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A inflação brasileira e a teoria de jogos

Brazilian inflation and the Theory of Games

RESUMO

Com base na desagregação do setor privado como uma ampliação do conhecido modelo de jogo político de Barro & Gordon, um problema de coordenação e/ou cooperação dos determinadores de preços no setor privado é identificado como uma possível causa para a persistência da inflação, mesmo durante os esforços de estabilização. Esse tipo de persistência é, pelo menos no curto prazo, independente da disposição do governo de parar a inflação. Um processo de profecias autorrealizáveis é iniciado pelo comportamento de “esperar para ver” dos determinadores de preços do setor privado, o que pode resultar na renúncia à política de estabilização. Quebrar esse comportamento de “esperar para ver” pode ser um dos principais problemas na estabilização de economias com inflação crônica alta.

PALAVRAS-CHAVE:
Inflação; teoria dos jogos; estabilização

ABSTRACT

Based on the disaggregation of the private sector as an amplification of the well-known Barro & Gordon policy-game model, a coordination and/or cooperation problem of the price-setters in the private sector is identified as a possible cause for the persistence of inflation even during stabilization efforts. This kind of persistence is, at least in the short-term, independent from the willingness of the government to stop inflation. A process of self-fulfilling prophecies is started by the “wait-and-see” behavior of private sector’s price-setters, which can result in the giving up of the stabilization policy. Breaking this “wait-and-see” behavior could be one of the major problems in stabilizing economies with chronic high inflation.

KEYWORDS:
Inflation; game theory; stabilization

1. INTRODUÇÃO

Desde o final dos anos 70, o Brasil enfrenta uma inflação alta de pelo menos três dígitos (somente em 1986, o ano do Plano Cruzado, a inflação caiu para dois dígitos). Dentro desse período, o país foi submetido a vários planos econômicos e nenhum deles conseguiu resolver o problema da inflação. Em junho de 1994, a alta dos preços passou dos 5.000% nos últimos 12 meses, e as chances de que em breve a crise seja superada dependem agora do Plano Real. Tendo em vista a diversidade dos planos anti-inflacionários elaborados e executados, cresce a possibilidade de que o processo inflacionário tenha raízes na própria estrutura da economia brasileira. Neste trabalho, vou tentar explicar a inflação alta e persistente no Brasil através de um modelo simples que usa a teoria dos jogos. Ele é baseado na interdependência estratégica, fenômeno que já foi apontado como uma das raízes da inflação inercial pelos neoestruturalistas. Hoje em dia é exatamente essa interdependência estratégica que pode prejudicar o desempenho do plano atual. Em um regime de inflação alta e persistente, a política de preços das empresas tende a mudar, pois o empresário orienta-se cada vez mais pela política adotada pelos seus concorrentes diretos.

Na discussão do fenômeno da inflação inercial durante os anos 80 encontram-se duas explicações principais para o desenvolvimento observado da taxa de crescimento do nível de preços. Primeiro, a muito conhecida tese de que os mecanismos de indexação (tanto formal quanto informal) seriam a raiz principal desse fenômeno inflacionário. Uma segunda linha na literatura aponta a existência de uma interdependência estratégica entre os agentes do mercado como causa da inflação inercial. Será seguida aqui a segunda linha de explicação, mostrando-se um caminho através do qual a interdependência estratégica pode ser a base da inflação inercial. Para isso, pretendo trabalhar a partir da teoria de jogos e desenvolver o processo inflacionário como um jogo de (n+l) jogadores.1 1 O modelo que vou usar aqui faz parte de minha tese de mestrado (Diplomarbeit) defendida na Faculdade de Economia da Universidade de Bonn em 1991. A tese, portanto, trata da teoria da inflação inercial e de choques heterodoxos a exemplo do Brasil.

O artigo será dividido basicamente em três partes. Depois dessa breve introdução, primeiramente discutirei o assaz conhecido modelo de Barro & Gordon, que foi desenvolvido pelos autores em 1983 para tratar a questão da credibilidade da política monetária, e as suas ampliações elaboradas por Backus & Driffill (1985BACKUS, D. & DRIFFILL, J. (1985). “Inflation and reputation”. American Economic Review 75 (3). ) e pelo próprio Barro (1986BARRO, R. J. (1986). “Reputation in a model of monetary policy with incomplete information”. Journal of Monetary Economics nº 17. ). Esses modelos têm em comum considerar que o setor privado é um agregado. Por isso, esses jogos têm somente dois jogadores participando: o governo e o setor privado. Em um segundo passo, pretendo desagregar o setor privado e analisar as consequências da desagregação no contexto da interdependência estratégica. Na última parte, juntarei os dois primeiros passos e integrarei os resultados da segunda parte no modelo de Barro & Gordon.

2. O MODELO DE BARRO & GORDON E SUAS AMPLIAÇÕES

O modelo de Barro & Gordon de 1983BARRO, R. J. & GORDON, D.B. (1983). “Rules, discretion and reputation in a model of monetary policy”. Journal of Monetary Economics nº 12. concentra-se no problema de time-consistency (a consistência ao longo do tempo). Esse problema pode ser interpretado como um abismo entre a otimalidade ex-post e ex-ante de diferentes políticas. Por causa desse conflito só políticas que mostram a característica da otimalidade ex-post ganham credibilidade entre os agentes econômicos.2 2 Um resumo dos modelos desenvolvidos nos anos 80 a respeito da consistência temporal e da credibilidade encontra-se em Barrionuevo Filho (1994).

