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Critérios de calagem e teores críticos de fósforo e potássio em latossolos sob plantio direto no centro-sul do Paraná

Liming criteria and critical levels of phosphorus and potassium in oxisoils under no-till system of the south-central region of Paraná state, Brazil

Resumos

A adoção do plantio direto (PD) em substituição ao preparo convencional promove alterações na dinâmica de nutrientes e na acidez no solo, podendo influenciar as relações solo-planta e, portanto, os critérios de manejo da fertilidade do solo. Este estudo teve como objetivo determinar os critérios de recomendação de calagem e os teores críticos de fósforo (P) e potássio (K) para o sistema de rotação de culturas envolvendo soja, milho, trigo, cevada e aveia branca, amplamente adotado na região Centro-Sul do Paraná. O estudo foi com base em 13 experimentos de campo conduzidos em Latossolos Brunos em longo prazo em PD (>15 anos), nos municípios de Guarapuava, Pinhão e Candói. Desses, cinco envolveram calagem e oito adubação de P e K. Em amostras de solo das camadas de 0-0,10 e 0,10-0,20 m, foi determinado o pH (CaCl2) e calculada a saturação por bases (V%) nos experimentos de calagem e os teores de P e K disponível (Mehlich-1) nos experimentos de adubação. O método dos quadrantes foi utilizado para determinar os critérios de recomendação de calagem; e o nível crítico de pH e V% consistiu no valor em que, acima do qual, as culturas apresentaram rendimento relativo (RR) superior a 90 % e nunca inferior a 80 %. A relação entre os teores de P e K e os valores de RR foi verificada pela equação de Mitscherlich, sendo o teor crítico aquele correspondente ao RR de 90 %. Os resultados indicaram que os níveis críticos relacionados à acidez e disponibilidade de P e K foram maiores para a camada de 0-0,10 m do que para a de 0-0,20 m. A cultura da soja foi mais sensível à acidez do solo, enquanto os cereais de inverno foram mais exigentes em P e K. Tomando-se como referência as culturas mais restritivas do sistema de rotação e a camada de 0-0,20 m, os níveis críticos para calagem foram pH (CaCl2) de 4,9 e saturação por bases de 60 %, enquanto os teores críticos para adubação foram 8 mg dm-3 de P e 0,30 cmol c dm-3 de K para Latossolos cultivados no longo prazo em sistema PD na região Centro-Sul do Paraná.

acidez do solo; culturas de grãos; calibração; fertilidade; solos tropicais


When conventional tillage is replaced by no-tillage (NT) changes occur in the dynamics of soil nutrients and acidity, which may influence the soil-plant relationships and consequently, the criteria for soil fertility management. This study determined the criteria for liming as well as the soil critical levels for P and K in a crop rotation of soybean, maize, wheat, barley, and white oat, widely used in the South-Central region of the State of Parana, in Southern Brazil. The study involved 13 field experiments on Hapludox soils under long-term no-tillage (>15 years) in Guarapuava, Pinhão and Candói; five of the experiments were related to liming and eight to P and K fertilization. In soil samples from the layers 0-0.10 and 0.10-0.20 m, of the liming studies, CaCl2-pH and base saturation (V%) were quantified and available P and K (Mehlich-1) in the samples from the fertilization. The quadrant method was used to determine the liming criteria; the critical levels for pH and base saturation were based on values that ensured relative crop yields above 90 % and never below 80 %. The ratio between the soil P and K levels and the relative crop yields could be represented by the Mitscherlich equation, where the levels required for relative crop yields of 90 % represent the critical values. The results indicated that the critical levels of soil acidity and available P and K were higher in the 0-0.10 m than the 0-0.20 m layer. Soybean was most sensitive to soil acidity, while the winter cereals were most demanding in P and K. Based on the most restrictive crop in the rotation and 0-0.20 m soil layer as reference, the critical levels for liming were CaCl2-pH of 4.9 and base saturation of 60 %, while the critical levels of fertilization were 8.0 mg dm-3 for P and 0.30 cmol c dm-3 for K for Oxisoils under long-term no-tillage, in the South-Central Region of Paraná.

