Doença de parkinson na atenção primária à saúde e o cuidado de enfermagem: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo:

mapear e analisar a literatura científica acerca dos cuidados de enfermagem direcionados às pessoas com doença de Parkinson na Atenção Primária à Saúde.

Método:

revisão de escopo utilizando a metodologia do Joanna Briggs Institute, realizada entre julho e outubro de 2020, e atualizada em novembro de 2021 em seis bases de dados, a partir dos descritores cuidados de enfermagem e doença de Parkinson, e seus respectivos acrônimos e sinônimos em inglês, português e espanhol.

Resultados:

foram incluídas 44 publicações nesta revisão, que identificaram como cuidados de enfermagem na Atenção Primária: avaliação das funções motoras e funções não motoras; gerenciamento das Atividades de Vida Diária e das Atividades Instrumentais de Vida Diária; educação para autogestão da doença para pessoas com Parkinson e seus parceiros de cuidado; abordagem supervisionada em grupo; e gerenciamento dos fatores pessoais.

Conclusão:

os cuidados de enfermagem à pessoa com Parkinson no âmbito primário envolvem, essencialmente, ações que incluem prestar cuidados centrados em nível individual e em grupo, abrangendo avaliação clínica, educação do paciente, envolvimento deste no contexto social do cuidado e desenvolvimento de relacionamentos positivos com os familiares e cuidadores.

DESCRITORES
Enfermagem; Cuidados de Enfermagem; Doenças Não Transmissíveis; Doença de Parkinson; Atenção Primária à Saúde; Revisão

ABSTRACT

Objective:

to map and analyze the scientific literature on nursing care aimed at people with Parkinson’s disease in Primary Health Care.

Method:

this is a scoping review using the Joanna Briggs Institute methodology, carried out between July and October 2020, and updated in November 2021 in six databases from nursing care and Parkinson’s disease descriptors, and their respective acronyms and synonyms in English, Portuguese and Spanish.

Results:

a total of 44 publications were included in this review, which identified as nursing care in Primary Care: assessment of motor and non-motor functions; management of activities of daily living and instrumental activities of daily living; disease self-management education for people with Parkinson’s and their care partners; supervised group approach; and personal factor management.

Conclusion:

Nursing care for people with Parkinson’s at the primary level essentially involves actions that include providing focused care at an individual and group level, encompassing clinical assessment, patient education, patient involvement in the social context of care, and developing positive relationships with family members and caregivers.

DESCRIPTORS
Nursing; Nursing Care; Noncommunicable Diseases; Parkinson Disease; Primary Health Care; Review

RESUMEN

Objetivo:

mapear y analizar la literatura científica sobre el cuidado de enfermería dirigido a personas con enfermedad de Parkinson en la Atención Primaria de Salud.

Método:

una revisión del alcance utilizando la metodología del Joanna Briggs Institute, realizada entre julio y octubre de 2020, y actualizada en noviembre de 2021 en seis bases de datos, de los descriptores cuidado de enfermería y enfermedad de Parkinson, y sus respectivas siglas y sinónimos en inglés, portugués y español.

Resultados:

en esta revisión se incluyeron 44 publicaciones, que identificaron como cuidados de enfermería en Atención Primaria: evaluación de las funciones motoras y no motoras; gestión de Actividades de la Vida Diaria y Actividades Instrumentales de la Vida Diaria; educación para el autocontrol de enfermedades para personas con Parkinson y sus cuidadores; enfoque de grupo supervisado; y manejo de factores personales.

Conclusión:

la atención de enfermería a las personas con Parkinson en el nivel primario implica esencialmente acciones que incluyen brindar cuidados enfocados a nivel individual y grupal, incluyendo la evaluación clínica, educación del paciente, participación del paciente en el contexto social de la atención y desarrollo de relaciones positivas con los miembros de la familia y los cuidadores.

DESCRIPTORES
Enfermería; Atención de Enfermería; Enfermedades no Transmisibles; Enfermedad de Parkinson; Atención Primaria de Salud; Revisión

INTRODUÇÃO

O atual cenário de saúde, com mudanças epidemiológicas, envelhecimento da população e aumento da prevalência das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), impõe ao enfermeiro buscar graus avançados de conhecimento e habilidades sobre a prática clínica na Atenção Primária à Saúde (APS), em prol da implementação de abordagem de cuidado integral que associe os esforços em gerenciar incapacidades físicas e psicossociais da doença, ao mesmo tempo em que promove a prestação de cuidados de saúde e bem-estar ao longo da vida dos usuários e suas famílias(¹).