Barro & Gordon descrevem um jogo de duas pessoas, tendo como jogadores o governo de um lado e o setor privado do outro. A função de desembolso (payoff-function) do governo depende tanto da inflação do período como também da diferença entre a inflação efetiva e a inflação esperada pelo setor privado.

z = - 1 2 a π 2 + b π - π e , a , b > 0 (1)

Essa função tem como base uma função de oferta do tipo Lucas:

y = y n + π - π e

Nessas funções, π = inflação efetiva

πe= inflação esperada

y = produto efetivo

ya= produto natural

Ou seja, o efeito positivo de uma inflação inesperada é o efeito da curva Phillips. A função de desembolso usada aqui não é a função original de Barro & Gordon, mas a função usada por Backus & Driffill no seu artigo de 1985.

Para montar o jogo falta ainda a função de desembolso do setor privado.3 3 Essa também vem de Backus & Driffill, porque Barro & Gordon não precisavam dessa função.

u p = - π - π e 2 (2)

Nota-se aqui que o valor absoluto da inflação não tem importância se ela for antecipada corretamente! As duas funções de desembolso fazem parte do conjunto de informações dos dois jogadores. Nesse modelo o governo consegue fixar a taxa efetiva de inflação através da sua política (independentemente de ser ela monetária ou cambial).

A solução ex-ante

No caso da solução ex-ante, o governo sabe que no ótimo o setor privado vai antecipar a inflação efetiva. Isso quer dizer que no ótimo

π = π e ,

e por isso uP = 0.

Sabendo disso, a função (1) se reduz a

z = - 1 2 a π 2 (1’)

que tem como solução obviamente π* = 0. É essa a taxa de inflação que o governo vai anunciar que pretende realizar.

A solução ex-post

Ex-post, porém, o governo, depois de tê-la anunciado, tem um incentivo para não cumprir sua promessa. Quando o setor privado antecipa uma inflação zero, o governo enfrenta uma outra função que quer maximizar. A função (1) muda para o governo para

z = - 1 2 a π 2 + b π , (l”)

e assim o governo vai efetivamente produzir uma inflação

π n = b / a .

Por causa dessa problemática, a política de anunciar uma inflação zero não é time consistent, ou seja, não é confiável. O governo enfrenta um problema de credibilidade. Consequentemente, o equilíbrio único resulta da solução ex-post, em que a inflação será

π n = b / a .

Nesse caso o setor privado iria antecipar exatamente essa taxa de inflação, ou seja,

π e = b / a .

Essa é a chamada solução discricionária do jogo. Para podermos visualizar melhor o nosso jogo, vamos supor que a = b = 2 , e limitemos as políticas possíveis do governo π = O e π = 1. Isto significa que o governo segue ou uma política de estabilidade ou uma política inflacionária. Em nosso jogo, não existe uma política intermediária. Desta maneira, podemos mostrar os desembolsos do jogo na matriz do Gráfico 1.

Gráfico 1:
A matriz normalizada do jogo de Barro & Gordon

É uma matriz 2 por 2 com respectivamente duas possibilidades de ação para cada jogador. É fácil verificar que a estratégia π = 1 do governo domina de forma absoluta a estratégia π = 0, porque jogando a primeira, os desembolsos são sempre melhores para o governo. Sabendo disso, a matriz de desembolso relevante se reduz para uma de 1 por 2 para o setor privado. Como a opção πe = 1 dá um resultado melhor para o setor privado, a solução seria, a pareto-inferior, (π, πe) = (1,1) com os desembolsos (-1,0).

Na análise de um jogo de vários períodos - aqui só analisamos a versão estática do jogo - e com um horizonte de tempo não-definido4 4 Com um horizonte de tempo prefixado, a solução obtida via backward induction seria sempre 1t “. , o resultado de Barro & Gordon depende, infelizmente, de diversas suposições:

  • da estratégia de punição do tipo tit-for-tat escolhido por Barro & Gordon;

  • do fator exógeno de desconto; e

  • da solução πn, que se dará no caso de o governo não poder se comprometer a seguir uma política prefixada.

Outro problema da solução de Barro & Gordon é que ela não é única, e que ela mostra somente um intervalo de soluções possíveis. Mas é neste modelo que podemos ver perfeitamente o problema de time consistency: “The temptation to push the economy towards the first best, drives the equilibrium away from the second best to the third best”5 5 V. Persson (1988), p. 520. . Nesse caso, o first best seria quando o governo engana o setor privado e produz uma inflação inesperadamente baixa. O second best seria o governo anunciar e produzir uma inflação zero, com o setor privado acreditando na política anunciada. O “third best” seria a solução discricionária do jogo com πn = b/a, demonstrada acima.

Tanto na análise de Backus & Driffill (1985BACKUS, D. & DRIFFILL, J. (1985). “Inflation and reputation”. American Economic Review 75 (3). ) como na análise do próprio Barro (1986BARRO, R. J. (1986). “Reputation in a model of monetary policy with incomplete information”. Journal of Monetary Economics nº 17. ) existe uma solução única, mesmo com um número limitado de repetições do jogo, ou seja, com um horizonte de tempo limitado e dadas as expectativas do setor público. Os dois modelos são baseados no conceito de incomplete information. Ambos supõem que o setor privado não conhece exatamente o objetivo do governo. No jogo há dois tipos de governo: o tipo 1, que joga π = 0 em todas as situações, e o tipo 2, que tem a função de desembolso dada por (1) mostrada na página anterior.6 6 Governos do tipo I são caracterizados por Backus & Driffill com o termo hard-nosed. Esses governos têm uma função de desembolso igual ao do tipo 2, só que nesses casos b = 0. Assim o jogador do tipo 2 tem sempre um incentivo a produzir uma inflação não esperada, porque agindo dessa maneira ele consegue melhorar seu desembolso como vimos na análise ex-post.

