Resumos
O subgênero Chevaliera está representado por 21 espécies, das quais grande parte ocorre no Brasil, habitando diferentes ecossistemas. Com o objetivo de auxiliar a taxonomia das espécies, são apresentados dados da anatomia foliar de 11 espécies do subgênero. Entre os caracteres mais relevantes destacam-se: posição dos estômatos, câmara subestomática com células espessadas, hipoderme, número de camadas do parênquima aqüífero, o formato das células dos canais de aeração e distribuição das fibras no mesofilo.
Aechmea; anatomia foliar; Bromeliaceae; Chevaliera
The subgenus Chevaliera comprises 21 species most of them occuring in several Brazilian ecosystems. In order to expand the taxonomic knowledge of this subgenus, data on the leaf anatomy of 11 species is presented. Among the characters which were described in this study, the most relevant ones are: stomata position, the thickeness of the substomatic chamber cells, hypodermis, number of layers of the water storage tissue, the shape of the cells that form air channels and the distribution of the fibers in the mesophyll.
Aechmea; Bromeliaceae; Chevaliera; leaf anatomy
Anatomia foliar de espécies brasileiras de Aechmea subg. Chevaliera (Gaudich. ex Beer) Baker, Bromelioideae-Bromeliaceae1 1 Parte da tese de doutorado da primeira autora, Programa de Pós-graduação em Botânica da Universidade de São Paulo.
Leaf anatomy of Brazilian species of Aechmea subgenus Chevaliera (Gaudich. ex Beer) Baker, Bromelioideae-Bromeliaceae
Gardene Maria de SouzaI, 2 2 Autor para correspondência: gardene@terra.com.br ; Maria Emília Maranhão EstelitaII; Maria das Graças Lapa WanderleyIII
IUniversidade Federal do Piauí, CCN, Departamento de Biologia, Campus da Ininga, 64049-550 Teresina, PI, Brasil
IIUniversidade de São Paulo, Departamento de Botânica, Rua do Matão, Travessa 14, CDU, 05508-900 São Paulo, SP, Brasil
IIIInstituto de Botânica, Seção de Curadoria do Herbário, Caixa Postal 4005, 01061-970 São Paulo SP, Brasil
RESUMO
O subgênero Chevaliera está representado por 21 espécies, das quais grande parte ocorre no Brasil, habitando diferentes ecossistemas. Com o objetivo de auxiliar a taxonomia das espécies, são apresentados dados da anatomia foliar de 11 espécies do subgênero. Entre os caracteres mais relevantes destacam-se: posição dos estômatos, câmara subestomática com células espessadas, hipoderme, número de camadas do parênquima aqüífero, o formato das células dos canais de aeração e distribuição das fibras no mesofilo.
Palavras-chave:Aechmea, anatomia foliar, Bromeliaceae, Chevaliera
ABSTRACT
The subgenus Chevaliera comprises 21 species most of them occuring in several Brazilian ecosystems. In order to expand the taxonomic knowledge of this subgenus, data on the leaf anatomy of 11 species is presented. Among the characters which were described in this study, the most relevant ones are: stomata position, the thickeness of the substomatic chamber cells, hypodermis, number of layers of the water storage tissue, the shape of the cells that form air channels and the distribution of the fibers in the mesophyll.
Key words:Aechmea, Bromeliaceae, Chevaliera, leaf anatomy
Introdução
Aechmea subgênero Chevaliera (Gaudich. ex Beer) Baker, está representado por cerca de 21 espécies, 17 das quais ocorrem no Brasil (Luther & Sieff 1994, 1998). São encontradas em diferentes ecossistemas tais como: Floresta Amazônica, Floresta Atlântica e Restinga (Smith & Downs 1979). O subgênero caracteriza-se por apresentar inflorescência simples, do tipo espiga ou capítulo ou composta, em racemo de espigas, neste caso, apresentando 2 a 20 espigas por inflorescência. Apresenta bráctea floral rígida, sépalas e pétalas conatas na base e pétalas formando ou não um tubo acima do hipanto. As pétalas apresentam na face interna um par de apêndices.