soil acidity; grain crops; calibration; soil fertility; tropical soils


DIVISÃO 3 - USO E MANEJO DO SOLO

COMISSÃO 3.1 - FERTILIDADE DO SOLO E NUTRIÇÃO DE PLANTAS

Critérios de calagem e teores críticos de fósforo e potássio em latossolos sob plantio direto no centro-sul do Paraná

Liming criteria and critical levels of phosphorus and potassium in oxisoils under no-till system of the south-central region of Paraná state, Brazil

Renan Costa Beber VieiraI; Cimélio BayerII; Sandra Mara Vieira FontouraIII; Ibanor AnghinoniIV; Paulo Roberto ErnaniV; Renato Paulo de MoraesVI

IDoutorando do PPG em Ciência do Solo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Av. Bento Gonçalves 7712. CEP 91540-000 Porto Alegre (RS). Bolsista da CAPES. E-mail: renancbvieira@yahoo.com.br

IIProfessor Associado do Departamento de Solos da UFRGS. Bolsista do CNPq. E-mail: cimelio.bayer@ufrgs.br

IIIPesquisadora da Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária - FAPA. Entre-Rios, Guarapuava, PR. CEP 85139-400. E-mail: sandrav@agraria.com.br

IVProfessor Titular do Departamento de Solos da UFRGS. Bolsista do CNPq. E-mail: ibangui@ufrgs.br

VProfessor do Departamento de Solos da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. CEP 88520-000 Lages (SC). Bolsista do CNPq. E-mail: a2pre@cav.udesc.br

VITécnico Agrícola da FAPA. E-mail: renatop@agraria.com.br

RESUMO

A adoção do plantio direto (PD) em substituição ao preparo convencional promove alterações na dinâmica de nutrientes e na acidez no solo, podendo influenciar as relações solo-planta e, portanto, os critérios de manejo da fertilidade do solo. Este estudo teve como objetivo determinar os critérios de recomendação de calagem e os teores críticos de fósforo (P) e potássio (K) para o sistema de rotação de culturas envolvendo soja, milho, trigo, cevada e aveia branca, amplamente adotado na região Centro-Sul do Paraná. O estudo foi com base em 13 experimentos de campo conduzidos em Latossolos Brunos em longo prazo em PD (>15 anos), nos municípios de Guarapuava, Pinhão e Candói. Desses, cinco envolveram calagem e oito adubação de P e K. Em amostras de solo das camadas de 0-0,10 e 0,10-0,20 m, foi determinado o pH (CaCl2) e calculada a saturação por bases (V%) nos experimentos de calagem e os teores de P e K disponível (Mehlich-1) nos experimentos de adubação. O método dos quadrantes foi utilizado para determinar os critérios de recomendação de calagem; e o nível crítico de pH e V% consistiu no valor em que, acima do qual, as culturas apresentaram rendimento relativo (RR) superior a 90 % e nunca inferior a 80 %. A relação entre os teores de P e K e os valores de RR foi verificada pela equação de Mitscherlich, sendo o teor crítico aquele correspondente ao RR de 90 %. Os resultados indicaram que os níveis críticos relacionados à acidez e disponibilidade de P e K foram maiores para a camada de 0-0,10 m do que para a de 0-0,20 m. A cultura da soja foi mais sensível à acidez do solo, enquanto os cereais de inverno foram mais exigentes em P e K. Tomando-se como referência as culturas mais restritivas do sistema de rotação e a camada de 0-0,20 m, os níveis críticos para calagem foram pH (CaCl2) de 4,9 e saturação por bases de 60 %, enquanto os teores críticos para adubação foram 8 mg dm-3 de P e 0,30 cmolc dm-3 de K para Latossolos cultivados no longo prazo em sistema PD na região Centro-Sul do Paraná.

Termos de indexação: acidez do solo, culturas de grãos, calibração, fertilidade, solos tropicais.