Dentre as DCNT, as doenças neurodegenerativas, juntamente com o rápido envelhecimento das populações, apresentam-se como desafios para o sistema de saúde, uma vez que os pacientes exigem cuidados e terapias especiais para enfrentar o impacto das limitações funcionais nas Atividades de Vida Diária (AVD) e participação social(²). Em relação às doenças neurodegenerativas, destaca-se a doença de Parkinson (DP) por sua incidência e prevalência, condição neurológica progressiva crônica causada pela perda de neurônios dopaminérgicos na Substantia Nigra pars Compacta (SNc)(³).

Entre os profissionais de saúde, os enfermeiros têm sido reconhecidos como profissionais-chave no primeiro contato do paciente com a assistência à saúde e no cuidado à pessoa com DP. São capazes de colaborar, juntamente com outros membros da equipe de saúde, para melhorar a qualidade de vida por meio de plano de cuidado padronizado que pode incluir necessidades de mobilidade, eliminação e repouso/sono, fornecendo cuidados na promoção da saúde e prevenção de complicações relacionadas ao processo neurodegenerativo da doença(⁴,⁵).

Entretanto, apesar da variedade de estudos sobre o assunto na área hospitalar, centros especializados de neuroreabilitação e cenários específicos de atuação do enfermeiro especialista em DP, tem havido pouca discussão sobre a prática de enfermagem às pessoas afetadas com a doença na APS(⁵). As intervenções mais descritas na literatura pelos especialistas em enfermagem em DP no âmbito primário APS envolvem habilidades de autogerenciamento, que se concentram principalmente na educação, apoio emocional(⁴) e cuidados paliativos(⁵). A relevância deste estudo está na possibilidade de ampliar o conhecimento sobre as práticas do enfermeiro de cuidados primários, e compreender as atribuições e implicação deste profissional na continuidade do cuidado das pessoas com DP nesse contexto de saúde.

Por este motivo, foi realizada revisão de escopo com o objetivo de mapear e analisar a literatura científica acerca dos cuidados de enfermagem direcionados às pessoas com DP na APS.

MÉTODO

Trata-se de revisão de escopo, conduzida de acordo com as diretrizes metodológicas do Joanna Briggs Institute (JBI)(⁶) para scoping review e relatada de acordo com a declaração Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR). A abordagem não se desviou do protocolo de revisão de escopo publicado anteriormente(⁷).

Identificação a Questão de Pesquisa

A pergunta de revisão foi formulada de acordo com o mnemônico PCC. Os elementos da questão foram os seguintes: P – População = pessoas com DP; C – Conceito = cuidados de enfermagem à pessoa com DP; C – Contexto = APS. A questão de pesquisa foi, portanto: quais os cuidados de enfermagem realizados às pessoas com DP no contexto da APS?

Fontes de Informação e Critério de Inclusão

Esta revisão de escopo considerou estudos primários quantitativos, qualitativos e métodos mistos e todos os tipos de estudos secundários, como revisões sistemáticas, de escopo, integrativa, narrativas, entre outros. Além disto, esta revisão considerou estudos explorando cuidados realizados por enfermeiro sozinho ou em abordagem multiprofissional. Foram incluídos artigos em inglês, espanhol e português, e não houve restrição quanto aos critérios de diagnóstico de DP. Nenhuma restrição de data de publicação foi feita, pois o objetivo da revisão foi relatar toda a literatura relevante.

Publicações que não detalharam atribuições ou cuidados de enfermagem à pessoa com DP, ou aquelas em que os cuidados de enfermagem ocorreram em contextos de recrutamento, como centro de reabilitação, hospital ou lar de idosos/instituições de longa permanência ou similares, e estudos com foco no ensino de enfermagem não foram incluídos.

