais atrasos no DI.
O Ministério da Saúde já manifesta essa preocupação desde a década de 1980, porém os estudos evidenciam que o acompanhamento do desenvolvimento não se encontra consolidado na prática dos profissionais da atenção básica(2929. Palombo CNT, Duarte LS, Fujimori E, Toriyama ATM. Use and records of child health handbook focused on growth and development. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2014 [cited 2018 Aug 11];48(n.spe):59-66. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342014000700059&lng=en
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-3030. Almeida AC, Mendes LC, Sad IR, Ramos EG, Fonseca VM, Peixoto MVM. Use of a monitoring tool for growth and development in Brazilian children - systematic review. Rev Paul Pediatr [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];34(1):122-31. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-05822016000100122&lng=en
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). Considerando que a detecção precoce de problemas no DI ajuda a prevenir agravos que podem se tornar irreversíveis, é imprescindível que a equipe de Enfermagem dos serviços de atenção primária avalie, acompanhe e principalmente amplie e fortaleça as ações de vigilância e promoção do DI em todas as oportunidades: consultas de puericultura, visitas domiciliares, atendimento em outros equipamentos sociais (escolas, creches, centros de referência em assistência social, igrejas, clubes) e até mesmo na administração de vacinas. Somente com um processo contínuo de vigilância é que se poderá iniciar os encaminhamentos e as intervenções com o menor ónus possível para a saúde da criança(1010. Coelho R, Ferreira JP, Sukiennik R, Halpern R. Child development in primary care: a surveillance proposal. J. Pediatr. (Rio J.) [Internet]. 2016 [cited 2018 Aug 11];92(5):505-11. Available from: http://www.scielo.br/scielo.plip?script=scLarttext&pid=S0021-75572016000600505&lng=en
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).
Para uma melhor abordagem, o profissional da equipe de Enfermagem deve ter uma visão ampla do desenvolvimento e observar a rede de determinantes sociais associada a atrasos no DI. Além disso, esse tema deve constituir prioridade política, com compromisso de toda a sociedade para a superação das desigualdades sociais e em saúde.
CONCLUSÃO
A prevalência de AMDI em crianças menores de 3 anos cadastradas na rede de atenção básica mostrou-se elevada, notadamente entre crianças de famílias com menor inserção social e com mais idade. Apesar de o DI ter sido verificado com instrumento de vigilância, o resultado evidencia a importância de se identificar o mais precocemente possível as falhas na aquisição de algum marco do desenvolvimento, com vistas a minimizar os efeitos negativos decorrentes dessa condição. Para tanto, há necessidade urgente de estratégias efetivamente implementadas: acompanhamento e promoção do DI pela equipe de Enfermagem da atenção primária, como parte da atenção integral à criança, em toda e qualquer oportunidade que se apresente, com o preenchimento do instrumento de vigilância; realização de pré-natal de qualidade para prevenção de baixo peso ao nascer; promoção do aleitamento materno exclusivo até os 6 meses e sua manutenção até os 24 meses; e prevenção de doenças e internações. Ademais, considerando que o DI decorre da interação de características biológicas e condições socioambientais, atreladas à família, ao ambiente e à sociedade, reitera-se a necessidade de políticas e programas voltados para o combate às iniquidades sociais para a prevenção de problemas no DI, que se agrava com a idade.
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Extraído da tese: “Avaliação do Desenvolvimento Infantil com Foco nos Determinantes Sociais”, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, 2018.
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Apoio financeiroFundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV), Processo n° 509309/2011. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq), Processo n° 480255/2012-1.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
2 Dez 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
-
Recebido
17 Ago 2018 -
Aceito
22 Jan 2019