SUMMARY

When conventional tillage is replaced by no-tillage (NT) changes occur in the dynamics of soil nutrients and acidity, which may influence the soil-plant relationships and consequently, the criteria for soil fertility management. This study determined the criteria for liming as well as the soil critical levels for P and K in a crop rotation of soybean, maize, wheat, barley, and white oat, widely used in the South-Central region of the State of Parana, in Southern Brazil. The study involved 13 field experiments on Hapludox soils under long-term no-tillage (>15 years) in Guarapuava, Pinhão and Candói; five of the experiments were related to liming and eight to P and K fertilization. In soil samples from the layers 0-0.10 and 0.10-0.20 m, of the liming studies, CaCl2-pH and base saturation (V%) were quantified and available P and K (Mehlich-1) in the samples from the fertilization. The quadrant method was used to determine the liming criteria; the critical levels for pH and base saturation were based on values that ensured relative crop yields above 90 % and never below 80 %. The ratio between the soil P and K levels and the relative crop yields could be represented by the Mitscherlich equation, where the levels required for relative crop yields of 90 % represent the critical values. The results indicated that the critical levels of soil acidity and available P and K were higher in the 0-0.10 m than the 0-0.20 m layer. Soybean was most sensitive to soil acidity, while the winter cereals were most demanding in P and K. Based on the most restrictive crop in the rotation and 0-0.20 m soil layer as reference, the critical levels for liming were CaCl2-pH of 4.9 and base saturation of 60 %, while the critical levels of fertilization were 8.0 mg dm-3 for P and 0.30 cmolc dm-3 for K for Oxisoils under long-term no-tillage, in the South-Central Region of Paraná.

Index terms: soil acidity, grain crops, calibration, soil fertility, tropical soils.

INTRODUÇÃO

A área agrícola cultivada em plantio direto (PD) teve grande expansão no Brasil a partir da década de 1990, atingindo 31 milhões de hectares em 2010 (Nogueira, 2011). No Estado do Paraná, segundo maior produtor de soja entre os estados brasileiros, aproximadamente 90 % da área cultivada com essa leguminosa é conduzida em PD (Agrosoft, 2009). Apesar da grande contribuição na produção agrícola nacional e da grande expressão do manejo conservacionista do solo, o Paraná não possui um sistema de recomendação de adubação e de calagem desenvolvido para sistemas de rotação de culturas em PD. Usualmente, são utilizadas indicações técnicas para as culturas isoladamente ou os sistemas de recomendação desenvolvidos em outros estados ou regiões, principalmente no RS e SC (CQFSRS/SC, 2004) e SP (Raij et al., 1997). Além disso, a maioria dessas recomendações foi originalmente desenvolvida para o sistema de preparo convencional (PC) do solo (Muzilli et al., 1978; Raij et al., 1997; CQFSRS/SC, 2004; Embrapa, 2008a,b; 2009).

A adoção do PD em substituição ao PC promove alterações na dinâmica de nutrientes e da acidez, principalmente na camada superficial do solo. Os efeitos nocivos da acidez são minimizados em solos em médio e longo prazo em PD, sobretudo pelo incremento de matéria orgânica (Ciotta et al., 2002). Compostos orgânicos de alta (Salet, 1998) e baixa massa molecular (Miyazawa et al., 1993; Bayer & Amaral, 2003) atuam na complexação de formas monoméricas do Al, o que possivelmente contribui para obtenção de altas produtividades de grãos no sistema PD em solos com acidez elevada (Salet, 1998; Franchini et al., 1999; Vieira et al., 2009).

A dinâmica de P no solo também é influenciada em PD, quando comparada com sistemas onde o solo é mobilizado mecanicamente. Sob as mesmas condições de manejo da fertilidade, os solos em PD apresentam teores analíticos de P maiores do que os manejados com aração e gradagens (Ciotta et al., 2002; Albuquerque et al., 2005; Costa et al., 2009. A disponibilidade de K às plantas também pode diferir entre os sistemas de manejo, principalmente em razão da sua maior adsorção eletrostática pela fase sólida, decorrente do aumento da CTC nos solos em PD (Mielniczuk, 2005). No que se refere à estratificação no perfil do solo, observou-se maior acúmulo de P nas camadas superficiais em comparação ao K (Eltz et al., 1989; Schlindwein & Anghinoni, 2000; Ciotta et al., 2002; Costa et al., 2009), por causa da sua menor mobilidade e retenção em formas não lábeis nas superfícies de óxidos de Fe e Al, presentes em expressiva quantidade em Latossolos (Novais et al., 2007).