Estudos sobre anatomia foliar em Bromeliaceae datam do início do século XX. Desses, alguns apresentam enfoque ecológico, sendo poucos os de cunho taxonômico. Krauss (1949) estudou a anatomia dos órgãos vegetativos do abacaxi (Ananas comosus (L.) Merr.), Robinson (1969) enfocou a anatomia foliar de espécies dos gêneros Connellia N.E. Brown, Cottendorfia Schultes f., Navia Mart. ex Schultes f. e Tomlinson (1969) apresentou uma visão geral da anatomia para a família. Ainda podem ser citados os trabalhos de Smith & Downs (1974) sobre a anatomia de alguns gêneros na família, os de Flores (1975), que comparou a anatomia foliar de Aechmea mexicana Baker e Hechtia glomerata Zucc., e de Braga (1977), que estudou a anatomia de espécies de Bromeliaceae da campina amazônica. Autores, como Brighigna et al. (1984), estudaram as características estruturais do mesofilo de algumas espécies de Tillandsia L. e, como Sousa & Neves (1996), compararam a anatomia foliar de quatro espécies de Tillandsia. Pita (1997) descreveu a anatomia dos órgãos vegetativos de espécies de Dyckia Schultes f. e de Encholirium Mart. ex Schultes f., e Sajo et al. (1998) mostraram aspectos estruturais das folhas de diferentes Bromeliaceae. Proença (2000) analisou folhas de espécies de Aechmea e, mais recentemente, Aoyama & Sajo (2003) analisaram a estrutura foliar de espécies de Aechmea subg. Lamprococcus (Beer) Baker e gêneros relacionados.
O presente trabalho tem como objetivo analisar a anatomia foliar de espécies brasileiras de Aechmea subgênero Chevaliera, enfocando características estruturais que auxiliem na taxonomia do grupo.
Material e métodos
No presente estudo foram analisadas 11 espécies brasileiras de Aechmea subg. Chevaliera. Os materiais testemunho encontram-se depositados nos herbários indicados abaixo, cujas siglas seguem Holmgren & Holmgren (2003).
Aechmea castanea L.B. Sm. - BRASIL. Espírito Santo: Cariacica, 8-III-2001, G.M. Sousa et al. 473 (SP); Santa Teresa, 10-III-2001, G.M. Sousa et al. 481 (SP). Aechmea conifera L.B. Sm. - BRASIL. BAHIA: Una, 6-V-2001, G.M. Sousa et al. 490 (SP, CEPEC).Aechmea depressa L.B. Sm. - BRASIL. BAHIA: Una, 7-II-2000, G.M. Sousa et al. 308 (SP, CEPEC, TEPB); Santa Cruz da Vitória, 7-V-2001, G.M. Sousa et al. 491(SP). Aechmea digitata L.B. Sm & R.W. Read - BRASIL. BAHIA: Almadina, 9-II-2000, G.M. Sousa et al. 311 (SP, CEPEC, TEPB). Aechmea hostilis E. Pereira. - BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Santa Teresa, 16-II-2000, G.M. Sousa et al. 318 (SP, MBML); 30V2000, G.M. Sousa et al. 321 (SP, TEPB). Aechmea leucolepis L.B. Sm. - BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Santa Teresa, 27-II-2002, G.M. Sousa et al. 499 (SP). Aechmea multiflora L.B. Sm. - BRASIL. BAHIA: Ilhéus, 6-II-2000, G.M. Sousa et al. 300 (SP, CEPEC); Mata de São João, 13-VI-2000, G.M. Sousa et al. 354 (SP, TEPB). Aechmea perforata L.B. Sm. - BRASIL. BAHIA. Jussarí, 11-II-2000, G.M. Sousa et al. 312 (SP, CEPEC). - BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Santa Teresa, 15-II-2000, G.M. Sousa et al. 313 (SP, MBML, TEPB). Aechmea rodriguesiana (L.B. Sm.) L.B. Sm. - BRASIL. AMAZONAS: Manaus, 10XI2000, G.M. Sousa et al. 390 (SP, INPA). Aechmea saxicola L.B. Sm. - BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Santa Teresa, 27-VI-2001, L. Kollmann et al. 4018 (SP, MBML). - BRASIL. RIO DE JANEIRO: Rio das Ostras, II-2000, Pablo s.n. (SP363887). Aechmea sp. nov. - BRASIL. ESPÍRITO SANTO: Cariacica, 6-II-2000, G.M. Sousa et al. 331 (SP).