Suponhamos a seguir que o período de análise seja fixo e o número de repetições conhecido por todos os jogadores. Por isso, a partir do momento em que é óbvio que o governo é do tipo 2, ou seja, a partir do momento em que o governo começa a inflacionar, o jogo tem como solução somente πn = 1, já que um governo do tipo 1 jamais iria fazer isto. Mas nesse jogo o governo do tipo 2 tem, no início do jogo, um incentivo para se disfarçar como um governo hard nosed.7 7 V. para ilustração o exemplo de Backus & Driffill (1985, p. 535f). Aqui os autores mostram, como um governo do tipo 2 consegue, através desse comportamento, melhorar os seus desembolsos no jogo. Supondo-se que as probabilidades do setor privado sejam p0 e (1 -p0) que o governo é respectivamente do tipo 1 ou 2, o jogo tem como solução um equilíbrio sequencial único.8 8 As probabilidades p0 e (1 - p0), fixadas pelo setor privado, podem ser interpretadas como a reputação do governo (Backus & Driffill (1985, p. 531). A solução é obtida a partir da aplicação da regra de Bayes na atualização das expectativas do setor privado.9 9 Para uma breve demonstração do conceito do equilíbrio sequencial, vide Tirole (1988). Nesse caso, um governo do tipo 2 é disciplinado e consegue melhorar os seus desembolsos só porque existe a possibilidade de um governo do tipo 1.

O importante é que, nesses modelos, a credibilidade não representa um problema no início do jogo, mas tende a se agravar no decorrer dele. Isso significa que, quando um governo do tipo 1 chega ao poder, com uma péssima reputação (nos modelos de Barro e de Backus & Driffill o p0 seria então muito pequeno), a redução da inflação vai ser demorada e acompanhada por uma forte recessão. Isso porque as expectativas inflacionárias do setor privado se encontram sempre acima da inflação efetiva. Do ponto de vista de Dornbusch & Fischer, isto mostra que mesmo para uma política com credibilidade continua válido: “But once the fundamentals are in place, there is still a credibility problem.?10 10 V. Dornbusch & Fischer (1986, p. 44). Cavallo (1981CAVALLO, D.F. (1981). “Stagflationary effects of monetarist stabilization policies in economies with persistent inflation”. In Flanders, M.J. & Razin, A., ed., Development in an inflationary world. Nova York, Academic Press, Inc. ) e Blejer & Leviathan (1987BLEJER, M.I. & LIVIATAN, N. (1987). “Fighting hyperinflation. Stabilization strategies in Argentina and Israel, 1985-86”. IMF Staff Papers 34 (3). ) comentam que esse problema de credibilidade pode ser resultado de um pessimismo inflacionário em países onde houve um período longo de uma economia cronicamente inflacionária com vários pacotes econômicos fracassados. Ou, como Diaz-Alejandro diz: “The expectations forming their (dos indivíduos; comentário do autor) behavior are based less on textbook models than on memories on previous failures within their own country”.11 11 V. Diaz-Alejandro (1981, p. 120).

Esse pessimismo inflacionário pode-se então incluir nos modelos de Barro e Backus & Driffill através de um p0 pequeno. Sabendo disso, o pessimismo inflacionário diminui o incentivo do governo a executar uma política de estabilização firme, frente aos custos altos (econômicos e políticos) que acompanhariam a estabilização.

3. A DESAGREGAÇÃO DO SETOR PRIVADO

A simplificação do modelo de Barro & Gordon, ou seja, tratar o setor privado como um único jogador, será abandonada na próxima seção. Mesmo que todos os jogadores (do setor privado) tenham o mesmo conjunto de informações e trabalhem com o mesmo modelo (suposições necessárias para uma agregação do setor privado), interdependências dentro do setor podem levar a uma inflação inercial. As diferentes possibilidades de interdependências estratégicas (fora do modelo de Barro & Gordon) serão apresentadas a seguir.

Suponhamos o setor privado como um jogo de n jogadores e cada um dos jogadores como fixador do seu preço.12 12 Essa suposição é questionável, mas em economias que não possuem mercados de competitividade perfeita, como, por exemplo, mercados bastante oligopolizados, não está fora da realidade. V., entre outros, Baer (1987), Canavese & di Tella (1988). Segundo Dornbusch, Sturzenegger & Wolf (1990), essa suposição depende do regime inflacionário (p. 8). Na interpretação do jogo há duas alternativas. Uma que vê o problema de cooperação como causa da inflação inercial e outra que responsabiliza o problema da coordenação pela inflação inercial.

3.1 O modelo de Yeager: o problema da cooperação

Suponhamos uma matriz de desembolsos como a do Gráfico 2 para o caso de n = 2, e que as estratégias possíveis dos jogadores sejam de aumentar ou não os seus preços. Esse jogo mostra um típico dilema de prisioneiros. Se ambos os jogadores se comportarem de maneira racional, os dois vão aumentar os seus preços. Eles vão usar as estratégias que levam ao equilíbrio Nash e que nesse caso coincidem com as estratégias Maximin, ou seja, com aquelas que minimizam as perdas possíveis no jogo para cada um dos jogadores. Esse equilíbrio, porém, é pareto-inferior ao caso em que ninguém aumenta os preços. Se os jogadores combinassem de não aumentar os preços, todos ficariam em uma situação melhor do que no equilíbrio Nash. Mas para citar Yeager: “Being the first to move would change relative prices, perhaps to his disadvantage. Instead of going first, he may rationally wait and see what others do ( ... ). What is individually rational and what is collectively rational may well diverge, as the well-known example of the prisoners’ dilemma illustrates. Taking the lead in a price and wage uptrend is a similar case in point.”13 13 Yeager (1981, p.19). Com a suposição de uma demanda fixa e de poucas capacidades disponíveis (que não podem ser aumentadas a curto prazo) pode-se imaginar uma matriz de desembolso como no gráfico acima. Quanto menores as perdas potenciais na demanda devido a um preço demasiado alto, e quanto maior a diferença entre os dois preços, mais provável fica uma estrutura de desembolsos como num dilema de prisioneiros.