Estratégias de Busca

Seguindo as recomendações da abordagem do JBI, utilizaram-se três etapas para a estratégia de busca. Em primeiro lugar, pesquisa prévia limitada no PROSPERO, Cochrane Database of Systematic Reviews, JBI Evidence Synthesis, Public MEDLINE (PubMed) e Cumulative Index to Nursing & Allied Health Literature (CINAHL) foi realizada para identificar artigos sobre o tema e analisar as palavras de texto contidas no título e resumo. Os termos de índice usados para descrever os artigos foram usados para desenvolver estratégia de busca completa. Nenhuma revisão sistemática ou de escopo abordando a questão da revisão foi identificada.

Em segundo lugar, foi realizada pesquisa usando as palavras-chave e termos de índice identificados nas bases de dados incluídas: PubMed, CINAHL, Web of Science (WoS), SciVerse Scopus (Scopus), Base de Dados de Enfermagem (BDENF), Literatura Latino-Americano e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO), entre os meses de julho e outubro de 2020, atualizadas em novembro de 2021. Em terceiro lugar, as listas de referência de todos os documentos identificados foram pesquisadas por estudos relevantes, contudo não foram encontradas referências adicionais para inclusão.

A fim de maximizar a exatidão da pesquisa, as buscas foram elaboradas em colaboração com bibliotecária especialista em ciências da saúde, projetando cabeçalhos de assuntos médicos da MEDLINE (MeSH), Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), e termos e palavras-chave foram adaptados a cada bases de dados pesquisadas de acordo com tais descritores.

Destaca-se que o descritor “Atenção Primária à Saúde” e seus termos relacionados foram utilizados em uma primeira estratégia de busca, no entanto, devido ao reduzido número de artigos encontrados, optou-se, em conjunto com a bibliotecária, retirar tais termos, sendo analisado o contexto da APS nos títulos e resumos como um dos critérios de inclusão para seleção dos manuscritos. A estratégia de busca para cada base de dados é listada no Quadro 1.

Quadro 1.
Estratégia de busca nas bases de dados. Florianópolis, SC, Brasil, 2020.

Seleção dos Estudos

Após a pesquisa, dois revisores independentes importaram os registros identificados para o Mendeley Web Importer, para gerenciamento das referências e remoção das duplicatas. Títulos e resumos foram, então, rastreados para avaliação de acordo com os critérios de inclusão. O texto completo dos estudos selecionados foi recuperado e avaliado em detalhes utilizando os mesmos critérios.

Extração de Dados

Os dados dos artigos incluídos foram extraídos usando ferramenta de extração de dados desenvolvida para esta revisão de escopo e publicada previamente no protocolo. Os dados extraídos incluíram informações específicas sobre título, ano de publicação, país de origem, delineamento, número de participantes no estudo, área do cuidado de enfermagem abordada e atividades de enfermagem realizadas.

Dois revisores treinados extraíram independentemente os dados das publicações. Quaisquer divergências que surgiram entre os dois revisores foram resolvidas por meio de discussão ou com terceiro revisor.

Síntese dos Dados

Seguindo as recomendações da JBI para análise, os dados extraídos foram agrupados para refletir os temas principais ou recorrentes relacionados ao objetivo da revisão que, neste caso, eram os cuidados realizados pelos enfermeiros no contexto da APS. Analisamos os estudos incluídos em cada área de cuidado fundamental, para identificar quais cuidados de enfermagem foram explorados com mais frequência(⁸). Os resultados são apresentados em quadros e figura em formato descritivo, acompanhados de síntese narrativa.

RESULTADOS

A pesquisa resultou inicialmente em 5.670 publicações, das quais 4.477 permaneceram para o processo de seleção por títulos e resumos após a remoção das duplicatas. Nesta etapa, 4.381 foram excluídos, por não atenderem aos critérios pré-estabelecidos, resultando na seleção de 96 estudos para avaliação em texto completo. Nesta fase, 52 estudos foram excluídos pelos motivos listados na Figura 1. Por fim, foram incluídos, nesta revisão, 44 artigos que atenderam aos critérios de elegibilidade. A Figura 1 apresenta o processo de seleção detalhado.

Figura 1.
Diagrama de fluxo do processo de seleção dos estudos para a revisão de escopo adaptado do Preferred Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses (PRISMA). Florianópolis, SC, Brasil, 2021.

