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Salvadoracris e Caruaruacris, novos gêneros de gafanhotos sul-americanos (Orthoptera, Acrididae)

Salvadoracris and Caruaruacris, new South American genera of grasshopper (Orthoptera, Acrididae)

Resumos

Salvadoracris gen. nov. com S. nigritus sp. nov. (espécie-tipo), do Peru (Cuzco) e Caruaruacris gen. nov. com C. bivittatus sp. nov. (espécie-tipo), do Brasil, Pernambuco, são descritos e ilustrados.

Abracrini; gafanhotos; novos gêneros; novas espécies; Ommatolampinae


Salvadoracris gen. nov. with S. nigritus sp. nov. (type species) from Peru, Cuzco, and Caruaruacris gen. nov. with C. bivittatus sp. nov. (type species), from Brazil, Pernambuco, are described and illustrated.

Abracrini; grasshoppers; new genus; new species; Ommatolampinae


SISTEMÁTICA, MORFOLOGIA E BIOGEOGRAFIA

Salvadoracris e Caruaruacris, novos gêneros de gafanhotos sul-americanos (Orthoptera, Acrididae)

Salvadoracris and Caruaruacris, new South American genera of grasshopper (Orthoptera, Acrididae)

Maria Kátia Matiotti da Costa; Gervásio Silva Carvalho

Faculdade de Biociências, Laboratório de Entomologia, Prédio 12 D - sala 45 - PUCRS. Av. Ipiranga, 6681. Caixa Postal 1429, 90619-900 Porto Alegre-RS, Brasil. katiamatiotti@yahoo.com.br; gervasio@pucrs.br

RESUMO

Salvadoracrisgen. nov. com S. nigritus sp. nov. (espécie-tipo), do Peru (Cuzco) e Caruaruacris gen. nov. com C. bivittatus sp. nov. (espécie-tipo), do Brasil, Pernambuco, são descritos e ilustrados.

Palavras-chave: Abracrini; gafanhotos; novos gêneros; novas espécies; Ommatolampinae.

ABSTRACT

Salvadoracrisgen. nov. with S. nigritus sp. nov. (type species) from Peru, Cuzco, and Caruaruacris gen. nov. with C. bivittatus sp. nov. (type species), from Brazil, Pernambuco, are described and illustrated.

Keywords: Abracrini; grasshoppers; new genus; new species; Ommatolampinae.

De acordo com a classificação de Amédégnato (1974), Ommatolampinae divide-se em 7 tribos e constitui uma subfamília extremamente diversificada. A maioria dos gêneros de Abracrini, atualmente reconhecidos como válidos, foi descrita nos estudos de Stål (1878), Bruner (1908, 1911, 1919), Hebard (1923, 1924), Jago & Rowell (1981), Perez et al. (1995). Esses estudos, juntamente com a revisão de Amédégnato & Descamps (1979), contribuíram para o conhecimento sistemático da tribo. Abracrini está constituída por 16 gêneros e aproximadamente 90 espécies que se encontram principalmente representadas na América do Sul. Os integrantes desta tribo diferem-se das outras tribos de Ommatolampinae por apresentarem a apófise interna da genitália do macho, vestigial ou ausente.

Com base em exemplares depositados na coleção do Museu da Facultad de Ciencias, Universidad de la Republica, Montevideo, Uruguay (FCUR) descrevemos dois novos gêneros em Abracrini.

MATERIAL E MÉTODOS

Os espécimes examinados estão depositados na Facultad de Ciencias, Universidad de la Republica, Montevideo, Uruguay (FCUR) e no Museu de Ciência e Tecnologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil (MCTP).

As medidas dos exemplares foram realizadas utilizando-se um paquímetro digital (Starrett) e, sempre que necessário com o auxílio de microscópio estereoscópico com ocular micrométrica. As medidas correspondem à média entre os espécimes disponíveis e valores extremos expressos entre parênteses. As siglas empregadas e seus significados são as seguintes: C.c., comprimento total do corpo, medido em vista lateral do ápice do fastígio até o final do abdome; C.t., comprimento da tégmina, tomado da base até o final da mesma; C.p., comprimento do pronoto, medido do início da prozona até o final da metazona; C.f., comprimento do fêmur da perna posterior, tomado da base até o final dos lóbulos geniculares. Todas as medidas são dadas em milímetros.

A nomenclatura da morfologia interna e das peças da genitália segue Dirsh (1956) e Amédégnato (1976).

Salvadoracris gen. nov.

Espécie-tipo: Salvadoracris nigritus sp. nov. (Fig.1A)



Descrição. Holótipo macho. Tamanho pequeno; tegumento liso, apenas o pronoto apresenta pouca rugosidade. Micróptero.

Cabeça. Um pouco mais larga do que a extremidade anterior do pronoto; perfil da face subretilínea; costa frontal plana; fastígio subtriangular, mais longo do que largo e com ápice arredondado, com sulco longitudinal mediano profundo; espaço interocular estreito, olhos grandes e proeminentes (Fig.1B); antenas filiformes, mais longas que a cabeça e pronoto juntos, compostas por 18 artículos.