As alterações que ocorrem na dinâmica da acidez e na disponibilidade dos nutrientes em solos sob PD possivelmente influenciam a relação solo-planta, o que pode refletir nos critérios de calagem e de adubação das culturas (Schlindwein & Gianello, 2004). Schlindwein & Gianello (2008) verificaram maiores teores críticos de P para amostras de solo coletadas na camada de 0-0,10 m em relação à de 0-0,20 m, os quais foram mais elevados do que os adotados em solos sob PC, considerando-se a camada de 0-0,20 m (CQFSRS/SC, 2004). Esses resultados demonstram a necessidade de serem conduzidos estudos com os objetivos de calibrar e determinar indicadores de acidez e teores críticos de nutrientes em solos sob PD, especialmente de longa duração (mais de 15 anos), os quais apresentam maior variabilidade vertical e horizontal dos atributos do solo (Schlindwein & Anghinoni, 2000; Alvarez V. & Guarçoni, 2003).

Em um esforço inicial para desenvolver um sistema de recomendação de corretivos e fertilizantes adaptado aos sistemas de produção em PD e às condições de solo e clima regionais e a fim de otimizar o uso de insumos e obter alta produtividade das culturas, este estudo teve por objetivo determinar critérios de recomendação de calagem e os teores críticos de P e K para um sistema de rotação de culturas amplamente representativo na região Centro-Sul do Paraná, onde o PD é o sistema de manejo predominante.

MATERIAL E MÉTODOS

Desenvolveu-se o estudo com base em 13 experimentos, todos conduzidos a campo por períodos que variaram de um a 10 anos, nos municípios de Guarapuava (25º 32' S, 51º 29' O), Pinhão (25º 41' S, 51º 39' O) e Candói (25º 34' S, 52º 03' O), na região Centro-Sul do Paraná. Desses, cinco experimentos envolveram calagem, enquanto os demais foram relacionados à adubação com P e K (três com P, três com K e dois com P e K conjuntamente). Em todas as áreas experimentais, o solo foi classificado como Latossolo Bruno (Embrapa, 2006), e encontrava-se por mais de 15 anos em PD quando do início dos experimentos.

Experimentos

As características detalhadas de cada experimento como período de condução, delineamento experimental, tratamentos, número de repetições, culturas, bem como as coletas de solo e suas respectivas profundidades, constam nos quadros 1 e 2. Nos experimentos envolvendo calagem, os tratamentos consistiram da aplicação de doses, dos tipos de calcário (convencional ou filler) e dos métodos de aplicação (dose única ou parcelada), abrangendo diferentes plantas de cobertura de inverno e aplicação isolada ou associada a gesso (Quadro 1). Os experimentos com adubação envolveram predominantemente doses de fertilizantes, mas também foi avaliado o modo de aplicação (linha e lanço) (Quadro 2). O manejo da adubação de N, P e K nos experimentos de calagem, de N e P, nos experimentos de K, e de N e K, nos experimentos de P, foi com base nas indicações existentes para as respectivas culturas (CFSRS/SC, 1995; Raij et al., 1997; Embrapa, 2008a; 2009).



Amostragem do solo e análises químicas

Coletaram-se amostras de solo das camadas de 0-0,10 e 0,10-0,20 m em todos os experimentos; em alguns deles, também foram coletadas na camada de 0-0,20 m (Quadros 1 e 2). Nos experimentos em que a camada de 0-0,20 m não foi avaliada, os atributos da fertilidade dessa camada foram estimados pela média aritmética dos seus respectivos valores nas camadas 0-0,10 e 0,10-0,20 m.

Nas amostras de solo dos experimentos com calagem, determinaram-se os valores de pH em CaCl2 e os teores de Ca e Mg por espectrofotometria de absorção atômica, após extração com solução de KCl 1 mol L-1. Os teores de P e K disponíveis foram extraídos pela solução de Mehlich-1 e determinados por espectrofotometria e fotometria de chama, respectivamente, conforme descrito em Tedesco et al. (1995). A saturação por bases (V%) foi calculada a partir dos teores de Ca, Mg e K trocáveis no solo e da capacidade de troca de cátions (CTCpH 7,0).