Porções da região mediana de folhas foram coletadas no campo e conservados em álcool 70% (Johansen 1940). Foram realizadas secções transversais, à mão livre, com auxílio de lâmina de barbear, na região mediana e no bordo. As secções transversais obtidas foram coradas em solução aquosa de safranina a 0,1% e azul de astra 0,1% (Bukatsch 1972). Para análise da epiderme em vista frontal, os materiais foram dissociados pela solução de Jeffrey (Johansen 1940). Lâminas semi-permanentes foram confeccionadas usandose como meio de montagem glicerina 50%.
Para testes microquímicos foram utilizados solução de lugol e cloreto de zinco iodado para detectar amido (Johansen 1940), solução de floroglucinol acidificado para lignina (Sass 1951), Sudan IV para substâncias lipofílicas (Gerlach 1984) e cloreto férrico para substâncias fenólicas (Johansen 1940).
Para melhor definição de escamas e estômatos, foram desidratadas porções da região mediana da folha em série etanólica crescente, utilizando-se ponto crítico (Horridge & Tamm 1968); as amostras foram, em seguida, metalizadas e observadas ao Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV), modelo Zeiss DSM 940.
As fotomicrografias foram obtidas utilizando-se câmara Leica MPS - 30, adaptada a um fotomicroscópio Leica.
Resultados
Em vista frontal, as folhas de todas as espécies estudadas apresentam grande quantidade de escamas peltadas em ambas superfícies, porém a maior concentração encontra-se na superfície abaxial. Na grande maioria das espécies, as escamas apresentam distribuição irregular, como em A. castanea L.B. Sm. (figura 1), A. depressa L.B. Sm. (figura 2) A. hostilis E. Pereira (figura 3) e A. leucolepis L.B. Sm. (figura 4); entretanto, em A. conifera L.B. Sm. e A. rodriguesiana (L.B. Sm.) L.B. Sm. (figuras 5, 6) elas estão dispostas em fileiras longitudinais. As escamas apresentam células da ala (figuras 1, 2, 4, 6) e disco central, o qual é pouco perceptível no material dissociado (figuras 5, 7).
Em vista frontal, as células epidérmicas apresentam paredes anticlinais sinuosas como em A. multiflora L.B. Sm. (figura 8) e A. rodriguesiana (figura 5). Grânulos esféricos, provavelmente de sílica, podem ser notados no interior das células epidérmicas de A. multiflora, A. hostilis e A. perforata L.B. Sm. A diferença entre as duas superfícies é notada, basicamente, pela quantidade de escamas, aparentemente menos abundante na superfície adaxial, como observado para A. saxicola L.B. Sm. (figura 9), e pela presença dos estômatos tetracíticos na face abaxial como observado na figura 5. Esses estômatos estão dispostos, na maioria das espécies, em depressões (tabela 1), como em A. digitata L.B. Sm. & R.W. Read (figura 10), A. hostilis (figura 11) e A. multiflora (figura 12). Os estômatos podem apresentar-se cobertos pelas alas das escamas com distribuição contínua como em A. rodriguesiana (figuras 6), ou descontínua, como em A. digitata e A. hostilis (figuras 10, 11).