Tórax. Pronoto bastante puncturado, prozona com puncturas profundas, exceto em duas áreas; metazona com puncturas menos profundas; sem carenas laterais; carena mediana cortada por três sulcos transversais; margem anterior e posterior do levemente emarginadas na metade; metazona menor em tamanho em relação a prozona (Fig.1B). Tubérculo prosternal com protuberância espiniforme. Espaço mesosternal subquadrado. Lóbulos metasternais próximos. Pernas hirsutas; fêmur posterior robusto ultrapassando o ápice do abdome; lúnulas geniculares agudas; tíbia posterior com 7 espinhos na margem externa e na interna. Tégminas delgadas, com ápice arredondado, ultrapassando a margem posterior do primeiro segmento abdominal.

Abdome. Tímpano presente. Ápice do abdome hirsuto. Placa supranal subtriangular, com um leve sulco longitudinal mediano, região central da placa com três manchas escuras arredondadas, as duas anteriores de tamanho maior que a terceira; cercos curtos, cônicos de perfil; pálio fortemente saliente, subcônico com extremidade arredondada; margem posterior do último tergito com uma grande fúrcula escura (Fig.1C); placa subgenital obtusa, com extremidade superior curvada e direcionada para dentro (Fig.1D).

Genitália. Cíngulo com apódema longo; escleritos endofálicos com ápodema achatado dorso-ventralmente, placas laterais bem desenvolvidas, gonóporo com expansão ventral retangular. Edeago com valvas superior e inferior longas e de mesmo tamanho com ápices divididos; escleritos do edeago cobertos dorsalmente com bainha ectofálica estreita (Fig.1F). Epífalo com ponte côncava, âncoras do mesmo tamanho que as projeções anteriores e as posteriores divergentes, lophi com extremidades pretas, bastante esclerotizados (Fig.1G).

Fêmea. Similar ao macho, porém maior (comprimento do corpo 18mm) e mais robusta. Olhos menos proeminentes; fêmur posterior apenas alcançando o ápice do abdome; valvas do ovipositor robustas, margem externa da valva superior e inferior levemente serreadas (Fig.1E).

Comentários. O presente gênero apresenta características bastante distintas que podem ser resumidas como segue: Espaço interocular estreito em relação ao primeiro segmento antenal; antenas filiformes, composta por 18 artículos; fúrcula distinta, prolongada posteriormente; cercos curtos, cônicos; extremidade posterior do último segmento abdominal cortado na metade; pálio saliente; edeago com valvas superior e inferior longas, com ápices divididos; lóbulos esclerotizados; epífalo com ponte côncava e âncoras distantes; lophi esclerotizados.

Etimologia. Homenagem ao pesquisador Prof. Carlos Salvador Carbonell da Universidad de la Republica, Montevideo, Uruguay (FCUR) por sua importante e admirável contribuição ao conhecimento acridológico. Salvador + akris (= gafanhoto).

Salvadoracris nigritus sp. nov.

Holótipo macho. Coloração do corpo castanho-escura para preto. Superfície dorsal da cabeça e pronoto preto brilhante. Antenas castanho-escuras. Face, gena, abaixo dos olhos, lóbulos laterais do pronoto e pleura, amarelados. Abdome dorsalmente preto até o 7° segmento, os demais amarelados. Superfície ventral do corpo amarelada. Tégminas totalmente pretas. Pernas anteriores e medianas castanho-claras. Fêmur posterior castanho-amarelado, tíbia posterior esverdeada, na metade distal castanho-escura com espinhos de extremidades pretas. Dorsalmente nos segmentos abdominais 4° ao 6° a presença de pares de manchas brancas.

Alótipo. Coloração do corpo castanho-clara. Pronoto ornado por duas faixas longitudinais dorsais amareladas; tégminas pretas com porção mediana dorsal amarelada. Dorsalmente, os segmentos abdominais são mais claros que os do macho.

Etimologia. Relativo à coloração do inseto; do latim nigritus = negro, escurecido, preto.

Material examinado. Holótipo macho: PERU. Cuzco: Atalaya, confluência dos rios Alto Madre de Dios y Carbón, vi.1976, M. Descamps & C.S.Carbonell leg. (FCUR). Alótipo fêmea: PERU. Madre de Dios: Pakitza, rio Manu, vi.1976 (M. Descamps, C. S.Carbonell) (FCUR). BRASIL. Amazonas: Humaitá, 8.x.1975 (A. Mesa), 1 macho e 2 fêmeas (FCUR). PERU. Cuzco: Atalaya, confluência dos rios Alto Madre de Dios y Carbón, vi.1976 (M. Descamps, C.S.Carbonell), 4 machos e 2 fêmeas (FCUR); Madre de Dios: Pakitza, rio Manu, vi.1976 (M. Descamps, C. S.Carbonell), 2 machos (FCUR).

Comentários. Os espécimens provenientes do Brasil, Amazonas (Humaitá), apresentam a coloração do corpo, em ambos os sexos, castanho-clara, pronoto com uma faixa dorsal-mediana e duas laterais amareladas do pronoto, bastante conspícuas.

Distribuição geográfica: Brasil (Amazonas) e Peru (Cuzco e Madre de Dios).