Produtividade de grãos e curvas de calibração

A produtividade de grãos das culturas foi avaliada em todas as safras e experimentos pela colheita de uma área útil que variou de 2 m2 (cereais de inverno) a 12 m2 (milho). Avaliou-se o teor de umidade nos grãos, sendo o rendimento das culturas expresso a 13 % de umidade. O rendimento relativo de grãos (RR) foi calculado atribuindo o valor 100 ao rendimento máximo da cultura em cada experimento e respectiva safra, sendo os demais valores de RR calculados proporcionalmente a esse.

As curvas de calibração foram obtidas a partir da análise conjunta de todas as safras e experimentos para cada cultura, relacionando os valores de RR aos dos indicadores de acidez e de disponibilidade de P e K no solo. Especificamente nos experimentos de P e K, o RR foi calculado apenas para os tratamentos que não tiveram reaplicação de fertilizante por ocasião da semeadura das culturas, pois o desempenho da cultura seria influenciado pelo fertilizante aplicado e promoveria distorções na relação entre os teores dos nutrientes no solo e o RR das culturas.

Critérios de recomendação de calagem e teores críticos de P e K

Os valores críticos de pH (CaCl2) e de V%, acima dos quais as culturas apresentavam rendimentos superiores a 90 % do RR, foram determinados de acordo com o método dos quadrantes, adaptado de Cate & Nelson (1971). Nesse método, o gráfico que descreve a variação de RR (eixo y) em relação aos valores de pH (CaCl2) ou V% (eixo x) é dividido em quatro quadrantes a partir de um eixo horizontal e um eixo vertical. O eixo horizontal foi fixado em RR de 90 %. Os níveis críticos de pH (CaCl2) e V% foram obtidos pelo ajuste do eixo vertical, de forma que acima do nível crítico as culturas nunca apresentassem RR inferior a 80 % e, em no máximo 20 % das situações, RR inferior a 90 %. Na figura 1, é apresentado esquematicamente o método dos quadrantes e os respectivos critérios adotados.


A curva de calibração composta pelos valores de RR das culturas e os respectivos teores de P e K no solo foi ajustada pela equação de Mitscherlich, descrita em Raij (1981). Os teores críticos de P e K foram definidos como os teores desses nutrientes no solo, em que as culturas apresentaram RR de 90 %, rendimento em torno do qual se verifica o maior retorno econômico das culturas em resposta à adubação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Critérios de calagem

Nas figuras 2 e 3, são apresentadas as relações entre o RR das culturas e os valores de pH (CaCl2) e de V% das camadas de 0-0,10 e 0-0,20 m, respectivamente. A soja foi a cultura mais sensível à acidez do solo, pois apresentou os menores valores de RR na ausência de aplicação de calcário, até 73 %, e os maiores incrementos na produtividade de grãos, em resposta à calagem (+37 %). Os cereais de inverno (trigo, cevada e aveia branca) e o milho apresentaram valores sempre superiores a 80 % do RR, em todos os experimentos e as safras, demonstrando menor sensibilidade à acidez do solo em comparação a soja. Os maiores incrementos na produtividade de grãos de soja, decorrentes da correção da acidez do solo, possivelmente estejam relacionados à dependência da fixação simbiótica de N pelos rizóbios, cuja população é reduzida expressivamente em valores de pH (H2O) inferiores a 5,5 (~pH 4,9 em CaCl2) (Bala et al., 2003).



A baixa resposta da maioria das culturas à calagem pode estar relacionada à complexação de Al favorecida pelos altos teores de matéria orgânica nos solos em estudo (> 50 g dm-3 na camada de 0-0,20 m), o que permitiu a obtenção de altos rendimentos, mesmo em condição de acidez elevada (Miyazawa et al., 1993; Franchini et al., 1999; Vieira et al., 2009). Os altos rendimentos verificados das culturas, mesmo nas condições de elevada acidez do solo, também podem ser decorrentes dos médios a altos teores de P nos solos dos experimentos com calagem, que variaram de 5 a 25 mg dm-3 (0-0,20 m). Parte da resposta das culturas à calagem é relacionada ao aumento da disponibilidade de P, seja pela diminuição da retenção do ânion fosfato no solo como pelo aumento do volume de solo ocupado pelas raízes das culturas (Ernani et al., 2000).