Gráfico 2:
O jogo de Yeager

O resultado é um problema de cooperação dentro do setor privado. Se fosse possível convencer os jogadores a atuar de maneira cooperativa, um resultado pareto-melhor seria factível, e neste sentido, superior ao das estratégias (individualmente) racionais. No entanto, deve-se considerar o fato que, em uma dinamização do jogo, os desembolsos mudariam no decorrer do tempo. Não é plausível que uma política de preços com aumentos sempre acima da inflação cause um aumento contínuo do rendimento do jogador. A política de estabilização do governo, aqui não-modelada, também influenciaria os desembolsos nos períodos seguintes.

3.2 O modelo de Simonsen: o problema de coordenação

Um outro ponto de vista é representado por Simonsen. Para ele, o problema da interdependência estratégica não se mostra como um dilema de prisioneiros, mas é resultado de um conflito entre as estratégias Nash e as estratégias Maximin dos jogadores. As últimas representam um comportamento totalmente defensivo.

A ideia inicial veio de Tobin (1981TOBIN, J. (1981). “Diagnosing inflation: a taxonomy”. Aus Flanders, M.J. & Razin, A., ed. Development in an inflationary world . Nova York, Academic Press. ). Ele descreve o conflito como um jogo em que os jogadores têm como objetivo não só maximizar os seus rendimentos, mas sim manter o seu status relativo frente aos outros jogadores. Por isso, eles tentam se proteger da melhor maneira possível contra uma redistribuição dentro do setor privado, a qual iria prejudicá-los.

Partindo de uma economia cronicamente inflacionária e em que não há competitividade perfeita, perdas possíveis de demanda causadas por um preço demasiado elevado (e as perdas resultantes no rendimento real) são preferidas às perdas que resultam de um preço demasiado baixo, segundo Tobin.

Simonsen tentou aperfeiçoar este pensamento de Tobin. No jogo de duas pessoas na matriz do Gráfico 3, as estratégias Maximin para os jogadores X e Y são (X3,Y3). O equilíbrio Nash do jogo (X1,Y1) é único e pareto-eficiente.14 14 Os desembolsos dessa matriz são ad hoc. Para o nosso caso, as estratégias 1, 2 e 3 poderiam significar, por exemplo, respectivamente pt = 0, pt = 1/2 p-t, e pt = p-1 Segundo Simonsen, é pouco provável que com uma grande quantidade de jogadores e em um super-game seja alcançado esse equilíbrio Nash imediatamente na primeira rodada. A decisão de os jogadores já no primeiro período escolherem as suas estratégias Nash ou as estratégias Maximin depende de:

  • até que ponto um jogador pode partir da suposição de que os outros jogadores comportam-se também racionalmente optando pelas estratégias Nash15 15 A respeito do postulado de racionalidade da solução Nash, v. Holler & Illing (1991), p. 98f. ;

  • quanto um jogador pode perder, se ele próprio se comporta racionalmente, e os outros (ou alguns deles), porém, não se comportam de maneira racional.

Gráfico 3:
O jogo de Simonsen

Limitando o jogo apresentado nessa seção às estratégias 1 e 3, obtém-se como resultado um jogo com dois equilíbrios Nash: (X1,Y1) e (X3,Y3). O primeiro é payoff dominante no sentido de Harsanyi & Selten, enquanto o segundo pode ser alcançado através das estratégias Maximin, demonstrando-se dominante a respeito do risco.16 16 Para mais detalhes sobre os conceitos de dominância, v. Harsanyi & Selten (1988). Num jogo de n-pessoas, Simonsen supõe que os jogadores comportar-se-iam de forma completamente defensiva no início do jogo. Ou seja, iriam escolher a sua estratégia Maximin.17 17 Como no jogo de Yeager, eles mostram, segundo Dornbusch & de Pablo (1990), um comportamento do tipo wait and see Numa repetição contínua do jogo, os jogadores seguiriam uma estratégia simples com expectativas estáticas. Na otimização dos seus desembolsos, eles partem do princípio de que os outros jogadores manterão as estratégias escolhidas no período anterior. Simonsen explica um tal comportamento através do half-of-the-average game.18 18 Uma breve descrição do jogo encontra-se no apêndice. No caso do jogo do Gráfico 3, o equilíbrio Nash seria alcançado somente no quinto período.19 19 1º. período: (X3,Y3); 2o período: (X3,Y3); 3o período: (X2,Y2); 4o período: (X2,Y1); 5º período: (X1,Y1). Simonsen mostra que caso haja mais do que um equilíbrio Nash, essa convergência não existe necessariamente As divergências nos primeiros períodos do desembolso do equilíbrio Nash podem ser interpretadas como custos de transição.

Simonsen monta em seus artigos um jogo de fixadores de preço, no qual ele mostra um tal comportamento limitadamente racional como fonte de inflação inercial. No caso de uma economia cronicamente inflacionária, a taxa de inflação cai após um programa de estabilização, mas “how quick or how slow will be the adjustment is still an open question, but the possibility of strong inercial leading to disual recession cannot be ruled out”.20 20 V. Simonsen (1987, p. 28). Segundo Dornbusch & de Pablo é possível supor que esse processo de ajustamento seria lento e custaria caro em termos de desemprego e perdas no produto, e seria seguido por uma longa fase de inflação alta.21 21 V. Dornbusch & de Pablo (1990, p. 96f). Nesse caso o problema é de coordenação.