Em secções transversais da lâmina foliar observase que as escamas se inserem pelo pedículo, em depressões epidérmicas (figura 13). O pedículo é constituído por três a quatro células, sendo as superiores retangulares e as basais quadrangulares, como observado em A. conifera (figura 13). A epiderme é uniestratificada, com células relativamente pequenas, de paredes espessadas e lúmem reduzido. Em todas as espécies estudadas, a cutícula é delgada e alcança a câmara subestomática. Na superfície inferior a epiderme é fortemente ondulada em A. hostilis e A. saxicola e levemente ondulada em A. depressa e A. multiflora. Os estômatos são aprofundados, em espécies como A. conifera (figura 14) e A. perforata (figura 15), ou localizam-se no mesmo nível das demais células epidérmicas, como em A. rodriguesiana. As células-guarda apresentam paredes espessadas que se projetam formando cristas (figura 14). Em Aechmea conifera (figura 14), A. digitata e A. rodriguesiana, as células que formam as câmaras subestomáticas apresentamse espessadas e, na região de contato direto com as células-guarda, encontram-se muito próximas, restringindo a abertura das mesmas (tabela 1).
A lâmina foliar mostra hipoderme mecânica que contém células alongadas no sentido anticlinal e com paredes espessadas, que se dispõem em uma a quatro camadas na região adaxial, como em A. hostilis (figura 16), e células retangulares em uma a três camadas na superfície abaxial, como em A. conifera (figura 13) e A. perforata (figura 15). Na região do bordo, a hipoderme mecânica é formada por maior número de camadas de células espessadas que se conectam com projeções espinescentes.
Adjacente à hipoderme mecânica, ocorre um parênquima aqüífero com número de camadas celulares variando de uma, como em Aechmea sp. nov. (figura 17), a sete camadas, como em A. digitata (figura 18). Seguese o parênquima clorofiliano, formado por células isodiamétricas e canais de aerênquima com células braciformes; estes últimos são contíguos às câmaras subestomáticas. As projeções celulares (braços) são acentuadas em A. castanea, A. conifera, A. digitata (figuras. 18, 20) e A. rodriguesiana. Em A. depressa, A. hostilis, A. leucolepis (figuras 21, 22), A. multiflora, A. perforata, A. saxicola (figuras 23) e Aechmea sp. nov. as projeções são curtas podendo a célula tender à isodiamétrica (tabela 1).
Idioblastos contendo ráfides foram observados nas células do parênquima aqüífero e clorofiliano em A. digitata (figura 18), A. saxicola (figura 23), A. depressa (figura 24), A. hostilis (figura 25), A. multiflora e Aechmea sp. nov. (figura 26).
Todos os feixes vasculares são colaterais e estão dispostos em uma única série, onde os de calibre maior alternam-se com os de calibre menor (Figuras 18, 19, 21, 23, 25, 26); esses feixes intercalam-se com os canais de aerênquima ou com células de parênquima clorofiliano. Os feixes de calibre maior, como em A. castanea (figura 19), A. saxicola (figura 23), A. depressa (figura 24), A. hostilis (figura 25), A. multiflora, A. perforata, A. rodriguesiana, e Aechmea sp. nov. (figura 26, 27), são completamente circundados por bainhas de fibras fortemente lignificadas, cujas células também evidenciam a lamela de suberina quando submetidas ao Sudan IV. Em A. digitata (figura 18), A. leucolepis (figuras 21, 22) e A. conifera (figura 28), essas fibras aparecem apenas como calotas adjacentes ao floema e xilema, situação que ocorre nos feixes de calibre menor de todas as espécies. Ainda podem ser observadas em A. digitata (figura18) e A. castanea (figuras 19, 29) calotas alongadas como extensões da bainha em direção à superfície adaxial. Também devem ser destacados feixes vasculares que se anastomosam com outros vizinhos, em muitos casos atravessando os canais de aerênquima (figuras 23, 26).