Características dos Estudos Incluídos

A revisão foi composta por 44 publicações, publicadas entre 1971 e 2021. 43 estudos eram unicêntricos, sendo a maioria dos Estados Unidos da América (n = 17), seguido por Reino Unido (n = 8), Coreia do Sul (n = 4), Brasil (n = 3) e Espanha (n = 2), além de Canadá, Itália, Alemanha, Dinamarca, Suécia, Holanda, Turquia, Singapura, Hong Kong, com um estudo cada. Apenas um estudo foi multicêntrico, com parceria entre os centros do Japão, Tailândia, Canadá, Dinamarca, Reino Unido e Holanda.

Há interesse e pesquisa crescentes na área com destaque para os anos de 2019–2020. Cronologicamente, os três primeiros estudos analisados nesta revisão foram realizados nos Estados Unidos, sendo o primeiro um relato de caso de paciente com DP com data de 1971, e, em seguida, somente após 16 anos, outro estudo relacionado à temática foi realizado, tratando-se de estudo experimental.

Quanto ao método utilizado, treze eram estudos quantitativos, doze eram revisões narrativas, sete eram qualitativos, sete eram relatos de caso, três eram revisões sistemáticas de literatura e um era estudo de métodos mistos. Os estudos incluídos tiveram como alvo pessoas com diagnóstico de DP e/ou seus familiares/cônjuges/cuidadores, contudo poucos consideraram o estágio clínico da DP ao detalhar o recrutamento da amostra. Detalhes podem ser encontrados no Quadro 2.

Quadro 2.
Características dos estudos incluídos na revisão de escopo. Florianópolis, SC, Brasil, 2021.

Cuidados de Enfermagem

Quinze estudos incluídos nesta análise de escopo eram revisões, consequentemente, a maioria das ações realizadas compreendeu mais de uma área de cuidado de enfermagem. Os resultados indicaram que os enfermeiros possuem como foco a melhoria do bem-estar da pessoa com DP, e seus parceiros de cuidado, por meio da avaliação da saúde, gerenciamento das incapacidades funcionais e educação em saúde. Os cuidados de enfermagem e descrição de atividades de enfermagem realizadas à pessoa com DP na APS podem ser encontrados na Figura 2.

Figura 2.
Cuidados de enfermagem e descrição de atividades de enfermagem realizadas a pessoas com Parkinson na Atenção Primária. Florianópolis, SC, Brasil, 2021.

Avaliação das Funções Motoras e Funções Não Motoras

Os estudos(¹¹,¹³,¹⁵,¹⁸,²⁷,³⁰–³³,³⁵,³⁹,⁴⁰,⁴⁴–⁴⁷,⁴⁹) sobre avaliação das funções motoras e funções não motoras revelaram que é necessário habilidades avaliativas da condição clínica, rastreamento dos sintomas motores e não motores nos vários estágios da doença e avaliação global por meio das escalas específicas, como a Movement Disorder Society Unified Parkinson’s Disease Rating Scale, Part III Motor Examination (MDS-UPDRS-III), Parkinson’s Disease Questionnaire–8 (PDQ-8), Parkinson’s Disease Questionnaire–39 (PDQ-39), bem como a utilização de testes de avaliação dos domínios físico e cognitivo, como Timed Up and Go test (TUG), Montreal Cognitive Assessment (MoCA) e escalas de depressão.

Gerenciamento das Atividades de Vida Diária e Das Atividades Instrumentais da Vida Diária

Os resultados(¹⁴,¹⁷,²⁶,³⁵,⁴³) evidenciaram o suporte de autocuidado como estratégia importante para melhorar a autonomia e o bem-estar das pessoas com DP, sendo que os temas mais explorados enfocaram melhorar a educação em saúde ao autocuidado para alimentação, banho, higiene íntima e para o vestir-se. Através da avaliação clínica, e treinamento os enfermeiros poderão acompanhar as AVD e atividades instrumentais de vida diária (AIVD) das pessoas com DP, para auxiliá-los na promoção da independência e desempenho das tarefas domésticas.

Outro ponto em comum, citado nos estudos(¹⁷,²⁴), mas, em menor frequência, foi a habilidade do enfermeiro em instruir a pessoa com DP a lidar com o estresse e outras exigências psicológicas, uma vez que as discinesias e complicações motoras podem levar ao impacto nas atividades ou interações sociais de pessoas que vivenciam os efeitos debilitantes da doença.