Resta a questão: por que os jogadores escolhem primeiro as suas estratégias Maximin em vez de alcançar logo na primeira jogada o equilíbrio Nash? Pois estratégias Maximin não representam uma solução racional dentro dos conceitos de teoria de jogos. Por essa razão, a interpretação do problema segundo Yeager, que parte do dilema de prisioneiros, seria, por um lado, preferível à de Simonsen. Por outro lado, o half-of-the-average game de Simonsen mostra que indivíduos são capazes de se comportar de forma limitadamente racional em situações de interdependência estratégica, se o potencial de perda é alto.22 22 Nos conceitos da bounded rationality, o indivíduo muitas vezes reage passivamente ao mercado em vez de exercer cálculos complicados. A respeito da bounded rationality, v. Selten (1990). Para evitar os custos altos devidos à interdependência estratégica dentro do setor privado, é preciso encontrar uma solução para o mencionado problema de coordenação e/ou cooperação.23 23 Também existe um problema de informação, Ou como Dornbusch, Sturzenegger & Wolf (l990) constatam: “When inflation is moderate to high, budget balancing is viewed as a negative sum game. Too many participants feel that inflation is costly to them and too few perceive that the reduction in resource waste will more than cover their costs.” (p. 49). Além disso, altos custos de transição podem fazer com que cada vez mais jogadores do setor privado acreditem no abandono, por parte do governo, da política de estabilização. Inicia-se um processo de self-fulfilling prophecies. O comportamento dos agentes econômicos faz com que os custos reais da política de estabilização aumentem cada vez mais. O governo encontra-se no dilema de ou aceitar esses custos ou realizar parte das expectativas negativas dos jogadores.24 24 V. Cukierman (1988, p. 66).

4. O MODELO DE BARRO & GORDON CONSIDERANDO A INTERDEPENDÊNCIA ESTRATÉGICA NO SETOR PRIVADO

Tentaremos a seguir integrar os resultados elaborados na segunda parte no modelo de Barro & Gordon.25 25 Aqui só será considerado o caso simplificado de duas estratégias possíveis por jogador. Para simplificar, o setor privado se constitui de apenas dois indivíduos, de tal maneira que se trata no total de um jogo de três pessoas. A função de desembolso dos indivíduos corresponde à função (2) apresentada no modelo de Barro & Gordon, somente ampliada pela parte da interdependência estratégica. Além disso, supõe-se um sistema de fixadores de preço, de forma que o fato decisivo já não é mais a diferença entre a inflação efetiva e a esperada, mas sim a diferença entre a inflação efetiva e o preço fixado pelo jogador i.26 26 Obviamente, esse preço parcialmente reflete as expectativas do jogador i.

u p i π , p i , p j = - π - p i 2 + p i - p j , i = 1 , 2 ; j = 1 , 2 ; i j (2’)

Nesse modelo o governo não consegue mais fixar a taxa de inflação através da sua política. Ele consegue influenciar essa taxa, mas não determiná-la. A inflação efetiva é igualmente dependente do comportamento da fixação de preços dos indivíduos e da política x do governo.

u p i π , p i , p j = - π - p i 2 + p i - p j , i = 1 , 2 ; j = 1 , 2 ; i j (3)

Essa suposição é contrária ao modelo de Barro & Gordon. Só é justificável, supondo-se implicitamente que a velocidade da moeda seja flexível.27 27 Como esse fato é comum em países de inflação extremamente alta, esse modelo pode ser considerado como uma tentativa de explicação para esses países. Se o governo agisse de maneira restritiva, mas os indivíduos não acreditassem nessa política e aumentassem os preços, a inflação cairia pouco, já que a velocidade de moeda aumentaria igualmente.

A função de desembolso do governo seria28 28 Essa função corresponde à função original de desembolso do nosso modelo na seção 1, ampliado pelo setor privado heterogêneo. :

z x , p 1 , p 2 = - π 2 + 2 π - 1 2 p 1 + p 2 . (1”)

Supondo que os indivíduos fixassem os seus preços sem saberem como o governo irá agir finalmente, obter-se-ia a seguinte árvore do jogo:29 29 Como a árvore mostra, no momento em que os jogadores tomam a decisão, eles não conhecem o comportamento dos outros.

Gráfico 4:
A árvore do modelo modificado de Barro & Gordon

Esta árvore pode ser analisada de maneira retrospectiva. Posta a condição de uma política não-inflacionária por parte do governo (isto é, x = 0), os jogadores do setor privado se encontram frente à matriz de desembolso mostrada no Gráfico 5. Isso corresponde a um dilema de prisioneiros, de modo que, no equilíbrio, os dois jogadores iriam inflacionar.

Gráfico 5:
Desembolsos do setor privado no caso de X = 0

Mesmo com uma política não-inflacionária do governo, é melhor para os dois jogadores do setor privado elevar os seus preços, devido à interdependência estratégica.

Se o governo decidir inflacionar (isto é, x = 1), a matriz de desembolso para o setor privado será a do Gráfico 6. Também aqui, ambos os jogadores vão inflacionar no equilíbrio. Segundo a matriz de desembolso, é vantajoso para os dois jogadores escolher a estratégia p = 1, para se defender do risco de grandes perdas.

Gráfico 6:
Desembolsos do setor privado no caso de x =1

Como o governo conhece a estrutura do jogo, ele consegue calcular esses dois equilíbrios. Sabendo como os jogadores do setor privado vão reagir à sua política, o governo também vai inflacionar no equilíbrio, devido a seus custos menores (-10/9 comparado com - 1). O jogo tem, portanto, um equilíbrio único [(x,p1p2) = (1,1,1)] com os desembolsos (-1,0,0). No entanto, esse equilíbrio não é eficiente.30 30 O first best seria (x,p1,p2) = (1,0,0) com os desembolsos (5/9,-1/9,-1/9). O second best seria (x,p1,p2)= (0,0,0).