O parênquima clorofiliano contiguo às bainhas dos feixes vasculares apresenta disposição radiada em A. leucolepis (figura 22) e A. perforata (figura 31).
Fibras não associadas aos feixes vasculares, encontram-se dispersas no parênquima clorofiliano, próximo à face abaxial em A. saxicola (figura 23), A. hostilis (figura 25) e Aechmea sp. nov. (figura 26); em todo o mesofilo, hipoderme e parênquima clorofiliano em A. castanea (figura 19), A. conifera (figura 28), A. perforata (figura 30) e A. rodriguesiana (figura 32); na periferia da hipoderme mecânica da face adaxial e parênquima clorofiliano em A. digitata (figura 18) e A. leucolepis (figura 21), e dispersas somente no parênquima clorofiliano em A. depressa (figura 24) e A. multiflora (tabela 1).
Substâncias fenólicas foram detectadas no mesofilo de A. multiflora e nas células do pedículo das escamas foliares de todas as espécies estudadas.
Chave de identificação das espécies estudadas
1. Fibras circundando parcialmente os feixes vasculares (calotas)
2. Células da câmara subestomática espessadas; canais de aeração compostos por células braciformes
3. Parênquima aqüífero com 3-4 camadas ................................. A. conifera
3. Parênquima aqüífero com 7-8 camadas .................................. A. digitata
2. Células da câmara subestomática não espessadas; canais de aeração compostos por células isodiamétricas ..................................... A. leucolepis
1. Fibras circundando completamente os feixes vasculares
4. Células dos canais de aerênquima com projeções acentuadas
5. Estômatos localizados no nível das demais células epidérmicas ..................... ................................................................................... A. rodriguesiana
5. Estômatos localizados em depressões da epiderme ................. A. castanea
4. Células dos canais de aerênquima com projeções curtas, isodiamétricas
6. Fibras não associadas aos feixes vasculares dispersas no parênquima clorofiliano e próximo a face abaxial ou dispersos só no parênquima clorofiliano; idioblastos presentes (com ráfides)
7. Parênquima aqüífero com apenas 1 camada de células ..... Aechmea sp.nov.
7. Parênquima aqüífero com 2-5 camadas de células
8. Epiderme adaxial, em corte transversal, fortemente ondulada; fibras não associadas aos feixes vasculares dispersas no parênquima clorofiliano e próximo a face abaxial
9. Parênquima aqüífero com 2-3 camadas de células alongadas verticalmente ............................................................ A. hostilis
9. Parênquima aqüífero com 3-5 camadas de células isodiamétricas .......... .............................................................................. A. saxicola
8. Epiderme adaxial em corte transversal levemente ondulada; fibras não associadas aos feixes vasculares dispersos só no parênquima clorofiliano
10. Parênquima aqüífero com 2-3 camadas de células ........ A. depressa
10. Parênquima aqüífero com 4-5 camadas de células......... A. multiflora
6. Fibras não associadas aos feixes distribuídas em todo o mesofilo; idioblastos ausentes ........................................................................ A. perforata
Discussão
Em Bromeliaceae a presença de escamas peltadas é considerada uma sinapomorfia para a família (Gilmartin & Brown 1987). Tais escamas têm a função de absorver água e nutrientes da atmosfera. Oferecem, também, proteção mecânica e restrição à transpiração (Tomlinson 1969, Benzing & Burt 1970, Benzing et al. 1976, Benzing et al. 1985, Souza & Neves 1996), além de protegerem contra predadores e atraírem polinizadores e dispersores por formarem um denso indumento sobre inflorescências e frutos, refletindo a luz e secretando enzimas digestivas (Benzing 2000). Na subfamília Bromelioideae essas estruturas apresentam quatro células centrais e ala menos conspícua (Gilmartin 1972). O número de células do pedículo pode variar numa mesma folha (Tomlinson 1969).