Educação Para Autogestão da Doença Para Pessoas Com Doença de Parkinson e Seus Parceiros de Cuidado

As evidências(¹³,¹⁴,¹⁷,¹⁸,²¹–²⁴,²⁸,³⁰,³³–⁴²,⁴⁴–⁴⁶,⁴⁸,⁵⁰,⁵²) clínicas disponíveis sobre a educação, para autogestão da doença para pessoas com DP e seus parceiros de cuidado, envolvem promover a saúde dos familiares e cuidadores, proporcionando educação familiar(¹³,¹⁴,²⁴,³⁷,⁴¹,⁴⁴,⁴⁸,⁵⁰) e espaço seguro de compartilhamento para conversas sobre assuntos delicados que envolvem, desde questões sexuais do casal após o diagnóstico da doença, a assuntos relacionados a cuidados paliativos para pacientes em fim de vida(³⁹).

Os achados(²¹,²⁸,³⁶,⁴⁶) apontam que, para a promoção da educação para autogestão da doença, é necessário conhecer a funcionalidade familiar, o acesso aos recursos comunitários, a rede social de apoio e o rastreamento da participação de cada indivíduo envolvido, sendo parte do cuidado de enfermagem e relacionados diretamente com a qualidade de vida da pessoa com DP.

Outro aspecto relevante na educação para autogestão voltada às pessoas com DP e seus parceiros de cuidado diz respeito à realização de visitas domiciliares. Os estudos revisados indicaram que, na equipe interdisciplinar, os enfermeiros lideram o atendimento domiciliar e são responsáveis por gerenciar a promoção de ambiente domiciliar seguro. As atividades implicam acompanhar as mudanças nos sintomas, problemas com a medicação, identificar pessoas com alto risco de quedas e questões relacionadas ao apoio social e saúde da pessoa com DP e seus familiares.

Abordagem Supervisionada em Grupo

A atividade supervisionada em grupo demonstrou ser cuidado colaborativo para alcançar mudanças positivas nos resultados de saúde da pessoa com DP. As atividades de enfermagem descritas nos estudos estavam relacionadas ao treinamento físico-funcional(¹⁹,²⁹,⁵¹), à promoção da socialização(¹²,²⁵,⁴²,⁵²), a reuniões de grupo de apoio e ajuda mútua(⁴²), e ao programa de mindfulness yoga para redução da ansiedade(²⁵).

Entretanto, os sete artigos(¹²,¹⁹,²⁵,²⁹,⁴²,⁵¹,⁵²) inseridos no tema subestimaram os cuidados coletivos na DP, pois as ações descritas nos estudos não se aprofundam em caracterizar a situação da saúde do território, comprometendo a construção conjunta do diagnóstico da área e a identificação das reais atividades de promoção da saúde, ações intersetoriais, de participação e controle social para as pessoas que convivem com a doença, aspectos importantes na realização de atividades supervisionadas em grupo.

Gerenciamento dos Fatores Pessoais

Nesta revisão, o gerenciamento dos fatores pessoais(¹¹,¹³,¹⁴,¹⁶,¹⁸,²⁰,²⁴,²⁶,³⁰,³¹,³⁷,³⁸,⁴³–⁴⁵,⁴⁷–⁴⁹) foi percebido como aspecto fundamental do cuidado de enfermagem para proporcionar resultados significativos aos sintomas motores e neuropsiquiátricos, melhorando os escores da qualidade de vida das pessoas com DP. Os cuidados consistiram em: conhecer e avaliar as condições clínicas e sociais; fornecer informações das rotinas diárias; gerenciar o tratamento de acordo com as metas de cuidados predefinidas(¹⁶,¹⁸,³³,³⁷), com enfoque no aconselhamento comportamental(¹³,¹⁴,²⁰,²⁴,²⁶,³⁰,⁴⁵,⁴⁹); e identificar os problemas de saúde(¹⁴,³⁸).