Essa análise refere-se a um governo do tipo 2, como descrito acima, e não ao do tipo hard nosed de Backus & Driffill. Seguindo a sua função de desembolso, o último nunca iria inflacionar, mas terminaria sempre numa situação inflacionária, devido à interdependência estratégica no setor privado.

O jogo mostra que a inflação pode continuar, independentemente da política ou do objetivo do governo.31 31 Embora não continue no mesmo nível absoluto. O processo de estabilização seria então mais longo e mais caro para a economia inteira. Em um próximo passo, esse modelo estático poderia ser dinamizado, com a finalidade de se verificar se dessa forma o mesmo não resultaria em um equilíbrio sequencial. Essa dinamização deveria incluir também as mudanças nos desembolsos dos jogadores no decorrer do tempo, sempre dependendo do desenvolvimento da inflação até esse ponto.

5. CONCLUSÃO

Mostramos no modelo desenvolvido acima que as dificuldades do governo em baixar a inflação não tem as suas raízes somente no problema reputacional, como acontece no modelo de Barro & Gordon, mas também na própria estrutura do setor privado da economia. É bem provável que a sociedade brasileira, com a sua longa história inflacionária e com a sua estrutura econômica oligopolizada, encontre-se num dilema parecido como aquele mostrado anteriormente. A maioria dos agentes econômicos teme confiar demasiadamente cedo em um programa de estabilização do governo e terminar perdendo ao não aumentar os preços no ritmo dos outros. Enquanto o governo não conseguir convencer os agentes econômicos a seguir sua política, será muito difícil combater a inflação brasileira.

É esse fenômeno da desconfiança entre os próprios agentes do setor privado que pode prejudicar por exemplo um plano de estabilização. O atual plano - que inclusive é amplamente aceito entre os economistas - depende muito do comportamento dos agentes econômicos no início da fase 3 do programa (introdução do Real). Como o plano não previu nenhum tipo de congelamento, um comportamento wait-and-see iria resultar em uma inflação que pode - através de self-fulfilling prophecies - aumentar a resistência contra o plano. Conseguir evitar esse tipo de comportamento facilitaria a tarefa do governo de estabilizar a economia. A introdução da URV numa fase transitória anterior à reforma monetária poderia ser interpretada como medida para resolver - pelo menos parcialmente - o problema de coordenação/cooperação dentro do setor privado. Além disso, o governo tenta, através de várias medidas convencer a sociedade que vai ficar firme no combate à inflação, e procura meios para ganhar credibilidade. Mas mudanças adicionais, como por exemplo a reforma tributária, a reforma da previdência social e a do Banco Central são indispensáveis no combate à inflação no médio e longo prazo. O grande apoio que o plano recebe dentro da sociedade brasileira mostra que havia uma demanda por uma estabilização profunda. Mas somente nos próximos meses será revelado se a sociedade brasileira realmente já chegou ao ponto em que uma parte está disposta a também pagar por essa estabilização. Segundo Alesina & Drazen (1991ALESINA, A. & DRAZEN, A. (1991). “Why are stabilizations delayed?”. American Economic Review 81 (5). ), é só nesse estágio que será possível realizar uma estabilização de verdade. Ou haveria ainda no Brasil necessidade de mais crises para se preparar uma reforma econômica profunda, como sugere o modelo de Drazen & Grilli (1993DRAZEN, A. & GRILLI, V. (1993). “The benefit of crisis for economic reforms”. American Economic Review 83 (3). )?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAAS

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  • 1
    O modelo que vou usar aqui faz parte de minha tese de mestrado (Diplomarbeit) defendida na Faculdade de Economia da Universidade de Bonn em 1991. A tese, portanto, trata da teoria da inflação inercial e de choques heterodoxos a exemplo do Brasil.
  • 2
    Um resumo dos modelos desenvolvidos nos anos 80 a respeito da consistência temporal e da credibilidade encontra-se em Barrionuevo Filho (1994BARRIONUEVO FILHO, A. (1994). “A “credibilidade” da política econômica anti-inflacionária e sua consistência temporal”. Revista de Economia Política 14 (1), janeiro 1994 .. ).
  • 3
    Essa também vem de Backus & Driffill, porque Barro & Gordon não precisavam dessa função.
  • 4
    Com um horizonte de tempo prefixado, a solução obtida via backward induction seria sempre 1t “.
  • 5
    V. Persson (1988PERSSON, T. (1988). “Credibility of macroeconomic policy. An introduction and a broad survey”. European Economic Review nº 32. ), p. 520.
  • 6
    Governos do tipo I são caracterizados por Backus & Driffill com o termo hard-nosed. Esses governos têm uma função de desembolso igual ao do tipo 2, só que nesses casos b = 0.
  • 7
    V. para ilustração o exemplo de Backus & Driffill (1985BACKUS, D. & DRIFFILL, J. (1985). “Inflation and reputation”. American Economic Review 75 (3). , p. 535f). Aqui os autores mostram, como um governo do tipo 2 consegue, através desse comportamento, melhorar os seus desembolsos no jogo.
  • 8
    As probabilidades p0 e (1 - p0), fixadas pelo setor privado, podem ser interpretadas como a reputação do governo (Backus & Driffill (1985BACKUS, D. & DRIFFILL, J. (1985). “Inflation and reputation”. American Economic Review 75 (3). , p. 531).
  • 9
    Para uma breve demonstração do conceito do equilíbrio sequencial, vide Tirole (1988TIROLE, J. (1988). The theory of industrial organization. Cambridge, Ma., The MIT Press . ).
  • 10
    V. Dornbusch & Fischer (1986DORNBUSCH, R. & FISCHER, St. (1986). “Stopping hyperinflations past and present”. Weltwirtschaftliches Archiv, vol. 122. , p. 44).
  • 11
    V. Diaz-Alejandro (1981DIAZ-ALEJANDRO, C.F. (1983). “Some aspects of the 1982-83 Brazilian payment crisis”. Brookings Papers on Economic Activity nº 2. , p. 120).
  • 12
    Essa suposição é questionável, mas em economias que não possuem mercados de competitividade perfeita, como, por exemplo, mercados bastante oligopolizados, não está fora da realidade. V., entre outros, Baer (1987BAER, W. (1987). “The resurgence of inflation in Brazil, 1974-86”. World Development 15 (8). ), Canavese & di Tella (1988CANAVESE, A.J. & DI TELLA, G. (1988). “Inflation stabilization or hyperinflation avoidance? The case of the Austral-Plan in Argentina, 1985-87”. In Bruno, M. (et al.): Inflation and Stabilization. Cambridge, Ma., The MIT Press. ). Segundo Dornbusch, Sturzenegger & Wolf (1990DORNBUSCH, R. & STURZENEGGER, F. & WOLF, H. (1990). “Extreme inflation: dynamics and stabilization”. Brookings Papers on Economic Activity nº 2. ), essa suposição depende do regime inflacionário (p. 8).
  • 13
    Yeager (1981YEAGER, L.B. (1981). Experiences with stopping inflation. Washington and London, American Enterprise Institute for Public Policy Research., p.19).
  • 14
    Os desembolsos dessa matriz são ad hoc. Para o nosso caso, as estratégias 1, 2 e 3 poderiam significar, por exemplo, respectivamente pt = 0, pt = 1/2 p-t, e pt = p-1
  • 15
    A respeito do postulado de racionalidade da solução Nash, v. Holler & Illing (1991HOLLER, M. & ILLING, G. (1991). Einführung in die Spieltheorie. Berlin, Springer Verlag. ), p. 98f.
  • 16
    Para mais detalhes sobre os conceitos de dominância, v. Harsanyi & Selten (1988HARSANYI, J.C. & SELTEN, R. (1988). A general theory of equilibrium selection in games. Cambridge, Ma., The MIT Press . ).
  • 17
    Como no jogo de Yeager, eles mostram, segundo Dornbusch & de Pablo (1990DORNBUSCH, R. & DE PABLO, J.C. (1990). “Argentina”. In Sachs, J.D.: Developing country debt and economic performance, vol. 2: Country Studies - Argentina, Bolívia, Brazil, Mexico. London. The University of Chicago Press. ), um comportamento do tipo wait and see
  • 18
    Uma breve descrição do jogo encontra-se no apêndice APÊNDICE O jogo de half-of- the-average Para mostrar que as pessoas nem sempre se comportam racionalmente, Simonsen (1987) explica no jogo de half-of-the-average como esse tipo de racionalidade limitada pode surgir. O jogo tem n jogadores. Cada um deles escreve um número real do intervalo fechado [0; l] num papel. Sendo x\ o número escolhido pelo jogador i, sua função de desembolso é a seguinte: z i = 0 , para x i > s 100 , para x i = s - 100 , para x i < s com s = 1 / 2 n ∑ i = 1 n x i Conhecendo as decisões tomadas pelos outros, o jogador i escolheria o número xi seguindo o cálculo seguinte: x i = n - 1 / 2 n - 1 y i com y i = 1 / n - 1 ∑ j ≠ i x j (1) que iria maximizar o seu desembolso. O equilíbrio Nash nesse jogo é único. Se todos os jogadores escolhem xi=O, cada um deles ganha 100. Mas devido à forma da função de desembolso, a estratégia Nash pode, rapidamente, resultar em uma perda para o jogador que a escolher. Um único jogador que não agir de forma racional transforma a estratégia Nash em uma estratégia de perda, escolhendo um número maior do que x=O, Como em (1) O~yi~l, cada escolha x i ≥ n - 1 / 2 n - 1 (2) significa uma estratégia Maximin. A retirada da desigualdade, deixando somente a igualdade, resulta na melhor estratégia Maximin dentre o conjunto de estratégias possíveis. Se os outros jogadores j ≠ i escolhem xj = 1, o jogador i consegue ganhar a quantia de 100, sem correr o risco de perder eventualmente 100, ou dependendo da racionalidade dos outros, decidindo-se segundo (2). Seguindo Simonsen, vamos supor que os jogadores, num jogo de vários períodos, ao tomar suas decisões consideram que o comportamento dos outros participantes no próximo período será estático. Assumindo essa simples estratégia de aprendizado de Simonsen, há uma convergência para o equilíbrio Nash nesse jogo. No primeiro período, sem que se tenha observado o comportamento dos outros, todos os jogadores escolhem as estratégias Maximin, ou seja: x i 1 = n - 1 / 2 n - 1 (3) Nos períodos seguintes os jogadores tomam as decisões a partir da estratégia de aprendizado, levando assim em conta o comportamento estático dos outros: x i t = n - 1 / 2 n - 1 y i , t - 1 (4) Como todos os jogadores seguem a mesma regra, eles se comportam de uma maneira similar, e pode-se concluir que xit = Yit. Usando esse resultado é possível reescrever (4) e mostrar o comportamento do jogador i no decorrer do tempo da seguinte maneira: x i t = n - 1 / 2 n - 1 t , para t ≥ 1 . (5) Para t → ∞ mostra uma convergência para o equilíbrio Nash. Nagel (1993) testou concepções parecidas do half-of-the-average game no laboratório experimental da Universidade de Bonn. Os experimentos feitos em dez sessões com um total de 166 participantes confirmaram um comportamento não racional. Eles levaram Nagel a propor uma teoria de bounded rationality e uma teoria de qualitative learning para explicar os resultados obtidos. .
  • 19
    1º. período: (X3,Y3); 2o período: (X3,Y3); 3o período: (X2,Y2); 4o período: (X2,Y1); 5º período: (X1,Y1). Simonsen mostra que caso haja mais do que um equilíbrio Nash, essa convergência não existe necessariamente
  • 20
    V. Simonsen (1987, p. 28).
  • 21
    V. Dornbusch & de Pablo (1990DORNBUSCH, R. & DE PABLO, J.C. (1990). “Argentina”. In Sachs, J.D.: Developing country debt and economic performance, vol. 2: Country Studies - Argentina, Bolívia, Brazil, Mexico. London. The University of Chicago Press. , p. 96f).
  • 22
    Nos conceitos da bounded rationality, o indivíduo muitas vezes reage passivamente ao mercado em vez de exercer cálculos complicados. A respeito da bounded rationality, v. Selten (1990SELTEN, R. (1990). “Some remarks on bounded rationality”. Discussion Paper nº B- 172, University of Bonn. ).
  • 23
    Também existe um problema de informação, Ou como Dornbusch, Sturzenegger & Wolf (l990DORNBUSCH, R. & STURZENEGGER, F. & WOLF, H. (1990). “Extreme inflation: dynamics and stabilization”. Brookings Papers on Economic Activity nº 2. ) constatam: “When inflation is moderate to high, budget balancing is viewed as a negative sum game. Too many participants feel that inflation is costly to them and too few perceive that the reduction in resource waste will more than cover their costs.” (p. 49).
  • 24
    V. Cukierman (1988CUKIERMAN, A. (1988). “The end of high israeli inflation: an experiment in heterodox stabilization”. In Bruno, M. (et al.). Inflation & stabilization. Cambridge, Ma., The MIT Press . , p. 66).
  • 25
    Aqui só será considerado o caso simplificado de duas estratégias possíveis por jogador.
  • 26
    Obviamente, esse preço parcialmente reflete as expectativas do jogador i.
  • 27
    Como esse fato é comum em países de inflação extremamente alta, esse modelo pode ser considerado como uma tentativa de explicação para esses países.
  • 28
    Essa função corresponde à função original de desembolso do nosso modelo na seção 1, ampliado pelo setor privado heterogêneo.
  • 29
    Como a árvore mostra, no momento em que os jogadores tomam a decisão, eles não conhecem o comportamento dos outros.
  • 30
    O first best seria (x,p1,p2) = (1,0,0) com os desembolsos (5/9,-1/9,-1/9). O second best seria (x,p1,p2)= (0,0,0).
  • 31
    Embora não continue no mesmo nível absoluto.
  • 32
    JEL Classification: E31; C70.