Os valores críticos obtidos para os indicadores de acidez apresentaram pequena variação quando consideradas as camadas diagnósticas de 0-0,10 e 0-0,20 m. Para a cultura da soja, os critérios de acidez estimados foram pH (CaCl2) de 5,0 e V = 65 %, para a camada de 0-0,10 m (Figura 2), e pH de 4,9 e V = 60 %, para a camada de 0-0,20 m (Figura 3). Para as culturas mais tolerantes à acidez (milho e cereais de inverno), os níveis críticos de pH (CaCl2) foram de 4,9 e 4,8 e V de 60 e 55 %, para as camadas de 0-0,10 e 0-0,20 m, respectivamente (Figuras 2 e 3).

Os valores críticos obtidos para a camada de 0-0,10 m foram muito similares aos utilizados nos Estados do RS e SC, que são pH (H2O) de 5,5 (~pH 4,9 em CaCl2) e V = 65 % (CQFSRS/SC, 2004). O valor de V = 65 %, encontrado neste estudo, também coincide com o indicado por Nolla & Anghinoni (2006) e Nicolodi et al. (2008); porém, o valor de pH (CaCl2) é intermediário aos obtidos por esses autores, que foram de 4,7 e 5,2, respectivamente.

Para a camada amostrada de 0-0,20 m, o valor crítico de V estimado para a soja (60 %) foi inferior ao de 70 %, indicado para esta cultura no Paraná (Embrapa, 2008b); entretanto, esse coincide com o indicado no Estado de São Paulo (Raij et al., 1997) e com o obtido por Nicolodi et al. (2008), para solos em PD no RS. Por sua vez, o valor de V estimado na camada de 0-0,20 m para a aveia branca, a cevada, o trigo e o milho (55 %) foi inferior à maioria das recomendações existentes para essas culturas. Para a cultura do trigo, a Embrapa (2008a) recomenda V = 60 % como critério de calagem. Para as culturas de aveia branca, cevada e milho, o critério de calagem é ainda maior, sendo indicada V = 70 % (Raij et al., 1997; Embrapa, 2009). A obtenção de critérios de recomendação de calagem mais baixos neste estudo, quando comparado aos existentes na literatura, pode ter ocorrido, ao menos em parte, em razão do efeito benéfico do uso do PD em longo prazo (>15 anos) sobre os teores de matéria orgânica (Bayer & Mielniczuk, 1997) e na disponibilidade de P (Ciotta et al., 2002). O teor de matéria orgânica do solo é considerado na recomendação da calagem para a cultura do milho no Estado de São Paulo (Raij et al., 1997), cujo nível crítico de V diminui de 70 para 50 %, para solos com matéria orgânica superior a 50 g dm-3.

Teores críticos de P e K

As relações entre os valores de RR das culturas e os teores de P e K estão apresentadas nas figuras 4 e 5, respectivamente. Em geral, a disponibilidade de P e K representou maior restrição à produtividade das culturas de inverno (aveia branca, trigo e cevada) ( 51 %) do que para as de verão (soja e milho) ( 80 %). Consequentemente, as culturas de inverno apresentaram maior resposta à aplicação de P e K do que as de verão e por esse motivo as culturas foram analisadas separadamente no grupo das hibernais (Figuras 4a,b; 5a,b) e das estivais (Figuras 4c,d; 5c,d). Os ajustes das curvas de calibração entre o RR das culturas e os respectivos teores de nutrientes no solo obtidos por meio da equação de Mitscherlich apresentaram coeficientes de determinação (R2) variando de 0,35 a 0,82, para P, e de 0,71 a 0,83, para K (Figuras 4 e 5), sendo todos significativos (p<0,01) pelo teste de F.



 




Os teores críticos de P foram maiores para os cereais de inverno do que para as culturas de verão e para a camada de 0-0,10 m do que para a de 0-0,20 m (Figura 4). O teor crítico de P para os cereais de inverno foi estimado em 11 mg dm-3, considerando a camada diagnóstica de 0-0,10 m (Figura 4a) e em 8 mg dm-3, levando-se em consideração a camada de 0-0,20 m (Figura 4b). Por sua vez, as culturas de verão apresentaram teores críticos de P de 7 e 6 mg dm-3 para as amostras coletadas nas camadas de 0-0,10 e 0-0,20 m, respectivamente (Figura 4c,d).