DISCUSSÃO

A DP é um distúrbios neurodegenerativos que inclui ampla gama de sintomas motores e não motores, que pode levar a impacto no bem-estar dos indivíduos que vivem com a doença(³). Por isto, os enfermeiros devem estar cientes das questões envolvidas na progressão da doença ao fornecer cuidados à pessoa com DP e seus familiares. Esta revisão de escopo identificou 44 estudos sobre cuidados de enfermagem para atender às necessidades das pessoas com DP no âmbito da APS, que visam: avaliação das funções motoras e funções não motoras; gerenciamento das AVD e das AIVD; educação para autogestão da doença para pessoas com DP e seus parceiros de cuidado; abordagem supervisionada em grupo, e gerenciamento dos fatores pessoais, demonstrando assim, a complexidade em relação aos cuidados de enfermagem.

Os resultados demonstraram que enfermeiros de cuidados primários desempenham papel essencial na otimização da funcionalidade e bem-estar das pessoas com DP, ao fornecer cuidado de suporte na avaliação das características clínicas, tanto motoras quanto não motoras, associadas à gravidade e duração da doença(¹¹,¹³,¹⁵,¹⁸,²⁷,³⁰–³³,³⁵,³⁹,⁴⁰,⁴⁴–⁴⁷,⁴⁹).

Como as manifestações da doença divergem entre os pacientes, e as necessidades e prioridades individuais são muito diversas, o enfermeiro deve dedicar tempo para levantar tais demandas e necessidades com apoio de instrumentos de avaliação clínica, para obter assistência direcionada ao alcance funcional(⁵,⁸). No Brasil, os enfermeiros e demais profissionais de saúde da APS são instrumentalizados para monitorar a saúde dos idosos e indivíduos com DCNT, através de escalas para avaliação funcional e cognitiva, disponibilizadas em protocolos e guias clínicos de atendimentos regionais ou materiais como os Cadernos de Atenção Básica do Ministério da Saúde(²). Apesar de esses materiais não serem específicos para DP, os instrumentos contidos neles podem auxiliar o enfermeiro na avaliação clínica e no monitoramento de distúrbios neurocomportamentais e cognitivos, muito comuns nos indivíduos com a doença.

Países, como Reino Unido e Holanda, possuem experiências exitosas com atuação de enfermeiras especialistas em DP, e seus documentos específicos para cuidados de enfermagem na DP estabelecem a promoção e gerenciamento da independência como competência dos enfermeiros que assistem esse público(³⁵,⁵³). Para o grupo do Reino Unido, o enfermeiro deve demonstrar conhecimento das necessidades fisiológicas, sociais e espirituais da pessoa com DP, avaliar a habilidade do indivíduo para gerenciar seus próprios cuidados e a capacidade de reconhecer e descrever sinais de problemas comuns que as afetam e que podem comprometer o autocuidado, além de apresentar o conceito de cuidado antecipatório, fortalecendo a tomada de decisão futura(⁵³).

A natureza clinicamente heterogênea e progressiva da DP(³), exige além da avaliação das características clínicas, o gerenciamento das AVD e das AIVD(¹⁴,¹⁷,²⁶,³⁵,⁴³). É fundamental que o enfermeiro desenvolva estratégias para estimular a pessoa com DP na realização das AVD e AVDI, promovendo melhora da qualidade de vida e evitando, assim, dependência funcional e sintomas depressivos(⁵⁴).

Como a DP poderá afetar a vida não apenas da pessoa com a doença, mas também de toda a sua família, a educação para autogestão da doença para pessoas com DP e seus parceiros de cuidado(¹³,¹⁴,¹⁷,¹⁸,²¹–²⁴,²⁸,³⁰,³³–⁴²,⁴⁴–⁴⁶,⁴⁸,⁵⁰,⁵²) é parte essencial do cuidado de enfermagem. Sobre a temática, observou-se que o manejo da díade paciente-cuidador inclui intervenções que visam à coordenação dos cuidados para os efeitos psicossociais da doença, que podem interferir nas interações dos relacionamentos, com ênfase particular no fortalecimento das redes de apoio dos cuidadores. Nessa mesma direção, autores(⁵⁵) argumentam que ser diagnosticado com doença neurodegenerativa é experiência que muda não só a vida do indivíduo com a doença, mas também dos parceiros de cuidado, tornando-se importantes abordagens que enfoquem os impactos da doença aos familiares e cuidadores para que estes não se tornem pacientes em potencial.