APÊNDICE

O jogo de half-of- the-average

Para mostrar que as pessoas nem sempre se comportam racionalmente, Simonsen (1987) explica no jogo de half-of-the-average como esse tipo de racionalidade limitada pode surgir.

O jogo tem n jogadores. Cada um deles escreve um número real do intervalo fechado [0; l] num papel. Sendo x\ o número escolhido pelo jogador i, sua função de desembolso é a seguinte:

z i = 0 , para x i > s 100 , para x i = s - 100 , para x i < s com s = 1 / 2 n i = 1 n x i

Conhecendo as decisões tomadas pelos outros, o jogador i escolheria o número xi seguindo o cálculo seguinte:

x i = n - 1 / 2 n - 1 y i com y i = 1 / n - 1 j i x j (1)

que iria maximizar o seu desembolso. O equilíbrio Nash nesse jogo é único. Se todos os jogadores escolhem xi=O, cada um deles ganha 100. Mas devido à forma da função de desembolso, a estratégia Nash pode, rapidamente, resultar em uma perda para o jogador que a escolher. Um único jogador que não agir de forma racional transforma a estratégia Nash em uma estratégia de perda, escolhendo um número maior do que x=O,

Como em (1) O~yi~l, cada escolha

x i n - 1 / 2 n - 1 (2)

significa uma estratégia Maximin. A retirada da desigualdade, deixando somente a igualdade, resulta na melhor estratégia Maximin dentre o conjunto de estratégias possíveis. Se os outros jogadores j ≠ i escolhem xj = 1, o jogador i consegue ganhar a quantia de 100, sem correr o risco de perder eventualmente 100, ou dependendo da racionalidade dos outros, decidindo-se segundo (2).

Seguindo Simonsen, vamos supor que os jogadores, num jogo de vários períodos, ao tomar suas decisões consideram que o comportamento dos outros participantes no próximo período será estático. Assumindo essa simples estratégia de aprendizado de Simonsen, há uma convergência para o equilíbrio Nash nesse jogo.

No primeiro período, sem que se tenha observado o comportamento dos outros, todos os jogadores escolhem as estratégias Maximin, ou seja:

x i 1 = n - 1 / 2 n - 1 (3)

Nos períodos seguintes os jogadores tomam as decisões a partir da estratégia de aprendizado, levando assim em conta o comportamento estático dos outros:

x i t = n - 1 / 2 n - 1 y i , t - 1 (4)

Como todos os jogadores seguem a mesma regra, eles se comportam de uma maneira similar, e pode-se concluir que xit = Yit. Usando esse resultado é possível reescrever (4) e mostrar o comportamento do jogador i no decorrer do tempo da seguinte maneira:

x i t = n - 1 / 2 n - 1 t , para t 1 . (5)

Para t → ∞ mostra uma convergência para o equilíbrio Nash.

Nagel (1993NAGEL, R. (1993). Experimental results on interactive competitive guessing. Discussion Paper nº B-236, University of Bonn. ) testou concepções parecidas do half-of-the-average game no laboratório experimental da Universidade de Bonn. Os experimentos feitos em dez sessões com um total de 166 participantes confirmaram um comportamento não racional. Eles levaram Nagel a propor uma teoria de bounded rationality e uma teoria de qualitative learning para explicar os resultados obtidos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 1995
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