O teor crítico de 7 mg dm-3 para a soja e o milho, na camada de 0-0,10 m, é similar ao valor adotado nos Estados do RS e SC (6 mg dm-3), independentemente da cultura, para solos com teor de argila acima de 600 g kg-1 (CQFSRS/SC, 2004). Entretanto, o teor crítico de 11 mg dm-3 de P para os cereais de inverno é superior ao valor de referência adotado nos Estados do RS e SC, mas, por sua vez, é similar ao teor de 10,5 mg dm-3 sugerido por Schlindwein & Gianello (2008), para solos do RS, e um pouco superior ao teor de 9 mg dm-3, indicado por Embrapa (2009), para solos do Paraná.

Os teores críticos estimados para a camada de 0-0,20 m (6 e 8 mg dm-3 para as culturas estivais e hibernais, respectivamente) foram similares ao valor de 7,6 mg dm-3 sugerido por Schlindwein & Gianello (2008) para solos do RS, bem como ao teor crítico de 6 mg dm-3 recomendado para culturas anuais em solos do Cerrado (Sousa & Lobato, 2004). Cabe salientar que existem recomendações de adubação que consideram o teor de argila como indicativo da capacidade tampão de P no solo, sendo uma variável no teor crítico de P, principalmente quando o P é extraído pelo método de Mehlich-1, onde solos com maior capacidade tampão (argilosos) apresentam teores críticos menores que os com menor capacidade tampão (arenosos) (CQFSRS/SC, 2004; Sousa & Lobato, 2004; Schlindwein & Gianello, 2008). Neste estudo, os solos apresentaram teor de argila semelhante, acima de 600 g kg-1, não sendo avaliada a influência da textura no teor crítico de P.

Além de aspectos relacionados à mineralogia e granulometria dos solos, assim como às condições climáticas que influenciam o potencial produtivo das culturas, a variação do teor crítico de P também pode ser determinada pelas características químicas do solo. Nesse sentido, Sousa & Lobato (2004) verificaram que o aumento do teor de matéria orgânica de 28,4 para 37,3 g kg-1, decorrente do cultivo com pastagem por nove anos, resultou numa diminuição do nível crítico de P de 6 para 3 mg dm-3, demonstrando o efeito potencial do uso e do manejo na relação solo-planta e, consequentemente, nos critérios de adubação.

Os teores críticos de K apresentaram comportamento semelhante aos de P, sendo maiores para as culturas de inverno, que foram mais responsivas a esse nutriente, em comparação às de verão (Figura 5). Considerando a camada de 0-0,10 m, o teor crítico de K para os cereais de inverno foi estimado em 0,40 cmolc dm-3 (Figura 5a), enquanto para as culturas de verão foi a metade disso, ou seja, em 0,20 cmolc dm-3 (Figura 5c). Nos Estados do RS e SC, independentemente da cultura, é adotado o teor crítico de 0,23 cmolc dm-3 para solos com CTCpH7,0 acima de 15 cmolc dm-3, mesma faixa de CTC dos solos estudados e da maioria dos solos da região Centro-Sul do Paraná. O valor de referência adotado nos dois estados do extremo sul do Brasil é muito similar ao teor crítico indicado neste estudo para as culturas de verão, mas é quase a metade do valor de 0,40 cmolc dm-3, indicado para os cereais de inverno.

Para a camada de 0-0,20 m, o teor crítico de K foi estimado em 0,30 cmolc dm-3, para os cereais de inverno (Figura 5b), e 0,16 cmolc dm-3, para as culturas de verão (Figura 5d), seguindo o mesmo comportamento verificado na camada mais superficial. O teor crítico para os cereais de inverno coincide com o indicado para a cultura da cevada (Embrapa, 2009), do trigo e do triticale (Embrapa, 2008a) para o Estado do Paraná, considerando a amostragem do solo na camada de 0-0,20 m. Entretanto, o teor crítico de 0,30 cmolc dm-3 também é indicado para a cultura da soja no Paraná (Embrapa, 2008b), sendo praticamente duas vezes o teor crítico estimado neste estudo (0,16 cmolc dm-3).