De acordo com os estudos revisados(¹¹,¹³,¹⁴,¹⁷,¹⁸,²⁰,²⁶,²⁹,³⁸,⁴¹,⁴⁴,⁴⁸) o atendimento domiciliar na modalidade de Telenfermagem, demonstrou ser ferramenta útil para garantir as necessidades do paciente e a continuidade do cuidado. Esse recurso vem sendo utilizado pelos enfermeiros da APS, fornecendo aos usuários orientação por telefone ou por videoconferência, planejamento de ações, visitas domiciliares, articulação multiprofissional e encaminhamento para serviços especializados(⁴,⁵⁶). No cenário atual, em tempos de distanciamento social imposto pela COVID-19, o teleatendimento pode ser ferramenta útil para manter o cuidado das pessoas com DP.

Pilar fundamental da APS, a visita domiciliar proporciona proximidade dos profissionais da equipe de saúde com aqueles que não conseguem chegar ao serviço devido às limitações pessoais ou geográficas do território(⁵⁴). Tal como acontece com idosos fragilizados, em decorrência das limitações físicas, pessoas com DP em estágio intermediário e avançado são beneficiadas com visitas regulares dos profissionais avaliando os possíveis riscos e limitações do seu ambiente domiciliar e do acesso do território.

Nesta revisão, sete estudos(¹²,¹⁹,²⁵,²⁹,⁴²,⁵¹,⁵²) relataram a abordagem supervisionada em grupo. No que corresponde a este assunto, estudo(⁵⁴) brasileiro acerca dos avanços e os desafios da atenção à saúde da população idosa com doenças crônicas na APS identificou que a formação de grupos é estratégia essencial no tratamento de doenças crônicas, pois permite a reflexão sobre o processo de adoecimento e os fatores envolvidos possibilitando estimular formas de autocuidado e mudança de estilo de vida.

Para os autores(⁵⁴), quando o cuidado ocorre de forma integrada com os profissionais do Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), é possível alcançar resultados significativos de saúde dos participantes, possibilitando a diminuição do número de encaminhamentos para a atenção secundária. Logo, os enfermeiros devem se beneficiar desses espaços interativos para promover a socialização e estilos de vida saudáveis, por meio do apoio à participação em grupo, encorajamento à verbalização e aconselhamento comportamental para as mudanças no estilo de vida a longo prazo.

Tendo em vista os estudos(¹¹,¹³,¹⁴,¹⁶,¹⁸,²⁰,²⁴,²⁶,³⁰,³¹,³⁷,³⁸,⁴³–⁴⁵,⁴⁷–⁴⁹) que examinaram o gerenciamento dos fatores pessoais, compreender e identificar o problema de saúde da pessoa com DP perante a perspectiva da enfermagem garantirá ações individualizadas destinadas a permitir que mantenham ou recuperem o controle de aspectos importantes da sua vida. Isso, por sua vez, ajudará a envolvê-los nas decisões clínicas e no estabelecimento de metas terapêuticas durante as consultas, melhorando os resultados de saúde e, consequentemente, a sua qualidade de vida e de seus cuidadores.

Nossos achados incentivam a abordagem colaborativa de cuidados primários que priorizam as ações multissetoriais para promoção e educação em saúde no nível individual, com foco nas especificidades de cada paciente, e ações coletivas, como a realização de grupos voltados à pessoa com DP e seus familiares, fortalecendo a capacidade de prevenção de complicações e autocuidado(⁵⁴,⁵⁶).

A natureza multifacetada da DP demanda dos enfermeiros intervenções voltadas a educar e apoiar os pacientes na manutenção de estilo de vida seguro e ativo, por meio da prevenção do declínio funcional e encaminhamento para profissionais da equipe interdisciplinar, em especial com foco para prática do exercício físico, terapia da fala e da terapia ocupacional para desaceleração da degeneração motora e neural(²⁰,²⁶,⁴⁴,⁴⁷). Nesse sentido, destaca-se o apoio dos profissionais do NASF no cenário da APS brasileiro, no qual realiza-se abordagem multidisciplinar, com discussão de casos e planejamento de cuidados, tão necessários e importantes devido à complexidade da DP(⁵⁴).