Embora, essas escamas estejam presentes nas duas superfícies foliares, no presente trabalho observou-se maior abundância na superfície abaxial, corroborando as informações de Strehl (1983), no qual a autora admite que os caracteres sejam mais conservativos na superfície abaxial do que na adaxial, a qual está mais exposta às variações macroclimáticas.
Na maioria das espécies estudadas as escamas estão distribuídas irregularmente, porém Braga (1977) encontrou, em A. mertensii (Meyer) Schultes f. e A. setigera (L.) Griseb. (Aechmea subg. Aechmea), escamas distribuídas em fileiras na região mediana da folha, corroborando os dados encontrados neste trabalho para A. conifera L.B. Sm. e A. rodriguesiana (L.B. Sm.) L.B. Sm.
Como registrado para Bromeliaceae, os estômatos estão restritos à epiderme abaxial e nas espécies estudadas esses se apresentam distribuídos irregularmente ou raramente em fileiras longitudinais como em A. rodriguesiana.
A grande maioria dos estômatos ocorre em depressões epidérmicas e é encoberto por escamas, o que, segundo Tomlinson (1969), previne a perda de água. Foi constatado que estômatos em depressões epidérmicas ocorrem nas espécies de florestas litorâneas, como as analisadas nesse estudo. Já estômatos no mesmo nível das células epidérmicas ocorrem na única espécie analisada, típica da Floresta Amazônica (A. rodriguesiana), ambiente onde o índice de umidade é sempre elevado. Entretanto, no trabalho de Aoyama & Sajo (2003), todas as espécies de Aechmea (Aechmea subg. Lamprococcus) analisadas apresentaram estômatos no mesmo nível das células epidérmicas, das quais apenas A. corymbosa (Mart. ex Schultes f.) Mez é proveniente da Floresta Amazônica, indicando que este caráter não deve estar relacionado ao ambiente.
A presença de espessamento nas células das câmaras subestomáticas contribui para diminuir a superfície de evaporação, fato também observado para outras plantas que apresentam tecidos armazenadores de água, como Opuntia inermis DC. (Cactaceae), conforme constatado por Osmond et al. (1979). No presente trabalho esse espessamento foi observado em A. conifera, A. digitata L.B. Sm. & R.W. Read e A. rodriguesiana. Proença (2000), Sajo et al. (1998) e Aoyama & Sajo (2003) observaram esse caráter em espécies de Aechmea de outros subgêneros.
As folhas das Bromeliaceae aqui estudadas mostraram características xeromorfas tais como: paredes das células epidérmicas espessadas, presença de hipoderme diferenciada em tecido mecânico e tecido armazenador de água, além de considerável número de fibras lignificadas e compactação do mesofilo. Segundo Tomlinson (1969), o estrato hipodérmico esclerificado nas Bromeliaceae é contínuo e uniforme na superfície adaxial e pouco desenvolvido na superfície abaxial onde se apresenta interrompido pelas câmaras subestomáticas; o autor comenta, ainda, que esse tecido esclerenquimático apresenta células maiores nas camadas no bordo foliar que se projetam para o interior dos espinhos, considerado no presente estudo como projeções espinescentes.
As escamas foliares em Bromeliaceae podem proteger a planta da excessiva luminosidade e propiciar a absorção de água (Benzing et al. 1976). Segundo Brighigna et al. (1984) a água absorvida pelas escamas é armazenada no parênquima aqüífero, protegendo o parênquima clorofiliano contra a dessecação favorecendo a fotossíntese.