Os teores críticos de P e K estimados para a camada de 0-0,10 m foram de 17 a 30 % maiores do que os estimados para a camada de 0-0,20 m; isso se deve ao acúmulo de nutrientes nas camadas mais superficiais do perfil do solo em PD (Eltz et al., 1989; Bayer & Mielniczuk, 1997; Schlindwein & Anghinoni, 2000). No trabalho de Schlindwein & Gianello (2008), a diferença entre os teores críticos nas camadas de 0-0,10 e 0-0,20 m foi mais acentuada, sendo de 38 %, para o P, e de 52 %, para o K. Os teores críticos distintos obtidos em cada camada de amostragem alerta para o risco de uma interpretação equivocada da fertilidade do solo pela utilização do mesmo teor crítico do nutriente para amostras de solo coletadas na camada de 0-0,10 e 0-0,20 m.

Indicações para o manejo da calagem e da adubação fosfatada e potássica

Num sistema de rotação de culturas, os níveis críticos a serem adotados no manejo da calagem e da adubação do solo devem ser com base nas culturas mais sensíveis à acidez e nas mais exigentes em nutrientes. Nesse sentido, a cultura da soja foi tomada como referência para o estabelecimento dos níveis críticos de pH (CaCl2) e V (%), enquanto os cereais de inverno foram utilizados para a determinação dos teores críticos de P e K. Dentre as camadas de solo, a camada 0-0,20 m foi considerada como referência, tendo como base a pesquisa realizada com a mesma base experimental deste estudo, segundo a qual o efeito da calagem e o da adubação, aplicados na superfície do solo, expressam-se em toda a camada de 0-20 cm, ou seja, não se restringem à camada de 0-10 cm, bem como há grande similaridade entre os índices de correlação dos atributos de acidez e de disponibilidade de P e K de ambas as camadas com o desenvolvimento e produtividade das culturas de soja, milho, trigo, cevada e aveia branca (Vieira, 2010). Portanto, com base nas culturas de referência e na camada diagnóstica de 0-0,20 m, sugere-se que os níveis críticos de acidez considerados para calagem em solos em PD em longo prazo sejam pH (CaCl2) = 4,9 e V = 60 %. Em relação aos nutrientes, os teores críticos sugeridos são 8 mg dm-3, para P, e 0,30 cmolc dm-3, para K.

CONCLUSÕES

1. As culturas apresentam diferente sensibilidade à acidez e à disponibilidade de fósforo e potássio no solo. A soja é mais sensível à acidez, enquanto os cereais de inverno (trigo, cevada e aveia branca) são mais sensíveis à disponibilidade de fósforo e potássio.

2. Os níveis críticos relacionados à acidez e à disponibilidade de fósforo e potássio nos Latossolos da região Centro-Sul do Paraná, em plantio direto em longo prazo, são maiores para a camada de 0-0,10 m do que para a de 0-0,20 m.

3. As culturas mais sensíveis, tomadas como referência, e considerando a camada diagnóstica de 0-0,20 m, sugere-se, para os Latossolos em plantio direto em longo prazo na região Centro-Sul do Paraná, que os critérios para calagem sejam pH (CaCl2) de 4,9 e saturação por bases de 60 % e que os níveis críticos de fósforo e potássio sejam 8,0 mg dm-3 e 0,30 cmolc dm-3, respectivamente.

AGRADECIMENTOS

À equipe da Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária (FAPA), em especial aos técnicos Antônio Sandro de Lima Rodrigues e Adão Paulo Rodrigues; aos cooperados da Cooperativa Agrária Eduardo Reinhofer, Hermine Leh e Jorge Fassbinder, e seus respectivos engenheiros-agrônomos, Otavino Rovani, Silvino Caus e Maurício Gruzska, pela cessão das áreas e pelo apoio na condução de alguns dos experimentos; e ao CNPq, pelo apoio financeiro e pelas bolsas concedidas aos autores.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 06 de setembro de 2011 e aprovado em 29 de novembro de 2012.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Mar 2013
  • Data do Fascículo
    Fev 2013

Histórico

  • Recebido
    06 Set 2011
  • Aceito
    29 Nov 2012
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