Embora o papel dos enfermeiros da APS no cuidado à pessoa com DP não tenha sido o foco desta revisão, foi abordado em estudos(¹¹,¹⁴,²⁰,²⁴) incluídos no gerenciamento dos fatores pessoais que os enfermeiros ajudam as pessoas com essa condição complexa a gerenciar seus inúmeros medicamentos, fornecem informações sobre como viver com a doença, além de promover apoio emocional aos pacientes e familiares. Esses achados são semelhantes aos encontrados em outras revisões(⁴,⁵⁷) sobre integração clínica na DP, constatando que, dependendo do contexto de serviço de saúde, o enfermeiro terá diferentes papéis e atribuições no cuidado a este paciente, contudo algumas atribuições geralmente são comuns como: gerenciamento de casos; avaliação e orientação na adesão à medicação; fornecimento de informações; educação em saúde; apoio psicossocial; auxílio no desenvolvimento de habilidades de enfrentamento; e suporte ao cuidador.

As competências clínicas específicas, reforçam a proposta da OPAS da necessidade de ampliação do papel da enfermagem na APS nos países da América Latina, enfatizando que novos perfis profissionais, como o de enfermeiros de prática avançada, são essenciais para assumir as demandas da função com autonomia e oferecer cuidado de alta qualidade ao paciente(¹).

Limitações do Estudo

Como característico das revisões que limitam idiomas, é possível que alguns estudos relevantes não tenham sido contemplados, no entanto nos sentimos seguros de que quaisquer estudos perdidos não alteram substancialmente o padrão das descobertas. Não estabelecemos nenhuma restrição de tempo, portanto, também foram recuperados documentos desatualizados. Por fim, a qualidade das 11 revisões narrativas incluídas no estudo representa limitação que deve ser reconhecida, uma vez que, com base no referencial metodológico utilizado, não avaliamos as qualidades metodológicas dos relatórios.

Implicações Para o Avanço do Conhecimento Científico Para a Área de Saúde e Enfermagem

O artigo aponta para os cuidados de enfermagem que podem ser realizados em âmbito primário de atenção à saúde às pessoas que convivem com a DP, auxiliando os enfermeiros no desenvolvimento das competências necessárias para a tomada de decisão clínica. Ainda, os cuidados de enfermagem listados neste estudo podem ser úteis para direcionar os planos de autogestão no nível individual ao longo do curso da doença, fornecendo clareza ao papel da enfermagem nos vários aspectos do cuidado na DP no contexto da APS.

Apesar de esta revisão revelar crescimento de estudos sobre a temática nos últimos anos, apenas alguns ensaios clínicos(⁹,²⁵,²⁶,⁴⁴) avaliaram a eficácia dos cuidados, demonstrando a necessidade de pesquisas futuras de alta qualidade, para gerar base de evidências fortes para a implementação de cuidados de enfermagem nos diferentes estágios da doença, discernindo quais cuidados identificados funcionam para subgrupos específicos dessa população. Além disto, a compreensão das práticas do cuidado coletivo e sua complexa relação nos modelos de atenção às pessoas que convivem com DP no território é um próximo passo importante nas pesquisas, frente à crescente prevalência da doença, tendo a participação e o controle social como elementos centrais que devem ser avaliados para caracterizar a situação de saúde dessa população.

CONCLUSÃO

Esta revisão de escopo demonstra o cuidado de enfermagem à pessoa com DP no âmbito primário de atenção à saúde, como complexo e multidimensional, enfatizando ações que incluem cuidados centrados em nível individual e em grupo, abrangendo avaliação clínica, educação do paciente, envolvimento deste no contexto social do cuidado e desenvolvimento de relacionamentos positivos com os familiares e cuidadores.

Como o cuidado mais importante desempenhado pelos enfermeiros, no contexto primário de saúde, esteve relacionado à avaliação dos sintomas em cada estágio clínico e estratégias educacionais para o gerenciamento e enfrentamento da doença, tornam-se necessário trabalhos adicionais que examinem o impacto e a eficácia clínica destes cuidados à saúde e bem-estar da pessoa com DP, principalmente em locais em que esses não têm acesso a serviços especializados em neuroreabilitação ou em contextos em que esses serviços são escassos.

EDITOR ASSOCIADO

Cássia Baldini Soares

• Apoio financeiro Fundação de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), prevista no Edital nº 046/2017 – Doutorado no país e no exterior – Bolsa de Doutorado, Processo: BD-08736/17

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  11 Mar 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  25 Ago 2021
• Aceito
  17 Jan 2022