Não foram observadas camadas de célula em paliçada, o que coincide com a observação de Downs (1974), que supõe que a ocorrência delas não seja freqüente em Bromeliaceae, embora Proença (2000) tenha encontrado esse tecido em A. bromeliifolia (Rudge) Baker (Aechmea subg. Macrochordion) e A. nudicaulis (L.) Griseb. (Aechmea subg. Pothuava (Baker) Baker)
Canais de aeração são encontrados nos representantes de Bromeliaceae; tais canais ocasionalmente estão interrompidos por diafragmas constituídos por células braciformes. A função desses canais é discutida no trabalho de Krauss (1949); entretanto, Tomlinson (1969) e Souza & Neves (1996) sugerem que tais canais facilitam a aeração em espécies de ambientes mésicos e que estes se comunicam com a câmara subestomática nas folhas de bromélias mesófitas.
A distribuição dos feixes vasculares colaterais em uma única série na lâmina foliar é um caráter comum para a família e a presença de feixes comissurais muitos delgados conectando os feixes maiores tem sido observado para Bromeliaceae por diversos autores (Braga 1977, Pita 1997, Sajo et al. 1998, Proença 2000), sendo também verificado nas espécies do subgênero Chevaliera.
Feixes vasculares rodeados por células parenquimáticas e fibras formando bainhas e/ou calotas indicam que deve se tratar da endoderme e periciclo, respectivamente, de acordo com a nomenclatura de Van Fleet (1961). Autores como Pita (1997), Sajo et al. (1998) e Proença (2000) fazem referência à presença dessas camadas nas espécies de Bromeliaceae por eles analisadas. No presente estudo, entretanto, não foram realizados estudos ontogênicos para a identificação dessas regiões. Nos trabalhos de Krauss (1949), Flores (1975) e Braga (1977) a bainha dos feixes vasculares é referida apenas como parenquimática. As extensões de bainha dos feixes, como ocorrem em A. digitata e A. castanea, devem desempenhar papel importante na distribuição de água para o mesofilo, além de oferecer sustentação e proteção aos feixes vasculares conforme afirmam Van der Merwe et al. (1994). Extensões semelhantes podem ser vistas em outras espécies de Bromeliaceae, conforme apresentam Sajo et al. (1998) e Proença (2000).
Para Bromeliaceae é referido o processo fotossintético do metabolismo ácido crassuláceo ou CAM (Smith et al. 1986, Mc Williams 1970). Entretanto, em A. leucolepis L.B. Sm. e A. perforata L.B. Sm. o parênquima clorofiliano é disposto radialmente aos feixes vasculares, o que é uma das características das plantas com estrutura Kranz ou estrutura das plantas que realizam fotossíntese C4. Tal característica pode representar uma tendência à estrutura Kranz, como ocorre em plantas consideradas intermediárias entre C3 e C4. Essa disposição radiada também foi observada em outras espécies de Bromeliaceae por Sajo et al. (1998) e Aoyama & Sajo (2003).
A posição dos estômatos, a ocorrência de câmara subestomática com células espessadas, a presença de hipoderme, o número de camadas do parênquima aqüífero, o tipo de células que interrompem os canais de aeração e a distribuição de fibras do mesofilo auxiliam a delimitação das espécies de Aechmea subgênero Chevaliera. Tais características também foram utilizadas por Horres & Zizka (1995), Sajo et al. (1998) e Proença (2000) em oito espécies de Bromeliaceae. Isso informa a importância das mesmas na delimitação de táxons da família.
Agradecimentos As autoras agradecem aos curadores dos herbários CEPEC (André Mauricio de Carvalho - in memorian), MBML (Hélio Boudet) e INPA (Carlos Cid), pelo auxílio e facilidades na coleta dos materiais. Ao suporte financeiro da Capes/PICDT (bolsa de doutorado do primeiro autor) e do CNPq (bolsa de produtividade em pesquisa do terceiro autor).
(recebido: 22 de agosto de 2003; aceito: 8 de setembro de 2005)
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Maio 2006 -
Data do Fascículo
Set 2005
Histórico
-
Recebido
22 Ago 2003 -
Aceito
08 Set 2005