Caruaruacris gen. nov.

Espécie-tipo: Caruaruacris bivittatus sp. nov. (Fig. 2A)



Descrição. Holótipo macho. Tamanho pequeno; tegumento puncturado. Micróptero.

Cabeça. Um pouco mais larga do que a extremidade anterior do pronoto; perfil da face subretilínea; occípicio bastante puncturado, costa frontal plana e puncturada; fastígio subtriangular com ápice arredondado, levemente mais longo do que largo, provido de um sulco mediano longitudinal; espaço interocular amplo; olhos grandes e proeminentes (Fig.2B); antenas ensiformes compostas por 15 artículos.

Tórax. Pronoto hirsuto, com carena médio-longitudinal proeminente, cortada por três sulcos profundos; ausência de carena lateral, prozona e metazona com puncturas profundas; margem anterior e posterior do disco pronotal emarginadas na metade (Fig.2B). Pleuras com puncturas esparsas. Tubérculo prosternal piramidal com ápice acuminado. Espaço mesosternal subquadrado e lóbulos metasternais muito próximos. Fêmur posterior robusto, estendendo-se além do ápice do abdome quase uma metade de seu comprimento, carena superior e carênula superior interna levemente serreadas; tíbia posterior hirsuta com 8 espinhos na margem externa e interna. Tégminas longas, alcançando a margem posterior do primeiro segmento abdominal.

Abdome. Tímpano presente; segmentos abdominais com bastante puncturas na sua parte superior; placa supranal subtriangular, um pouco mais longa do que largura basal, com margens laterais sinuosas e elevadas, presença de duas protuberâncias na região mediana da placa, porção distal arredondada; cercos longos e delgados; margem posterior do último tergito com concavidade mediana limitada lateralmente por duas pequenas saliências (Fig.2C); placa subgenital abruptamente acuminada, curta e hirsuta (Fig.2D).

Genitália. Apódema do cíngulo longo; escleritos endofálicos com ápodema achatado dorso-ventralmente, placas laterais bem desenvolvidas, gonóporo com expansão ventral digitiforme. Edeago com valvas superior e inferior curtas, subiguais, com ápices não divididos; escleritos do edeago coberto dorsalmente com bainha ectofálica estreita (Fig.2E). Epífalo com ponte plana, âncoras muito próximas, divergentes, estas de mesmo tamanho que as projeções anteriores, lophi bilobados; escleritos ovais bem desenvolvidos (Fig.2F).

Comentários. O gênero Caruaruacris apresenta características muito distintas que podem ser resumidas como segue: Espaço interocular amplo em relação ao primeiro segmento antenal; antenas ensiformes, composta por 15 artículos; fúrcula indistinta, representada por uma concavidade mediana; cercos longos, delgados; extremidade posterior do último segmento abdominal não cortado na metade; pálio não saliente; edeago com valvas superior e inferior curtas, com ápices não divididos; epífalo com ponte plana, âncoras próximas e lophi não esclerotizados.

Etimologia. O nome do gênero é alusivo à localidade-tipo, Caruaru/Brasil. Caruaru + akris ( = gafanhoto).

Caruaruacris bivittatus sp. nov.

Holótipo macho. Coloração geral do corpo castanho-clara com faixas amareladas. Fastígio e occípicio amarelados com uma faixa mediana preta que percorre desde ápice da cabeça, tornando-se um pouco mais larga no final do pronoto, percorrendo todo o tórax, até o primeiro segmento abdominal. Antenas esverdeadas, com a parte inferior manchada de preto. Fastígio e porções laterais do occipício com duas faixas amareladas divergentes percorrendo todo pronoto até o terceiro segmento abdominal, os demais segmentos amarelados. Genas e lóbulos laterais do pronoto amarelados. Fronte amarelada com manchas escuras; margem inferior das genas, clípeo e suturas epistomal e pleurostomal manchadas de preto. Margem posterior do pronoto intercalada com manchas pretas. Superfície ventral do corpo amarelada. Tégminas castanho-escuras. Pernas esverdeadas; tíbia posterior com espinhos de extremidades pretas.

Fêmea. Desconhecida.

Etimologia. O nome da espécie é alusivo às faixas dorsais.

Material examinado. Holótipo macho. BRASIL. Pernambuco: Caruaru, 28.xi.2000, M. J. Souza Lopes leg. (FCUR).

Distribuição geográfica. Brasil (Pernambuco).

Agradecimentos. Ao Prof. Carlos Salvador Carbonell pela inestimável ajuda e pelo empréstimo do material, sem o qual este trabalho não poderia ser efetuado. Ao desenhista Augusto Ferrari pela execução das ilustrações; ao Eleandro Sidney Moyses pelo auxílio na elaboração do mapa de distribuição. Ao CNPq pela concessão da bolsa de estudo ao primeiro autor que permitiu a realização desta pesquisa (Proc. 140687/2001-7).

Recebido em 28/11/2005; aceito em 08/02/2006

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Abr 2006
  • Data do Fascículo
    Mar 2006

Histórico

  • Recebido
    28 Nov 2005
  • Aceito
    08 Fev 2006
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